A ética da liberdade

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14. As crianças e seus direitos

Já estabelecemos o direito de propriedade de cada homem à sua própria pessoa e à terra virgem que ele encontra e transforma através de seu trabalho, e mostramos que, a partir destes dois princípios, podemos deduzir a estrutura completa dos direitos de propriedade a todos os tipos de bens.  Isto inclui os bens que ele adquire por meio de troca ou como resultado de uma herança ou de uma doação voluntária. No entanto, resta definir o complicado caso das crianças.  O direito de autopropriedade de cada homem foi estabelecido para adultos, para autoproprietários naturais que têm que usar suas mentes para selecionar seus fins e ir atrás deles.  Por outro lado, é óbvio que um bebê recém-nascido não é, em nenhum sentido natural, um autoproprietário já existente, mas sim um autoproprietário em potencial.[1] Porém isto levanta uma difícil questão: quando, ou de que maneira, uma criança em desenvolvimento adquire seu direito natural à liberdade e à autopropriedade?  Gradualmente ou de uma hora para outra?  Em qual idade?   E qual critério estabelecemos para esta mudança ou transição?

Primeiro, vamos começar com a criança no período pré-natal.  Qual é o direito de propriedade sobre o feto que os pais, ou mais especificamente a mãe, possuem?  Em primeiro lugar, devemos observar que a posição conservadora católica geralmente tem sido rejeitada muito rapidamente.  Esta posição afirma que o feto é uma pessoa viva e, portanto, que o aborto é um ato de assassinato e, por isso, deve ser declarado ilegal como qualquer outro caso de assassinato.  A resposta mais comum é que se deve simplesmente demarcar onascimento como o início da vida de um ser humano possuindo direitos naturais, incluindo o direito de não ser assassinado; antes do nascimento, prossegue a contra-argumentação, a criança não pode ser considerada uma pessoa viva.  Contudo, a réplica católica de que o feto está vivo e na iminência de ser uma pessoa em potencial fica então perto demais da opinião geral de que um bebê recém-nascido não pode ser agredido porque ele é um adulto em potencial.  Enquanto o nascimento é de fato a linha de demarcação apropriada, a formulação usual faz do nascimento uma linha de divisão arbitrária, e falta fundamentação racional suficiente na teoria de autopropriedade.

A fundamentação apropriada para analisar o aborto está no absoluto direito de autopropriedade de cada homem.  Isto imediatamente implica que toda mulher tem o absoluto direito ao seu próprio corpo, que ela tem o domínio absoluto sobre seu corpo e sobre tudo que estiver dentro dele.  Isto inclui o feto.  A maioria dos fetos está no útero da mãe porque a mãe consentiu a esta situação, porém o feto está lá pelo livre e espontâneo consentimento da mãe.  Mas, se a mãe decidir que ela não deseja mais o feto ali, então o feto se torna um invasor parasitário de sua pessoa, e a mãe tem o pleno direito de expulsar o invasor de seu domínio.  O aborto não deveria ser considerado o “assassinato” de uma pessoa, mas sim a expulsão de um invasor não desejado do corpo da mãe.[2] Quaisquer leis restringindo ou proibindo o aborto são portanto invasões dos direitos das mães.

Tem sido objetado que, já que a mãe originalmente consentiu com a concepção, ela consequentemente “assumiu um compromisso” com o feto e não pode “violar” este “contrato” fazendo um aborto.  No entanto, existem muitos problemas nesta doutrina.  Em primeiro lugar, como veremos a seguir, uma mera promessa não é um contrato que pode ser compelido: os contratos só são apropriadamente executáveis se sua violação envolver roubo implícito, e claramente tal consideração não pode ser aplicada aqui.  Segundo, obviamente não há “contrato” aqui, já que o feto (óvulo fertilizado?) dificilmente pode ser considerado uma entidade contratante voluntária e consciente.  E terceiro, conforme vimos anteriormente, um ponto crucial da teoria libertária é a inalienabilidade da vontade e, portanto, a impossibilidade de se forçar contratos voluntários de escravidão.  Então, mesmo se tivesse sido firmado um “contrato”, ele não poderia ser executado porque a vontade da mãe é inalienável e ela não pode ser legitimamente escravizada a carregar e ter um bebê contra a vontade dela.

Outro argumento dos anti-aborcionistas é que o feto é um ser humano vivo e, por isso, é dotado de todos os direitos dos seres humanos.  Muito bem; vamos admitir, apenas para dar seguimento a argumentação, que os fetos são seres humanos  —  ou, de um modo mais geral, potenciais seres humanos  —  e são, por conseguinte, dotados da totalidade dos direitos humanos.  Mas, podemos perguntar, que humanos possuem o direito de ser parasitas coercivos dentro do corpo de um hospedeiro humano relutante?  Obviamente, nenhum humano que já nasceu tem tal direito e, portanto, a fortiori, o feto também não pode ter tal direito.

Os anti-aborcionistas geralmente exprimem o argumento anterior em termos do “direito à vida” do feto, em paralelo ao direito que os humanos nascidos possuem.  Não utilizamos este conceito neste volume por causa de sua ambiguidade, e porque qualquer direito apropriado subentendido por seus defensores está incluído no conceito do “direito de autopropriedade”   —  o direito de a pessoa estar livre de agressões.  Até a professora Judith Thomson, que, em sua discussão da questão do aborto, tenta inconscientemente manter o conceito de “direito à vida” ao lado do direito de se possuir o próprio corpo, demonstra lucidamente as armadilhas e os erros da doutrina do “direito à vida”:

Para algumas pessoas, ter o direito à vida inclui ter o direito a receber ao menos as necessidades mínimas suficientes para se continuar vivo.  Mas suponha que o que na verdade é o mínimo suficiente que um homem necessita para continuar vivo seja algo que ele não tem nenhum direito de receber?  Se eu tenho uma doença terminal e a única coisa que irá salvar minha vida é o toque da mão gélida de Henry Fonda em minha testa febril, então, ainda assim, eu não tenho o direito de receber o toque da mão gélida de Henry Fonda em minha testa febril.  Seria extremamente gentil da parte dele voar da costa oeste para me prover isto. . . . Mas eu não tenho absolutamente nenhum direito ante qualquer um de tal maneira que ele devesse fazer isso por mim.
Em resumo, é inadmissível interpretar o termo “direito à vida” para conceder a alguém um direito de compelir a ação de outra pessoa para prolongar aquela vida.  Em nossa terminologia, tal direito seria uma violação inadmissível do direito de autopropriedade de outra pessoa.  Ou, como diz a professora Thomson convincentemente, “ter o direito à vida não é garantia de um direito cujo uso lhe seja dado, nem de ter um direito de poder continuar a usar o corpo de outra pessoa  —  mesmo se a própria vida de alguém depender disso”. [3]

Agora suponha que o bebê tenha nascido.  E agora?  Primeiro, podemos dizer que os pais  —  ou preferivelmente, a mãe, que é o único parente garantido e visível  —,  por serem criadores do bebê, tornam-se proprietários dele.  Um bebê recém-nascido não pode ser um autoproprietário de verdade em nenhum sentido.  Por essa razão, a mãe ou qualquer outra parte ou partes podem ser o dono do bebê, contudo, afirmar que uma terceira parte possa reivindicar sua “propriedade” sobre o bebê daria a esta pessoa o direito de confiscar à força o bebê de seu dono natural, ou “original”, a sua mãe.  A mãe, então, é a dona natural e legítima do bebê, e qualquer tentativa de confiscar o bebê através da força é uma invasão do direito de propriedade dela.

Mas certamente a mãe ou os pais não podem receber a propriedade da criança como um domínio absoluto de bens herdados, porque isto implicaria a bizarra situação de um adulto de cinquenta anos de idade estar sujeito à absoluta e inquestionável jurisdição de seus pais de setenta anos de idade.  Assim, o direito de propriedade dos pais necessitam de um limite de tempo.  Mas ele também tem que estar limitado no tipo, pois certamente seria grotesco para um libertário que acredita no direito de autopropriedade defender o direito de um pai assassinar ou torturar seus filhos.

Portanto, devemos dizer que, mesmo a partir do nascimento, a propriedade dos pais não é absoluta mas sim uma espécie de tutela ou de “consignação”.  Resumindo, todo bebê, assim que nasce, e que consequentemente não está mais no interior do corpo de sua mãe, possui o direito de autopropriedade em virtude de ser uma entidade separada e um adulto em potencial.  Portanto, deve ser ilegal e uma violação dos direitos da criança que os pais agridam sua pessoa mutilando, torturando, assassinando etc.  Por outro lado, o próprio conceito de “direito” é um conceito “negativo”, que demarca as áreas de ação de uma pessoa em que nenhum homem pode interferir justamente.  Portanto, nenhum homem pode ter um “direito” de compelir alguém a efetuar um ato positivo, pois neste caso a compulsão viola o direito à pessoa ou à propriedade do indivíduo que está sendo coagido.  Deste modo, podemos dizer que um homem tem umdireito à sua propriedade (i.e., um direito de não ter sua propriedade invadida), porém não podemos dizer que qualquer um tenha o “direito” a um “salário digno”, pois isto significaria dizer que alguém seria coagido a prover este salário a ele, e isto violaria os direitos de propriedade da pessoa que está sendo coagida.  Como um corolário, isto significa que, em uma sociedade livre, nenhum homem deve ser sobrecarregado com a obrigação legal de fazer qualquer coisa por outro, já que isso invadiria os direitos do primeiro; a única obrigação legal que um homem tem para com outro é respeitar os direitos do outro homem.

Aplicando nossa teoria ao relacionamento entre pais e filhos, o que já foi dito significa que os pais não têm o direito de agredir seus filhos, mas também que os pais não deveriam ter a obrigação legal de alimentar, de vestir ou de educar seus filhos, já que estas obrigações acarretariam em ações positivas compelidas aos pais, privando-os de seus direitos.  Os pais, portanto, não podem assassinar ou mutilar seu filho, e a lei adequadamente proíbe um pai de fazer isso.[4] Mas os pais deveriam ter o direito legal de não alimentar o filho, i.e., de deixá-lo morrer.  A lei, portanto, não pode compelir justamente os pais a alimentar um filho ou a sustentar sua vida.[5] (Novamente, se os pais têm ou não têm mais propriamente uma obrigação moral ao invés de uma obrigação legalmente executável de manter seu filho vivo é completamente outra questão.) Esta regra nos permite resolver aquelas questões complicadas como: será que os pais deveriam ter o direito de deixar um recém-nascido deformado morrer (e.g., ao não alimentá-lo)?[6] A resposta é claramente sim, resultando a fortiori do direito mais amplo de permitir que qualquer recém-nascido, deformado ou não, morra.  (Não obstante, como iremos ver a seguir, em uma sociedade libertária a existência de um livre mercado de bebês irá fazer com que tal “desprezo” seja mínimo.)

Nossa teoria também nos possibilita examinar a questão do Dr.  Kenneth Edelin, do Hospital da Cidade de Boston, que em 1975 foi condenado por homicídio culposo por permitir que um feto morresse (obviamente, conforme o desejo da mãe) após realizar um aborto.  Se os pais possuem um direito legal de permitir que um bebê morra, então, a fortiori eles possuem o mesmo direito quanto a fetos fora do útero.  Semelhantemente, em um mundo futuro onde os bebês possam nascer em aparelhos fora do útero (“bebês de proveta”) mais uma vez os pais teriam o direito legal de “desligar os aparelhos” dos fetos, ou melhor, de se recusarem a pagar pelo funcionamento dos aparelhos.

Examinemos as implicações da doutrina de que os pais deveriam ter uma obrigação legalmente executável de manter seus filhos vivos.  O argumento a favor desta obrigação contém dois componentes: que os pais criaram o filho através de um ato proposital feito por livre escolha; e que a criança está temporariamente indefesa e não é uma autoproprietária.[7] Se considerarmos primeiro o argumento do desamparo, então antes temos que considerar a questão geral de que é uma falácia filosófica afirmar que as necessidades de Ajustamente impõem a B obrigações coercivas de satisfazer estas necessidades.  Porque, deste modo, os direitos de B são violados.  Segundo, se é possível afirmar que uma criança indefesa impõe obrigações legais a alguém, por que especificamente a seus pais e não a outras pessoas?  O que os pais têm a ver com isso?  A resposta, obviamente, é que eles são os criadores da criança, porém isto nos leva ao segundo argumento, o argumento da criação.

Então, considerando o argumento da criação, ele imediatamente exclui qualquer obrigação de uma mãe manter vivo um filho que tenha sido resultado de um ato de estupro, já que este não foi um ato livremente empreendido.  Ele também exclui qualquer obrigação de um padrasto, madrasta, tutor ou pais adotivos que não participaram de maneira alguma da criação da criança.

Além disso, se a criação engendra uma obrigação de sustentar a criança, por que essa obrigação deveria cessar quando a criança se torna um adulto?  Como Evers declara:

Os pais continuam sendo os criadores da criança, por que eles não são obrigados a sustentar a criança para sempre?  É verdade que a criança não é mais indefesa; mas o desamparo (como mostrado acima) não é por si só um motivo de se vincular obrigações.  Se a condição de ser o criador de um outro indivíduo é a fonte da obrigação, e esta condição persiste, por que a obrigação também não persiste?[8]
E quanto ao caso, em alguma época futura, de um cientista tornar-se capaz de criar vida humana em laboratório?  O cientista é o “criador”.  Será que ele também deve ter uma obrigação legal de manter a criança viva?  E suponha que a criança seja deformada e doente, quase não humana; será que ele ainda tem um vinculo de obrigação legal de manter a criança?  E, se tem, quanto de seus recursos  —  seu tempo, energia, dinheiro, bens de capital  —  ele deveria ser legalmente obrigado a investir para manter a criança viva?  Quando esta obrigação cessa, e por qual critério?

Esta questão dos recursos é igualmente relevante no caso de pais naturais.  Como Evers mostra:

[C]onsideremos o caso de pais pobres que tem um filho que adoece.  A doença é grave o bastante para que os pais, a fim de obter cuidados médicos para manter o bebê vivo, teriam que passar fome.  Será que os pais têm uma . . . obrigação de reduzir a qualidade de suas próprias vidas mesmo a ponto de se autoextinguirem para assistir a criança?[9]
E, se não, podemos acrescentar, especificamente em que ponto cessa a obrigação legal dos pais?  E através de qual critério?  Evers continua:

Alguém pode querer argumentar que os pais devem ter a obrigação de prover apenas um cuidado mínimo normal (calor, abrigo, nutrição) necessário para manter a criança viva.  Mas, se alguém vai defender a posição da obrigação, parece não ter lógica  —  tendo em vista a enorme variedade de qualidades e características humanas  —  vincular a obrigação ao leito procrustiano da média humana.[10]
Um argumento comum defende que o ato voluntário dos pais criou um “contrato” pelo qual os pais são obrigados a manter a criança.  Mas (a) isto também implicaria que o alegado “contrato” valeria para o feto, o que proibiria o aborto, e (b) isto incide em todas as dificuldades da teoria do contrato conforme analisado acima.

Finalmente, como Evers mostra, suponha que consideremos o caso de uma pessoa que voluntariamente resgata uma criança de um violento naufrágio em que os pais dela acabam morrendo.  Num sentido bem real, o salvador trouxe vida à criança; então será que o salvador tem atada a ele uma obrigação legal de manter a criança viva daí para frente?  Isto não seria uma “monstruosa servidão involuntária que estaria sendo impingida ao salvador?”[11] E, se seria para o salvador, porque não também para os pais naturais?

A mãe então, no nascimento de seu filho, torna-se a “proprietária da guarda” dele, com a única obrigação legal de não agredir a pessoa de seu filho, já que a criança possui a autopropriedade potencial.  Sem considerar isso, enquanto a criança viver em casa, ela tem que necessariamente estar sob a jurisdição de seus pais, já que ela está vivendo na propriedade que pertence aos pais.  Certamente os pais têm o direito de estabelecer regras para o uso da casa deles e propriamente para todas as pessoas (crianças ou não) que vivem naquela casa.

Mas quando é que diremos que esta jurisdição de guarda dos pais sobre os filhos deve terminar?  Com certeza qualquer idade específica (21, 18 ou qualquer outra) será totalmente arbitrária.  A pista para a solução desta espinhosa questão está nos direitos de propriedade dos pais sobre a casa deles.  Pois o filho tem seus plenosdireitos de autopropriedade quando demonstra que os têm naturalmente  —  resumindo, quando ele sai ou “foge” de casa.  Independentemente de sua idade, temos que conceder a toda criança o absoluto direito de fugir e de encontrar novos pais de criação que irão voluntariamente adotá-la, ou de tentar sobreviver por si só.  Os pais podem tentar convencer a criança fugitiva a retornar, mas é totalmente inadmissível que eles escravizem e agridam os seus direitos de autopropriedade usando a força para compeli-la a retornar.  O absoluto direito de fugir é a expressão suprema dos direitos de autopropriedade da criança, independentemente de sua idade.

Agora se os pais podem possuir seu filho (dentro do sistema da não agressão e da liberdade de fugir), então eles podem também transferir esta posse para outra pessoa.  Eles podem entregar o filho para adoção ou podem vender os direitos sobre a criança em um contrato voluntário.  Em resumo, temos que nos defrontar com o fato de que a sociedade genuinamente livre terá um próspero livre mercado de crianças.  Superficialmente isto parece monstruoso e desumano.  Mas uma reflexão mais apurada irá revelar o humanismo superior de tal mercado.  Pois temos que constatar que já existe um mercado de crianças hoje, mas, já que o governo proíbe a venda de crianças por um preço, os pais hoje podem apenas doar seus filhos a uma agência de adoção licenciada sem cobrar nada.[12] Isto quer dizer que de fato temos hoje um mercado de crianças, mas que o governo impinge um controle de preço máximo a zero e restringe o mercado a umas poucas agências privilegiadas e, portanto, monopolistas.  O resultado tem sido o de um típico mercado onde o preço do produto é mantido pelo governo muito abaixo do livre preço de mercado: uma enorme “escassez” do produto.  A demanda por bebês e crianças é geralmente muito maior do que a oferta, e consequentemente nos deparamos com tragédias diárias de adultos sendo privados das alegrias da adoção de crianças por agências de adoção tirânicas e intrometidas.  Na verdade, encontramos uma grande demanda insatisfeita de adultos e casais por crianças, assim como um grande número de bebês excedentes e indesejados que são negligenciados ou maltratados por seus pais.  Ao se permitir um livre mercado de crianças, este desequilíbrio seria eliminado, e se possibilitaria que bebês e crianças fossem alocados paralonge de pais que desprezam seus filhos ou que não se importam com eles, e para perto de pais adotivos que desejam profundamente estas crianças.  Todos os envolvidos: os pais naturais, as crianças e os pais adotivos que compram as crianças estariam em uma situação melhor neste tipo de sociedade.[13]

Então, na sociedade libertária a mãe teria o absoluto direito sobre seu próprio corpo e, portanto, o absoluto direito de fazer um aborto; e teria a propriedade da guarda de seus filhos, uma propriedade limitada somente pela ilegalidade da agressão contra suas pessoas e pelo absoluto direito de a criança fugir ou deixar o lar a qualquer momento.  Os pais poderiam vender seus direitos de guarda das crianças a qualquer um que desejasse comprá-los por um preço acordado reciprocamente.

Pode-se destacar que o estado atual das leis juvenis nos Estados Unidos é, em muitos pontos, praticamente o inverso do nosso desejado modelo libertário.  Na situação atual, tanto os direitos dos pais quanto os das crianças são sistematicamente violados pelo estado.[14]

Primeiro, os direitos dos pais.  Na lei atual, as crianças podem ser confiscadas de seus pais por outros adultos (quase sempre, o estado) pelas mais variadas razões.  Duas razões, abuso físico dos pais e abandono voluntário, são plausíveis, já que no primeiro caso os pais agrediram o filho e, no segundo, os pais voluntariamente abandonaram a custódia.  No entanto, dois pontos deveriam ser mencionados: (a) que, até poucos anos atrás, as decisões dos tribunais conferiam imunidade aos pais para delitos corriqueiros de agressões físicas contra seus filhos  —  felizmente, isto está sendo reparado;[15] e (b) apesar da grande publicidade sendo dada à “síndrome da criança espancada”, tem sido estimado que apenas 5% dos casos de “abuso infantil” envolvem agressão física por parte dos pais.[16]

Por outro lado, os dois outros fundamentos usados para se confiscar filhos de seus pais, ambos sendo inseridos na classificação geral de “negligência infantil”, claramente violam os direitos dos pais.  Eles são: não prover alimentação, abrigo, educação ou cuidados médicos “adequados” a seus filhos; e não proporcionar um “ambiente conveniente” a seus filhos.  Deveria ser óbvio que estas duas categorias, especialmente a segunda, são vagas o suficiente para fornecer uma desculpa para o estado confiscar praticamente qualquer criança, já que cabe ao estado definir o que é “adequado” e “conveniente”.  Igualmente vagos são os outros critérios, corolários, que permitem ao estado confiscar filhos cujo “desenvolvimento ideal” não esteja sendo promovido pelos pais, ou quando os “melhores interesses” da criança (novamente, tudo definido pelo estado) assim sugerirem.  Alguns casos recentes servirão para exemplificar o quão abrangente tem sido este poder confiscatório.  No caso In re Watson de 1950, o estado considerou que uma mãe negligenciou três filhos em virtude do fato de que ela era “incapaz pela razão de seu status emocional, sua condição mental e seus supostos sentimentos profundamente religiosos equivalerem a fanatismo”.  Nesta decisão, repleta de implicações totalitárias, o tribunal salientou a suposta obrigação de os pais criarem seus filhos de acordo com as “convenções e costumes da comunidade em que pretendem viver” e em respeito a elas.[17] Em 1954, no caso Hunter v. Powers, o tribunal novamente violou a liberdade religiosa, bem como os direitos dos pais, ao confiscar um filho sob o fundamento de que os pais estavam muito intensamente devotados a uma religião dissidente, e que a criança deveria na verdade estar estudando ou brincando ao invés de decorando literatura religiosa.  Um ano antes, no caso In re Black, um tribunal de Utah confiscou oito filhos de seus pais porque os pais se omitiram em ensinar às crianças que a poligamia era imoral.[18]

Além da religião, a moralidade pessoal também tem sido ditada pelo governo.  Em 1962, cinco crianças foram confiscadas da mãe por um tribunal sob a alegação de que a mãe “frequentemente recebia companhias masculinas no apartamento”.  Em outros casos, os tribunais têm considerado que os pais foram “negligentes” com os filhos, e, por isso, confiscaram as crianças, porque as brigas dos pais ou um sentimento de insegurança do filho supostamente colocavam em risco seus melhores interesses.

Em uma decisão recente, o juiz Woodside do Tribunal Superior da Pensilvânia alertou diretamente a respeito do enorme potencial coercivo do critério de “melhores interesses”:

O tribunal não deveria tomar dos pais a custódia de um filho somente sob o fundamento de que o estado ou suas agências podem encontrar um lar melhor para ele.  Se o critério do “lar melhor” for o único critério, os funcionários públicos de bem estar social poderiam tomar os filhos de metade dos pais cujos lares são considerados menos desejáveis e colocá-los nos lares da outra metade da população que possui os lares considerados mais desejáveis.  Estendendo mais este princípio, veríamos que a família que fosse considerada a possuidora do melhor lar poderia escolher qualquer um de nossos filhos.[19]
Os direitos das crianças, ainda mais que os dos pais, têm sido invadidos sistematicamente pelo estado.  As leis de frequência escolar obrigatória, endêmicas nos Estados Unidos desde a virada deste século, obrigam as crianças a comparecer às escolas públicas ou privadas aprovadas oficialmente pelo estado.[20] As leis de trabalho infantil supostamente “humanitárias” têm sistematicamente impedido, através do uso da força, que as crianças entrem no mercado de trabalho, privilegiando assim os seus concorrentes adultos.  Ao impedi-las violentamente de trabalhar e de ganhar a vida, e ao obrigá-las a ir para escolas que elas geralmente desgostam ou que não sejam apropriadas para elas, as crianças frequentemente se tornam “vadias”, uma acusação usada pelo estado para colocá-las em instituições penais chamadas “reformatórios”, onde as crianças são de fato aprisionadas por agirem ou deixarem de agir de formas que jamais poderiam ser consideradas “crimes” se efetuadas por adultos.

Na verdade, foi estimado que de 25% a 50% dos “delinquentes juvenis” atualmente encarcerados pelo estado não cometeram atos que seriam considerados crimes se cometidos por adultos (i.e., agressões contra a pessoa e a propriedade).[21] Os “crimes” dessas crianças estavam no exercício de suas liberdades de maneiras que desagradam os asseclas do estado: vadiagem, “incorrigibilidade”, fuga de casa.  Entre os sexos, são particularmente as meninas que são presas desta maneira por ações “imorais” ao invés de por ações verdadeiramente criminosas.  A porcentagem de garotas presas por imoralidade (relações sexuais “impertinentes”) ao invés de por crimes genuínos vai de 50% até mais de 80%.[22]

Desde a decisão da Suprema Corte dos EUA no caso de 1967, In re Gault, tem sido concedido aos réus juvenis, ao menos teoricamente, os direitos processuais elementares de adultos (o direito de ser informado sobre as acusações formais específicas, o direito à assistência judiciária, o direito de interrogar testemunhas), mas eles foram concedidos somente em casos onde eles foram acusados de algum crime.  Como Beatrice Levidow escreveu, a decisão de Gault e outras similares:

não se aplicam a quaisquer audições adjudicativas exceto àquelas em que o delito de que o jovem está sendo acusado seja uma violação de leis criminais se cometido por um adulto.  Portanto, as garantias dos casos Kent, Gault e Winship não protegem devidamente os direitos processuais dos jovens que são dependentes, que estão abandonados, necessitados de supervisão, que são vagabundos, que fugiram de casa ou realizaram outros atos que só são delitos quando praticados por jovens como fumar, beber, ficar na rua até tarde etc.[23]
Como resultado, os jovens são comumente privados destes direitos processuais elementares concedidos aos réus adultos, como o direito a fiança, o direito a uma transcrição, o direito à apelação, o direito a um júri, o ônus da prova caber à acusação e a ilegalidade de se usarem provas que são baseadas apenas em rumores.  Como Roscoe Pound escreveu, “os poderes da Star Chamber inglesa eram uma ninharia quando comparados àqueles de nossos tribunais juvenis”.  De vez em quando, um juiz dissidente faz uma crítica incisiva deste sistema.  Assim, o juiz Michael Musmanno declarou em um caso na Pensilvânia em 1954:

Certas garantias legais e constitucionais, como a isenção da autoincriminação, a nulidade de testemunhos de terceiros que se baseiem em rumores, a interdição ex parte e de informações secretas, tudo isso sustentado invejosamente nas decisões do Wyoming ao Alabama, devem ser jogadas fora na Pensilvânia quando a pessoa que comparece ante o tribunal de justiça for um menino ou menina de pouca idade.[24]
Além disso, os códigos de leis juvenis do estado são guarnecidos de uma linguagem vaga que possibilita acusações e encarceramentos quase que ilimitados por diversas formas de “imoralidade”, “vadiagem comum”, “desobediência habitual”, “incorrigibilidade”, “ingovernabilidade”, “depravação moral”, “risco de se tornar moralmente depravado”, “conduta imoral” e até associação com pessoas de “caráter imoral”.[25]

Além do mais, a tirania de sentenças indefinidas (veja nosso capítulo anterior sobre punição) tem sido manejada contra os jovens, com eles frequentemente recebendo uma sentença mais longa do que um adulto receberia pelo mesmo delito.  Na verdade, a regra na justiça juvenil contemporânea tem sido impor uma sentença que pode deixar um jovem na cadeia até que ele atinja a maioridade.  Além disso, recentemente, em alguns estados, esta deplorável situação tem sido agravada separando-se os jovens em duas categorias  —  criminosos genuínos que são classificados como “delinquentes”, e a outra, crianças “imorais” que são classificadas como “pessoas que necessitam ser supervisionadas” ou PENS (“Pessoa Em Necessidade de Supervisão”).  Depois disso, os “criminosos” PENS recebem sentenças mais longas do que os verdadeiros criminosos juvenis! Assim, em um estudo recente, Paul Lerman escreve:

A extensão da permanência institucional era de dois a vinte e oito meses para delinquentes e de quatro a quarenta e oito meses para garotos PENS; a média era nove meses para delinquentes e trinta meses para PENS; e a duração média de permanência era 10,7 meses para delinquentes e 16,3 meses para PENS. . . .

Os resultados de tempo de permanência não incluem o período de detenção; o estágio do processo correcional anterior a colocação em uma instituição.  Análises de números recentes de detenções nas cinco regiões da cidade de Nova Iorque revelam o seguinte padrão: (1) garotos e garotas PENS têm mais chances de serem detidos do que os delinquentes (54% a 31%); e (2) uma vez que os jovens PENS são detidos, eles têm o dobro de chances de serem detidos por mais de 30 dias do que os delinquentes normais (50% a 25%).[26]
Mais uma vez, são as jovens femininas que predominantemente são punidas por delitos “imorais”.  Por exemplo, um recente estudo no Havaí descobriu que garotas acusadas meramente de fugir de casa passavam normalmente duas semanas na detenção aguardando julgamento, enquanto os garotos acusados por crimes reais eram detidos por apenas poucos dias; e que quase 70% das garotas presas em uma escola reformatória estatal estavam encarceradas por delitos de imoralidade, enquanto o mesmo ocorria com apenas 13% dos garotos presos.[27]

A concepção judicial atual, que considera que a criança praticamente não tem nenhum direito, foi analisada vigorosamente pelo juiz Abe Fortas da Suprema Corte em sua decisão no caso Gault:

A ideia de crime e de punição deveria ser abandonada.  A criança deveria ser “tratada” e “reabilitada” e os procedimentos, da detenção até a institucionalização, deveriam ser “clínicos” ao invés de punitivos.

Estes resultados deveriam ser obtidos, sem nenhum prejuízo conceitual e constitucional, ao se insistir que os procedimentos não eram inimigos, pois o estado estava procedendo como parens patriae (o estado como pai).  A frase em latim provou-se ser uma grande ajuda para aqueles que visam racionalizar a exclusão de jovens do cenário constitucional; mas este significado é obscuro e suas credenciais históricas são de relevância duvidosa.

. . . O direito do estado, como parens patriae, de negar às crianças os direitos processuais disponíveis aos mais velhos foi elaborado a partir da asserção de que uma criança, diferentemente de um adulto, não tem um direito “à liberdade e sim à custódia”.  . . . Se seus pais falharem em executar efetivamente suas funções de custódia  —  isto é, se a criança for “delinquente”  —  o estado pode interferir.  Ao fazer isso, ele não priva a criança de quaisquer direitos, porque ela não tem nenhum.  Ele apenas fornece a “custódia” que a criança merece.  Baseando-se nisso, os procedimentos envolvendo jovens eram descritos como “civis”, não “criminais”, e, portanto, não sujeitos aos requerimentos que restringem o estado quando ele busca privar uma pessoa de sua liberdade.[28]
Pode-se acrescentar que chamar uma ação de “civil” ou de “custódia” não faz a prisão deixar de ser uma prisão, nem a torna um pouco mais agradável para a vítima do “tratamento” ou da “reabilitação”.  O criminologista Frederick Howlett criticou vigorosamente o sistema do juizado de menores, e o colocou em um abrangente contexto libertário.  Ele escreve sobre

a negação de certos direitos básicos dos indivíduos  —  o direito de se associar com quem eles escolherem e de se engajar voluntariamente em atos que não prejudiquem ninguém a não ser eles mesmo.  O bêbado que entope nossos tribunais deveria ter o direito de ficar bêbado; a . . . prostituta e seu cliente não deveriam ter que responder à justiça por um ato que é decisão pessoal deles.  Do mesmo modo, a criança malcriada tem o direito fundamental de ser uma criança, e, se ela não cometeu nenhum ato que seria considerado crime se fosse realizado por um adulto, por que levá-la diante de um tribunal . . . ?  Antes de se apressar em ameaçar ou em “ajudar” uma pessoa fora do sistema judicial, será que a comunidade não deveria considerar primeiramente a alternativa de não se fazer nada?  Será que ela não deveria reconhecer o direito da criança, enquanto pessoa, a não receber tratamento ou a ser livre de interferências de uma autoridade externa?[29]
Uma defesa particularmente eloquente dos direitos das crianças ocorreu em uma decisão de 1870 em Ilinois, anos antes da moderna afirmação do despotismo estatal no sistema de juizado de menores, iniciada na virada do século do período progressivo.  Nesta decisão em People ex rel.  O’Connell v.  Turner, o juiz Thornton declarou:

O princípio de assimilação da criança pelo estado e sua completa submissão a ele são totalmente inadmissíveis em um mundo moderno civilizado. . . .

Estas leis proporcionam a “proteção cuidadosa” da criança; elas conduzem suas “obrigações”, e somente um “ticket de saída”, dependente da discrição incontrolada de uma junta de guardiões, permite que um garoto encarcerado respire o ar puro do paraíso do lado de fora dos muros de sua prisão e sinta os instintos da idade adulta através do contato com o mundo ativo. . . . O confinamento pode ser de um a quinze anos, conforme a idade da criança.  A clemência do executivo não pode abrir as portas da prisão, pois nenhum delito foi cometido.  O mandado dohabeas corpus, um mandado para assegurar a liberdade, não pode proporcionar alívio nenhum, pois o poder soberano do estado, como parens patriae, determinou que o encarceramento é impossível de ser revogado.  Esta restrição da liberdade natural é tirania e opressão.  Se, sem crime, sem condenação por qualquer delito, as crianças do estado devem assim ser confinadas pelo “bem da sociedade”, então seria melhor que a sociedade fosse reduzida a seus elementos originais, e que o governo livre reconhecesse seu fracasso. . . .

A incapacidade dos menores não faz deles escravos ou criminosos. . . . Podemos deter crianças responsáveis por seus delitos; responsáveis por suas ofensas; impor pesados fardos sobre seus ombros, e ainda privá-las de suas liberdades, sem acusação ou sem ter havido condenação por crimes?  [A Carta de Direitos de Ilinois, seguida da Declaração de Direitos da Virginia e da Declaração da Independência, declara que] “todos os homens são naturalmente livres e independentes, e possuem certos direitos inerentes e inalienáveis  —  entre eles à vida, à liberdade e à busca da felicidade”.  Esta linguagem não é restritiva; ela é clara e compreensiva, e declara uma grande verdade, a de que “todos os homens”, todas as pessoas, em todo lugar, possuem o direito inerente e inalienável à liberdade.  Devemos dizer às crianças do estado, vós não podereis usufruir deste direito  —  um direito independente de todas as leis e regulamentos humanos. . . . Mesmo os criminosos não podem ser condenados e aprisionados sem o devido processo da lei.[30]
[1] John Locke, em seu Dois Tratados Sobre o Governo, pág. 432, expressou-se desta forma:

Os filhos, confesso, não nascem nesse estado pleno de igualdade (de direito à sua liberdade natural), embora nasçam para ele.  Quando vêm ao mundo, e por algum tempo depois, seus pais têm sobre eles uma espécie de domínio e jurisdição, mas apenas temporários.  Os laços dessa sujeição assemelham-se aos cueiros em que são envoltos e que o sustentam durante a fraqueza da infância.  Quando crescem, a idade e a razão os vão afrouxando até caírem finalmente de todo, deixando o homem à sua própria e livre disposição.
[2] O que estamos tentando estabelecer aqui não é a moralidade do aborto (que pode ou não pode ser moral por outras razões), mas sua legalidade, i.e., o direito absoluto de a mãe fazer um aborto.  O que nos interessa neste livro é o direito de as pessoas fazerem ou não fazerem diversas coisas, não se elas deveriam ou não deveriam exercer estes direitos.  Deste modo, argumentaríamos que todas as pessoas têm o direitode comprar e consumir uma Coca-Cola de um vendedor voluntário, não que qualquer pessoa deveria ou não deveria realmente realizar tal compra.

[3] Judith Jarvis Thomson, “A Defense of Abortion,” Philosophy and Public Affairs (Outono 1971): 55–56.

[4] Sobre a distinção entre eutanásia ativa e passiva, veja Philippa R. Foot, Virtues and Vices (Berkeley: University of California Press, 1978), págs. 50ff.

[5] Confira a visão do teórico anarquista individualista Benjamin R. Tucker: “Sob uma liberdade equitativa, ao passo que ela [a criança] desenvolve individualidade e independência, lhe é conferida imunidade de ataques ou invasões, e isso é tudo.  Se os pais deixarem de sustentá-la, não por isso eles obrigam qualquer outro a sustentá-la”.  Benjamin R.  Tucker, Instead of a Book (New York: B.R. Tucker, 1893), pág. 144.

[6] O programa original da Euthanasia Society of America incluiu o direito de os pais deixarem que bebês monstruosos morram.  Esta também tem sido uma prática comum e crescente de parteiras e de obstetras, que deixam bebês monstruosos morrerem no nascimento ao simplesmente não executarem ações positivas para mantê-los vivos.  Veja John A. Robertson, “Involuntary Euthanasia of Defective Newborns: A Legal Analysis,” Stanford Law Review (Janeiro 1975): 214–15.

[7] O argumento deste e do próximo parágrafo fia-se excessivamente em Williamson M. Evers, “Political Theory and the Legal Rights of Children,” (manuscrito não publicado), págs. 13-17.  Veja também Evers, “The Law of Omissions and Neglect of Children,” Journal of Libertarian Studies 2 (Inverno1978): 1-10.

[8] Evers, “Political Theory,” pág. 17.

[9] Ibid., pág. 16.

[10] Ibid., págs. 16–17.

[11] Ibid., pág. 15–16.

[12] Hoje é possível fazer “arranjos independentes” de uns pais para outras pessoas, mas eles só podem ser feitos com a aprovação de um juiz, e tais arranjos são desencorajados oficialmente.  Assim, em Petitions of Goldman, a Suprema Corte de Massachusetts recusou-se a permitir que um casal judeu adotasse gêmeos nascidos de pais católicos, ainda que os pais naturais estivessem totalmente de acordo com a adoção.  O fundamento da recusa foi de que os regulamentos estatais proibiam adoções inter-religiões.  Veja Lawrence List, “A Child and a Wall: A Study of ‘Religious Protection’ Laws,” Buffalo Law Review (1963–64): 29; citado em Evers, “Political Theory,” págs. 17-18.

[13] Alguns anos atrás, as autoridades de Nova Iorque orgulhosamente anunciaram que haviam desmembrado um “conluio ilegal de bebês”.  Os bebês estavam sendo importados da Grécia, por determinado preço, por negociantes audazes e então vendidos a ansiosos pais em Nova Iorque.  Ninguém pareceu perceber que todos os envolvidos nesta transação alegadamente bárbara se beneficiaram: os necessitados pais gregos ganhavam dinheiro, assim como a satisfação de saber que seu bebê iria crescer em um lar muito mais abastado; os novos pais tinham a realização de seu imenso desejo de terem um filho; e os bebês, que eram transferidos para um ambiente muito melhor.  E os negociantes colhem seus lucros como intermediários.  Todos ganharam; quem perdeu?

[14] Sobre o atual estado do direito juvenil em relação ao modelo libertário, estou em débito com Evers, “Political Theory,” passim.

[15] A imunidade foi originalmente concedida aos pais em uma decisão de 1891 de um tribunal do Mississipi emHewlett v. Ragsdale.  No entanto, recentemente, os tribunais têm concedido às crianças seus plenos direitos de apresentar processos por lesões.  Veja Lawrence S. Allen, “Parent and Child-Tort Liability of Parent to Unemancipated Child,” Case Western Reserve Law Review (novembro1967): 139; Dennis L. Bekemeyer, “A Child’s Rights Against His Parent: Evolution of the Parental Immunity Doctrine,” University of Illinois Law Forum (Inverno 1967): 806-7; e Kenneth D.  McCloskey, “Parental Liability to a Minor Child for Injuries Caused by Excessive Punishment,” Hastings Law Journal (fevereiro 1960): 335-40.

[16] Quanto a isso, veja o relato do condado de Cook em Patrick T. Murphy, Our Kindly Parent  —  the State(New York: Viking Press, 1974), págs. 153-54

[17]Compare o pronunciamento de Sanford Katz, um proeminente especialista em “abuso infantil”: “negligência infantil envolve uma conduta dos pais, geralmente pensada em termos de comportamento passivo, que resulta em uma ausência de provisão das necessidades da criança conforme definidas pelos valores escolhidos da comunidade”.  Sanford Katz, When Parents Fail (Boston: Beacon Press, 1971), pág. 22.  Sobre a disputa entre pais e sobre In re Watson, veja Michael F.  Sullivan, “Child Neglect: The Environmental Aspects,” Ohio State Law Journal (1968): 89–90,152–53.

[18] Veja Sullivan, “Child Neglect,” pág. 90.

[19] Citado em Richard S. Levine, “Caveat Parens: A Demystification of the Child Protection System,”University of Pittsburgh Law Review (Outono 1973): 32.  O conceito frequentemente proposto de um “direito de a criança ser desejada” tem implicações muito mais bizarras e totalitárias.  Sem considerar a impossibilidade de se utilizar a violência para impingir uma emoção a alguma outra pessoa, tal critério iria dar às partes não envolvidas, na prática o estado, o poder de determinar quando o “desejo” existe e de confiscar os filhos de pais que não obedeçam a este critério praticamente indefinível.  Deste modo, Hillary Rodham, do Fundo de Defesa à Criança, desafiou este critério: “Como um ‘direito de ser desejado’ deve ser definido e imposto? . . . As diretrizes necessariamente vagas e amplas desta imposição poderiam ressuscitar os perigos das leis atuais, novamente requerendo que o estado faça julgamentos gerais discricionários a respeito da qualidade da vida de uma criança.” Hillary Rodham, “Children Under the Law,” Harvard Educational Review(1973): 496.

[20] Sobre a educação compulsória nos Estados Unidos, veja William F. Rickenbacker, ed., The Twelve-Year Sentence (LaSalle, III.: Open Court, 1974).

[21] Veja William H. Sheridan, “Juveniles Who Commit Noncriminal Acts: Why Treat in a Correctional System?”Federal Probation (Março 1967): 27.  Veja também Murphy, Our Kindly Parent, pág. 104.

[22] Além de Sheridan, “Juveniles Who Commit Noncriminal Acts,” pág. 27, veja Paul Lerman, “Child Convicts,”Transaction (julho-agosto1971): 35; Meda Chesney-Lind, “Juvenile Delinquency: The Sexualization of Female Crime,” Psychology Today (Julho 1974): 45; Colonel F. Betz, “Minor’s Rights to Consent to an Abortion,” Santa Clara Lawyer (Primavera 1971): 469-78; Ellen M. McNamara, “The Minor’s Right to Abortion and the Requirement of Parental Consent,” Virginia Law Review (fevereiro 1974): 30532; e Sol Rubin, “Children as Victims of Institutionalization,” Child Welfare (janeiro 1972): 9.

[23] Beatrice Levidow, “Overdue Process for Juveniles: For the Retroactive Restoration of Constitutional Rights,” Howard Law Journal (1972): 413.

[24] Citado em J. Douglas Irmen, “Children’s Liberation  —  Reforming Juvenile Justice,” University of Kansas Law Review (1972–73): 181-83.  Veja também Mark J. Green, “The Law of the Young,” em B. Wasserstein and M. Green, eds., With Justice for Some (Boston: Beacon Press, 1970), pág. 33; Sanford J. Fox, Cases and Material on Modern Juvenile Justice (St. Paul, Minn.: West, 1972), pág. 68.

[25] Veja a discordância da Justiça de Cadena no caso E.S.G. v. State de 1969 no Texas, em Fox, Cases and Material on Modern Juvenile Justice, págs. 296–98.  Veja também Lawrence J. Wolk, “Juvenile Court Statutes  —  Are They Void for Vagueness?” New York University Review of Law and Social Change (Inverno 1974): 53; Irmen, “Children’s Liberation,” págs. 181  —  83; e Lawrence R. Sidman, “The Massachusetts Stubborn Child Law: Law and Order in the Home,” Family Law Quarterly (Primavera 1972): 40–45.

[26] Lerman, “Child Convicts,” pág. 38.  Veja também Nora Klapmuts, “Children’s Rights: The Legal Rights of Minors in Conflict with Law or Social Custom,” Crime and Delinquency Literature (setembro 1972): 471.

[27] Meda Chesney-Lind, “Juvenile Delinquency,” pág. 46.

[28] Fox, Cases and Material on Modern Juvenile Justice, pág. 14.

[29] Frederick W. Howlett, “Is the YSB All it’s Cracked Up to Be?” Crime and Delinquency (outubro 1973): 489  —  91.  Em seu excelente livro, The Child Savers, Anthony Platt chama a atenção para o fato de que a origem do sistema juvenil de juizado reformatório escolar do período progressivo, na virada do século XX, foi especificamente programada para impor uma “reforma” despótica na “imoralidade” das crianças da nação de maneira significativa.  Deste modo, Platt, em The Child Savers (Chicago: University of Chicago Press, 1970), pág. 99–100, escreve que os “protetores da criança”

se mostraram muito mais ativos e alcançaram maior êxito na tarefa de estender o controle governamental sobre todo o conjunto de atividades juvenis que anteriormente eram ignoradas ou tratadas informalmente. . . . Os protetores da criança eram em um sentido geral proibicionistas que acreditavam que o progresso social depende da imposição eficiente da lei, da estrita supervisão do lazer e da recreação das crianças, e da regulamentação de prazeres ilícitos.  Seus esforços eram direcionados ao resgate de crianças de instituições e situações (teatros, salões de festas, bares etc.) que ameaçassem suas “dependências”.  O movimento de proteção à criança também levantou o assunto da preservação da criança a fim de fazer objeções a uma série de instituições “depravadas”: assim, as crianças só poderiam ser protegidas do sexo e do álcool através da destruição de bordéis e bares.
Veja também ibid., págs. 54,67-68, 140.  Para manifestações anteriores de “proteção às crianças”, parens patriae, e para o encarceramento de jovens por vadiagem, veja J. Lawrence Schultz, “The Cycle of Juvenile Court History,” Crime and Delinquency (outubro 1973): 468; e Katz, When Parents Fail, pág. 188.

[30] 55 I11.  280 (1870),  republicado em Robert H. Bremner, ed., Children and Youth in America (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1970–74), vol.  2, págs. 485–87.  Naturalmente, os reformadores da “proteção à criança” irritaram-se com os resultados da decisão O’Connel, que o proeminente reformador social e infantil Frederick Wines chamou de “absolutamente prejudicial.  Ela emana de uma sensibilidade mórbida a respeito da liberdade pessoal”.  Veja Platt, The Child Savers, pág. 106.

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