A Rede Social – um filme que entende tudo corretamente

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yoyytoyhQuem são os heróis capitalistas e populares da nossa época?  A Rede Social é um filme que celebra um dos grandes: Mark Zuckerberg, fundador do Facebook.   A princípio, pode parecer uma história enfadonha, impossível de ser transformada em filme interessante: como o Facebook veio a existir e cresceu, enfrentando vários processos judiciários no caminho e se tornando o gigante que é hoje.

Com efeito, o filme não apenas é extremamente empolgante e formidável em seus próprios termos, como também é provavelmente o melhor filme sobre a livre iniciativa já feito em nossa época.  Ele entende de maneira absolutamente correta como é o empreendedorismo no mundo real.  Ele lida brilhantemente com todas as questões importantes do tema, desde a motivação por trás da transformação de uma ideia em um novo produto (não se trata necessariamente de ganhar dinheiro) até a impossibilidade de se decompor ideias e dividi-las em unidades de propriedade individual.  Alega-se que o filme mistura fato e ficção, mas isso não altera em nada as muitas lições que ele oferece, bem como o tema geral abordado.

O filme surge no momento certo.  O Facebook tem sido vítima de uma campanha crescentemente injuriosa feita pela intelligentsia.  Alega-se que a rede social viola a privacidade, estimula o egoísmo desvairado, destrói vidas ao incitar as pessoas a fazer com que elas deem muitas informações pessoais, destrói casamentos, leva jovens a cometer suicídio, faz com que as pessoas desperdicem uma vasta quantidade de tempo, o qual supostamente deveria ser gasto ao ar livre, arruína a cultura ao digitalizar a comunicação em detrimento da interação cara a cara, e devasta a linguagem ao simplificar o termo “amigo”.

Tais são os supostos crimes do Facebook.  Se você acha que o website é culpado disso tudo, há uma solução simples: não o utilize.  O Facebook é totalmente voluntário.  É também gratuito para todos.  Ocorre também que as pessoas — as últimas estatísticas relatam que 500 milhões de pessoas possuem conta no Facebook, mas os números tendem a crescer para 1 bilhão e além — gostam bastante da ferramenta e passaram a depender dela.  Com efeito, trata-se do mais popular website da história.  Ele vem conectando as pessoas como nunca antes, permitindo que uma pessoa se mantenha atualizada sobre as ações de milhares de outras pessoas em tempo recorde.  Trata-se de uma enorme contribuição para a humanização e a personalização da Internet, possibilitando que uma vasta pletora de causas e ideias pudesse se expressar e encontrasse audiência.

Há um significado filosófico na frase “rede social”.  Ela ecoa uma distinção entre os meios econômicos e políticos, no sentido de que há uma distinção entre sociedade e estado: os meios sociais são sempre voluntários, ao passo que os meios estatistas são sempre coercivos.  A Rede Social é uma abreviatura dessa vasta matriz da comunicação e trocas que surge espontaneamente da escolha humana; é à “sociedade”, no sentido voluntário da palavra, que o Facebook deve sua energia, ordem e harmonia.

Como sempre ocorre no campo da livre iniciativa, tudo começou com uma pequena ideia: as pessoas gostam de saber sobre os outros e gostam que os outros saibam sobre elas.  A internet permite que isso aconteça.  O filme mostra como a ideia germinou dentro da microcultura da Universidade de Harvard, com Zuckerberg fazendo experimentos com softwares e coletando ideias de todas as fontes possíveis.  Ele transformou sonhos em um algoritmo que se tornou um sucesso.  O filme habilmente ilustra como esse empreendimento foi guiado por ideias, sendo testado diariamente, até mesmo de hora em hora, de acordo com o interesse e a demanda dos consumidores, com constantes refinamentos ao longo do caminho.

Entretanto, apenas as ideias não foram o suficiente.  Elas ganharam vida por meio da genialidade tecnológica.  Elas foram implementadas por meio de uma profunda devoção e até mesmo de um louvável fanatismo.  O filme mostra também que, embora ganhar dinheiro e se submeter ao teste dos lucros e prejuízos sejam os mecanismos cruciais de um sucesso comercial, a busca por dinheiro não foi a motivação fundamental para a criação do Facebook.  Zuckerberg não estava atrás de dinheiro.  O que ele queria era fazer algo criativo, notável e inovador.  Seu objetivo era criar algo novo e útil ao universo.

Quando o Facebook começa a alçar voo e se torna popular, Zuckerberg aguçadamente percebe que sua popularidade, o fato de o site ser “bacana”, é seu principal ativo.  Ele sensatamente constata que não deve ser feito nada que ponha em risco esse ativo fundamental.  O objetivo não é ganhar o máximo de dinheiro o mais rápido possível, mas sim solidificar a paixão que as pessoas demonstravam por aquilo que o Facebook estava propiciando.  Essa atitude entre empreendedores é muito mais comum do que supõe a crença tradicional.  O arquétipo é o de um sonhador obcecado em realizar um sonho e não o de um calculista obcecado com a ganância.

Outro ponto certeiro do filme envolve a mais difícil lição de vida que qualquer pessoa de talento singular, qualquer sonhador que realize algo admirável, deve aprender na vida.  Nascemos e viemos a este mundo achando que o sucesso obtido em qualquer área será visto com aclamação e louvação.  A nós quase nunca é dita a verdade que vemos nesse filme: o sucesso é algo que quase sempre será visto por outros com inveja, ódio, menosprezo, rebaixamento e repugnância — e, algumas vezes, tais sentimentos emanarão das mais inesperadas fontes.

O indivíduo de sucesso em qualquer área — e isso é provavelmente verdade para todas as épocas e todos os lugares — irá rapidamente se descobrir rodeado de lobos (muitos deles antigos cordeiros) ávidos por arruinar, devastar e destruir sua carreira.  Mesmo os maiores feitos são rebaixados e menosprezados como sendo um mero golpe de sorte.  Em outros casos, são creditados a terceiros ou depreciados como não sendo tão grandiosos.  Se houver leis que deem aos lobos a oportunidade de manifestar plenamente sua inveja, elas certamente serão utilizadas.  Todo empreendedor deve estar preparado para isso, deve esperar por isso e deve saber lidar com isso quando o momento chegar.

E foi assim que o Facebook teve de lidar, logo no início, com vários desafios e campanhas difamatórias, não sendo surpresa alguma que, na era digital, o ataque inicial tenha ocorrido no campo da “propriedade intelectual” — e, nesse quesito, o filme oferece outra grande contribuição.  Ele mostra o quão irrelevante é a propriedade intelectual para o sucesso empreendedorial, e como ela se tornou o slogan favorito dos derrotados e a grande desculpa a que recorre toda uma classe de pessoas com mau senso empreendedor.  “Ele roubou minha ideia” é a grande mentira de nossa época, pois ideias não têm como realmente serem roubadas.  Ademais, não há uma única ideia atual que não tenha sua origem em alguma outra ideia anterior.

O filme mostra como os irmãos gêmeos Cameron e Tyler Winklevoss, alunos de Harvard, pediram a Zuckerberg para que este escrevesse o código para um site que ambos estavam criando, o Harvard Connection, que no final acabou se transformando no ConnectU.  Zuckerberg, porém, tinha outras e mais elaboradas ideias fervilhando em sua mente.  Assim que o Facebook decolou, os irmãos Winklevoss começaram a choramingar e, após tentarem de todas as formas possíveis destruir o Facebook, porém sem lograr êxito, os gêmeos resolvem processar Zuckerberg por violação de sua propriedade intelectual, ainda que os códigos de ambos os projetos não tivessem absolutamente nada em comum.

Há algumas frases no filme que ilustram perfeitamente a absurdidade do conceito de propriedade intelectual.  Zuckerberg está indignado com a acusação de que ele tenha roubado algo.  Afinal, os irmãos Winklevoss ainda possuíam a ideia deles; eles apenas não haviam feito nada de útil com ela.  E se Zuckerberg de fato tiver se baseado parcialmente na ideia de terceiros?  Como o próprio Zuckerberg diz em determinado momento, será que “um sujeito que constrói uma cadeira muito boa passa a dever dinheiro para alguém que, alguma vez na vida, também tenha construído uma cadeira?”.  Maldito Zuckerberg! Utilizando o bom senso contra o hermético e confuso mundo da propriedade intelectual.

Outra maneira de demonstrar isso é uma frase que Zuckerberg utiliza nos testemunhos após a ação judicial.  Ele diz para um dos gêmeos, “Se você tivesse inventado o Facebook, você teria inventado o Facebook”.  Isso soa simplista, mas realmente é tudo que se precisa saber para entender a absurdidade de tais queixas.  Quem ganha e quem perde no mercado não é uma questão arbitrária; o mercado tende as separar aqueles que falam daqueles que fazem; os sonhadores daqueles que de fato assumem os riscos; e os agentes que têm iniciativa dos meros pensadores.  Se você é incapaz de criar e não consegue competir, sempre poderá alegar uma violação de propriedade intelectual.  Você sempre poderá utilizar algo como base para um esquema legalizado de extorsão.

Uma parte essencial do empreendedorismo é saber escolher qual ideia, dentre as milhares que chegam a uma pessoa diariamente e de todas as direções, poderá ser utilizada para influenciar um empreendimento comercial.  Em um momento do filme, um estudante aborda Zuckerberg e o pergunta se ele sabe se uma determinada garota tem namorado e, se sim, quão séria é a relação.  Isso dá a Mark a ideia de permitir que os usuários do Facebook atualizem sua situação amorosa em suas páginas pessoais.  O acréscimo desse único recurso o convenceu de que já era hora do site ir ao ar.  O novo site foi lançado pouco tempo depois.  Pelos padrões da propriedade intelectual, o estudante que fez a pergunta a Zuckerberg teria direito a uma fatia dos lucros do Facebook, pois aquela conversa gerou uma ferramenta crucial para o website.  Mais ainda: pela lógica, cada usuário do Facebook também teria esse mesmo direito.

Ao apresentar cuidadosamente várias das influências externas sobre Zuckerberg, em uma série de cenas brilhantes que englobam uma enorme variedade de setores e opiniões, o filme apresenta a realidade de como surgem as ideias, e mostra como os litígios de propriedade intelectual se tornaram uma opção jurídica legal para os perdedores, um recurso chantagista para que os ressentidos e invejosos espoliem os bem sucedidos.  Afinal, caso o Facebook não tivesse se tornado um sucesso, os irmãos Winklevoss jamais se imaginariam como vítimas de qualquer coisa.  Apenas esse fato já demonstra que essa situação nunca envolveu realmente nenhum tipo de roubo.

Se alguém rouba seu carro, você é uma vítima de roubo, não importa se o ladrão vai abandonar o carro algumas esquinas mais à frente ou se ele vai utilizá-lo para ganhar dinheiro em alguma corrida.  A propriedade intelectual acaba sendo uma questão judiciária apenas quando o réu utiliza algo exitosamente.  Tão logo uma ideia se torne um sucesso, pode ter certeza que uma turba de pessoas irá se enfileirar para dizer que a ideia é originalmente delas.  Os gêmeos utilizam a lei para extorquir milhões de dólares; e quem está certo e quem está errado — questões essenciais de justiça — é um detalhe que nem sequer aparece na decisão a ser estabelecida judicialmente.  De novo: tudo isso que o filme mostra é algo excessivamente realista no mundo atual.

Especialmente marcante é a descrição de como os gêmeos imaginam poder destruir o Facebook, movidos pelo ressentimento em relação ao sucesso de Zuckerberg.  Eles falam sem qualquer restrição ou constrangimento: eles querem arruiná-lo por completo.  Aqui vemos como a propriedade intelectual acaba criando um risco moral, permitindo que os invejosos criem barreiras para o progresso social e econômico.

Não tenho nenhum conhecimento dos detalhes verídicos do caso, mas é possível que o filme tenha subestimado toda a valiosa influência que o esforço competitivo para criar a Harvard Connection teve sobre Zuckerberg. Ainda assim, como mostra o filme, é assim que surgem as grandes ideias.  Nenhuma grande ideia desse mundo é criada do nada — contrariamente ao mito.  As grandes ideias resultam da interação de uma enorme variedade de influências advindas de todas as direções.  O vencedor é aquele que transforma isso em uma realidade comercial.  Até que isso aconteça, tudo é só conversa.

Uma outra questão jurídica abordada no filme envolve as rixas de Zuckerberg com seu melhor amigo, o qual havia sido nomeado diretor financeiro do Facebook, mas que acabou sendo ejetado da empresa quando os medalhões — dentre os quais uma outra lenda, Sean Parker, do Napster — concluíram que ele de fato não estava à altura do trabalho.  Pessoalmente, isso me parece ser uma questão apenas de boas maneiras e de relações contratuais, e não de propriedade intelectual.  O caso foi resolvido fora dos tribunais.

Como bem disse o EconomicPolicyJournal, esse filme pode acabar fazendo com que milhões de jovens estudantes e tecnologicamente astutos tornem-se empreendedores, atraindo também outros tantos para o mundo do empreendimento digital.  Isso é algo que as pessoas não apreendem em sala de aula.  Elas irão aprender tudo no campo, por meio da exposição extracurricular ao acelerado mundo do comércio, aprendendo a desenvolver uma intuição sobre o que realmente as pessoas querem e como fazer para atender a essa demanda no mercado.

Você pode até não gostar do Facebook, mas ele evidentemente deixou mais interessante a vida de milhões de pessoas.  Em todo caso, por décadas tenho ouvido a intelligentsia desmerecer as invenções do momento, apenas para mais tarde ver aquelas mesmas pessoas utilizando entusiasmadamente a mesma tecnologia que haviam menosprezado antes.  Os críticos severos da tecnologia de hoje nada mais são do que os usuários tardios, porém entusiasmados, de amanhã.

Recentemente, fui visitar um cavalheiro já idoso, um distinto escritor de ficção, em uma clínica geriátrica.  Ele trata seu computador de mesa como se fosse sua corda de salvação para o mundo exterior, permitindo que ele se mantenha em contato com sua extensa família e se comunique com seus amigos por todo o país.  Minha memória me fez voltar a uma conversa que tive com ele há 17 anos.  Na ocasião, eu havia perguntado o que ele achava da internet e do e-mail (a web ainda não existia na época).  Ele disse que considerava essas inovações “o fim do mundo”.  Ele disse isso com um tom sinistro em sua voz.  Bem, talvez ele estivesse certo quanto a isso.  Afinal, foi mesmo o fim daquele mundo e o início de um novo mundo que essa mesma pessoa desde então aprendeu a amar.

E o mesmo se aplica ao Facebook.  Zuckerberg finalizou um mundo e começou um outro mundo — novo e melhor — para milhões de pessoas.  A Rede Social mostra como o mercado comercial deu a um nerd da informática uma chance de fazer isso e como ele o fez.  Trata-se de um filme que celebra os mocinhos, ridiculariza os vilões, mostra a realidade sobre aquilo que qualquer pessoa de sucesso irá enfrentar, mostra o sistema jurídico como o patético inimigo da livre iniciativa que ele realmente é, e rende uma homenagem — há muito devida — ao empreendedorismo.

Esse filme já é um glorioso sucesso — o que obviamente significa que ele já está sob ataque: um crítico doWashington Post acha que o filme não mostra como a inovação privada não passa realmente de um golpe de sorte, além de reclamar também que o filme não ressalta as maravilhas que o governo proporciona por meio da infraestrutura pública.

Sim, é claro, e esse crítico pode apoiar a produção de um filme similar chamado A Rede Governamental, estrelando os burocratas e seus defensores na mídia.  Certamente vai ser um grande sucesso de bilheteria.

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