13. O futuro do euro
A liquidação desses maus investimentos é benéfica no sentido de que ela promove um expurgo dos projetos ineficientes e realinha a estrutura da produção de modo que esta agora passe a atender às reais preferências dos consumidores. Os fatores de produção que foram inadequadamente utilizados nesses maus investimentos são liberados e transferidos para aqueles projetos que os consumidores querem que sejam mais urgentemente realizados.
Em conjunto com esta insustentável expansão econômica gerada pela criação artificial de crédito, o endividamento de toda a sociedade aumenta. A expansão do crédito e as taxas de juros artificialmente baixas que tal expansão gera permitem um nível de endividamento que não seria possível em um sistema bancário que não fosse de reservas fracionárias, isto é, um sistema bancário com reservas de 100% e lastreado por alguma commodity. Esta manipulação do crédito faz com que as dívidas possam aumentar para um nível muito além daquele que a quantidade de recursos reais existentes na economia normalmente permitira, pois as taxas de juros sobre as dívidas se tornam baixas e novas dívidas podem ser criadas do nada para substituir dívidas antigas. O sistema bancário de reservas fracionárias promove um endividamento ostensivo tanto dos cidadãos quanto dos governos.
Embora um crescimento econômico artificial e um endividamento geral tivessem ocorrido em escala mundial, o boom europeu apresentou ingredientes próprios. Em decorrência da introdução do euro, as taxas de juros nos países mais fortemente inflacionistas caíram, ainda que a poupança de seus cidadãos não houvesse aumentado. O resultado foi um boom econômico nos países do sul da Europa e na Irlanda.
O apoio implícito fornecido pelo governo alemão aos membros da união monetária reduziu artificialmente as taxas de juros (seu componente de risco) tanto para os devedores públicos quanto para os privados. Países tradicionalmente inflacionistas repentinamente tiveram uma redução no fardo gerado pelo serviço de sua dívida e, por conseguinte, vivenciaram um forte aumento nos gastos públicos e privados. Ao mesmo tempo, as taxas de câmbio fixadas em níveis relativamente altos em toda a zona do euro — o que significa que as moedas dos países inflacionistas se tornaram sobrevalorizadas — beneficiaram estes países inflacionistas, fazendo com que os preços das importações caíssem dramaticamente nos países periféricos. Italianos, espanhóis e gregos — pessoas acostumadas a moedas mais fracas que as de seus vizinhos do norte da Europa — vivenciaram uma poderosa valorização de suas moedas quando houve a convergência monetária no final da década de 1990 e início da década de 2000. Como a adoção do euro significou um valor comum para todas as moedas, e como a economia alemã — com seu poderoso marco alemão — era a que predominava sobre toda a Europa, o resultado foi que esses países periféricos passaram a ter uma unidade monetária com maior poder de compra do que suas moedas locais até então vigentes.
Bens de consumo duráveis, como carros e imóveis, passaram a ser adquiridos em maior volume, levando a um acentuado crescimento do setor imobiliário, o mais espetacular deles ocorrendo na Espanha. Os países do sul Europa foram perdendo competitividade à medida que os salários foram aumentando em toda a zona do euro. O consumismo excessivo e a perda de competitividade foram sustentados durante vários anos pelo crescente endividamento público e privado, bem como pelas contínuas injeções de dinheiro criado pelo sistema bancário.
Este boom europeu afetou os países de maneiras distintas. Os investimentos errôneos e insustentáveis e o consumismo excessivo foram mais altos nos países de inflação de preços tradicionalmente alta, e menores nos países do norte, como a Alemanha, onde as taxas de poupança permaneceram altas.
O esquema entrou em colapso quando o crescimento econômico mundial chegou ao seu inevitável fim. A liquidação dos investimentos errôneos e insustentáveis — preços dos imóveis em queda e empréstimos insolventes — gerou problemas para o sistema bancário. Calotes e prejuízos nos investimentos passaram a ameaçar a solvência dos bancos, inclusive bancos europeus. Esses problemas de solvência desencadearam uma crise de liquidez na qual os bancos com problemas de maturação de suas dívidas passaram a ter dificuldades para rolar suas dívidas de curto prazo.
Na época, havia alternativas disponíveis para lidar com o problema da solvência e recapitalizar o sistema bancário. [1] Investidores privados poderiam ter injetado capital naqueles bancos que eles considerassem viáveis no longo prazo. Adicionalmente, credores poderiam ter se transformado em acionistas, desta forma reduzindo o endividamento dos bancos e reforçando seu capital. Instituições financeiras inviáveis — para as quais não houvesse um número suficiente de capital privado ou de credores transformados em acionistas — teriam sido liquidadas.
Entretanto, essas soluções de livre mercado para os problemas das solvências bancárias foram deixadas de lado e, em seu lugar, outra opção foi escolhida. Governos de todo o mundo saíram injetando dinheiro nos bancos ao mesmo tempo em que garantiam os passivos do sistema bancário. Já que impostos são bastante impopulares, essas injeções governamentais foram financiadas pelo aumento da dívida pública, algo menos impopular e cujas consequências aparecem apenas mais tarde. Em outras palavras, os investimentos errôneos induzidos pelo inflacionário sistema bancário encontraram nos governos um patrocinador supremo, cujo método de financiamento consistia em inchar as dívidas públicas.
Há outras razões para que as dívidas públicas tenham aumentado dramaticamente. Os governos incorreram em medidas adicionais para lutar contra o saudável processo de depuração que o livre mercado faria contra os investimentos errôneos — medidas essas que serviram apenas para postergar a recuperação. Além do setor financeiro, outros setores ultradimensionados receberam injeções diretas de capital ou se beneficiaram com subsídios do governo.
Dois principais exemplos de recebedores de subsídios foram o setor automotivo em vários países europeus e o setor da construção civil na Espanha. Tais subsídios postergaram ainda mais a reestruturação dessas economias. A livre mobilidade dos fatores de produção foi obstruída por programas de obras públicas que serviram apenas para absorver recursos escassos que eram necessitados mias urgentemente em outras indústrias. Subsídios mais generosos para os desempregados aumentaram o déficit ao mesmo tempo em que reduziram os incentivos para que essas pessoas procurassem emprego fora dessas indústrias sobredimensionadas. Outro fator que ajudou a aumentar os déficits foi a queda nas receitas tributárias causada pelo aumento do desemprego e pela queda dos lucros.
As intervenções governamentais não apenas postergaram a recuperação econômica, como também fizeram isso à custa do aumento dos déficits públicos — aumentos esses que estão avolumando os já enormes níveis da dívida pública. Essa grande dívida pública pré-existente é o produto do insustentável assistencialismo estatal. Como esses sistemas de pensão criam passivos para os quais simplesmente não há fundos — obstáculos insuperáveis para os modernos estados de bem-estar social —, de certa forma a atual crise, com seu dramático aumento nas dívidas governamentais, representa um passo adiante rumo ao inevitável colapso do estado de bem-estar social.
Como já vimos, na Europa, há uma peculiaridade adicional para o problema da dívida. Quando o euro foi criado, as nações-membro fizeram um acordo implícito de que nenhuma delas deixaria o euro após se juntar a ele. Se as coisas ficassem ruins, uma nação poderia ser socorrida pelo resto da União Monetária Europeia. Com esta implícita garantia de socorro, um severo problema de dívida soberana acabou sendo pré-programado.
Esse suposto apoio dado por nações fiscalmente mais robustas reduziu artificialmente as taxas de juros sobre os títulos das dívidas das nações fiscalmente irresponsáveis. Acesso ao crédito barato permitiu que países como a Grécia mantivessem um setor público agigantado e ignorassem os problemas estruturais gerados por salários artificialmente altos (pouco competitivos). Em última instância, quaisquer déficits poderiam ser financiados pela criação de dinheiro pelo Banco Central Europeu, externalizando os custos sobre os outros membros da UME.
Do ponto de vista de um político, os incentivos em tal sistema são explosivos: se eu, como um político em campanha, prometesse bondades para meus eleitores a fim de ganhar a eleição, poderia externalizar os custos dessas promessas, jogando-os todos sobre os outros países membros da UME por meio da inflação monetária — e os pagadores de impostos futuros é que terão de arcar com a dívida. Mesmo que o governo venha a precisar de um socorro (o pior cenário possível), isso acontecerá somente em um distante futuro pós-eleitoral.
Ademais, quando a crise estourar, eu poderei convencer os eleitores de que ela não foi causada por mim; ela se abateu sobre o país como um desastre natural — ou, ainda melhor, que ela foi causada por especuladores malvados. Embora medidas de austeridade impostas pela UME ou pelo FMI possam surgir no futuro, a próxima eleição está bem mais próxima. É fácil perceber como a típica miopia dos políticos de uma democracia combina-se com a capacidade de externalizar sobre outras nações os custos dos déficits, produzindo uma explosiva inflação causada pelo endividamento.
Devido a esses incentivos, alguns países europeus já estavam bastante adiantados em seu processo de insolvência quando estourou a crise financeira e os déficits explodiram. Os mercados se tornaram descrentes de várias promessas governamentais. O episódio grego é um exemplo óbvio desta desconfiança do mercado. Como os políticos querem salvar o euro a qualquer custo, as garantias de socorro se tornaram explícitas. A Grécia recebe empréstimos da UME e do FMI, totalizando um valor estimado de €110 bilhões de 2010 a 2012, além de ter recebido um segundo pacote de socorro de €130 bilhões em fevereiro de 2012. Além disso, mesmo com os títulos do governo grego sendo classificados como lixo, o BCE continua os aceitando, passando inclusive a comprá-los diretamente do governo grego.[2] [3]
O contágio da Grécia se espalhou para outros países — como Portugal, Espanha e Itália — que também possuíam déficits e dívidas altos. Alguns destes sofrem com alto desemprego e mercado de trabalho inflexível. O contágio destes países pode desencadear sua insolvência — e o fim do euro. A UME reagiu a essa possibilidade e entrou “com tudo”, prometendo, em conjunto com o FMI, um pacote adicional de €750 bilhões para os países-membro em apuros. A Irlanda foi forçada a recorrer ao fundo de resgate em novembro de 2010, e Portugal fez o mesmo em abril de 2011.
Os governos podem conter a crise?
O governo grego tentou várias medidas para acabar com seu problema da dívida. Ele anunciou um congelamento nos salários do setor público, uma redução no número de servidores públicos, e um aumento nos tributos sobre gasolina, tabaco, álcool e grandes imóveis.
Mas seriam estas medidas suficientes? Há essencialmente cinco maneiras de os países excessivamente endividados da UME atenuarem os problemas de suas dívidas.
1) Reduzir o gasto público. O governo grego vem reduzindo seus gastos, mas ainda segue incorrendo em altos déficits. A redução no gasto pode simplesmente não ser o bastante. Ademais, não está claro se o governo pode manter estes pequenos cortes no orçamento. A Grécia é famosa por seus protestos violentos contra reformas políticas relativamente pequenas. Como a maioria da população parece ser contra cortes nos gastos, o governo pode não conseguir reduzir o orçamento de maneira suficiente e duradoura.
2) Aumentar sua competitividade para estimular o aumento das receitas tributárias. O governo grego, no entanto, ainda não teve a coragem de seguir este caminho. Seu enorme setor público não foi substancialmente reduzido, e os salários permanecem pouco competitivos em decorrência de sindicatos poderosos e ainda muito privilegiados. Esta falta de competitividade é um permanente obstáculo sobre as finanças públicas. Um padrão de vida artificialmente elevado é mantido em decorrência de déficits governamentais. Aqueles trabalhadores que são pouco competitivos aos níveis salariais vigentes vão procurar emprego no setor público, ou se aposentam precocemente, ou se contentam em receber seguro-desemprego.
A alternativa seria parar de subsidiar o desemprego, seja ele na forma disfarçada de aposentadoria precoce, na forma de empregos públicos improdutivos, ou abertamente, com seguros-desemprego. Isso reduziria os salários na economia privada. A abolição dos privilégios sindicais reduziria ainda mais os preços. Desta forma, a competitividade das empresas gregas aumentaria e os déficits do governo seriam reduzidos. Os países europeus latinos passam por situações similares.
3) Tentar aumentar suas receitas aumentando impostos. A Grécia e outros países periféricos já fizeram isto. Mas o aumento nos impostos está gerando novos problemas para os gregos. Riqueza está sendo retirada do setor produtivo e redirecionada para o improdutivo setor público. Os incentivos para produzir, poupar e investir foram adicionalmente reduzidos. O crescimento econômico está obstruído.
4) Crescimento induzido pela desregulamentação. Esta pode ser a alteração mais fácil de ser alcançada politicamente, e também a mais promissora. Sua desvantagem é que ela demora um tempo que alguns países podem não ter.
Com um crescimento econômico mais vigoroso, as receitas de impostos tendem a aumentar, o que pode automaticamente reduzir os déficits. Crescimento e inovação são gerados pela liberalização completa de economias problemáticas. Com regulamentações e privilégios abolidos, e empresas e propriedades públicas privatizadas, novas áreas são abertas para empreendedores competitivos. O setor privado passa a ter mais espaço para respirar.
Os pacotes promulgados pelo governo grego consistem deste tipo de desregulamentação. A Grécia privatizou empresas e eliminou privilégios — como a obrigatoriedade de licenças para motoristas de caminhões (os quais, não surpreendentemente, se revoltaram contra este ataque ao seu cartel, entraram em greve e paralisaram o país por alguns dias). Mas a Grécia, ao mesmo tempo, implantou medidas que dificultam a respiração do setor privado. Aumentos de impostos, especialmente os aumentos nos impostos sobre vendas, são bons exemplos. As medidas, conjuntamente, parecem ser insuficientes para produzir o crescimento econômico necessário para a redução da dívida pública.
5) Ajuda externa. Mas pode um socorro externo conseguir aquilo que insuficientes medidas de liberalização não conseguiram? Podem os pacotes de socorro de €110 bilhões e €130 bilhões ao governo grego, em conjunto com as compras de títulos do BCE e os €750 bilhões adicionais que foram prometidos, impedir essa crise da dívida soberana? Ou o ponto sem retorno já foi cruzado? Há vários motivos que explicam por que apenas jogar dinheiro sobre um problema causado por dinheiro abundante e barato pode ser algo incapaz de impedir a propagação dessa crise de dívida soberana.
a. Os €240 bilhões dados à Grécia podem, por si sós, não ser suficientes. O que vai acontecer se a Grécia não tiver conseguido reduzir seus déficits suficientemente ao final do prazo do empréstimo? A Grécia não parece estar no rumo de se tornar autossuficiente. Ela está, paradoxalmente, fazendo pouco e muito para atingir esse intento. Ela está fazendo muito no que tange aos impostos, aumentando a carga tributária e, com isso, prejudicando o setor privado. Ao mesmo tempo, a Grécia está fazendo pouco no que tange aos gastos, não reduzindo suficientemente as despesas do governo, além de também não estar desregulamentando sua economia e estar privatizando muito pouco. Ademais, as greves estão paralisando a economia e as demonstrações violentas estão colocando em risco as medidas de austeridade. A situação na Irlanda e em Portugal não está melhor. Espanha e Itália, ambas socorridas pelo BCE, também estão em situação periclitante.
b. Ao se gastar dinheiro para socorrer os governos grego, português e irlandês, menos fundos ficam disponíveis para socorrer outros países. Aumenta-se o risco de não haver dinheiro suficiente para socorrer o governo de outras nações (tais como Portugal e Espanha) caso uma ajuda se faça necessária. Consequentemente, as taxas de juros cobradas sobre os títulos desses países — que agora se revelaram ainda mais arriscados — subiram. Embora o pacote adicional de €750 bilhões tenha sido criado em resposta a esse risco, a iminente ameaça de contágio foi interrompida a um custo: um maior endividamento dos membros mais fortes da UME, o que significa que o problema da dívida soberana foi agravado ainda mais.
c. No final, sempre haverá alguém que terá de pagar por esse empréstimo a juros entre 2 e 3,5% (antes, eram 5%) feito pela UME à Grécia. (Com efeito, os EUA [e o Brasil] estão pagando uma parte dessa soma indiretamente, por meio de sua participação no FMI).[4] À medida que as dívidas dos outros membros da UME aumentam, eles terão de pagar juros maiores sobre seus títulos. Quando o socorro foi anunciado, Portugal já estava pagando mais por sua dívida, e teria prejuízo caso emprestasse dinheiro a 5% para a Grécia. Dado que tanto a dívida total quanto os juros cobrados do governo português estão subindo, é provável que brevemente o país não mais consiga refinanciar sua dívida. Quando o governo português foi finalmente socorrido pelo resto da UME, as dívidas e os juros cobrados dos outros países subiram ainda mais. Isso poderá derrubar o próximo país mais fraco da lista, o qual por sua vez também necessitaria de um socorro, e assim por diante, em um efeito dominó.
d. O socorro à Grécia, à Irlanda e a Portugal (e a promessa de apoio a outros países-membros problemáticos) reduziu os incentivos para se controlar os déficits. Afinal, por que reduzir seus déficits se você irá receber até mesmo uma segunda rodada de socorros, como ocorreu com a Grécia? O resto dos países da UME pode muito bem pensar que eles, assim como a Grécia, também têm direito ao auxílio da UME. Por exemplo, dado que as taxas de juros podem se estabilizar após o socorro, a pressão sobre o governo espanhol para que este reduza seu déficit e flexibilize suas leis trabalhistas será artificialmente removida — uma vez que estas medidas, embora necessárias, são extremamente impopulares entre os eleitores.
A Espanha é o próximo governo na fila após Portugal. Os problemas da Espanha são inúmeros e contêm as características de outros países periféricos. O principal problema da Espanha é o seu alto endividamento público e privado. Taxas de juros artificialmente baixas provocadas pelo BCE formaram uma bolha imobiliária. Os preços dos imóveis dispararam, os espanhóis se endividaram e passaram a viver muito além de suas reais condições financeiras. Quando a bolha estourou, os preços dos imóveis caíram e os espanhóis perderam seus empregos; várias pessoas não mais conseguiram pagar suas dívidas. Construtoras e famílias deram o calote em suas dívidas, gerando problemas para o sistema bancário.
O endividamento do governo praticamente dobrou, saindo de 36,1% em 2007 para estimados 70,2% em 2011. Já as dívidas privadas estão acima de 200% do PIB. Em 2007, em decorrência da atividade econômica gerada pelo auge da bolha imobiliária, o governo espanhol apresentou um superávit orçamento de 1,7%. Já em 2009, após a crise e o estouro da bolha, o governo mergulhou em um déficit de 11,2%, indo depois para 9,3% em 2010. A taxa de desemprego continua em torno dos 20%. Ao mesmo tempo, políticos não parecem muito dispostos a implantar reformas estruturais.
É provável que os bancos espanhóis ainda tenham uma substancial quantia de empréstimos insolventes concedidos a Portugal, o que os deixa totalmente expostos. Um aumento nas taxas básicas de juros anunciado pelo BCE para conter a inflação irá gerar problemas para as finanças públicas do país, podendo desencadear mais calotes privados e gerar mais problemas para o sistema bancário.
Os próximos países na fila são Itália e Bélgica, os quais são grandes demais para serem socorridos pelo atual fundo de resgate. Em 2010, a dívida pública da Itália subiu para 119% do PIB, com seu déficit chegando a 4,6%. A Bélgica, que não possui um governo formalmente estabelecido, está com sua dívida pública ao redor de 100% do PIB. O último prego no caixão da UME, no entanto, pode ser a França. Sua dívida em relação ao PIB aumentou para 81,7%, com um déficit que chega a 7%. Mesmo pequenas reformas estruturais como um aumento na idade de aposentadoria de 60 para 62 anos geraram enormes protestos e greves em outubro de 2010, o que gera dúvidas sobre a possibilidade política de se reduzir substancialmente o déficit da França. A possibilidade de François Hollande se tornar o próximo presidente da França torna o panorama ainda mais sombrio, dado que ele prometeu um aumento nos gastos públicos e um fim às medidas de austeridade.
Embora, na Europa como um todo, os déficits tenham sido ligeiramente reduzidos, o endividamento público segue crescendo; em alguns países, de maneira veloz e insustentável. A cada dia que passa que a dívida continua aumentando e as reformas estruturais não são feitas, vai se tornando mais provável que o continente já tenha passado daquele ponto além do qual não há mais retorno.
[1] Ver Philipp Bagus, “The Fed’s Dilemma,” Mises.org daily (October 8, 2009), http://mises.org.
[2] Ver Robert Lindsay, “ECB in U-turn on Junk Bonds to Save Greek Banking System,” Times Online (May 4, 2010), http://business.timesonline.co.uk. No dia 14 de janeiro de 2011, a Fitch foi a última das três grandes agências de classificação de risco a rebaixar a dívida do governo grego ao status de lixo.
[3] O envolvimento do setor privado no segundo socorro à Grécia induziu a S&P a classificar a Grécia como “moratória seletiva” no dia 27 de fevereiro de 2012. Consequentemente, o BCE suspendeu os títulos gregos da condição de qualificados para colateral. Porém, isto foi um ato meramente simbólico, dado que o BCE permitiu que o Banco Nacional da Grécia aceitasse títulos gregos em seu programa ALE (Assistência de Liquidez de Emergência) — ou seja, o banco central grego ainda poderia utilizar títulos classificados como estando em moratória seletiva como colateral para produzir novos euros, os quais possuem curso forçado em toda a zona do euro.
[4] Ver Bob Davis, “Who’s on the Hook for the Greek Bailout?” The Wallstreet Online (May 5, 2010), http://online.wdj.com.