Hitler vs. Stalin: a Frente Oriental, 1941–1945

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[Resenha de Livro: “Deathride: Hitler vs. Stalin: the Eastern Front, 1941–1945” (“Trajeto Mortal: Hitler vs. Stalin: a Frente Oriental, 1941–1945”), de John Mosier, Simon & Schuster, Nova York, 470 páginas, 2010.]

Ao longo do último meio século, têm sido apresentadas ao grande público leitor numerosas histórias da titânica luta armada dos anos 1940 entre a Alemanha e a União Soviética; e essas histórias, na sua maioria, seguem o mesmo padrão: a Alemanha, liderada pelo seu Führer louco e ávido por conquistas, fez um ataque surpresa à URSS. Os alemães obtiveram muitos ganhos rápidos e várias vitórias fáceis sobre um desavisado inimigo russo. Porém, à medida que os russos se recuperavam da surpresa inicial, eles mobilizaram os seus ilimitados recursos em homens e produção industrial e revidaram, forçando gradualmente os invasores a recuarem através das fronteiras e, por fim, derrotando a ameaça nazista praticamente sozinhos. Os alemães se enfraqueciam em todas as áreas, ao passo em que os russos se fortaleciam cada vez mais, tornando inevitável a derrota dos germânicos. Os Aliados ocidentais ajudaram, sim, mas foram os russos que, de forma esmagadora, derrotaram a ameaça nazista. Assim prossegue o roteiro recebido.

Pilhas de estatísticas soviéticas e uma quantidade de documentos soviéticos parecem corroborar as alegações de Stálin sobre o desenrolar da guerra. A maior parte dos historiadores ocidentais aceitou a veracidade dessas fontes e as cita rotineiramente, mesmo hoje nas obras mais recentes, como, por exemplo, nos numerosos estudos de David Glantz sobre as diversas batalhas no leste. Historiadores anteriores, como John Erickson, fizeram o mesmo, oferecendo os seus trabalhos para serem utilizados de forma um tanto incestuosa por escritores posteriores, estabelecendo essa versão inspirada em Stálin como escrita, estabelecida. Os poucos historiadores que contradizem esse roteiro recebido viram a si mesmos e às suas obras rotulados como “controversos” e as suas teses e ideias geralmente rejeitadas ou tratadas com desprezo.

Um granadeiro alemão na Frente Oriental encara a câmera. A guerra entre a Alemanha e a União Soviética começou como um ataque surpresa de um Führer ávido por conquistas ou como um ataque preventivo contra um predador soviético preparado para invadir a Alemanha e a Europa?

John Mosier é um desses historiadores, cujos recentes trabalhos — The Myth of the Great War (“O Mito da Grande Guerra”), The Blitzkrieg Myth (“O Mito da Blitzkrieg”) e Cross of Iron (“Cruz de Ferro”) — têm consistentemente consolidado o ponto de que pesquisas mais profundas e objetivas revelam uma realidade bastante diferente das presunções comuns sobre as duas principais guerras da Alemanha (Primeira e Segunda Guerras Mundiais). Mas o seu trabalho mais recente, Deathride (“Trajeto Mortal”), certamente o colocará em sérios apuros. As surpresas são muitas. Em vez de como um ditador louco, como um ditador que estava ávido por conquistar o mundo e que cometia erros intermináveis, Hitler é apresentado como um homem são e racional que toma decisões sensatas e bastante inteligentes, entendendo estratégia e política global muito melhor que os seus generais. No lugar de um ataque surpresa aos inocentes russos, Mosier concluiu que a guerra foi um ataque preventivo [“pre-emptive strike”] contra um predador preparado para invadir a Alemanha e a Europa. Viktor Suvorov — o autor da pioneira obra Icebreaker (“Quebra-gelo”) e do trabalho posterior The Chief Culprit (“O Principal Culpado”) — e Joachim Hoffmann — autor de Stalin’s War of Extermination (“A Guerra de Extermínio de Stálin”) — são respeitosamente citados como fontes importantes. Isso, por si só, já é uma grande surpresa, visto que a maioria dos historiadores rejeita com desdém as descobertas deles ou simplesmente ignora por completo as obras desses autores. A própria ideia de atribuir aos soviéticos a culpa real pela guerra ao invés de a Hitler contradiz muitas verdades estabelecidas e costuma ser tratada como tabu.

“As evidências mais recentes confirmam aquilo que os interrogatórios alemães de oficiais soviéticos capturados revelaram em 1941: que Stálin planejava, de fato, atacar Hitler no primeiro momento oportuno. Por aproximadamente cinquenta anos, essa ideia tem sido: ou descartada como absolutamente desprezível, como absolutamente indigna de qualquer consideração; ou atacada de maneira selvagem, apesar de ela se conformar ao padrão de comportamento soviético tanto de antes de 1939 quanto de depois de 1945.

Portanto, as evidências recentes contradizem uma lenda stalinista desde há muito tempo estabelecida e certamente explicam a motivação de Hitler: o seu ataque à União Soviética foi um ataque preventivo.” (p. 82)

E:

“Um resumo dos principais interrogatórios e das deduções dos interrogadores, material retirado dos registros da Wehrmacht [as forças militares alemãs da época, compostas pelo Heer – Exército, pela Kriegsmarine – Marinha e pela Luftwaffe – Aeronáutica], está contido em Joachim Hoffmann, Stalin’s War of Extermination, 1941–1945: Planning, Realization, Documentation (“A Guerra de Extermínio de Stálin, 1941–1945: Planejamento, Concretização, Documentação”), traduzido por William Diest (Capshaw, Alabama, Theses and Dissertations Press, 2005, páginas 80–88). (…) Em 1990, Vladimir Rezhun, um desertor que tinha sido oficial da inteligência militar soviética, escrevendo sob o pseudônimo de Suvorov, publicou Icebreaker: Who Started the Second World War (“Quebra-gelo: Quem Iniciou a Segunda Guerra Mundial”), traduzido por Thomas Beattie (Londres, Hamish Hamilton, 1990). Nesse livro, ele resumiu os planos de Stálin e ofereceu, como evidência comprobatória, as disposições do Exército Vermelho em posições avançadas (tais disposições são corroboradas pelos interrogatórios da Wehrmacht também resumidos por Hoffmann, Stalin’s War of Extermination, páginas 65–70). Após o colapso da URSS, as intenções enumeradas nas obras de Hoffmann e Suvorov foram confirmadas, mais notavelmente por Constantine Pleshakov (Stalin’s Folly — ‘A Loucura de Stálin’), mas também por outros estudiosos russos (conferir a extensa citação em Stalin’s Folly, p. 285).” (nota 49/p. 397)

Uma tendência comum dos generais alemães após a guerra era concordar com muitas dessas suposições. Eles buscavam se distanciar de Hitler e do nacional-socialismo, apresentando o líder nazista como uma espécie de flautista mágico que os enganou e os forçou a entrar na guerra. De acordo com essa versão que servia aos seus próprios interesses, todas as coisas que deram errado foram por causa das decisões e intromissões insanas de Hitler, ao passo em que tudo que deu certo foi resultado da genialidade desses mesmos generais. O objetivo era, em primeiro lugar, proteger as próprias reputações; em segundo lugar, proteger a imagem do estado-maior (alto comando) alemão; e, em terceiro lugar, simplesmente sobreviver na Alemanha do pós-guerra e fortalecer o relacionamento deles com os conquistadores, particularmente com os EUA, que ocuparam — e que, sem dúvida, prosseguem ocupando — a Alemanha derrotada.

Mosier assinala que, em quase todos os casos, Hitler estava correto nas suas decisões, enquanto os seus generais se encontravam errados. A casta de oficiais alemães era treinada para tomar cidades grandes e, especialmente, capitais; mas Hitler compreendia que as guerras modernas se compunham de natureza mais econômica — conflitos para se apoderar de recursos, tanto para negar ao inimigo a capacidade de travar guerras quanto para, em concomitância, incrementar a própria capacidade de fazer isso. O autor afirma que os generais de Hitler simplesmente não conseguiam compreender essa visão.
“Uma das queixas certeiras de Hitler sobre os seus generais era a de que eles nada entendiam sobre ‘os aspectos econômicos da guerra’; a generalização podia ser estendida a áreas fora da economia.” (p. 31)

E:

“Os comandantes do exército, desde os primórdios, imaginavam de forma tradicional o objetivo de uma guerra com a Rússia: a destruição dos exércitos e a ocupação das antigas e novas capitais, especialmente Moscou.” Mosier citando o livro Panzer Leader (“Líder Panzer”), de Heinz Guderian: “[Hitler] dizia que as matérias-primas e a agricultura da Ucrânia eram vitalmente necessárias para a futura condução da guerra. Ele falou, mais de uma vez, da necessidade de neutralizar a Crimeia, ‘o porta-aviões soviético para atacar os campos de petróleo romenos’. Pela primeira vez, eu o ouvi usar a frase: ‘Os meus generais não sabem nada sobre os aspectos econômicos da guerra.’ [citado de Panzer Leader, edição Da Capo de 1996, p. 200] (…).” (páginas 131–132)

A análise de Mosier dos mitos soviéticos inspirados por Stálin está repleta de um estudo cuidadoso tanto dos registros alemães quanto dos registros russos. Na sua opinião, os registros alemães são bastante precisos, acurados, e foram mantidos em minuciosos, minudentes detalhes. Longe de uma força militar alemã se enfraquecendo ano após ano, tanto em efetivo quanto em blindados, etc., o autor demonstra que ela paulatinamente se fortalecia em tropas, em blindados, em todas as formas de poder efetivo de fogo e em qualidade de liderança, tanto tática quanto estratégica. Os recursos russos, apresentados como ilimitados e em expansão, estavam constantemente diminuindo. Os seus soldados pereciam às dezenas de milhões graças às ordens de Stálin para ataques frontais contínuos em todos os lugares, enquanto os seus blindados eram regularmente “destruídos” pelo poder de fogo e pelas táticas dos alemães. Até mesmo as estatísticas oficiais soviéticas de perdas e de números de produção revelam muitas inconsistências e anomalias que, quando combinadas com a análise, pelo autor, dos números alemães muito mais precisos, possibilitaram a Mosier o fornecimento de uma imagem mais fiel daquilo que estava ocorrendo.

O que se revela é que as baixas de ambos os lados refletiam uma proporção de cerca de 5:1, proporção essa favorecendo as forças alemãs. Com uma população soviética naquela época de aproximadamente 170 milhões e uma população alemã próxima a 100 milhões, os russos não conseguiriam sustentar por muito tempo uma proporção superior a 2:1. Em outras palavras, a taxa de desgaste estava esgotando a Rússia de homens. Hitler compreendeu isso e, sabiamente, esforçou-se para dar prosseguimento ao processo. Daí as suas ordens de “manter-se firme” em 1941 e posteriormente, provocando novos combates desgastantes, resultando em enormes disparidades nas perdas, disparidades que favoreciam, de novo, a Alemanha.

A produção e a utilização de blindados e de poder de fogo são cuidadosamente analisadas. Mosier mostra que, embora os soviéticos alegassem números absurdamente altos de produção de tanques, não apenas os números reais eram muito menores, como também os próprios tanques apresentavam problemas intermináveis. A vida operacional deles era frequentemente medida em dias ou mesmo horas, antes que avarias e falhas acontecessem. Os russos produziam tanques, mas não muito no que diz respeito a peças de reposição. Não produziam sequer veículos de recuperação; e oficinas e instalações de reparo eram quase desconhecidas. Os blindados alemães eram, em geral, de qualidade superior e bem conservados, com veículos danificados sendo rapidamente recuperados e colocados de volta em serviço. As disparidades de desempenho no campo de batalha não eram muito diferentes das taxas de perda de homens.

Mosier apresenta um estudo sobre outras formas de poder de fogo móvel alemão que, a rigor, normalmente não eram classificadas como “blindadas”, visto que os seus canhões só podiam ser elevados e abaixados, sem torres móveis. Canhões de assalto, artilharia autopropulsada, canhões antiaéreos móveis, caça-tanques e outros novos artefatos bélicos eram produzidos em quantidades cada vez maiores e implantados em unidades independentes designadas para o apoio à infantaria ou para a complementação das divisões Panzer. Às vezes rejeitados, como inovações indesejadas, por generais Panzer, tais como Heinz Guderian e outros, esses artefatos foram, entretanto, tremendamente bem-sucedidos na destruição de milhares de tanques soviéticos e na dispersão de concentrações de tropas, paralisando repetidamente grandes ofensivas soviéticas, ao mesmo tempo em que amplificavam ainda mais as já mencionadas proporções de perdas.

O autor demonstra que os soldados e oficiais alemães eram bem treinados e aprimoraram as suas táticas e estratégias à medida que a guerra avançava, ao passo em que os soldados e oficiais soviéticos, em geral, permaneceram mal treinados e mal preparados e ainda mais mal liderados. Mosier apresenta com franqueza as forças armadas soviéticas como incompetentes, continuando a sofrer enormes perdas e inúmeras derrotas, grandes e pequenas, até o término da guerra. Ele também critica a reputação dos marechais soviéticos Zhukov, Koniev e outros, considerando-os certamente superestimados e bastante desonestos nas suas próprias memórias da guerra.

Então, como os soviéticos poderiam ter vencido a guerra? Mosier mostra como: em primeiro lugar, a URSS recebeu, dos EUA e da Grã-Bretanha, enormes quantias de dinheiro (empréstimos e arrendamentos) e outras formas de ajuda. Caminhões, aeronaves, tanques americanos, óleos combustíveis, alimentos, tudo foi amplamente, até mesmo enormemente, fornecido aos soviéticos, salvando-os, de fato, da destruição nas mãos dos alemães — tudo isso contrariando o mito stalinista de que tal auxílio foi insignificante e desempenhou pouca ou nenhuma função na derrota da Wehrmacht pelo Exército Vermelho. Em segundo lugar, apesar das repetidas exigências de Stálin por uma “segunda frente” aliada para aliviar a pressão sobre a Rússia, na verdade várias dessas frentes já estavam drenando os recursos da Alemanha — uma segunda frente aérea sobre a própria Alemanha; uma terceira frente na Batalha do Atlântico; uma quarta frente na guerra no Norte da África e, depois, na Sicília e na Itália —, tudo antes da invasão da França no Dia D, em junho de 1944.

O autor demonstra conclusivamente: o que realmente deu a vantagem aos soviéticos foi a constante transferência das melhores unidades alemãs da frente oriental para outras áreas de operações militares no oeste, assim como para os Bálcãs, para a França, para a Itália e para outros lugares, em resposta a ameaças reais ou esperadas dos Aliados, incluindo a famosa divisão “Grossdeutschland”, a unidade “Leibstandarte” e outras divisões importantes da SS [“Schutzstaffel”], além de outras unidades que possuíam o melhor equipamento. A Wehrmacht foi finalmente despojada do poder de fogo de que necessitava no leste; e o seu papel passou a ser predominantemente defensivo. Na análise de Mosier, cai por terra o mito soviético de um Exército Vermelho sólido como uma rocha, que repelia os alemães de modo constante e vitorioso em todos os lugares.

“Agravando as dificuldades dos comandantes alemães, estava a determinação de Hitler em responder a ameaças percebidas em outros lugares. Em agosto, o alto comando alemão, reagindo ao ataque a Dieppe, entrou em pânico e transferiu a principal superunidade alemã, a divisão blindada ‘Leibstandarte’ da SS, para a França. De fato, Berlim pretendia enviar para lá também a principal força de combate do exército, a ‘Grossdeutschland’, e a sobrecarregada Luftwaffe estava desviando recursos valiosos para o Mediterrâneo em resposta à invasão Aliada. Dada a dependência alemã do poder aéreo tático, a decisão foi, de fato, uma má notícia. Os presságios para Stálin eram favoráveis.” (páginas 209–210)
A Operação “Zitadelle”, no verão de 1943 — também conhecida como Batalha de Kursk —, foi a última grande ofensiva alemã no leste. Hitler ordenou a retirada em um ponto em que alguns generais alemães acreditavam estarem prestes a um grande avanço e à vitória — novamente para transferir unidades para o enfrentamento de ameaças em outros lugares além da Rússia. Mosier considera isso um erro incomum por parte de Hitler, mas uma decisão ou um conjunto de decisões inteiramente racional e compreensível. Assim, a Batalha de Kursk é frequentemente vista como o ponto de viragem no leste, um ponto a partir do qual a maré da Alemanha ali iria refluir.

Mosier também tira inúmeras outras conclusões interessantes.

Em sua opinião, o fracasso da Alemanha em desenvolver e produzir em massa um bombardeiro estratégico significou o fim da guerra contra Stálin. No entanto, o autor deixa claro que a Alemanha derrotou os soviéticos quase completamente sem ele em 1941 e que foi principalmente apenas a ajuda muito generosa dos EUA que permitiu à URSS sequer sobreviver, de modo que, sem um bombardeiro desses, a guerra provavelmente teria sido vencida pela Alemanha de qualquer maneira.

Mosier acredita que a luta de guerrilhas [“partisan war”] na Rússia, na Ucrânia e na Bielorrússia foi pouco mais que um incômodo para os alemães e nunca constituiu uma ameaça grande. Nesse sentido, ressalta que a maioria das perdas civis soviéticas durante a guerra foi resultado direto das ordens de Stálin e não das ações alemãs em si, já que o líder soviético comandava revoltas e represálias por toda parte atrás das linhas, revoltas e represálias cuja maioria foi sufocada pelas forças alemãs, com poucas perdas para si mesmas, mas com grandes perdas para os russos.

Uma conclusão interessante e singular tirada pelo autor é a de que as gigantescas perdas de homens e a gigantesca destruição física sofridas pela União Soviética durante a guerra levaram, em última análise, ao colapso do comunismo naquele país várias décadas depois. Se assim for, então Adolf Hitler é o indivíduo ou o agente a ser creditado por esse evento seminal. Mas, no mínimo, Hitler de fato impediu que a maior parte da Europa fosse invadida, em 1941, pelos capangas de Stálin — algo que quase ninguém está hoje disposto a admitir. [Confira a discussão detalhada e convincente de Mosier acerca dos efeitos sociais e econômicos de longo prazo das perdas de homens, páginas 364–367.]

É bastante revelador o olhar atento de Mosier sobre a natureza da “verdade” e da “realidade” soviéticas, aliadas ao estilo único de liderança de Stálin. O líder soviético normalmente fazia um pronunciamento político sobre a guerra, sobre a economia ou sobre a produção, etc., e era esperado que os seus subordinados procedessem, então, à produção de relatórios e estatísticas — i.e., de “fatos” — que afirmassem, confirmassem a “realidade” de Stálin. Tais relatórios e estatísticas, então, eram arquivados, para serem posteriormente utilizados por historiadores, jornalistas e outros que buscavam determinar números e tendências da guerra — inclusive aqueles que duvidavam da veracidade desse material frequentemente o utilizavam de qualquer maneira, com base no argumento de que “não há mais nada com que trabalhar”, assim reforçando e perpetuando os mitos de Stálin. Os sucessores dele, como Nikita Khrushchev, por exemplo, também perpetuavam seletivamente os mitos, caso os considerassem úteis; assim, os famosos discursos e declarações de Khrushchev que denunciaram os crimes de Stálin no GULAG e os expurgos stalinistas do “Grande Terror” não se estenderam à denúncia dos vários mitos que cercam a “Grande Guerra Patriótica”, mitos esses que permaneceram — e ainda permanecem — úteis para a liderança russa até os dias atuais. Mitos semelhantes sobre a Segunda Guerra Mundial a serviço da elite dominante dos Estados Unidos também foram — e ainda são — perpetuados.

O próprio Stálin não aceitava ser contraditado; ele era famigerado por punir as pessoas que lhe davam notícias desagradáveis. Um caso envolveu um importante líder da aviação soviética que salientou a Stálin que as aeronaves da Força Aérea Vermelha eram mal projetadas e mal produzidas, propensas a avarias e falhas; esse líder foi preso, torturado e executado — dando Stálin, desse modo, um exemplo notável para os outros. A visão marxista-leninista da natureza da verdade em si a revela como um constructo político cujo propósito político é sempre mais importante que meros fatos ou a realidade. Numa interpretação completamente contrária e estranha ao modelo ocidental, o dito marxista “todas as coisas são políticas” determina que a verdade, a história, a literatura — tudo, de fato — devem ser feitas para servirem aos objetivos revolucionários do marxismo-leninismo. A natureza da verdade em si desse modo definida, tecnicamente falando — i.e., pelo menos do ponto de vista deles —, propõe a ideia de que os marxistas não estejam tecnicamente “mentindo” quando fabricam mitos e roteiros sobre a Segunda Guerra Mundial ou sobre a maneira como a URSS venceu a guerra.

Analisando de modo abrangente, este livro de Mosier, com certeza, será considerado revigorante e agradavelmente surpreendente para os revisionistas. O autor inclusive cita alguns materiais do Journal of Historical Review do IHR (“Institute of Historical Review” — Instituto de Revisão Histórica), bem como parte da obra de Walter Sanning, ambas as fontes até então relegadas à margem externa da historiografia. A editora de Deathride: Hitler vs. Stalin: the Eastern Front, 1941–1945, Simon & Schuster, é de primeira linha, pelo menos para fins de prestígio entre os leitores em geral; e os títulos anteriores de Mosier parecem ter apresentado bom desempenho no mercado. Isso significa que pelo menos alguns historiadores, de fato, leem e levam em consideração a obra dos revisionistas? Certamente deve ser assim, proporcionando, de forma inevitável, uma espécie de “efeito em cascata” no qual temas revisionistas, interpretações revisionistas e até mesmo fatos revisionistas alcançam o mainstream.

Ou talvez tudo isso seja efêmero, para ser, em algum momento, abafado ou silenciado. Fico imaginando se John Mosier tem estabilidade na universidade na qual trabalha e que tipo de críticas ele está recebendo dessa instituição e dos próprios colegas.

Infelizmente, o livro não possui bibliografia nem ilustrações, mas tem vários mapas excelentes e uma detalhada e refinada seção de notas.

2 COMENTÁRIOS

  1. Onde esse artigo foi publicado originalmente? não tem o link. Esse é o tipo de artigo que nos leva ao site…

    Resenha espetacular! É uma vergonha, esse livro é de 2010 e se não fosse publicada essa resenha aqui no Instituto Rothbard, para variar, eu não saberia de sua existência. É curioso observar que os vagabundos que defendem a democracia “com um voto bem informado”, são os mesmos que bloqueiam o acesso a informações cruciais. E não estou falando aqui de censura, pois este livro foi publicado ao menos nos EUA. Mas de algo mais complexo, pois somos uma cópia de terceira categoria dos EUA. Assim essas coisas são bloqueadas aqui na colônia americana.

    Sim, eu sei da existência deste livro agora e nada me impede de adquiri-lo. Só que essa suposta liberdade torna-se irrelevante quando sabemos que milhões de pessoas aprendem o lixo comuno-estatista todos os dias nos gulags do MEC. É exatamente por isso que o libertarianismo e a tradição católica do tipo Fraternidade São Pio X tem aparência de seitas. Por definição, uma verdade crida somente por um grupo é característica de seita. E esses supostos eleitos tendem a ser arrogantes. O problema é que a verdade crida nestas “seitas” é a Verdade, tanto sobrenatural, que é Nosso Senhor Jesus cristo, quanto no século, que é a filosofia política austro-libertária. Ou seja, a seita na realidade é o próprio mundo moderno.

    Quando através do assentimento intelectual rejeitamos os vândalos Concílio Vaticano II ou o estatismo que gera esses mitos históricos da segunda guerra – e existem mitos para todos os gostos, necessariamente, eramos parte da narrativa oficial. Ou seja, e impossível que de um dia para o outro, se chegue a conclusão que o sistema mente 100% do tempo. De nada adiantou eu saber que tinha alguma coisa de errada com o mundo. Somente lendo Murray Rothbard e descobrindo a missa tridentina tudo passou a fazer sentido.

    Lamentável.

  2. De onde surgiu que a Alemanha pudesse ter 100 milhões de habitantes na época da guerra? Isso só seria plausível se considerasse alemães um punhado de povos dos territórios que ela ocupou durante o conflito, ou pelo menos os alemães étnicos que viviam fora das suas fronteiras (ainda assim, uma conta difícil de fechar).

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