O Brasil é o país dos subsídios para os pobres. Além da tarifa social elétrica, há a carta social; o vale-transporte; a farmácia popular; o restaurante popular; o ensino público gratuito, até a universidade; a assistência médica gratuita e até, em alguns casos, a aposentadoria gratuita. Até mesmo para os pobres criminosos existe a concessão de um benefício, o “auxílio-reclusão”. Ôpa, e não nos esqueçamos, tem também o vale-qualquer-coisa-que-ainda-precise: o bolsa-família.
Escrevo este artigo inspirado em outro, anterior, no qual discorro sobre o sofrível sistema elétrico de que dispomos, este que é feito de açúcar, pois não pode ver chuva sem dar no pé.
Isto, como se não pagássemos uma fortuna para poder ter um pequeno punhado de quilowatts em casa, tanto da parte do preço quanto por impostos, taxas e contribuições. Afinal, só de ICMS, são 42,85% de tunga (estou falando da alíquota real, pois, pela regra da sua aplicação, o tributo faz parte do preço final, ou, no jargão tributarista, é cobrado “por dentro”.)
Ainda assim, ou mesmo por isto, uma recente manchete do jornal “O Liberal”, do Pará, anuncia que mais de quinhentas mil pessoas usufruem da tarifa reduzida, também chamada de “tarifa social”, um autêntico subsídio para as pessoas pobres terem um ponto de luz, uma geladeira, e claro, uma tv, para não perder a novela.
Não há dúvida que tantos subsídios facilitem um pouco a vida dos pobres. Que seria deles sem tais benefícios? Como um pobre poderia pagar para que seu filho pudesse frequentar a faculdade?
Assim se apresenta o pensamento hoje hegemônico, não somente entre os pobres, mas reinante em praticamente toda cabeça brasileira. Como o pobre poderia pagar por todos estes bens e serviços, se não fossem subsidiados pelo estado?
A começar, primeiramente deveríamos perguntar quais destas concessões seriam realmente necessárias, ou de fornecer, ou de simplesmente existirem. Paga-se auxílio-vítima? Se não, então por que pagamos auxílio-reclusão?
O tema do ensino público — refiro-me especialmente ao de nível superior — nos requer também especial atenção: em um país onde faltam recursos para as coisas mais básicas, por que o estado deve prover o “surplus” da faculdade a um cidadão? Não estaria de bom tom dar o ensino fundamental, e vá lá, o médio? Não se lhe asseguraria assim o indispensável para colocá-lo na linha de largada?
Em tempo, por que existem tantas faculdades, e tantos cursos? Serão todos eles indispensáveis para o exercício de uma profissão, ou será mais apropriado dizer que fazem parte de esquemas corporativistas e sindicais? Em países como o Japão, um técnico, ou mesmo um reles operário que tenha aproveitado a oportunidade de cursar vários cursos livres e objetivos, eles dão banho nos engenheiros brasileiros. Será que é necessário um curso de doutorado para se saber como apertar um parafuso?
Se todas estas regalias, sem contar aquelas das quais me olvidei — sim, porque há muitas mais —, se todas elas tornam a vida da classe pobre menos angustiante, necessário se faz conhecer que são elas mesmas que mantém estas pessoas perenemente no estado em que se encontram.
Quando profiro tal afirmação, não recorro somente ao argumento de que tornam-nas viciadas e indolentes, embora isto seja plenamente verdadeiro para muitas delas. Afirmo com conhecimento empírico de causa, eis que ando necessitando encontrar alguém que se disponha a trabalhar como acompanhante de uma senhora da minha família e não encontro. Segundo relato da nossa secretária do lar, também cooptada a buscar alguém no seio de sua vizinhança, muitas mulheres fortes e jovens recusam-se a se oferecer, alegando que não precisam do emprego, já que são beneficiárias do tal bolsa-voto-de-cabresto. E mais: ainda tratam a nossa colaboradora com sarcasmo!
Eu disse que a indolência não é tudo, embora seja muito triste, como demonstrei no parágrafo acima. Além desta consequência, há também o motivo puramente econômico. Tanta redistribuição de renda traz como resultado o empobrecimento relativo daqueles que pagam a conta, os que trabalham e produzem. Com o governo a sugar quarenta por cento de tudo o que produzimos, pouco sobra para investir.
As pessoas que indagam como os pobres poderiam se alimentar, se tratar, se locomover, morar, frequentar a faculdade e, ora bolas, também ir ao cineminha, se não fossem tais subsídios, o fazem com base justamente no cenário atual, em que todas estas coisas são providas pela sobrecarga nos ombros alheios. Se pararem um minuto para imaginar qual o cenário que se descortinaria se tantos impostos não existissem, poderiam vislumbrar os mesmos pobres com bons empregos, pagando digna e orgulhosamente por bens e serviços de qualidade, e não os péssimos oferecidos pelo estado.
Mas há ainda um lado mais tenebroso desta política distributivista: se observarmos as diversas manifestações naturais que têm ocorrido no mundo todo — e que são plenamente sabidas de acontecer, embora não previsíveis quanto ao momento certo (só para darmos um chega-pra-lá nos defensores do “aquecimento global”), poderemos observar como as pessoas que vivem nos países mais capitalistas se dão muito melhor do que aquelas submetidas a regimes mais socialistas.
Terremotos são passíveis de acontecer, principalmente nas beiras das placas tectônicas, mas os cidadãos chilenos já praticamente voltaram à vida normal, enquanto o Haiti chegou a um estado de total colapso. Um violento terremoto já sacudiu em anos recentes a cidade de Los Angeles, mas a cidade está lá, com seus prédios reluzentes, enquanto em países como Bangladesh, Índia e Paquistão têm o poder de deixar ruínas para sempre (e muitos mais mortos também).
No Brasil, as enchentes são a principal espécie de acidente natural, mas mesmo no Sul, onde a qualidade de vida é reconhecida como sendo melhor do que a das regiões Norte e Nordeste, as mortes e as sequelas duram por muito tempo, e os cidadãos tornam-se quase que totalmente dependentes da magnânima discricionariedade do estado em socorrê-las.
Certa vez, fiquei surpreso com o depoimento de um comandante da Marinha, que a mim declarou ter de se virar para prover o rancho de sua guarnição com pouco mais de três reais por dia (por cabeça)! E isto, para oferecer quatro refeições e mais a “jacuba” dos que cumprem serviço de guarda. Este relato eu o testemunhei há coisa de uns quatro ou cinco anos, de modo que a situação não deve estar muito diferente hoje.
Por acaso o leitor sabe com quanto dispõe um comandante de uma tripulação da marinha norte-americana? Pois eu digo, segundo o relato do meu amigo comandante: zero dólar! Isto mesmo! Zero! Ocorre que o rancho é uma atividade privada, e os próprios marinheiros a pagam! Certamente, com mais qualidade do que o nosso esforçado capitão.
Nos Estados Unidos, um carro da classe média alta, tal como o Honda Civic, é o automóvel das empregadas domésticas, e elas não recebem subsídios para comprá-lo. Quem há de me sustentar que não é bem melhor do que se espremer num ônibus ou em um trem barulhento, quente e superlotado?
A poupança do povo é aplicada diretamente, mas o estado sempre cobra o seu pedágio por seus serviços, de modo que o que chega ao destinatário não passa de uma simbólica fração. Portanto, caro leitor, a quem aparecer a você com tal argumento, mostre a esta pessoa o quanto as coisas poderiam ser diferentes se a poupança ficasse com o povo, e não com o estado. Diga ao seu interlocutor que o pobre pagaria com o emprego e a poupança que o governo lhe rouba.