Ontem, dia 15/02/2012, saiu no telejornal Bom Dia Brasil que o governo decidiu sobretaxar os cobertores vindos do Paraguai e do Uruguai, que na verdade são chineses.
De fato, os cobertores chineses já vinham recebendo uma sobretaxa resultante de uma medida de “defesa comercial” erguida sobre a acusação de que são oferecidos ao mercado doméstico sob preços bem mais em conta do que os concorrentes nacionais, o que para o empresariado nacional e os burocratas da Secretaria de Comércio Exterior significa a prática de “comércio desleal”.
Usando da criatividade, os exportadores fizeram uso das facilidades artificiais criadas pelo Mercosul, que concede privilégios aduaneiros aos dois países vizinhos, de modo que com pequenas modificações seus produtos passaram a constar como se tivessem sendo produzidos lá.
Pelo imbróglio, bem se vê o quanto o estado cria os próprios mecanismos de deturpação do bom funcionamento do mercado.
Em uma declaração que não consigo decifrar se é cínica, porque voltada aos brasileiros, ou patética, se dirigida aos próprios chineses, o senhor vice-presidente Michel Temer, que representou o governo brasileiro durante a segunda reunião da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban), pediu na segunda-feira (13-02-2012) que os chineses façam um “dimensionamento voluntário das exportações” para o Brasil, principalmente em setores sensíveis. “Nos preocupamos com o aumento maciço e indiscriminado de produtos chineses no mercado brasileiro e somos obrigados a registrar que ocasionam deslocamentos da produção brasileira”, discursou Temer para a comitiva chinesa.
Imagine alguém pedir a um comerciante que lhe venda um pouco menos. O que pode ser mais bizarro?
Vamos agora ao que interessa: os chineses estão nos vendendo cobertores baratos. Como isto pode tornar os brasileiros mais pobres? Visualize você próprio ganhando um cobertor de presente e reflita se você ficou mais pobre ou mais rico.
A verdade é que importações de produtos mais baratos fazem com que o padrão de vida de todos os brasileiros aumente, de modo que o dinheiro economizado poderá ser utilizado em outros fins, inclusive em investimentos produtivos.
Peço prestar atenção agora ao linguajar político-estatal, este cujas palavras são as mesmas do nosso vernáculo, mas com significados bem distintos, para traduzirmos corretamente o que se quer dizer por “defesa comercial”, “práticas desleais”, “condições não-adequadas” e “proteção da indústria nacional”:
“Estamos especialmente atentos a práticas ilegais e desleais que, de alguma maneira, permitem que produtos importados estejam competindo em condições não adequadas com os produtos e bens produzidos pela indústria brasileira”, afirma Tatiana Prazeres, secretária de comércio exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. (fonte acima)
Certamente, ao sobretaxar o produto importado, o governo consegue fazer com que este se nivele ao bem fabricado nacional. O que ele não fala — porque politicamente não interessa — é que tal nivelação se dá por cima, isto é, de forma que resultem preços mais caros ao consumidor. Em outras palavras, o governo decide prejudicar toda a população brasileira para suposta ou alegadamente defender um único setor industrial — e sem ter de promover nenhuma renúncia fiscal, claro.
Ademais, esta medida traz como consequência o encarceramento em cativeiro da indústria doméstica, já que as condições agora consideradas adequadas existem somente em solo pátrio. Além disso, traz também o desestímulo ao desenvolvimento tecnológico e à eficiência da indústria, que se torna acomodada e relaxada em sua posição de relativo conforto. Este filme já rodou diversas vezes na história e nunca aprendemos com ele.
O fato é que os produtos chineses poderiam encontrar em nosso mercado interno produtores compatriotas em condições de oferecer concorrência — com grande ganho para os consumidores — se nossa carga tributária e nossa burocracia não constituíssem obstáculos praticamente intransponíveis.
Entretanto, para o governo, isto está fora de cogitação. Não querendo abrir mão de todos os ovos da galinha, sequer deixa ao menos um, de indez; igualmente, também está fora de questão abdicar de legislar casuisticamente, sempre fazendo política com o patrocínio dos privilegiados e perseguindo desafetos.
A seu turno, a própria indústria objeto da medida de salvaguarda comercial não tem interesse em promover uma mitigação fiscal e uma racionalização da burocracia, vez que não quer se submeter ao processo de ampla concorrência. O que ela visa é justamente aquela proteção que lhe permita praticar os preços mais altos.
Percebam os leitores como aparecem as manchas, as sujeiras e os encardidos ao revirarmos ao avesso os discursos com que o governo e o empresariado encostado (os “fatcats” ou gatos gordos) se vestem. “Defesa Comercial”? A sobretaxação de cobertores importados chineses favorece os empresários encostados e a manutenção da carga tributária, enquanto prejudica severamente os consumidores, especialmente os mais pobres.
É função da população e das entidades representativas dos consumidores atacar este estado de coisas. É função de uma verdadeira oposição refutar e combater tais medidas protecionistas, para o bem, a justiça e o desenvolvimento de todos.
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