A economia da tragédia

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tragédiaOs pacotes de estímulo e outras intervenções governamentais seguem sendo implantadas a um ritmo alucinante em todo o mundo.  Os gênios que nos governam insistem em crer que confiscar a riqueza produzida pela economia voluntária e redirecioná-la para projetos arbitrários irá fazer com que todos fiquem mais ricos.

Infelizmente, grande parte daqueles que criticam essas medidas preferiu atacar a qualidade ou a “eficiência” (como se isso fosse possível) dos gastos públicos.  Com argumentos assim, a estatização do mundo estará completa em dois anos.

A principal falácia desse modo trágico de pensar a economia é a própria idéia de que a saúde da economia é produto dos gastos governamentais, os quais são financiados tanto por empréstimos contraídos pelo governo (o que deixa ao setor privado uma menor fatia do conjunto total da poupança disponível para mais empréstimos), ou pela simples e irrestrita impressão de dinheiro, ou pelo confisco direto da população (impostos).  Sempre que o governo gasta dinheiro em alguma coisa, tanto o volume do gasto como o seu destino serão necessariamente arbitrários, pois o governo não segue o mesmo mecanismo de lucros e prejuízos que impede o setor privado de desperdiçar recursos e de empregar seus fatores de produção de maneira tal que não atenda os desejos dos consumidores.  O governo pode confiscar os recursos das pessoas sem o consentimento delas, e não faz diferença para o governo se as pessoas querem ou não – ou se elas irão ou não – utilizar as coisas que ele irá produzir.  Enquanto isso, a economia fica sem os bens que teriam sido produzidos pelo setor voluntário caso o governo não tivesse confiscado esses recursos para seu próprio uso.

Os keynesianos mais sofisticados – perdão pelo paradoxo – irão reagir dizendo que, embora eles de fato concordem com esse argumento para a situação em que a economia está vivenciando um “pleno emprego”, seu ponto não é válido para quando há “recursos ociosos”.  Nesse caso, dizem eles, pode-se “estimular” esses recursos ociosos, colocando-os em ação sem que isso esteja retirando recursos de outros empregos, já que esses recursos ociosos atualmente não possuem nenhum emprego alternativo.

Boa tentativa.  Mas não importa quais sejam os projetos que os sábios planejadores inventem para empregar esses “recursos ociosos”, eles estarão inevitavelmente retirando recursos complementares de empregos alternativos que são mais urgentemente desejados do que qualquer projeto inventado pelo governo.  Vários recursos correntemente utilizados serão inevitavelmente retirados de seus empregos atuais a fim de se estimular os “recursos ociosos”.  Portanto, o argumento dos “recursos ociosos” realmente não consegue se esquivar do problema do custo de oportunidade. (Para uma refutação mais completa, veja este artigo).

Além disso, os proponentes desse tipo de estímulo mostram uma notável falta de interesse em saber por que estes “recursos ociosos” estão de fato ociosos.  Eles estão ociosos por causa de erros de cálculo empreendedorial cometidos na fase da expansão econômica.  E o que pode ter causado esses erros sistêmicos de cálculo?  Seria a manipulação das taxas de juros feita pelos bancos centrais, o que leva os investidores a fazer estimações incorretas sobre a lucratividade dos empreendimentos, provocando assim expansões econômicas artificiais? F.A. Hayek ganhou o Prêmio Nobel em 1974 por explicar – trabalhando em cima dos ensinamentos de Mises – como isso ocorre.

Imagine uma cidade.  Agora imagine que um circo venha para essa cidade fazer apresentações por algumas semanas.  O dono de um restaurante poderá expandir sua capacidade na falsa esperança de que o circo e o concomitante aumento na demanda por sua comida que tal evento irá acarretar irão durar para sempre.  Mas quando o circo encerrar suas apresentações na cidade, esse dono de restaurante perceberá que está com “recursos ociosos” em suas mãos.  Nesse cenário, não devemos tentar inventar maneiras de se empregar esses recursos ociosos.  Se fizermos isso, estaríamos apenas retirando mão-de-obra e outros recursos de outros setores da economia, onde eles estão correntemente empregados de modo a melhor satisfazer a demanda real dos consumidores.  O fato é que a expansão desse restaurante jamais deveria ter ocorrido.  Por isso, o certo é deixar que essa bolha ocorrida murche de volta para seu tamanho anterior, o que irá liberar recursos e permitir que outras atividades da economia – atividades que não sejam bolhas – possam correspondentemente se fortalecer.  (É preciso entender que os recursos de uma economia não são infinitos.  Por isso eles precisam ser liberados de alguns setores para poderem ser utilizados por outros setores. Veja mais aqui).

Após o estouro da bolha econômica – bolha essa gerada por um crescimento econômico insustentável criado pela expansão monetária feita pelo banco central – a economia de mercado e seu sistema de preços, se deixados livres, irão adotar um novo arranjo de recursos que irá empregar os fatores de produção disponíveis de modo que eles produzam os bens e serviços que correspondam à real demanda dos consumidores.  Durante essa recessão (rearranjo econômico), indivíduos interagindo livremente dentro do mercado irão classificar quais projetos e empreendimentos em andamento são sólidos e sustentáveis, e quais são apenas bolhas incapazes de se manter sem um constante e artificial aumento na oferta monetária, e que por isso não podem (e nem devem) sobreviver agora que realidade se reafirmou.

Foi isso que deixaram o mercado fazer durante a já esquecida depressão americana de 1920-1921.  Ao invés de criar um pacote de “estímulo fiscal”, o governo cortou seu orçamento.  O Fed (o banco central americano), por sua vez, não fez nada.  Enquanto isso, a economia pôde limpar os investimentos erroneamente empreendidos durante o falso crescimento econômico ocorrido nos anos anteriores (anos da Primeira Guerra Mundial), possibilitando assim uma robusta recuperação econômica (Ver mais aqui).

Nos EUA atual, o boom artificial ocorrido no mercado imobiliário fez com que os americanos se sentissem mais ricos do que de fato eram.  Como resultado, eles consumiram mais do que teriam consumido caso essa bolha imobiliária, totalmente criada pela expansão monetária promovida pelo Fed, não tivesse distorcido seu discernimento sobre o real valor de seu patrimônio líquido.  Os americanos compraram mais imóveis do que poderiam bancar, e por causa da aparentemente infinita apreciação desses imóveis (causada pelo estímulo creditício fornecido pelo Fed), os americanos podiam renegociar suas hipotecas e sair comprando mais bens de consumo.  E eles compraram mais bens – e só agora perceberam isso – do que deveriam ter comprado.  O que a economia americana precisa agora, portanto, não é de mais “gastos” per se.  Gastos e endividamentos excessivos causaram o problema inicial.  Os americanos estão com mais dívidas do que podem pagar – o que significa que calotes nos cartões de crédito irão gerar uma nova rodada de socorros financeiros.

Agora me expliquem: como é que mais “gastos” irão resolver esse problema?

Foi em parte por causa disso que a taxa de poupança dos americanos atingiu, nos últimos anos, a taxa mais baixa da história.  Poupar parecia algo supérfluo.  Afinal, eles possuíam um ativo que garantidamente iria se apreciar constantemente.  Foi isso, aliás, que os especialistas lhes disseram.  Os próprios economistas do Fed, formados e com titulações nas melhores universidades da área, garantiram que o aumento dramático ocorrido nos preços dos imóveis não era uma bolha insustentável que inevitavelmente estouraria.  Tratava-se de um aumento sustentável baseado em fatores reais.

Oops!

Uma economia que se baseava no endividamento e no consumo excessivo não deve ser “estimulada” para voltar a ser assim.  Ela deve ser re-estruturada seguindo-se diretivas sustentáveis.

Por exemplo, só agora a população americana está percebendo que o modelo adotado pela rede Starbucks – que tinha uma loja em cada esquina – era de fato uma bolha.  Com o estouro da bolha imobiliária, as pessoas puderam fazer uma estimativa mais acurada de seu real nível de riqueza.  Consequentemente, elas agora estão menos dispostas a pagar $5 por um copo de café – ou $6 por uma casquinha de sorvete, como estava ocorrendo na hoje moribunda rede Cold Stone Creamery.  Estes agora são recursos que precisam ser liberados para que outras empresas que estejam fazendo empreendimentos genuínos, empreendimentos que não são resultantes de bolhas, possam se fortalecer e, com isso, acelerar a recuperação econômica.

Em uma recente coletiva, o presidente Barack Obama citou o caso do Japão como evidência para seu argumento a favor dos estímulos.  O presidente precisa urgentemente trocar seus assessores econômicos, pois a verdade é outra: o Japão fez exatamente aquilo que o governo americano já fez e segue ameaçando fazer com ainda mais intensidade – e não obteve resultado algum.  Desde uma estatização parcial do sistema bancário até pacotes de “estímulo” totalizando trilhões de ienes, desde socorros financeiros a empresas zumbis até o corte da taxa básica de juros para zero, eles tentaram de tudo. (Leia um relato completo sobre o que foi feito no Japão aqui).

Naturalmente, a resposta keynesiana é que o Japão simplesmente não gastou o suficiente.  Hein?  Graças aos pacotes – incorretamente classificados como “estímulo” – que o governo japonês impôs sobre seu povo, o Japão é hoje o país mais endividado do mundo desenvolvido.  Assim sendo, será que se tornar o país mais endividado do mundo desenvolvido – e isso é um grande feito – ainda não significa “gastos suficientes” para os keynesianos?

O que seria suficiente, então?  Um quatrilhão de dólares?  Um googol de dólares? Infinito menos um dólar?  Realmente gostaria muito de saber qual a cifra para um pacote de “estímulo” que faria um keynesiano dizer, “Bom, agora esse valor já é demais!”

Se há algum consolo nessa crise, é que cada vez mais pessoas estão percebendo que a chamada opinião respeitável está totalmente errada, e há muito tempo.  A profissão econômica, em sua grande maioria, se constrangeu a si própria com um keynesianismo tão rude, que sequer conseguiria convencer um aluno de sexta série.  Aqueles que eram propagados como grandes especialistas, que foram incapazes de ver os sinais evidentes da crise e que não têm idéia de como ela ocorreu – “as pessoas incorreram em riscos excessivos!”, dizem eles, em uma não-explicação que simplesmente foge da pergunta – não têm a mínima idéia de como solucioná-la.

Foi por isso que escrevi meu novo livro Meltdown, que fornece um panorama de livre mercado sobre o que causou o problema, onde a economia se encontra agora e como sair da crise.  As pessoas estão prontas para ouvir idéias racionais e previamente negligenciadas, principalmente se as pessoas que as defendem foram as que previram a atual crise – como de fato os economistas seguidores da Escola Austríaca o fizeram.  Depende de nós levar a elas essas idéias.

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