Keynes tem que morrer para que a economia sobreviva

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Nas eleições presidenciais americanas de 2012, Barack Obama alertou que os Estados Unidos mergulhariam numa profunda depressão se o plano de Ron Paul de cortar $ 1 trilhão do orçamento federal fosse posto em prática.

Opa, perdão. Não foi Obama quem alertou que os cortes orçamentários levariam à depressão.

Foi Mitt Romney.

Romney acabaria se tornando o candidato do Partido Republicano, o autointitulado “partido pró-livre mercado”.

Uma ideologia se torna vitoriosa quando ambos os lados da “opinião respeitável” tomam suas ideias básicas como algo natural e inquestionável. Eis o quão completa foi a vitória keynesiana.

A bem da verdade, o keynesianismo já havia se tornado a ideologia prevalecente uma década antes de Romney sequer ter nascido.

A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, o influente tratado de John Maynard Keynes, surgiu durante a Grande Depressão, uma época em que um grande número de pessoas começava a duvidar dos méritos e da resiliência do capitalismo. Era uma obra de teoria econômica, mas seus propagandistas insistiam que ela oferecia também respostas práticas para questões contemporâneas urgentes, como: como ocorrera a Depressão, e por que estava sendo tão duradoura?

A resposta para ambas as perguntas, segundo Keynes e seus seguidores, era a mesma: falta de intervenção estatal.

No entanto, como demonstrou Murray Rothbard em seu livro de 1963 A Grande Depressão Americana, assim como Lionel Robbins e outros também já haviam escrito à época, a Depressão certamente não fora causada por falta de intervenção estatal.  Ela foi causada pelas políticas de expansão de crédito orquestrada pelos bancos centrais em todo o mundo, e foi prolongada por causa da imposição de várias soluções burlescas que os governos seguiam improvisando e implantando.

Para começar, Herbert Hoover aumentou os gastos do governo federal em 43% em um único ano: o orçamento do governo, que havia sido de US$ 3 bilhões em 1930, saltou para US$ 4,3 bilhões em 1931.  Já em junho de 1932, Hoover aumentou todas as alíquotas do imposto de renda, com a maior alíquota saltando de 25% para 63% (e Roosevelt, posteriormente, a elevaria para 82%).

A Grande Depressão, na verdade, não precisaria durar mais de um ano caso o governo americano permitisse ampla liberdade de preços e salários (exatamente como havia feito na depressão de 1921, que foi ainda mais intensa, mas que durou menos de um ano justamente porque o governo permitiu que o mercado se ajustasse).  Porém, o governo fez exatamente o contrário: além de aumentar impostos e gastos, ele também implantou políticas de controle de preços, controle de salários, aumento de tarifas de importação (que chegou ao maior nível da história), aumento do déficit e estimulou uma arregimentação sindical de modo a impedir que as empresas baixassem seus preços.

Contudo, a tese de que, durante uma recessão — e, principalmente, durante uma depressão — os governos nada deveriam fazer, não agradava aos próprios governos.  Políticos não gostam de inação; eles gostam de serem vistos como “pessoas que fazem”.   Consequentemente, era bem mais atraente às autoridades a mensagem que lhes transmitia Keynes: o livre mercado gera depressões, e para que haja prosperidade é necessário aumentar os gastos e intervenções do governo.

Discorramos brevemente sobre o livro que deu início a essa revolução ideológica. Para ser eufemista, a Teoria Geral não era exatamente o tipo de texto que alguém imaginaria que pudesse ter um poder avassalador.

Paul Samuelson, que viria a se tornar um dos mais notáveis propagandistas mundiais do keynesianismo, admitiu em um momento de rara sinceridade que, quando leu o livro pela primeira vez, não conseguiu ter “a menor ideia do que se tratava”.  “Acho que não estou revelando nenhum segredo”, disse ele, “quando afirmo solenemente — com base em lembranças pessoais vívidas — que ninguém em Cambridge, Massachusetts, realmente conseguiu entender o que estava escrito no livro, até mais ou menos doze ou dezoito meses após a publicação.”

A Teoria Geral, prosseguiu ele:

É um livro mal escrito e mal organizado; qualquer leigo que, ludibriado pela reputação passada do autor, comprasse o livro, teria sido lesado em cinco xelins. Não é adequado para uso em sala de aula. É arrogante, rancoroso, polêmico e pouco generoso em seus créditos. É cheio de mistificações e confusões. … Em suma, uma obra de gênio.

Murray Rothbard, que após a morte de Ludwig von Mises passou a ser considerado o decano da Escola Austríaca de Economia, escreveu vários textos críticos importantes sobre Keynes, bem como um longo e revelador ensaio biográfico sobre o cidadão. O primeiro desses textos veio na forma de um ensaio escrito quando Murray tinha apenas 21 anos de idade: Spotlight on Keynesian Economics. O segundo surgiu em seu tratado de 1962, Man, Economy, and State, e o terceiro compôs um capítulo de seu livro Por uma Nova Liberdade.

Murray não mediu palavras, referindo-se ao keynesianismo como “o embuste mais nocivo e bem-sucedido da história do pensamento econômico”. “Toda a lógica keynesiana”, acrescentou, “é um amálgama de distorções, falácias e premissas drasticamente fantasiosas.”

Além dos problemas do sistema keynesiano, havia os lamentáveis traços de Keynes como pessoa, dissecados nesta mini-biografia sobre Keynes. Deixarei Murray descrevê-los:

O primeiro era sua presunçosa vaidade, que lhe assegurava que pudesse lidar com todos os problemas intelectuais de forma rápida e acurada, e que o levou a desprezar qualquer princípio geral que pudesse limitar seu ego desenfreado. O segundo era seu forte sentimento de que não apenas havia nascido na elite britânica dominante, como também era predestinado a liderá-la. […]

O primeiro era sua presunçosa vaidade, que lhe assegurava que pudesse lidar com todos os problemas intelectuais de forma rápida e acurada, e que o levou a desprezar qualquer princípio geral que pudesse limitar seu ego desenfreado. O segundo era seu forte sentimento de que não apenas havia nascido na elite britânica dominante, como também era predestinado a liderá-la. […]

O terceiro elemento era seu profundo ódio e desprezo pelos valores e virtudes da burguesia, pela moralidade convencional, pela poupança, pela frugalidade, e pelas instituições básicas da vida familiar.

Quando ainda estudante na Universidade de Cambridge, Keynes integrou um grupo exclusivo e secreto denominado Os Apóstolos. Fazer parte desse grupo alimentou sua vaidade, sua egolatria e seu desprezo pelos outros. Em uma carta pessoal, ele escreveu: “Seria monomania esta avassaladora superioridade moral que sentimos? Tenho a sensação de que a maior parte do resto [do mundo além dos Apóstolos] nunca percebe absolutamente nada.  São ou muito idiotas ou muito corrompidos.”

Em sua juventude, Keynes e seus amigos se tornaram o que ele próprio denominava “imoralistas”. Em um texto de 1938 intitulado “My Early Beliefs“, ele escreveu:

Repudiávamos absolutamente qualquer obrigação pessoal nossa de obedecer a regras gerais. Tínhamos o direito de julgar cada indivíduo em seus méritos, e tínhamos a sabedoria para fazê-lo com êxito. Este era um componente muito importante da nossa crença, e a defendíamos com violência e agressividade. Para o mundo externo, essa era a nossa característica mais evidente e perigosa. Repudiávamos totalmente quaisquer formas de moralidade, convenção e sabedoria tradicionais. Éramos, em suma, e no sentido mais exato do termo, imoralistas.

Keynes tinha 55 anos quando publicou esse texto.  E, mesmo naquele estágio já avançado de sua vida, ele afirmou que o imoralismo “ainda é, no fundo, a minha religião. […] ainda sou e sempre serei um imoralista”.

No campo da economia, Keynes exibiu o mesmo tipo de abordagem que adotara em relação à filosofia e à vida em geral. “Tenho medo de ‘princípios'”, disse ele a uma comissão parlamentar em 1930. Essa, naturalmente, é a atitude de qualquer pessoa que ambiciona influência, prestígio e o exercício do poder; ter princípios apenas obstruiria seu caminho.

Dessa maneira, Keynes inicialmente defendia o livre comércio, depois virou a casaca em 1931 e se tornou um protecionista, voltando depois a defender o livre comércio durante a Segunda Guerra Mundial. Como disse Rothbard: “Nunca qualquer exame de consciência ou até mesmo uma simples hesitação refrearam suas mudanças vertiginosas.”

Seu livro a Teoria Geral dividiu a população mundial em vários grupos, cada um com suas características próprias. Aqui Keynes pôde dar vazão a seus ódios crônicos.

Primeiramente havia uma grande massa de consumidores, estúpidos e robóticos, cujas decisões de consumo eram fixas e determinadas por forças alheias, de forma que Keynes pôde reduzi-los a uma simples e matemática “função de consumo”.

Depois havia um subconjunto de consumidores, os poupadores burgueses, por quem Keynes tinha um particular desprezo. No passado, tais pessoas eram louvadas por seu hábito de poupar, que era o que possibilitava os investimentos que elevaram o padrão de vida de toda a população.  Mas o sistema keynesiano rompeu o vínculo entre poupança e investimento, alegando que os dois não tinham qualquer relação um com o outro. A poupança era, na verdade, um entrave ao sistema, dizia Keynes, e podia gerar recessões e depressões.

Assim, Keynes vituperou a burguesia, os hábitos burgueses e a respeitabilidade moral de se levar uma vida frugal e tradicional. Poupar era tolice, não sabedoria.

O terceiro grupo eram os investidores. Em relação a estes, Keynes era um pouco mais favorável. As atividades dessas pessoas não podiam ser reduzidas a uma mera função matemática.  Elas eram dinâmicas e livres. Porém, e infelizmente, elas também eram dadas a oscilações selvagens e irracionais em seu comportamento e em sua visão de mundo. Essas oscilações irracionais faziam da economia uma montanha-russa.

Finalmente, chegamos ao quarto e último grupo. Esse grupo é supremamente racional, economicamente sábio, e indispensável à estabilidade da economia. Esse grupo não apenas é capaz de invalidar as decisões tolas de todos os anteriores, como também é perfeitamente apto a impedir a economia de cair em depressões ou excessos inflacionários.

Você provavelmente não ficará espantado ao descobrir que os oniscientes e perspicazes peritos que integram o quarto grupo de Keynes são os políticos e as autoridades do governo.

Para compreender exatamente o que Keynes esperava que os políticos fizessem, analisemos brevemente o sistema econômico desenvolvido por ele em seu livro a Teoria Geral. Sua argumentação básica é que a economia de mercado tende a um estado crônico de subutilização dos recursos. Para que não se caia na depressão e nela se permaneça para sempre, é necessária a sábia supervisão e intervenção da classe política.

De novo, podemos tranquilamente rejeitar a possibilidade de as classes políticas do mundo ocidental terem abraçado o keynesianismo porque os políticos fizeram um profundo estudo das obras de Keynes. Pelo contrário: o keynesianismo soube apelar às duas maiores motivações dos políticos: sua necessidade de parecer indispensáveis e sua gana por exercer o poder.

O keynesianismo apenas brandiu essas ideias diante da classe política, a qual, então, reagiu como um cão salivante.  Lamento destruir sonhos romantizados e idílicos, mas o que houve foi apenas isso e nada mais do que isso.  Nenhum político fez qualquer estudo aprofundado das obras de Keynes para então adotar suas idéias.  Aliás, como o próprio Paul Samuleson confessou, nem ele próprio conseguiu entender Keynes.

Contudo, no início dos anos 1970, a economia keynesiana sofreu um golpe devastador; ou, para usar a expressão mais ilustrativa de Rothbard, “morreu do pescoço para cima”.

O keynesianismo não era capaz de explicar — e nem muito menos de resolver — a estagflação, ou recessão inflacionária, vivida pelos EUA e pela Inglaterra nos anos 1970.

Supostamente, era a função dos planejadores keynesianos conduzir a economia de modo a impedir as ameaças gêmeas: de um lado, uma economia superaquecida e inflacionária; de outro, uma economia deprimida, com deflação, e com desempenho abaixo do ideal. Durante um boom econômico, os planejadores keynesianos deveriam “enxugar o excessivo poder de compra” da população elevando impostos e, com isso, diminuindo o consumo. Durante uma depressão, os keynesianos deveriam diminuir os impostos e aumentar os gastos do governo para injetar consumo na economia.

Porém, quando ocorreu uma recessão inflacionária com alto desemprego, toda essa abordagem teve de ser descartada. O componente inflacionário sugeria que os gastos tinham de ser reduzidos.  Já o componente recessivo e do alto desemprego sugeria que os gastos tinham de ser aumentados. Como poderiam os planejadores keynesianos fazer ambos simultaneamente?  Como poderiam eles pisar no acelerador e no freio ao mesmo tempo?

Obviamente, isso não era possível, o que explica por que o keynesianismo entrou em declínio no final dos anos 1970, tornando-se uma teoria obtusa.

Em seu livro Man, Economy, and State, Rothbard demoliu o sistema keynesiano em todos os seus alicerces, mostrando que as relações entre os grandes agregados econômicos pressupostos pelos keynesianos, e essenciais a seu sistema, são completamente destituídos de lógica e não se sustentam. Ele implodiu os principais conceitos empregados nas análises keynesianas: função de consumo, multiplicador e acelerador, só para começar.

Bem, por que isso importa hoje?

Os erros de Keynes acabaram por conceder poder a classes políticas sociopáticas ao redor de todo o globo, e privaram o mundo do progresso econômico que, sem o keynesianismo, teríamos tido.

O Japão é um grande exemplo de ruína keynesiana: o índice Nikkei 225, que atingiu 38.500 em 1990, ainda não conseguiu chegar a sequer metade desse valor desde então. Um quarto de século atrás, o índice de produção industrial no Japão era de 96,8; após 25 anos de uma política keynesiana agressiva que deu ao Japão a maior dívida em relação ao PIB em todo o mundo (229,2% do PIB), o índice de produção industrial atual… continua em 96,8.

Enquanto isso, os Estados Unidos tiveram dezesseis anos de estímulo fiscal e taxas de juros absurdamente baixas, tudo encorajado pelos keynesianos. O resultado?  O número de empregos realmente capazes de sustentar uma família de classe média é hoje dois milhões a menos do que quando Bill Clinton deixou a presidência.

Nenhuma quantidade de estímulo parece ser suficiente; e, quando o estímulo fracassa, a visão tacanha do establishment keynesiano só consegue pensar em dobrar a aposta, sem jamais questionar a política em si.

Mas há uma alternativa, e é aquela defendida por Murray N. Rothbard e Ludwig von Mises: a Escola Austríaca de Economia e sua análise da economia de mercado pura.

Contra todo o edifício da opinião predominante, o Instituto Mises sempre se posicionou e se impôs como um crítico ferrenho das políticas predominantes. Para os dissidentes, os intelectualmente curiosos, os propensos a duvidar dos ditos especialistas que não produziram nada além de ruína, o Instituto Mises tem sido um farol.

Formamos toda uma geração de austríacos no meio acadêmico, jornalístico e financeiro. Nosso trabalhamos duro fez com que, quando uma catástrofe como a crise de 2008 ocorreu, a explicação austríaca já estava pronta.

Mas, com a sua ajuda, podemos realizar muito mais. Os keynesianos estão fingindo ter tudo sob controle, mas sabemos que isso é uma fantasia. Uma oportunidade ainda maior que a de 2008 nos aguarda, e queremos ajudar a conduzir a opinião pública e formar um quadro de jovens e brilhantes acadêmicos e eruditos para esse dia. Com a sua ajuda, podemos, enfim, acordar do pesadelo keynesiano.

Como disse um tradutor coreano de um texto austríaco: “Keynes tem que morrer para que a economia sobreviva.” Com a sua ajuda, podemos acelerar a chegada desse glorioso dia.

2 COMENTÁRIOS

  1. Antes de conhecer a Escola Austríaca eu achava que a Astrologia tinha mais base científica que a Economia, dados os fracassos repetidos de os economistas “mainstream” produzirem soluções minimamente eficientes.!

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