A sacralização dos Estados-nação

1

Franz Oppenheimer dizia que havia duas maneiras de obter riqueza. Uma delas era criá-la através do trabalho e da troca; a outra, era a apropriação da riqueza criada pelo trabalho alheio. Ele chamou a primeira forma de “os meios econômicos”, a segunda, “os meios políticos”. Segundo Oppenheimer, o Estado é uma organização do meio político. Sua própria existência exige a criação prévia de riqueza pelos meios econômicos, que posteriormente ele se apropria por meio do uso da força[1]. A criação de Estados implica necessariamente a criação de diferentes classes sociais, a dos produtores e a dos ladrões:

      “Todo estado na história foi ou é um estado de classe, uma forma de governo de grupos sociais superiores e inferiores.”[2]

Em análise semelhante, Alexander Rüstow falou da criação de Estados como um fenômeno de “superestratificação”, no qual um estrato superior, militar e organizacionalmente qualificado, se impõe e explora um estrato inferior economicamente produtivo[3].

Charles Tilly, por outro lado, definiu os Estados como organizações com poder coercitivo, distintas dos grupos familiares e de parentesco, que têm precedência sobre qualquer outra organização sobre um grande território[4]. A origem dos Estados encontra-se no uso da força por um grupo de pessoas sobre outro grupo em um determinado território com o objetivo de se apropriar de seus recursos. Para Tilly, a única diferença entre um Estado e uma máfia é o sucesso do primeiro em conseguir o monopólio dos meios de coerção[5].

Mas, como aponta Rothbard, uma vez estabelecido o Estado, seu principal problema é manter o poder. Embora o uso da força seja seu modus operandi habitual, ele acaba precisando do apoio da maioria dos governados, mesmo que esse apoio consista em nada mais do que aquiescência passiva. O principal meio pelo qual a classe dominante predatória ganha o apoio da classe explorada governada é ideológico:

      “A maioria deve ser persuadida pela ideologia de que seu governo é bom, sábio e, no mínimo, inevitável.”[6]

Estabelecer essa ideologia será tarefa dos intelectuais a serviço do Estado. O principal método de estabelecer uma ideologia que justifique o poder do Estado será o da sacralização do Estado. Como aponta C. C. Pecknold:

       “O Estado exigia que as massas colocassem sua fé na nação, e usavam a fé religiosa para fazer isso.”[7]

Assim, os Estados-nação europeus recorrerão à sacralização para justificar seu poder cercando-se de uma auréola sagrada. Segundo Thomas Hippler:

      “O desenvolvimento do Estado nacional era inseparável de uma apropriação do sagrado.”[8]

Nesse desenvolvimento, observa-se a continuação da tradição da potência absoluta, que enfatiza o caráter total do poder soberano, cujas leis e normas não dependem de uma ordem natural externa que a limita, mas possuem a capacidade de criar tal ordem e agir fora dela. Observa-se também a continuação do processo, iniciado por Hobbes, da transferência da doutrina dos dois corpos do rei da monarquia para o próprio Estado. Em Hobbes é o Estado, como instituição jurídica, que possui um corpo místico. Esse corpo místico também será transferido para o povo ou para a nação, da qual o Estado será a expressão. Os Estados transferirão “a poderosa ideia cristã de um povo unido no corpo místico de Cristo para uma nova concepção de unidade mística na ideia de nação”.[9] Graças a essa ideia, as elites encarregadas de construir Estados nacionais foram capazes de forjar uma identidade nacional com a qual mobilizar as massas.

No trabalho de construção dessa identidade nacional a serviço do Estado, o Iluminismo teve papel decisivo, dando importante contribuição para a sacralização da sociedade civil e da nação, elevando-as à condição de órgãos e valores supremos para o cidadão moderno. Por exemplo, Diderot (1713-1784) escreveu na Enciclopédia:

      “O amor à pátria é o amor às leis e à prosperidade do Estado, e é particularmente forte nas democracias. É uma virtude política pela qual o indivíduo renuncia aos seus próprios interesses e dá preferência ao interesse público em detrimento dos seus. É um sentimento, e não se baseia em nenhum conhecimento; pode ser compartilhado pela pessoa mais baixa e pelo chefe de Estado.”[10]

Como explica Gentile, o Iluminismo estava convencido de que uma sociedade bem ordenada não poderia existir sem algum tipo de religião coletiva que educasse o indivíduo a colocar o bem público acima do interesse próprio. O ideal de uma nova religião civil baseada nos princípios do deísmo, dos direitos naturais e da virtude cívica foi formado na segunda metade do século XVIII em conexão com o culto à nação e os deveres de cidadania. Inspirava-se no antigo modelo de religião republicana e era percebido como o fundamento ideal para assegurar a unidade moral do corpo político e para instruir os cidadãos na consciência do bem comum, senso de dever cívico, lealdade às instituições e devoção à nação.[11]

Como exemplo dessa tendência à religião civil do Iluminismo, Voegelin aponta o abade Raynal (1713-1796) que, na Historie philosophique des Deux-Indes (1770) escreveu:

     “O Estado não é feito para a religião, mas a religião é feita para o Estado. Primeiro princípio.

O interesse geral é a regra que rege tudo o que deve existir no Estado. Segundo princípio.

O povo, ou a sua autoridade representativa, tem o direito exclusivo de julgar a conformidade de qualquer instituição com o interesse geral. Terceiro princípio.”[12]

Segundo Raynal, em uma opinião que concorda com as de Hobbes e Rousseau, a autoridade do povo tem o direito de examinar o dogma e a disciplina das igrejas e de estabelecer ou proibir um culto. Quando os administradores do Estado são reunidos, a Igreja é reunida. Quando o Estado fala, a Igreja não tem mais nada a dizer. Não há outros apóstolos senão o legislador e seus magistrados. Não há livros sagrados além daqueles reconhecidos pelo Estado. Não há outro direito divino senão o bem-estar da República. Segundo Voegelin, essa atitude é a prova de que:

       “A ideia do Estado como teocracia, com os legisladores como autoridade eclesiástica, com a lei como manifestação divina e com a commonweal como substância, foi plenamente desenvolvida antes da Revolução.”[13]

O exemplo mais característico da defesa da teocracia estatal é Jean Jacques Rousseau (1712-1778), que descreve a soberania com as características com que outros escritores descreveram a vontade de Deus: é inalienável, indivisível, permanente e não pode falhar.[14] A soberania reside na “vontade geral”, isto é, na vontade de todo o corpo político e não em uma de suas partes. Rousseau afirma que o poder soberano que surge da vontade geral é completamente absoluto, sagrado e inviolável.[15] Essa vontade é “essencialmente um conceito religioso imanentizado e tornado objeto de devoção sagrada”[16], que dá ao corpo político poder absoluto sobre todos os seus membros.

Em Rousseau, o corpo político é formado quando cada pessoa simultaneamente aliena seus direitos a comunidade absolutamente soberana. Para ele, isso não significa escravidão, porque escravidão é dependência pessoal e o contrato social cria um soberano impessoal.[17] Além disso, espera que as leis que emanam da soberania popular sejam gerais e imparciais. Uma condição necessária para isso é a reeducação da população. Rousseau esperava que um legislador carismático do tipo Moisés ou Licurgo inculcasse na população a virtude cívica característica da antiga Esparta ou da Roma republicana.[18] Esse legislador, segundo Rousseau:

        “deve sentir-se em condições de mudar, por assim dizer, a natureza humana, de transformar cada indivíduo, que é ele mesmo um todo perfeito e solitário, em parte de um todo maior, do qual recebe de certa forma a vida e o ser.”[19]

Uma vez realizada essa reeducação, as leis feitas pelo povo soberano refletiriam os interesses e valores comuns em torno dos quais o legislador profético teria reunido o povo.

Para Rousseau só há um homem coletivo, da mesma forma que há apenas uma vontade coletiva soberana. Cada um coloca a sua pessoa e todo o seu poder em comum sob a direção suprema da vontade geral. A passagem do estado de natureza para o estado civil provoca uma notável mudança no homem, substituindo, em seu comportamento, o instinto de justiça e dando às suas ações a moralidade que antes lhes faltava.[20] Como aponta Elshtain, no processo de formação do corpo político, o homem torna-se, por meio de um rito sagrado, um cidadão. Ele começa como um pecador, dominado por uma má forma de instinto, e emerge como um avatar da justiça, tendo se purificado do velho e adotado o novo. Nesse rito de passagem, o homem se integra ao coletivo.[21]

O governo administrativo diário está sujeito à lei de ferro da oligarquia, o povo soberano delega a uma comissão de magistrados a administração do governo diário. O próprio Rousseau diz que é contrário à ordem natural que um grande número governe e um pequeno número seja governado, e incentiva a tendência oligárquica, apoiando-se no consentimento tácito uma vez estabelecida a sociedade política.[22]

Rousseau afirmou em 1756 que, quando a sociedade foi formada, o povo não poderia ficar sem uma religião. Em O Contrato Social (1762) ele desenvolveu as premissas para a produção de uma religião civil como o vínculo espiritual indispensável que manteria a unidade política em um novo Estado nacional fundado na soberania popular.[23] Sob esse conceito, havia a necessidade de superar a divisão criada pelo cristianismo, que havia separado o sistema teológico do sistema político, estabelecendo a Igreja. Isso fragmentou a unidade do corpo político, causando divisão interna. O cristianismo, especialmente o catolicismo, foi nocivo porque deu ao cristão duas pátrias diferentes e dois líderes diferentes, dizendo-lhe ainda que sua verdadeira pátria não é deste mundo. Criou homens fracos que não estavam dispostos a buscar a glória morrendo por seu país. Rousseau afirmava que a única solução era seguir a proposta de Hobbes de reunir as duas cabeças da águia e alcançar a restauração por meio da unidade política.[24] O cristianismo teve que ser rejeitado porque, em vez de amarrar os corações ao Estado, tinha o efeito de separá-los dos assuntos terrenos. A democracia precisava de uma profissão de fé puramente civil, a partir da qual o Soberano fixasse os artigos, não exatamente como dogmas religiosos, mas como sentimentos sociais, sem os quais o homem não poderia ser um bom cidadão ou um sujeito leal.[25] No mundo de Rousseau não pode haver um corpo religioso independente. Tudo deve estar em conformidade com o Estado e deve ser útil ao Estado. Uma religião civil é aquela que faz o homem “amar seus deveres”.[26]

A religião civil forneceria ao Estado, suas práticas e suas instituições justificativas metafísicas. Rousseau acreditava que os seres humanos eram naturalmente bons, mas eram corrompidos pela sociedade humana, especialmente pela instituição da propriedade privada. O homem natural não tinha necessidade de religião. Somente no estado corrupto, mas agora inevitável, de existência social é que os sentimentos religiosos são necessários para guiar as pessoas e dar-lhes a devida orientação interior para viverem juntas. Uma verdadeira religião une os ritos sociais com a natureza, apoiando a moralidade da natureza. Deve-se seguir a religião do próprio país, desde que seja coerente com a ordem da natureza. As religiões que favorecem a moralidade da natureza são aquelas que coordenam as interações entre as pessoas de acordo com a orientação interior dos sentimentos morais naturais. Como expressões da religião civil, Rousseau prescrevia festividades e entretenimentos que permitissem aos cidadãos se verem nos outros cidadãos e se identificarem com o público como um todo.[27]

Essa identificação com a totalidade é essencial para Rousseau. Devemos adorar a pátria desde o momento em que nascemos, ela deve estar em nossos corações e pensamentos. Na nossa obediência reside a nossa liberdade. Hobbes, apesar do poder e da unidade do Leviatã, ainda considerava legítimo que um indivíduo tentasse impedir o soberano de executá-lo. Rousseau vai além, afirmando que devemos consentir e que não podemos nos opor ao que a vontade geral decidiu, uma vez que, como partes da vontade geral, concordamos.[28] Um membro da população soberana deve submeter-se ao governo ou ser removido do corpo político por exílio ou morte. O soberano tem o poder de expulsar os infiéis antissociais e executar aqueles que cometem apostasia secular por não viverem de acordo com os preceitos da religião civil.[29] Segundo Rousseau:

      “Aquele que ousa dizer: “Fora da Igreja não há salvação“, deve ser expulso do Estado, a menos que o Estado seja a Igreja e o príncipe o Pontífice.”[30]

Na opinião de Elizabeth Elshtain:

      “Rousseau infunde transcendência na política em vez de reservá-la para o sagrado.[31]

Com essa infusão de transcendência, Rousseau adota uma versão monista e unitária da soberania que nivela tudo em seu caminho, vontades particulares, crenças particulares, etc., tudo o que se mostra um problema para a imagem da indissolubilidade e indivisibilidade da soberania.

A Revolução Francesa adotou Rousseau e Voltaire como seus pais intelectuais, transferindo seus restos mortais para o Panteão, em 1794 e 1791, respectivamente, com elaboradas cerimônias que lembram procissões religiosas. Além disso, a apropriação de temas e formas religiosas pode ser observada nos catecismos revolucionários que eram ensinados nas escolas.[32] Isso é consistente com a descrição de Christoph Martin Wieland (1733-1813) da Revolução Francesa como uma religião dedicada à idolatria dos ideais políticos.[33] Como apontam Carl L. Bankston III e Stephen J. Caldas, a religião civil de Rousseau foi transformada em uma religião política que impôs ao mundo suas próprias expectativas escatológicas radicais.[34] Norman Hampson também aponta que o jacobinismo tinha uma concepção rousseauniana da soberania total do Estado, único árbitro da crença religiosa e, em última instância, do direito de propriedade. Nessa concepção, o Estado é a autoridade definitiva quando se trata de ordenar os assuntos econômicos.[35]

Inspirados nas ideias de Rousseau, os jacobinos da Revolução Francesa, para contrapor a influência negativa do cristianismo e unir os cidadãos na totalidade sagrada da nação, tentaram criar, como rituais da vida pública, festas e catecismos. Como exemplo, podemos citar a gigantesca festa de 14 de julho de 1790. Uma força de trabalho voluntária trabalhou para transformar a planície do Champ de Mars em um vale entre duas colinas, onde os espectadores ficariam. Cinquenta mil guardas e soldados desfilaram ao longo do anfiteatro, passando em frente a um altar da pátria e diante de 300.000 espectadores. Esta festa culminou com uma missa sincronizada em todas as províncias e uma cerimônia na qual um juramento de fidelidade à nação foi administrado.[36]

Um dos efeitos da sacralização dos Estados-nação foi a intensificação do pro patria mori. A tradição republicana sustentava que o serviço militar servia como escola de cidadania e que a guerra aumentava a consciência política do cidadão-soldado, reafirmando suas convicções patrióticas. Rousseau afirmava que o serviço militar aguçava o zelo patriótico dos homens livres. Nos governos republicanos, as guerras do Estado tornaram-se as guerras do povo. Interesses individuais e comunitários foram considerados sinônimos, e o alistamento obrigatório foi imposto.[37]

Segundo Thomas Hippler, a transição histórica das concepções tradicionais e monárquicas de soberania para a soberania popular dos Estados-nação modernos implica a integração daqueles elementos que pensadores anteriores, como Bodin, por exemplo, consideravam autônomos da soberania política: o econômico e o religioso. Na visão de Hippler, esses dois elementos ressurgem na forma de duas características fundamentais do Estado moderno, o social e o nacional, e é somente por meio de sua integração que a soberania popular se constitui como omnino absolutum imperium. A nação se torna sagrada, e o Estado, que é a manifestação da nação e do povo, tem o dever e a responsabilidade de controlar a vida econômica para garantir o bem-estar da nação.

Segundo Hippler, a construção da soberania do povo é apenas o inverso da construção do povo como portador da soberania, uma construção ao mesmo tempo simbólica e material: o povo foi concebido como portador de soberania e criado como tal por meios políticos e institucionais. Esse processo está intimamente ligado à nacionalização do povo e do Estado. O Estado como pessoa fictícia há muito era visto como algo unitário, mas com o início do século XIX esse caráter unitário também se aplicava à nação. A nação é carregada de um significado simbólico, cultural e sagrado que permitiu, por um lado, conceber o Estado como expressão do povo e, por outro, ocultar o papel do Estado no processo de formação desse povo.[38]

A sacralização do povo, da nação e do Estado, como sua expressão, também é encontrada em Johann Gottlieb Fichte (1762-1814). Esse pensador alemão, que havia elogiado a Revolução Francesa no início (pois ela parecia entronizar os direitos individuais), acabou considerando a liberdade civil ou coletiva como algo mais importante.[39] Ele afirmou que nenhum alemão seria verdadeiramente livre até que todos os alemães tivessem alcançado a libertação nacional. O objetivo de Fichte era a formação de um Estado-nação autossuficiente, livre do comércio internacional, cuja economia seria governada pelo governo e na qual as viagens ao exterior seriam reservadas a poucos cientistas e pensadores e sempre com permissão do Estado.[40] Além da novidade do conceito de nação, esse objetivo não pode ser distinguido daquele já buscado por Bacon em A Nova Atlântida.

A sacralização do Estado atingirá sua forma mais sistemática na obra de Hegel (1770-1831). Nas palavras de A. James Gregor:

       “Hegel sacralizou o Estado, fez da História seus meios e dos seres humanos seus instrumentos.”[41]

No sistema de Hegel, seu conceito de Geist, a Mente ou Espírito, é um descendente direto do Espírito Santo do cristianismo. Hegel via a história do Espírito como a história no tempo do Absoluto. Para Hegel, o Absoluto é a substância por trás de nosso ser individual e transitório. Sua intenção era revelar algo do Absoluto que tudo governa. No início de sua discussão sobre a História Universal, Hegel afirmou que, para conhecer algo do Absoluto, ele primeiro passaria a discernir as características abstratas da natureza do Espírito; isto seria seguido por um relato dos meios utilizados pelo Espírito para realizar sua Ideia; e, por fim, falaria da forma assumida pela encarnação perfeita do Espírito, o Estado.

Hegel identifica o Estado como algo divino, possuidor de majestade e autoridade absoluta. O Espírito, em seu processo de realização, emprega o Estado; isto é, o Estado é o Espírito objetivado. Por sua vez, o Estado, ao exigir que os indivíduos cumpram suas finalidades, concede-lhes a oportunidade de seu pleno amadurecimento como agentes morais.

Para alcançar os propósitos do Espírito, o Estado tinha que sintetizar os indivíduos, tornando-os um com o Estado e, assim, recrutando-os para o serviço do Espírito. Foi no Estado que os indivíduos descobriram a totalidade do que é justo e moral, pois isso só poderia ser determinado através do reconhecimento das qualidades do Espírito, e somente no Estado os indivíduos poderiam obter esse conhecimento através do processo formativo da educação. O Estado deveria manter os indivíduos como cidadãos, assegurando seus direitos, promovendo seu bem-estar, protegendo suas famílias, educando-os na consciência de seus interesses mais fundamentais, afastando-os do interesse egoísta e trazendo-os de volta à vida moral do Espírito Universal. O Estado também tinha que educar os cidadãos em suas obrigações, o que implicava a necessidade de desenvolver a capacidade de se sentir um com o Todo. Através dessa capacidade, os indivíduos poderiam compreender a existência da Vontade Universal. Tal Vontade deve reger todo o comportamento humano.[42]

Em suma, os Estados nacionais, através da sacralização, tornar-se-ão entidades místicas, que dão forma política ao corpo do povo ou da nação, que é onde reside a soberania. Essa soberania, inalienável, não é patrimônio dos indivíduos, mas da sociedade como um todo. De fato, a existência dos próprios indivíduos só adquire sentido e respeitabilidade quando eles se tornam parte integrante do Todo místico que é o Estado. Para que os indivíduos compreendam essas verdades, é necessário educá-los, para que abandonem os caminhos perniciosos do egoísmo e estejam prontos para morrer pelo país e servir à glória do Estado. Esta última, por sua vez, deve garantir seu bem-estar por meio do controle das atividades econômicas.

 

 

 

 

Artigo original aqui

_________________________________

Notas

[1] Franz Oppenheimer, The State. Its Development and History Viewed Sociologically (Nueva York: Vanguard Press, 1926), pp. 25-27.

[2] “Every state in history was or is a state of classes, a polity of superior and inferior social groups”, Oppenheimer, The State, p. 5.

[3] Alexander Rüstow, Freedom and Domination. A Historical Critique of Civilization (Princeton: Princeton University Press, 1980), p. 12.

[4] Charles Tilly. Coerción, capital y los Estados europeos. 990-1990 (Madrid: Alianza Editorial, 1990), p. 20.

[5] Ver Charles Tilly, “War-making and State Making as Organized Crime”, en Bringing The State Back In, ed. P. Evans, D. Rueschesmeyer y T. Skopol (Cambridge: Cambridge University Press, 1985): 169-187.

[6] “The majority must be persuaded by ideology that their government is good, wise and, at least, inevitable”. Murray N. Rothbard, Egalitarianism as a Revolt Against Nature (Auburn. Ludwig von Mises Institute, 2000), p. 62.

[7] “The state required the masses to put their faith in the nation, and they used religious faith to do this”, C. C. Pecknold, Christianity and Politics. A Brief Guide to the History (Eugene: Cascade Books, 2010), p. 5.

[8] “The development of the national state was inseparable from an appropriation of the sacred”. Thomas Hippler, Citizens, Soldiers and National Armies. Military service in France and Germany, 1789-1830 (Londres y Nueva York : Routledge, 2007), p. 206.

[9] “[…] the powerful Christian idea of a people united in the mystical body of Christ to a new conception of mystical unity in the idea of nation”. Pecknold, Christianity and Politics, p. 77. Para la transferencia de la idea del cuerpo místico al Estado-nación ver también Eric L. Santner, The Royal Remains. The People’s Two Bodies and the Endgames of Sovereignty (Chicago y Londres: The University of Chicago Press, 2011), p. 44 y John von Heyking, “Post- 9/11 Evocations of Empire in Light of Eric Voegelin’s Political Science”, em Enduring Empire. Ancient Lessons for Global Politics, ed. D. E. Tabachtnick y T. Koivukoski (Toronto: University of Toronto Press, 2009), p. 197.

[10] “Love for the fatherland is love for the laws and the prosperity of the state, and is particularly strong in democracies. It is a political virtue by which an individual surrenders his own interests and gives preference to the public interest over his own. It is a sentiment, and not based on any knowledge; it can be shared by the lowliest person and by the head of state”. Citado por Gentile, Politics as Religion, p. 17.

[11] Gentile, Politics as Religion, pp. 17-18.

[12] “The state is not made for religion, but religion is made for the state. First principle. The general interest is the rule governing everything that should exist in the state. Second principle. The people, or its representative authority, has the exclusive right of judging the conformance of any institution whatever with the general interest. Third principle”. Citado por Eric Voegelin, From Enlightenment to Revolution (Durham: Dike University Press, 1975), pp. 171-172.

[13] “The idea of the state as a theocracy, with the legislators as the ecclesiastical authority, with the law as the divine manifestation, and with the commonweal as the substance, thus, is fully developed before the Revolution”, Voegelin, From Enlightenment to Revolution, p. 172.

[14] Jean-Jacques Rousseau, El contrato social, trad. J. Carrier Vélez (Barcelona: Edicomunicación, 1994), pp. 47-51.

[15] Rousseau, El contrato social, p. 54.

[16] Elshtain Sovereignty, p. 131.

[17] Rousseau, El contrato social, p. 38.

[18] Evers, “Social Contract: a Critique”, p. 190.

[19] Rousseau, El contrato social, p. 61.

[20] Rousseau, El contrato social, p. 42.

[21] Elshtain, Sovereignty, pp. 131-132.

[22] Evers, “Social Contract: a Critique”, pp. 190-191.

[23] Para la religión civil ver Rousseau, El contrato social, pp. 147-158.

[24] Rousseau, El contrato social, p. 151.

[25] Gentile, Politics as Religion, p. 18. Ver también Benjamin Wiker, Worshipping the State: How Liberalism Became Our State Religion (Washington: Regnery Publishing, 2013), pp. 175-179.

[26] Rousseau, El contrato social, p. 156. Ver también Elshtain, Sovereignty, p. 135 y Michael Burleigh, Earthly Powers. Religion and Politics in Europe from the Enlightenment to the Great War (Londres: Harper Perennial, 2006), p. 13.

[27] Burleigh, Earthly Powers, 77-78. Ver también Carl L. Bankston III y Stephen J. Caldas. Public Education. America’s Civil Religion. A Social History (Nueva York: Teachers College Press, 2009).

[28] Elshtain, Sovereignty, pp. 134-135.

[29] Burleigh, Earthly Powers, p. 78. Wiker, Worshipping the State, p. 180.

[30] Rousseau, El contrato social, p. 158.

[31] Elshtain, Sovereignty, p. 131.

[32] Burleigh, Earthly Powers, p. 45.

[33] Burleigh, Earthly Powers, pp. 21-22.

[34] Bankston III y Caldas, Public Education. America’s Civil Religion, p. 14.

[35] Norman Hampson, Historia de la Revolución Francesa (Madrid: Alianza Editorial, 1984), p. 272.

[36] Burleigh, Earthly Powers, pp. 76-77.

[37] Joseph Allan Frank, With Ballot and Bayonet. The Political Socialization of American Civil War Soldiers (Athens: University of Georgia Press, 1998), p. 23.

[38] Hippler, Citizens, Soldiers and National Armies, pp. 216-217.

[39] Por lo que, en realidad, debería haber estado completamente de acuerdo con los ideales revolucionarios.

[40] Burleigh, Earthly Powers, p. 160. W. Eaton, “J.G. Fichte as a Forerunner of Nacional Socialism”, Quarterly Review. A Journal of University Perspectives, 48, no. 10 (diciembre 1941): 331.

[41] “Hegel sacralized the State, made History its medium, and human beings its instruments”. A. James Gregor, Totalitarianism and Political Religión. An Intellectual History (Stanford: Stanford University Press, 2012), p. 24.

[42] Gregor, Totalitarianism and Political Religión, pp. 23-24.

1 COMENTÁRIO

  1. Este artigo é certeiro. Parece que este Instituto Rothbard Brasil quer purificar o ambiente dos anarco-ateus. O nobre Oscar Rodriguez Carreiro desmascarou os supostos ateus do estado laico. Só que a religião deles é a igreja de satanás.

    “O amor à pátria é o amor às leis e à prosperidade do Estado, e é particularmente forte nas democracias. É uma virtude política pela qual o indivíduo renuncia aos seus próprios interesses e dá preferência ao interesse público em detrimento dos seus. É um sentimento, e não se baseia em nenhum conhecimento; pode ser compartilhado pela pessoa mais baixa e pelo chefe de Estado.”

    O que o cristão faz de livre e espontânea vontade, o ateu estatista faz igual, só que obrigado pela ponta de um fuzil. Porém, o cristão se submete a própria razão, do qual chegou ás provas da existência de Deus e qual a única religião verdadeira. O ateu randiano liberal se submete a um pedaço de papel escrito por políticos, ou seja, se submete a algo que ele não consegue justificar com o uso da razão. De modo que o ateu liberal é exclusivamente um sofista.

    “o corpo político é formado quando cada pessoa simultaneamente aliena seus direitos a comunidade absolutamente soberana. Para ele, isso não significa escravidão, porque escravidão é dependência pessoal”

    Ou seja, na cabeça do aloprado ateu liberal, o escravo é a senhoria com um terço na mão, pois ela é bucha de canhão dos padres. Agora, livre é o ateu estatista, que tem que fazer neném no colo do papai estado. Cada um com suas prioridades…

    “A passagem do estado de natureza para o estado civil provoca uma notável mudança no homem, substituindo, em seu comportamento, o instinto de justiça e dando às suas ações a moralidade que antes lhes faltava”

    Pois é, exatamente o que eu escrevi em outro lugar: o mentecapto ateu liberal não produz porra nenhuma de moral – sem Deus não existe moral objetiva, mas opiiões circunstanciais -, então tem que se apegar a (falta de) moral estatal. Porque os ateus liberais, para justificarem suas perversões sexuais ou coisas do tipo, precisam que o estado os defenda, pois para o ateu a lei é o máximo de moral que ele entender. Ou seja, esses vagabundos precisam do estado para poderem dizer: o que não é proibido é permitido. O desastre está feito, pois o político rabiscador de papel se utiliza das leis somente para legitimar seus crimes – como imposto, serviço militar ou crimes de liberdade de pensamento , ou para causar confusão…

    “O cristianismo, especialmente o catolicismo, foi nocivo porque deu ao cristão duas pátrias diferentes e dois líderes diferentes, dizendo-lhe ainda que sua verdadeira pátria não é deste mundo. Criou homens fracos que não estavam dispostos a buscar a glória morrendo por seu país.”

    É piada esse negócio – dos ateus que acham isso, considerando que o católico tradicional sabe que não são as leis que garantem a sua liberdade, mas a fé em Deus e um pai de família com seus filhos armados de machados no portão de casa. É como aquela famosa foto do filme “um estado de liberdade”. É a versão econõmica do mito: “países católicos são pobres”…

    “Por sua vez, o Estado, ao exigir que os indivíduos cumpram suas finalidades, concede-lhes a oportunidade de seu pleno amadurecimento como agentes morais.”

    Mas isso só pode ser uma piada de mal gosto. Um ateu liberal (imoral), é um agente moral da mesma maneira que eu sou Wolfgang Amadeus Mozart. Pelo amor de Deus!

    Outros comentadores já escreveram que os liberais e os randianos são inimigos da liberdade, mas que posam de seus defensores. O que eu acrescento é que são anti-católicos, que no mundo secular parece ser irrelevante. Assim, o liberal só fala em impostos para que todo o resto da agenda estatista possa avançar. Examente por isso bilionários monopolistas adoram impostos. E essa contradição vergonhosa conta como benefício para eles… eis o mundo cheio de imbecis ateus. Ateísmo, protestantismo, liberalismo e sionismo são todos a mesma gangue estatal, provando que a descentralização é eficiente, como dizem os austro-libertários. Os bandidos são espertos: transformaram o estado na mais eficiente organiação de todos os tempos. Isso é obra sobre-humana, ou seja, de um anjo. No caso satanás. Depois dizem que Deus não existe…

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui