Uma das confusões que considero mais comum atualmente é a relação entre liberalismo / capitalismo e “meritocracia” – que no contexto que nos interessa pode ser resumida na ideia de que o “esforçado”, a pessoa que trabalha ficará rica, receberá muito enquanto o preguiçoso, o que não trabalha será pobre. O óbvio fato de que pessoas muito esforçadas (pessoas que nós diríamos “merece”) são pobres é nos apresentado como a prova cabal de que a meritocracia não funciona e de que a defesa moral do capitalismo não passa de bravata para defesa dos “ricos e poderosos”. Mas o mais revelador de tudo isso é que os próprios inimigos do capitalismo (principalmente os igualitaristas) dão mais destaque a meritocracia como sendo o “coração moral” do capitalismo do que seus próprios defensores (alguns nem mencionam a meritocracia como base moral do sistema).
O cumulo da confusão é o gerado pelos chamados “liberais rawlsianos” e outros igualitaristas simpatizantes. Rawls em seu Uma Teoria da Justiça chega a afirmar que não há justiça no fato de alguém ser “dotado pela natureza” com maiores capacidades e consequentemente conseguir maiores rendimentos. Esse seria um rendimento que não foi obtido pelo seu mérito, seria mais um “acaso da natureza” e que, portanto, não existiria muitos problemas em termos de justiça ou moral, na redistribuição da renda proveniente desse acaso ou mesmo ser contra a distribuição de tal renda com base nesses quesitos (aliás, pelo contrário, seria moral e justo redistribuir). Outro erro muito comum é a questão da herança: que mérito tem alguém que recebe uma mega herança dos pais? O único “mérito” de quem recebeu a herança foi ter nascido filho de um rico. O que obviamente não é mérito nenhum. Logo, um liberal que defenda a meritocracia e o seu suposto “correspondente” como sistema econômico, o capitalismo, deveria defender o fim das heranças ou algo como tributação pesada, além de um amplo programa para garantir igualdades de oportunidade, que equalize o ponto de saída de todos e aí sim, cada um por mérito próprio conquistaria a sua “posição”.
O que temos a dizer sobre a justiça de alguém ter nascido com habilidade e inteligência e outro ter nascido sem nenhum dos dois? A resposta, como o próprio Rawls dá, é nada. A natureza não é justa ou injusta. Simplesmente é. O fato do céu ser azul, de alguém nascer alto outro baixo, de um cachorro ter quatro patas e não oito não comporta o conceito de justiça simplesmente porque são coisas dadas, coisas que não dependem de ação humana alguma, é como o mundo é, queiramos ou não. A primeira condição para uma ação ser qualificada de certa ou errada, justa ou injusta é a existência de um agente consciente, racional, que possa escolher, que comete tal ato por escolha, com “propósito”. “Ações” de algo sem consciência, sem razão são simplesmente dados. A chuva cair, o rio descer e não subir, a montanha ser mais alta ou mais baixa, o leão trucidar uma girafa ou mesmo um homem não tem absolutamente nada a ver com justiça. Para dizer se uma ação é justa ou não, é necessário um processo de “conceitualização”, é necessário raciocínio para descobrir como os “existentes”, como a realidade é e depois com base nisso podemos afirmar se uma ação é certa ou errada, se corresponde a realidade ou não. Tudo isso só é possível para seres com tais capacidades, potencialidades: seres que podem raciocinar, seres que escolhem, que agem conscientemente, “por raciocínio”.
Vejam que a realidade, a natureza de cada existente é que nos fornece a base para afirmar se algo é certo ou errado. A realidade, o universo, não é, ele mesmo, certo ou errado. Ele simplesmente é. Se eu disser que “baleias voam” estarei errado porque aquele existente designado pela palavra “baleia” não voa. Baleias não voarem é um dado, é o que é. Não cabe afirmar “é certo ou errado que as baleias não voem”. Certo e errado são conceitos que se referem à compatibilidade, a correspondência de um pensamento, de uma proposição sobre algo com o que esse algo é, ou seja, com a realidade. É uma contradição classificar a realidade com os adjetivos “certo e errado”.
E em termos do problema colocado pelos igualitaristas? Justiça ou injustiça são o certo ou errado em termos de ação humana “social” (em relação a outro homem) no que se refere ao uso da força. Injusta é a ação que contradiz o que cada ser humano é, a sua natureza. Assim como no caso da baleia que precisa ter as suas características, i.e, sua natureza descoberta para que possamos classificar as proposições sobre ela como verdadeiras ou falsas, certas ou erradas, no caso de justiça ou injustiça precisamos descobrir como o homem é, a sua natureza. E será ela a “juíza” da correção (justiça) de cada proposição (ação humana). Ela (natureza humana), por si só, não é justa ou injusta. Simplesmente é. Nós não “escolhemos” ser assim. Não escolhemos ser conscientes, não escolhemos ter a capacidade de raciocínio. Não escolhemos precisar fazer X ou Y (como, por exemplo, comer) caso queiramos viver. E não escolhemos precisar raciocinar, produzir para comermos. Escolhemos sim, se queremos ou não raciocinar sobre algo, se queremos ou não “produzir”, se queremos ou não tentar viver – o único ser vivo que faz isso. No fundo, a única escolha que o homem tem é sobre sua capacidade de raciocinar, sua capacidade de “focar”, de se “concentrar”, em suma, a única escolha é sobre a sua propriedade mais natural, ele mesmo, sua mente. Tudo isso nada tem de justo ou injusto. Isso é o “padrão”, o que determinará se uma ação humana será justa ou injusta (certa ou errada).
Se o fato de alguém nascer com habilidade e capacidade não é justo ou injusto, a renda, a produção obtida com essa capacidade e habilidade é justa ou injusta? Ao contrário da primeira etapa (a capacidade inata), a produção sim poderá ser justa ou injusta porque produção não tem nenhuma origem que não seja uma ação humana. Por mais habilidoso que alguém seja, se a própria pessoa não decidir fazer uso dessa habilidade e capacidade, nada será produzido e ela morrerá como qualquer ser humano que faça o mesmo e não tenha outro que produza por ele. Se a natureza do homem diz que sua sobrevivência depende da sua produção, que por sua vez depende da sua capacidade de raciocínio,de aprender, das suas habilidades, então a norma que diz que alguém tem “direito ao fruto do seu trabalho”, tem “propriedade sobre seu trabalho e seus frutos” é uma norma correta, justa. Se alguém, dentro dessa norma, produz mais ou menos, não interessa o montante, a produção (a ação humana produzir algo e se “apropriar” desse algo) é justa. Mas essa produção não depende de algo que não é “mérito” nenhum do indivíduo, sua capacidade inata? Sim, mas isso é o próprio indivíduo, é o próprio ser humano em questão. E como qualquer ser humano ele tem propriedade sobre o que produz (aquilo que só passou a existir, que foi “criado”, por uma ação dele, ação essa que colocou em uso todas as suas habilidades inatas).
Já a redistribuição sim, seria completamente injusta. Se o fato de alguém nascer com habilidade não é tema de justiça (porque não é fruto de ações humanas), certamente a redistribuição é uma ação humana e uma ação humana que violará completamente a natureza da entidade em questão: o homem. Ela negará ao homem a sua autopropriedade, dirá que ele não tem direito ao fruto do seu trabalho e consequentemente não terá direito sobre sua própria vida. Será um escravo, um animal sacrificado em nome de uma suposta “igualdade material”. Será sacrificado porque a natureza não é o que alguns candidatos a deuses gostariam que ela fosse. A redistribuição, feita por homens, para “consertar” a realidade que não é o que eles gostariam que fosse, sim, essa será não só passível de ser classificada como justa ou injusta, como será classificada de injusta.
Obviamente não se “conserta” o que não é passível de conserto. A realidade é. Não é “quebrada”, “boa”, “ruim”. Ela é dada. Os seus componentes têm uma natureza específica, natureza que precisa ser aprendida pelo homem (que também é um desses componentes), para que os existentes possam servir de meios para sua sobrevivência, para a conquista dos seus objetivos. No caso do homem propriamente dito, ele descobrirá que nenhum homem, em si, pode ser um meio, um animal sacrificável. Descobrirá que os homens precisam de certas coisas para “funcionarem adequadamente” e que essas coisas são a propriedade sobre ele mesmo, sua mente, sobre as coisas que produz, e sobre as coisas já produzidas que coloca em uso, que colaboram com o seu trabalho na produção de novos bens. Negar ao homem esse direito é negar a ele o direito a vida e condená-lo a morte. O igualitarismo é simplesmente uma das mais conhecidas tentativas de negar tudo isso. Claro que o resultado será tão pior quanto maior for a intensidade da aplicação de métodos “não humanos”. Um programa de redistribuição de renda que “tolere” muita desigualdade será menos danoso que um que não aceite desigualdade alguma.
Hayek, famoso economista austríaco, vencedor do premio Nobel, cansou de dizer que uma sociedade que visasse à igualdade ou alguma noção de “justiça social” relacionada a isso, acabaria por se tornar uma sociedade menos livre e no limite (dependendo da obsessão por esse objetivo), uma sociedade totalitária. E a razão é simples, embora o próprio Hayek tenha desenvolvido muito mais o tema e até por um lado distinto: seres humanos são diferentes, possuem habilidades diferentes, objetivos diferentes. A “produção” que cada um obterá dependerá desses fatores. Se for respeitado o direito de cada ser humano sobre si mesmo, sua mente, e sobre o fruto de seu trabalho, enfim, se for respeitada sua natureza e a forma de sobrevivência decorrente dessa natureza, o resultado que cada um obterá será completamente diferente. Só através do uso ilegítimo da força, da coerção, da violação da liberdade é que o resultado será diferente do “natural”. Mas as pessoas não continuarão produzindo o que produziam antes. Elas não “funcionam” através do uso da força (e quanto mais força você aplicar, o resultado para uma dada sociedade será mais catastrófico). No fim o que se obtém é a pobreza, a miséria, homens vivendo como cachorros, como meros animais e uma classe de “comandantes” com poder total vivendo um pouco melhor, embora, mesmo em termos “materiais”, abaixo de um “exemplar médio” de qualquer sociedade liberal moderna.
Dito tudo isso sobre a justiça da redistribuição e dos ganhos obtidos de habilidades inatas, onde fica a meritocracia? É importante entender que a meritocracia é mais uma consequência do que a base de qualquer defesa moral do capitalismo. Um pouco disso já foi visto nos parágrafos anteriores: se alguém é mais habilidoso, e tem sua natureza como ser humano respeitada, então acabará produzindo mais e “recebendo” mais (dado que ele terá propriedade sobre o fruto de seu trabalho, do seu esforço). Você então tem a relação: maior “mérito”, num sentido corriqueiramente aceito, maior riqueza, produção. Mas existem “n” fatores entre o esforço de cada um e o que ele receberá, e nenhum desses fatores será injusto (muito pelo contrário, boa parte desses fatores são apenas usos que outros homens igualmente proprietários, fazem de seus bens).
Por exemplo, um varredor de rua dedicadíssimo, esforçado, trabalha de sol á sol por 10 horas diárias, pai de família exemplar e ótima pessoa. Dificilmente alguém diria que uma pessoa assim não “merece” alimentar seus filhos, dar uma boa vida para a sua família. Ocorre que aquilo que as pessoas enxergam como “mérito” na hora de lamentar o baixo salário do varredor, não as faz pagar mais pelo serviço do mesmo varredor. O que um varredor produz é o serviço “ruas limpas”. Como varrer rua é algo que não necessita de habilidades, capital humano acima da média, enfim, qualquer um pode fazer, marginalmente o valor que as pessoas dão a uma rua “um pouco mais limpa” é baixo, logo estão disposta a trocar o serviço “ruas limpas” por pouca coisa (o que faz com que os ofertantes desse serviço “ganhem” pouco). As pessoas são obrigadas a pagar muito para o varredor varrer a rua? A resposta obviamente é não. Os bens de X que entrarão na troca são de X, é ele que decide se dá muito, dá pouco. E o varredor tem todo o direito de rejeitar ou aceitar (ou seja, tem propriedade sobre ele mesmo e os serviços que pode ofertar).
Isso significa então que no capitalismo, mérito e ganho não são causa e efeito, ou mesmo que não são “fortemente correlacionados”? Não, só significa que “mérito” no sentido corriqueiro do termo não é o mesmo “mérito” quando se refere a ganhos em um sistema de livre mercado. Veja, por exemplo: o varredor de rua tem filhos, trata bem a família etc.. mas nada disso motivou ninguém a pagar muito para ele. Simplesmente porque as pessoas não valoram isso a ponto de desembolsar algo a mais. Não é um “valor”, não é um “bem”, no sentido econômico, para elas. Agora imagine o seguinte: alguém se esforça muito, trabalha arduamente para exterminar a humanidade, cometer assassinatos cruéis etc.. Alguém acha que o sujeito deve receber bastante porque se esforça, se dedica em produzir o extermínio da humanidade? A resposta é um não (pelo menos para a maioria), simplesmente porque ser morto não é um bem, um “valor”, para a imensa maioria das pessoas. O mérito que é “premiado” no capitalismo é habilidade, a competência em produzir valor, bens e consequentemente “bem estar”. Não habilidade, competência em produzir qualquer coisa.
O varredor de rua, nesse sentido, é (ou está sendo) “incompetente”, não tem habilidade ou ainda é “pouco produtivo”. Ele não produz bens, não produz valor (bem estar). O que ele produz tem pouco valor, pouca importância para alguém se dispor a trocar muitos outros bens pelo seu serviço. E o herdeiro de uma grande fortuna que só faz duas coisas na vida: dorme e se diverte? Qual o mérito em ter uma grande fortuna sendo que o sujeito não produz absolutamente nada (de grande ou pouco valor). Quem dá esse exemplo indignado com a suposta falha da “meritocracia” deveria parar um pouco e olhar para o sujeito que criou a herança, não para quem a recebeu. Se um velhinho muito rico, nos ultimas dias de vida saísse de helicóptero jogando dinheiro ninguém reclamaria que você ficou “R$100,00” mais rico por total falta de mérito. Algum igualitarista condena a caridade? Que mérito tem alguém que recebe caridade? O de ter feito uma “cara de dó” convincente? E o melhor de tudo: se o herdeiro que recebeu uma bolada não tem mérito nenhum, que mérito tem qualquer outra pessoa para receber “do nada” a mesma bolada ou uma porcentagem da bolada?
Toda herança precisou ser construída em algum momento do tempo. E ela foi construída com mérito incontestável (trabalho, esforço, competência, habilidade em fazer “coisas produtivas”). Ora, quem produziu e poupou esse monte de bens tem propriedade sobre esses bens. E como proprietário, ele pode fazer o que bem entender, inclusive passar, de presente, para um herdeiro. Se não lhe deixam fazer um acordo desse tipo com outra pessoa (o herdeiro), então o ofertante da herança não é proprietário da fortuna que produziu, o que não faria nenhum sentido em termos nem de justiça, nem de “meritocracia”. Se o herdeiro não tiver “mérito” ele perderá a herança (tão menos mérito – mais bobagens ele tiver/fazer, tão mais rápido será a destruição do seu patrimônio). Existem vários exemplos de herdeiros que destruíram verdadeiros “impérios”, só sobrando o nome.
Ainda sobre heranças e herdeiros, uma confusão muito corrente sobre a falta de mérito dos herdeiros (filhos de ricos) é a questão do “tudo foi mais fácil” ou “nunca trabalharam de verdade”. O “tudo foi mais fácil” é mais compreensível, embora bem pouco óbvio. Tudo é mais fácil no sentido de que, quando criança, adolescente ele podia ter muito mais coisas que o filho de um pobre. Mas ele também tem outras coisas nem tão boas a mais que o filho do pobre: coisas como pressão e responsabilidade. A responsabilidade e a pressão em não fracassar, em ter a sombra de um pai competente, em manter e até crescer um empreendimento que o pobre talvez jamais sonhasse que existia. Se o pobre tem a responsabilidade direta sobre sua vida e talvez a vida de sua família, o rico teria a “responsabilidade” (indireta) sobre a vida de muitos pobres e suas respectivas famílias. “Responsabilidade” em fornecer os bens de capital que tornam a produtividade do pobre um pouco melhor e consequentemente seus ganhos maiores. A responsabilidade de alocar os serviços dos trabalhadores “pobres” de forma a gerar o maior retorno possível. Obviamente alguns conseguem e outros não. E, também, muitos que são pobres hoje conseguem algo parecido, até melhor e se tornar “ofertantes de herança”.
E a critica do “trabalhar pouco”? É importante lembrar que uma herança é produto do trabalho de alguém que a construiu e exerceu seu direito de propriedade (obviamente ainda em vida), deixando-a para outra pessoa. O herdeiro não teve qualquer mérito em recebê-la, assim como ninguém teria (muito menos os governos). Então porque deve ser respeitado o direito de herança? Se alguém acha que só devem ser respeitados direitos de propriedade ligados ao mérito, além de defender que nenhuma caridade ou presente sejam permitidos, deveria permitir heranças porque ela foi mérito de seu criador e negar o direito do criador em repassá-la para quem quisesse seria negar o direito de propriedade e consequentemente o mérito em ter construído tal herança. Uma vez que o herdeiro recebeu a herança, os efeitos do mérito serão sentidos queira ele ou não. Um herdeiro que só faça bobagens, que não produza nada, que só consuma a herança, verá a herança diminuir, assim como a cozinheira que ganhava R$500,00, não poupa nada e nunca mais volta ao trabalho verá os seus R$500,00 sumirem.
O único problema de tudo isso é que alguns consideram que “poupar” não é produzir nada. Então, perguntam raivosamente, o herdeiro pode ficar com a bunda no sofá sem fazer nada e ainda ficar cada vez mais rico? É o famoso e desprezado (moralmente) lema de que “dinheiro faz dinheiro”. Toda essa reprovação moral vem de um erro econômico que acabou virando a teoria econômica padrão das esquerdas e de economistas de “botequim”: a teoria do valor trabalho. A ideia de que valor vem do trabalho (no sentido mais corriqueiro do termo). Um comerciante, com a bunda sentada no sofá, que realoca o que supostamente já foi produzido com trabalho não está produzindo nada. Se ganha algo, ou é porque aproveitou algum “desequilíbrio momentâneo” ou porque tirou daqueles que produziram com trabalho o bem. Quem poupa e empresta a juros é o vilão em pessoa. Como a fonte de valor é o trabalho, alguém que ganha pegando o que já foi produzido e cobra um adicional, só pode tirar esse valor dos que usaram seu trabalho para produzir o bem. Essas pessoas não percebem que bens alocados em diferentes lugares no espaço e no tempo possuem diferentes valores porque servem a diferentes propósitos. Que não há nada inerente em um dado bem (como trabalho) que determine o seu valor. As pessoas com a mentalidade da teoria do valor trabalho não conseguem compreender, que, por exemplo, sem a poupança do herdeiro, o adiantamento no tempo de bens que ele faz ao poupar, jamais surgiriam fabricas e maquinas que permitem uma produtividade e um salário para o trabalhador muito maior. Além disso, que essa quantidade adicional de bens das mais diversas formas é um “serviço produtivo”, algo que as pessoas estão dispostas a pagar. Elas não percebem que a mera “transferência de bens no tempo” através da poupança é algo produtivo, que cria valor por permitir a produção de mais bens hoje. O erro fundamental é colocar o trabalho como fonte de valor, não perceber que a fonte de valor é a mente humana e que os homens valorizam uma mesma coisa das mais variadas formas em diferentes situações no tempo e no espaço.
Por fim, depois de tudo o que foi dito, qual afinal a verdadeira relação da meritocracia com o capitalismo/liberalismo? Como entendida normalmente, meritocracia (qualquer mérito) e capitalismo tem muito pouco a ver. A “meritocracia” que é premiada no capitalismo é a “meritocracia produtiva”, é o mérito por produzir da forma mais econômica que qualquer outro, aquilo que as pessoas desejam. Mas mesmo essa meritocracia é consequência e não um “primado moral” do capitalismo. A base moral do capitalismo é a defesa da vida humana. A defesa do ser humano e do seu direito a viver. Como o homem pode melhorar em muito o seu bem estar se relacionando com os demais através das trocas, oferecer muito a quem lhe pode dar algo muito valioso é a forma racional, a forma que homens livres constroem uma relação permanente de harmonia, de beneficio mútuo. É a forma de convencer, persuadir aqueles que podem produzir tal coisa valiosa, a produzirem. Eis aí a meritocracia: quem produz aquilo que as pessoas valoram muito, ou seja, quem é produtivo, obterá dos demais muitos bens em troca do seu produto. E isso será vantajoso para ele, para os que trocam e até para os que não são produtivos. “Graças” aos produtivos eles poderão obter bens que jamais sonhariam por um preço bem menor do que em uma “sociedade autárquica” (isso supondo que tais bens estivessem disponíveis nessas sociedades).