“O Estado é a grande ficção pela qual todo mundo se esforça para viver à custa de todo mundo.” (Bastiat)
Nada mais natural que o sonho da casa própria. Todos gostam da idéia de ter um teto seu. Governos populistas exploram esta demanda, estimulando o crédito imobiliário ou mesmo a construção direta de casas populares. Trata-se de um “altruísmo” com o esforço alheio, já que o governo não passa de um instrumento que tira à força de José para dar a João. Quando as pessoas falam de “direito à moradia”, esquecem que casas não caem do céu; logo, o direito de João ter sua casa representa necessariamente o dever de José construí-la. Para Robinson Crusoé ter “direito” a uma casa, Sexta-Feira deve ser obrigado a fazê-la. Eufemismos à parte, isso tem um nome: escravidão.
Por que seria justo alguém ser forçado a trabalhar para que outro possa ter uma casa própria? Aliás, por que todos devem ter uma casa própria? A decisão de comprar uma casa, com crédito ou não, deve ser individual, de acordo com as possibilidades do orçamento. Muitas vezes não fará sentido comprar uma casa, sendo melhor viver de aluguel. Quando o governo intervém e estimula artificialmente a construção de casas e o crédito imobiliário, ele está praticando uma injustiça com os pagadores de impostos, além de incentivar a formação de distorções no mercado que podem eventualmente formar uma bolha.
O caso recente americano ilustra isso de forma clara, já que as impressões digitais do governo estavam em todas as cenas do crime. O governo foi o primeiro a estimular atos irresponsáveis que inflaram a bolha imobiliária, agradando os mais humildes num primeiro momento, mas causando grande estrago depois. O patamar de alavancagem das semi-estatais Fannie Mae e Freddie Mac virou uma bomba-relógio, um acidente pronto para acontecer. Empréstimos imobiliários foram concedidos para famílias sem emprego e sem renda, contando apenas com a constante elevação dos preços das casas. A “justiça social” custou caro ao pagador de impostos.
A simbiose entre governo e construtoras é extremamente perigosa. O governo populista usa impostos para fazer casas populares em busca de votos. As construtoras celebram o cliente gigantesco, e não muito preocupado com os custos e a qualidade, já que utiliza o dinheiro da “viúva”. Mas quem paga a conta superfaturada? Ora, a classe média, como sempre! O trabalhador liberal que não consegue fugir dos impostos e não tem como bancar um lobby poderoso em Brasília. O assalariado que é obrigado a descontar na folha de pagamento os pesados impostos todo mês. Enfim, aqueles eufemisticamente chamados de “contribuintes”, que são sempre convidados, sob a mira de uma arma, a arcar com a conta do populismo.
Na famosa novela A Nascente, de Ayn Rand, a construção de um conjunto habitacional popular pelo governo se torna peça central da trama. As palavras do herói Howard Roark, explicando ao parasita Peter Keating o que ele pensava sobre o assunto, merecem profunda reflexão por todos aqueles que suspendem o raciocínio em troca da boa sensação de pregar o altruísmo, mesmo que com o suor dos outros:
“Fico feliz se as pessoas que precisam de uma casa que eu projetei encontram um modo de viver melhor. Mas este não é o motivo do meu trabalho. Nem minha justificação. Nem minha recompensa. […] Que arquiteto não está interessado em conjuntos habitacionais? Detesto essa idéia maldita. Acho que é um empreendimento que tem seu valor… fornecer um apartamento decente a um homem que recebe quinze dólares por semana. Mas não às custas de outros homens. Não se isto aumenta os impostos, aumenta todos os outros aluguéis e obriga o homem que recebe quarenta a viver num buraco de rato. […] Eu não tenho vontade de penalizar um homem porque ele só vale quinze dólares por semana. Mas que um raio me parta se posso entender por que um homem que vale quarenta deve ser penalizado… e penalizado em favor de um que é menos competente. Claro, existe um monte de teorias sobre o assunto e livros e mais livros que discutem isso. Mas olhe só os resultados. Ainda assim, os arquitetos são todos a favor do governo bancar a habitação. E você conhece algum arquiteto que seja contra cidades planejadas? Eu só queria perguntar a cada um deles como podem ter certeza de que o plano adotado vai ser o seu. E se for, que direito tem ele de impor suas idéias aos outros? […] Não acredito em conjuntos habitacionais financiados pelo governo. Não quero ouvir nada sobre nobres propósitos. Acho que não são nobres.”
De acordo. Tais fins podem parecer nobres, mas não são. Enquanto arquitetos engajados, defensores de mais e mais governo ou mesmo de uma ditadura comunista, ficam ricos através de projetos do governo, a classe média sofre pagando mais impostos. Enquanto acionistas de construtoras aliadas do governo enchem um pouco mais os bolsos, a classe média paga mais caro para morar com seu próprio esforço. Enquanto o governo se perpetua no poder com programas populistas de casa própria, o preço das casas e dos aluguéis aumenta para a maioria. O certo seria chamar isso de “minha casa, sua vida”, já que a casa de um representa um fardo para a vida do outro.
E não adianta os que defendem o governo tentarem monopolizar os fins – moradia decente para os mais humildes, pois isso todos gostariam. O que está em debate são os meios pregados. O governo representa uma forma injusta e ineficiente para tal meta. Se o objetivo é ter mais moradia adequada para os pobres, então a solução é justamente retirar tantos obstáculos criados pelo próprio governo, começando pela imoral carga tributária e a asfixiante burocracia. O governo não é parte da solução, mas do problema.