Desabafos e devaneios econômicos

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320_img09062010112950O artigo a seguir não tem um tema específico, mas sim um propósito, desabafar alguns pensamentos e análises do nosso cotidiano midiático.

É lamentável o rumo que a ciência econômica tomou no século XX.

Após um início de século promissor, partindo das bases sólidas de Carl Menger, Böhm-Bawerk e especialmente Ludwig von Mises, proeminentes economistas da época eram influentes personalidades no mundo político e econômico de seus países e continente.

Um fato que escapa a iniciantes (e céticos) da Escola Austríaca é que seus principais autores tiveram extrema influência e presença no cenário político.

Carl Menger era o tutor do arquiduque Rudolf von Habsburg, príncipe herdeiro do império austro-húngaro.

Eugen von Böhm-Bawerk foi ministro de finanças da Áustria. Sim, você leu corretamente, ministro. Inclusive extremamente preocupado com a solvência do estado. Sem querer desmerecê-lo, mas com um padrão-ouro, essa tarefa é bem mais fácil.

Seu aluno mais importante, Ludwig von Mises foi conselheiro econômico do chanceler austríaco Engelbert Dollfuss e de Otto von Habsburg, além de ser amigo influente de Wilhelm Röpke, o qual foi conselheiro econômico de Ludwig Erhard, que apesar de não ser um austríaco foi capaz de aplicar reformas agressivas de livre mercado levando a Alemanha a recuperar-se com uma velocidade impressionante após a Segunda Guerra Mundial.

Porém, e infelizmente, o furacão keynesiano levou a ciência econômica a um rumo catastrófico e hoje vivemos as consequências deste episódio.

Não é difícil entender a desilusão e a falta de interesse pela ciência econômica na atualidade. Como um cidadão comum pode confiar em um economista, se em um dia ele abre o jornal e lê “temos que atear fogo para sair da crise”, e no dia seguinte está lá escrito que “é preciso jogar água para sair da crise”.

A falta de credibilidade dos economistas da atualidade é desconcertante, fato comprovado pela carta enviada por economistas britânicos à rainha da Inglaterra, desculpando-se pela incapacidade de prever uma crise inevitável e inerente ao atual sistema monetário.

Confesso que me é extremamente difícil aceitar que uma pessoa sensata e inteligente possa pensar que a simples impressão de dinheiro possa trazer prosperidade. Tarefa mais árdua ainda, quando tal pessoa é detentora de um prêmio Nobel.

Ben Bernanke ainda acredita que conseguirá evitar uma recessão ainda mais profunda nos EUA. Jean-Claude Trichet parece ter se rendido as leis econômicas (ou da natureza, como preferir).

Robert Skidelsky acredita firmemente ser um erro crasso reduzir déficits em meio a uma recessão. Diversos economistas austríacos defendem ser impossível evitar uma recessão após uma expansão creditícia. Prolongá-la sim, é possível. Por quanto tempo? Complicadíssimo prever. Entretanto, ao se prolongar a recessão, na ingênua tentativa de evitá-la, acaba-se por potencializá-la. E quando não for mais possível prorrogar o inevitável, a queda será ainda mais acentuada.

Com o conhecimento da ciência econômica que possuímos atualmente, podemos dizer que Adam Smith cometeu erros gravíssimo em sua obra prima A Riqueza das Nações. Não obstante, há uma frase sua que capta perfeitamente a essência da sensatez em matéria de economia: “What is prudence in the conduct of every private family, can scarce be folly in that of a great kingdom” (Aquilo que é prudente na condução de qualquer família dificilmente poderia ser insensato na condução de um grande reino).

Se um trabalhador está endividado, com possibilidade de perder o emprego, seria prudente endividar-se ainda mais para tirar férias no Caribe? Por que então, ao aplicar o mesmo conceito às finanças de um país, economistas abdicam da sensatez?

Se um padeiro produz pães muito além de sua demanda diária usual, os preços unitários tendem a cair. Por que então devemos evitar a qualquer custo que os preços dos imóveis americanos caiam? Ah, porque os cidadãos dos EUA têm sua riqueza medida pelos preços de suas casas. Entendi. Opa, mas e como ficam os que estão desempregados ou em situação financeira complicada? Não seria benéfico que os preços caíssem a níveis que os consumidores voltassem a comprar? Quantos imóveis um cidadão comum precisa? Não interessa, diria Paul Krugman, temos que continuar construindo casas e comprando, num círculo vicioso sem fim, até que cada família tenha pelo menos 3 ou 4 casas! E por que parar em 4? Podemos mais, sem fim, o céu é o limite! Ou melhor, o crédito é o limite. E de onde vem o crédito? Aos leitores do IMB que já captaram a mensagem, sim, a poupança precede o crédito.

Talvez a dicotomia entre macro e microeconomia ofusque as mentes dos economistas keynesianos e do mainstream, incapazes de entender que “dividir” a ciência econômica de tal maneira impossibilita entender as repercussões que políticas públicas têm na sociedade, seja em uma grande corporação, em uma banca de jornal ou em um governo.

Por fim, e pouparei os leitores de mais desabafos e devaneios econômicos, faço uma pergunta: estou sozinho ou tem algum leitor que se enraivece ao ver políticos, economistas, leigos e afins debatendo e opinando sobre qual deva ser a taxa de juros da economia?

Às vezes tento estimar a enorme perda de tempo e esforços de milhares de pessoas dedicadas a estudar e debulhar estatísticas[1] infindáveis com a finalidade de justificar suas ações. Sem contar todos os membros da equipe econômica do governo e Banco Central e os jornalistas e repórteres cobrindo os eventos desta trupe. Quanta improdutividade!

Imaginem um órgão chamado COPPOF (Comitê de Política do Pão Francês). Agora, imaginem que seus membros, extremamente qualificados, doutores e com vasta experiência, se reúnam quinzenalmente com o intuito de decidir qual será o preço justo do pão francês, afinal de contas, este é um item de elevada importância nutricional na vida de um cidadão, e nada mais sensato que um órgão governamental para decidir sobre seu preço.

No entanto, o preço do pão francês não pode ser definido por nenhuma autoridade ou grupo de pessoas, por mais sábias que elas sejam, pois ele depende das valorações subjetivas de cada indivíduo. Da mesma forma com a taxa de juros, que é a taxa de preferência temporal de cada indivíduo, ou quanto cada um decide poupar para consumir no futuro, reduzir o consumo presente para poder consumir mais no futuro.

Como já foi habilmente explicado pelo editor do IMB, Leandro Roque, o Banco Central não pode estabelecer a taxa de juros, ele pode manipulá-la para que se aproxime de seu alvo. Curiosamente, este procedimento não era possível na época em que o mundo ainda utilizava aquele “chato e restritivo” padrão-ouro. Nada que impedisse a criatividade dos políticos. Na Inglaterra do século XVII os governantes tentavam diminuir a taxa de juros via decreto.[2]

Que eu não seja mal interpretado, não estou afirmando que as ações do Banco Central não têm efeito. O BC não pode estabelecer a taxa de preferência temporal de cada pessoa, assim como nenhum órgão pode definir o quanto um cidadão deseja consumir de cerveja ou de sanduíche. Entretanto, a sua atuação de manipular as taxas de juros tem um impacto extremamente prejudicial à economia, pois influencia o preço mais importante do mercado, o preço do dinheiro no tempo.

Se alguém é contra subsídios de qualquer espécie, deveria entender que uma taxa de juros artificialmente baixa, ou seja, abaixo da poupança real da economia, funciona como o subsídio último. É um subsídio universal, pois atua em toda a economia simultaneamente.

Com uma taxa de juros artificialmente baixa, inúmeros projetos que antes não eram viáveis, se tornam atraentes da noite para o dia.

Subsidiar é sustentar uma operação economicamente inviável.

Pronto. Creio ter articulado a minha mensagem.

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Notas:

[1] Segundo Huerta de Soto, “estatística” é algo ruim por definição, pois etimologicamente vem da palavra estado. Ver http://www.youtube.com/user/josemanuelgonzalezg#p/u/218/xvRX33m0axI

[2] Murray Rothbard, Economic Thought Before Adam Smith, (Alabama, Mises Institute, 2006), p. 320

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