Existem muitas variantes do libertarianismo vivas no mundo atual, porém o rothbardianismo continua a ser seu centro de gravidade intelectual, sua consciência primordial, seu cerne moral e estratégico, e o ponto focal de debate até mesmo quando seu nome não é mencionado.
O motivo é que Murray Rothbard foi o criador do libertarianismo moderno, um sistema político-ideológico que propõe uma fuga decisiva das armadilhas da esquerda e da direita e de seus planos centrais acerca de como o poder estatal deve ser usado. O libertarianismo é a alternativa radical que afirma que o poder estatal é impraticável e imoral.
“Senhor Libertário” era como Murray N. Rothbard era chamado, e também de “O Maior Inimigo Vivo do Estado”. Ele continua a sê-lo. Sim, ele teve muitos antecessores, pelos quais ele foi influenciado: toda a tradição liberal clássica, os economistas austríacos, a postura anti-belicista da Old Right americana, e a tradição dos direitos naturais. Porém, foi ele quem juntou todas estas peças em um sistema unificado que a princípio parece implausível, mas que, uma vez definido e defendido por Rothbard, se mostra inevitável. As peças individuais deste sistema são claras, (autonomia individual, direitos de propriedade indeléveis, mercados livres, e uma postura anti-estado em todos os aspectos concebíveis), porém suas implicações são impactantes.
Após você ser exposto ao panorama completo — e Por uma Nova Liberdade vem sendo o principal meio de exposição por mais de um quarto de século — é impossível esquecê-lo. Ele se torna a lente indispensável pela qual podemos ver os eventos no mundo real com a maior clareza possível.
Este livro, mais que qualquer outro, explica por que a importância de Rothbard parece aumentar ano após ano (sua influência cresceu enormemente desde sua morte) e por que o rothbardianismo tem tantos inimigos na esquerda, na direita e no centro. A ciência de liberdade que ele trouxe claramente à tona é, pura e simplesmente, tão eletrizante na esperança que ela cria de um mundo livre quanto é implacável com o erro. Sua consistência lógica e moral, aliada à sua força intelectual, representa uma ameaça a qualquer visão ideológica que procure utilizar o estado para refazer o mundo de acordo com algum plano pré-programado. E, com a mesma intensidade, ela impressiona o leitor com uma visão auspiciosa do que pode ser realizado.
Rothbard começou a escrever este livro logo após receber uma ligação de Tom Mandel, um editor da Macmillan que havia visto um editorial de Rothbard no The New York Times publicado na primavera de 1971. Foi a única comissão recebida por Rothbard em toda a sua vida de uma editora comercial. Quando examinei o manuscrito original, tão consistente em sua tipografia e praticamente finalizado após o seu primeiro rascunho, pareceu-me visível que, para Rothbard, escrevê-lo foi uma alegria quase natural. Ele é consistente, implacável e enérgico.
O contexto histórico ilustra um ponto que frequentemente é ignorado: o libertarianismo moderno não nasceu em reação ao socialismo ou ao esquerdismo — embora ele seguramente seja anti-esquerda e anti-socialismo. Para ser mais exato, o libertarianismo, em seu contexto histórico, surgiu como uma resposta ao estatismo do conservadorismo e sua celebração seletiva de um planejamento central de estilo conservador. Os conservadores podem não adorar o estado de bem-estar social ou as regulamentações econômicas excessivas, porém apreciam o exercício do poder em nome do nacionalismo, do belicismo, de políticas “pró-família” e da invasão da privacidade e da liberdade pessoal. No período após o governo do democrata Lyndon Johnson, os presidentes republicanos, ainda mais do que os democratas, foram responsáveis pelas mais intensas expansões dos poderes executivo e judiciário. E foi para defender uma liberdade pura contra as concessões e corrupções do conservadorismo — iniciando-se com o período de Nixon, porém continuando ao longo das presidências de Reagan e Bush — que a economia política rothbardiana foi criada.
Também é notável como Rothbard opta por não usar meias-palavras em seu argumento. Outros intelectuais que tivessem recebido um convite semelhante poderiam ter sucumbido à tentação de diluir seus argumentos, para torná-los mais palatáveis. Por que, por exemplo, defender a ausência do estado quando defender um governo limitado poderia trazer mais pessoas para o movimento? Por que condenar o imperialismo americano quando fazê-lo apenas acabaria limitando a atração do livro a conservadores anti-soviéticos que, não fosse por este motivo, poderiam apreciar suas inclinações ao livre-mercado? Por que se aprofundar tanto na privatização dos tribunais, estradas e dos sistemas hídricos e correr o risco de, ao fazê-lo, se indispor com tantas pessoas? Por que entrar no terreno pantanoso da regulamentação do consumo e da moralidade pessoal — e fazê-lo com uma consistência tão desconcertante — quando seguramente um público maior teria sido atraído caso isto não fosse feito? E por que entrar em detalhes como questões monetárias, bancos centrais e tópicos semelhantes quando um argumento mais diluído em prol da livre iniciativa teria agradado muito mais em termos gerais?
Porém, enfeitar e ceder para agradar ou ganhar mais público simplesmente não era uma de suas características. Ele sabia que tinha uma oportunidade única na vida de apresentar o pacote completo do libertarianismo, em toda a sua glória, e não estava disposto a abrir mão disto. E é por isso que lemos neste livro não apenas um argumento para a diminuição do governo, mas também para a sua eliminação pura e simples; não apenas um argumento para a atribuição de direitos de propriedade, mas também para a submissão ao mercado até mesmo em questões relativas a aplicações de contratos; e não apenas um argumento a favor do corte do assistencialismo, mas também para o completo banimento de todo o sistema de bem-estar social.
Enquanto outras tentativas de se defender o libertarianismo, tanto antes quanto depois deste livro, costumam pedir por simples medidas de transição ou estão dispostas a ceder o máximo possível aos estatistas, não é isto que Murray nos oferece. Não ele, para quem sistemas como vouchers escolares ou a privatização de programas governamentais não deveriam sequer existir. Em seu lugar, ele apresenta e dá sequência à visão inteiramente completa e totalmente revigorante do que deve ser a liberdade. É por isto que tantas outras tentativas semelhantes de se escrever o Manifesto Libertário não resistiram ao teste do tempo, enquanto este livro continua a ser tão procurado.
Da mesma maneira, muitos livros foram escritos sobre o libertarianismo durante estes anos, que cobriram apenas a filosofia, a política, a economia ou a história. Aqueles que reuniram todos estes temas geralmente eram coletâneas de diversos autores. Apenas Rothbard tinha o domínio em todos os campos, o que lhe permitiu escrever um manifesto integral — um que jamais foi superado. E ainda assim, sua abordagem é tipicamente modesta: ele constantemente se refere a outros escritores e intelectuais do passado e de sua própria geração.
Ademais, algumas introduções deste tipo são escritas para dar ao leitor uma transição mais facilitada para um livro difícil; este, no entanto, não é o caso aqui. Ele jamais se refere ao leitor com condescendência, mas sempre com clareza. Rothbard fala por si mesmo. Pouparei o leitor de uma lista de minhas partes favoritas, ou de especulações sobre quais passagens Rothbard teria tornado mais claras se ele tivesse tido a chance de lançar uma nova edição. O leitor perceberá por sua própria conta como cada página exala energia e paixão, como a lógica de seu argumento é incrivelmente persuasiva, e como o fogo intelectual que inspirou esta obra escrita há mais de 40 anos continua a arder hoje com a mesma intensidade.
Este livro é considerado “perigoso” exatamente porque, uma vez ocorrida a exposição ao rothbardianismo, nenhum outro livro sobre política, economia ou sociologia poderá novamente ser lido da mesma maneira. O que era um fenômeno comercial acabou por se tornar genuinamente um manifesto clássico, o qual, prevejo, será lido por muitas gerações vindouras.