É algo maravilhoso ver o mercado em ação, tanto nos tempos bons quanto nos ruins. Apenas veja o modo como o sistema de preços — esse maravilhoso e espontâneo barômetro que coordena a utilização sensata dos recursos — reagiu em resposta à humana realidade da recessão econômica.
À medida que vamos nos preparando para o futuro, com as festas de fim de ano se aproximando, os consumidores estão se perguntando se é algo sensato incorrer em novas e excessivas obrigações financeiras. Eles estão cortando gastos e se mostrando incertos quanto ao clima econômico. Para a maioria das pessoas, a única evidência real do declínio econômico é a devastação que foi impingida aos seus fundos de pensão. E isso causa uma enorme hesitação psicológica em relação ao consumo.
A decisão dos consumidores em não gastar com frivolidades, mas sim com coisas necessárias, fornece um sólido incentivo para que eles equilibrem a responsabilidade financeira com suas necessidades materiais. E o comércio varejista está aí para tornar realidade essa opção. Assim, os preços estão caindo de um extremo ao outro. Brincos que antes custavam $700 hoje estão custando $250; bolsas que custavam $1000 hoje saem por $250; televisões de altas polegadas que antes custavam $2000 hoje estão saindo por $1.200; e ternos que antes estavam em $900 hoje saem por $400. As promoções estão por todos os lados, desde laptops e celulares, até carros. A experiência de vida ensina que agora é a hora de comprar.
Agora imagine se esses preços fossem determinados por um comitê central. A reação — se alguma houvesse — seria extremamente lenta. O comitê iria provavelmente se ater a alguma regra de precificação do tipo “custo a mais” — uma regra que fixa o preço de um produto de acordo com o custo de sua produção mais os lucros do produtor -, o que iria fazer com que a realidade presente fosse casada com os gastos passados, algo que seria desastroso. Mas no livre mercado há uma só realidade: o atual problema de se equilibrar a demanda do consumidor com a viabilidade econômica.
E o mecanismo de preços fornece o meio para se coordenar as demandas do consumidor com a realidade dos produtores. Os varejistas estão hoje com estoques excessivos de mercadorias, uma vez que compraram seus produtos de Natal ainda no primeiro semestre deste ano. (Nunca podemos nos esquecer do fato óbvio de que, uma vez que os vendedores têm de comprar os produtos antes de revendê-los, isso faz desta atividade uma iniciativa totalmente especulativa. Sempre.)
O declínio econômico veio pesada e repentinamente, e seu impacto foi sentido por toda a estrutura de produção. Os varejistas estão com sérios problemas: estoques excessivos, fluxo de caixa declinante e um setor financeiro avesso ao risco. A única solução é descarregar os produtos. E isso só será possível caso os preços sejam reduzidos, o que vai precisamente de acordo com a demanda dos consumidores. Desta forma, é nessa sinalização do mecanismo de preços que vemos uma notável coordenação acontecendo.
Quando todos esses cortes de preços são considerados conjuntamente — e eles estão difusos por toda a economia —, o que temos é um arranjo macroeconômico que é um grande alívio para os consumidores em tempos difíceis. Mas você não saberia disso se se informasse apenas pela imprensa convencional, que segue sua gritaria típica contra os supostos perigos da “deflação”. E assim, em uma incrível inversão dos fatos, temos de tolerar políticos, analistas financeiros e economistas sendo citados em todos os veículos de comunicação dizendo que o verdadeiro problema com a economia são os preços em queda.
Eles estão confundindo causa e efeito. A causa da recessão é o fato de a bolha ter estourado, e o efeito é a pressão baixista nos preços. Os interesses dos produtores e dos consumidores estão sendo coordenados pelo sistema de preços. Caso os planejadores centrais interrompam esse processo, eles acabarão punindo a todos: os consumidores, que não mais poderão poupar dinheiro com grandes promoções; e as empresas, que acabarão armazenando mais estoques do que são capazes de bancar. Seremos privados das bênçãos trazidas por preços menores, que são — contrariamente ao que alguns dizem — totalmente compatíveis com crescimento econômico.
Além disso, quanto menos os consumidores gastarem agora, mais estarão poupando para o futuro, o que também parece ser uma escolha sábia.
E não apenas isso: preços em queda são uma maneira eficiente de expurgar todos os erros econômicos de um sistema repleto de maus investimentos que ocorreram durante o período da expansão econômica artificial. Não entrarei em mais detalhes sobre esse assunto; apenas deixarei indicado o iluminador trabalho de Guido Hülsmann: Deflation and Liberty.
Aqueles que afirmam haver uma desarmonia de interesses entre os consumidores — que querem ver preços em queda — e a saúde geral da economia, o fazem por mostrar um apego ao pensamento keynesiano, que, em seu nível mais básico, garante que os preços não são capazes de coordenar oferta e demanda. Não obstante, vemos os preços agirem assim diariamente. O mercado, se deixado livre, é o meio através do qual a harmonia entre todos os agentes do mercado é alcançada.
Muitas pessoas ficam imaginando como é possível que o Federal Reserve (o banco central americano) esteja incorrendo em uma expansão monetária brutal, criando dinheiro sem quaisquer restrições, e ainda assim os preços estejam caindo. A resposta pode ser encontrada nos balancetes do sistema bancário. As reservas estão lá, mas não estão encontrando pessoas que as queiram emprestadas. Freqüentemente ouvimos dizer que está acontecendo uma contração no crédito. Errado. O que está ocorrendo de fato — e que é a real fonte desse suposto problema — é uma contração das tomadas de empréstimos. Os tomadores de empréstimo não estão em posição alguma de ampliar seus negócios e fazer investimentos futuros. É por isso que, apesar dos esforços do Fed em expandir a oferta monetária, o que está ocorrendo de fato é uma contração desta.
O Fed está criando uma variedade de artifícios para poder injetar trilhões de novos dólares na economia americana sem ter de depender do sistema bancário. Só o tempo dirá se isso vai funcionar ou não. Enquanto isso, um sério e iminente perigo nos espreita. Assim que a recessão acabar, os empréstimos serão retomados. Com um sistema bancário de reservas fracionárias e uma oferta ilimitada de dinheiro, provavelmente veremos uma reversão da tendência de queda dos preços — o que era uma leve deflação se tornará inflação, chegando possivelmente a uma hiperinflação. O momento em que isso ocorrerá e a extensão da gravidade dependem de inúmeras variáveis, mas definitivamente é algo a ser levado em consideração.
Sendo assim, a urgência em se cortar preços hoje se torna ainda mais evidente. Agora é a hora de diminuir os preços o máximo possível. Sim, isso significa mais bancarrotas e falências, desemprego e coisas piores, mas isso é exatamente o que é necessário. Como os austríacos já vêm dizendo há muito tempo, a recessão é um período de correção; uma fase necessária para se depurar os erros presentes na economia, erros esses que foram criados durante o período da expansão artificial. Não é uma praga econômica, mas um tônico que cura. Se deixarmos o mercado funcionar sem tentarmos interferir em suas operações, veremos a recessão rapidamente atingir o seu ápice. Porém, desse momento em diante, a economia estará preparada para um futuro de crescimento.
Não há nada que os governos possam fazer hoje — exceto revogar leis e regulamentações — que leve a um aprimoramento do funcionamento do mercado. Como Mises escreveu em seu magnífico ensaio sobre lucros e prejuízos, o sistema de preços é o que nos guia tanto para o sucesso quanto para o fracasso, em um ambiente de liberdade. Temos de saber tolerar igualmente os dois destinos.
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Ver também: Deflação: os maiores mitos e Deflação, livre ou compulsória