As revoluções comunistas do século XX tinham como objetivo confiscar a riqueza gerada por indústrias privadas e redistribuí-la para os trabalhadores “explorados”, sobre cujos ombros os lucros foram extraídos. Os EUA fizeram da rejeição desta ideia e do seu apoio aos princípios do livre mercado o ponto central de sua narrativa econômica. No entanto, em decorrência da política tributária atual e da política tributária que vem sendo sugerida para ser aplicada sobre os acionistas das grandes empresas, não é nenhum exagero dizer que governo americano confisca uma fatia da produção industrial que geraria inveja até mesmo no mais raivoso e radical bolchevique.
O propósito de uma empresa é gerar lucros para seus proprietários (todas as outras funções são secundárias a este objetivo). Empresas de capital aberto distribuem seus lucros por meio de dividendos. Porém, como resultado do sistema de tributação dupla vigente nos EUA, no qual a renda é tributada em nível corporativo e depois novamente em nível pessoal, o governo recebe uma fatia muito maior da renda das empresas do que seus próprios proprietários.
Suponha que uma empresa americana tenha obtido uma renda de um milhão de dólares durante o período de um ano. Atualmente, seus lucros seriam tributados a uma alíquota de 35% (para este exemplo ficar mais fluente, não levarei em conta a alíquota menor que incide sobre os primeiros $100.000 de lucros), o que significa que a empresa teria de pagar $350.000 diretamente para o governo (supondo que ela obteve sua renda sem deduções tributárias especiais). Dos $650.000 restantes, uma típica empresa distribuidora de dividendos distribuiria 40% para seus acionistas (isso é conhecido como “relação de pagamento” e a média real é um pouco menor do que 40%).
Portanto, neste exemplo, a empresa pagaria $260.000 (40% de $650.000) para seus acionistas. Os restantes $390.000 seriam normalmente mantidos como “lucros retidos” ou “lucros não distribuídos”, e seriam utilizados para manter e substituir equipamentos depreciados, para fazer novos investimentos, para financiar pesquisa e desenvolvimento e para expandir as operações da empresa. Se a empresa não fizer tais investimentos, será impossível sobreviver, e sua capacidade de perpetuar suas distribuições de lucros estaria limitada.
Estes lucros retidos ainda representam ativos para os acionistas, mas seu propósito principal é o de gerar lucros futuros e dividendos mais altos. Os acionistas só irão se beneficiar diretamente destes lucros retidos quando os dividendos futuros forem distribuídos. É claro que eles podem hoje vender suas ações e obter algum lucro — pagando o imposto sobre ganhos de capital ao fazerem isso —, mas tal atitude irá apenas transferir estes benefícios futuros para o novo comprador.
Quando distribuídos para os acionistas, os $260.000 em dividendos são tributados novamente a uma alíquota de 15% (de acordo com a lei vigente), agora em nível pessoal. Como resultado, os acionistas recebem apenas $221.000 daquele lucro de $1 milhão. Some estes $39.000 de impostos sobre dividendos aos $350.000 já confiscados pela alíquota de 35% do imposto de pessoa jurídica, e temos que o confisco governamental total dos lucros da empresa é de praticamente $390.000. Em outras palavras, o governo americano obtém desta empresa um fluxo de caixa 75% maior do que seus genuínos proprietários. Olhando de maneira ligeiramente diferente, o governo confisca aproximadamente 65% dos lucros não retidos, ao passo que os acionistas, que colocaram seu dinheiro na empresa e que correram todo o risco, recebem 35%. Isso parece justo?
Este nível de tributação coloca as empresas americanas em notória desvantagem em relação às empresas daqueles países contra os quais os EUA concorrem mais vigorosamente. Na China, a divisão do bolo é muito mais favorável aos proprietários. Lá, as empresas são tributadas a uma alíquota de 25%, e os dividendos, a 10%. Utilizando estes números (e a mesma “relação de pagamento” utilizada para a empresa americana), o governo chinês fica com 51% dos lucros corporativos distribuídos e os acionistas, com 49%. Em Hong Kong (que faz parte da China Comunista, mas que usufrui um governo independente), a situação é ainda melhor. Lá, a alíquota do imposto corporativo é de 16% e o imposto sobre dividendos é zero. Fazendo a mesma matemática, o governo fica com 33% e os acionistas ficam com 67%.
Esta comparação levanta um ponto interessante. Se os acionistas na China comunista podem manter para si uma fatia maior de seus ganhos do que os acionistas na América capitalista, qual nação é mais comunista e qual é mais capitalista?
No final de fevereiro, a administração Obama e Mitt Romney ofereceram propostas concorrenciais para uma reforma deste imposto corporativo, com ambos dizendo que suas propostas tornariam as empresas americanas mais competitivas. O plano de Romney reduz a alíquota do imposto corporativo para 25%, enquanto mantém o imposto sobre dividendos em 15%. Isto tornaria as coisas apenas ligeiramente melhores, com o governo abiscoitando 54% dos lucros distribuídos e os acionistas, 46% (distribuição esta ainda não tão generosa quanto a da China Comunista). Não surpreendentemente, o plano de Obama irá tornar as coisas muito mais difíceis.
Embora o presidente proponha reduzir a alíquota do imposto corporativo para 28% e também queira abolir o imposto sobre dividendos, ele quer passar a tributar as distribuições de dividendos como se fossem renda comum. Na prática, a vasta maioria dos indivíduos que recebe dividendos está na faixa mais alta da renda tributável. Isto significa que uma fatia muito volumosa destes dividendos será tributada segundo a alíquota mais alta do imposto de renda de pessoa física, que é de 39%. Mas Obama também quer submeter estas pessoas de renda mais alta a uma sobretaxa para assim poder financiar o plano de saúde socializado que ele quer implementar, o que significa que vários recebedores de dividendos serão tributados a uma alíquota de 44% (isso também levando em conta a abolição das deduções pessoais para os indivíduos de alta renda). Portanto, para estes indivíduos de alta renda, utilizando nosso atual exemplo, a nova distribuição segundo a proposta de Obama será de aproximadamente 70/30 a favor do governo. Isto é ainda pior do que a atual situação.
Mas as coisas são na realidade ainda piores do que isso. O imposto de renda corporativo é apenas uma das veias que as empresas abrem para o governo. Pense em todos os outros impostos que as empresas pagam, como encargos sociais e trabalhistas e impostos sobre vendas. É claro que estes impostos elas repassam aos seus empregados e consumidores, mas o fato é que a receita flui 100% para o governo, com seus acionistas não recebendo nada senão uma conta pelo custo da coleta.
E ainda há todos os impostos pagos diretamente pelos próprios empregados sobre seus salários. Claro, este dinheiro pertence aos empregados e não aos acionistas, mas se não fossem os lucros das empresas, estes salários, bem como os impostos pagos sobre eles, não existiriam. Quando todos estes canais de coleta de impostos são considerados, pense no total que o governo arrecada de impostos oriundos de atividades empresariais e compare ao total que os proprietários das empresas recebem em dividendos. Não dá pra saber o valor correto, mas tenho certeza de que a fatia que o governo confisca é várias vezes maior do que o total que os acionistas recebem.
Ainda no século XIX, a América era de fato um país capitalista. Não havia imposto de renda nem de pessoa física nem de pessoa jurídica. Os acionistas recebiam 100% dos lucros distribuídos. Como resultado desta estrutura, as empresas americanas cresceram aceleradamente e ajudaram a desencadear a mais veloz expansão econômica que o mundo jamais havia visto. Mas isso foi ontem, a realidade hoje é outra.
Considerando-se os atuais números, mesmo se os líderes americanos fossem marxistas ferrenhos, quais seriam suas motivações para estatizar empresas que estão na lista da Fortune 500 [relação das 500 empresas mais bem-sucedidas pela revista Fortune]? Dado que eles já recebem a maior fatia da distribuição dos lucros, qual seria o ponto de se estatizar empresas? Tal atitude iria apenas desarranjar e desordenar as estruturas produtivas, destruindo o que ainda resta de qualquer motivação em se buscar o lucro. Tal medida iria apenas matar a galinha dos ovos de ouro, e os socialistas sabem disso. Se o governo estatizasse uma empresa, ele também teria de gerenciá-la. Alguém realmente crê que burocratas tomariam decisões melhores do que proprietários privados? Nem os próprios burocratas acreditam nisso. E o que é pior, se estas decisões gerassem prejuízos em vez de lucros, o governo teria de absorver 100% destes prejuízos. Sob o atual sistema, por outro lado, o governo obtém a maior fatia dos lucros, ao passo que os acionistas privados ficam com 100% dos prejuízos. Impossível um sistema mais confortável para o governo.
Há um nome para este sistema vigente: fascismo. Embora o fascismo e o comunismo sejam formas de socialismo, os fascistas ao menos são espertos o bastante para entender que, se os meios de produção forem estatizados, seus empregados e proprietários não irão trabalhar com o mesmo afinco, e o governo acabará perdendo receitas.
É vergonhoso constatar que o país que já foi visto como o farol das liberdades civis e econômicas não mais possui sequer a capacidade de reconhecer o que é realmente capitalismo. Enquanto os proprietários das empresas continuarem não sendo apropriadamente recompensados pelos seus riscos por causa do governo, as empresas americanas jamais reconquistarão sua dominância, os americanos não reconquistarão suas liberdades perdidas e o padrão de vida do país continuará em queda livre. Como as coisas estão hoje, os EUA já se tornaram um povo que vive do governo, para o governo e pelo governo, e não o contrário. Os “comunistas” chineses têm muito o que aprender conosco.