Nota do IMB: o artigo a seguir faz parte do concurso de artigos promovidos pelo Instituto Mises Brasil (leia mais aqui). As opiniões contidas nele não necessariamente representam as visões do Instituto e são de inteira responsabilidade de seu autor.
Ao contrário do que acontece atualmente, toda teoria minimamente fundamentada em economia e administração defende que existem profissionais específicos com capacidade para descobrir o que o consumidor demanda.
Não é à toa que, em empresas bem sucedidas, todas as decisões costumam passar necessariamente pelo departamento de marketing. É ele o responsável por operacionalizar o processo de descoberta empresarial. O conceito de um especialista do marketing pode nos ajudar a revelar de maneira mais sucinta seu papel. Eugene Kelly define o marketing como “o estudo sistemático das forças de formação da procura e da motivação do consumidor, das considerações temporárias especiais que influenciam as transações econômicas e dos esforços integrados e reações dos consumidores e compradores de um mercado.” Ou seja, o foco da técnica de marketing é atender os anseios dos consumidores.
Mas, se as empresas já dedicam grande porção de tempo e esforço para atender os consumidores (descobrindo o que eles querem e fornecendo), por que seria necessário, por exemplo, um código de defesa do consumidor ou as agências reguladoras? Só é possível imaginar – sendo subsidiado pela teoria acima – que os desejos dos consumidores só não são atingidos pelas empresas devido à incapacidade de descobrirem esses desejos. Mas esse ponto não justifica de maneira alguma a existência desses órgãos, pois não há nenhum fator que indique que eles seriam mais competentes na tarefa de entender as demandas do consumidor que a área de marketing das empresas.
Não é papel dos legisladores definir o que o consumidor demanda, pois o único modo de obter esse conhecimento é por meio dos processos de tentativa e erros, ou seja, pelo mercado. Quando um órgão legislador é substituído por um profissional de marketing, cada “resposta” (feedback) dos consumidores – seja eles por meio de um menor ou maior volume de compras, queixas, sugestões, pesquisas, entre outros – proporciona aos empreendedores a possibilidade de alterar a oferta de bens e melhorar os processos de trocas por meio da internalização desse novo conhecimento adquirido. Ressalta-se que, em breve, essa opinião estará desatualizada e terá que ser novamente verificada para acompanhar os movimentos dos concorrentes e mudanças de preferências dos agentes.
Esse modelo mercadológico não pode ser imitado através de desenhos institucionais porque o Estado não tem o componente empresarial que faz com que a informação relevante seja processada e utilizada; no caso de um burocrata tentar imitar o processo, o que vai acontecer é que ele considerará apenas o seu conhecimento, suas preferências, em detrimento ao uso do conhecimento de todos os consumidores, como é pautada a visão dos profissionais de marketing.
E, mesmo que esse problema não existisse devido ao processo de alteração das leis ser custoso e demorado, ele não poderia acompanhar as mudanças constantes das preferências dos consumidores, nem lidar com preferência inversas e conflitantes. Ludwig Von Mises condensa isso na frase em que diz que “o progresso é precisamente aquilo não previsto pelas regras e regulamentos“.
Dessa forma, leis que visam interferir na relação de trocas entre os agentes no mercado estão fadadas ao fracasso, pois lhes falta componentes mercadológicos que só podem se dar por meio do mercado.
A Soberania do Consumidor
Em 1936, o economista Willian Hutt, em seu livro “Economists and the Public”, cunhou o termo soberania do consumidor[1] (consumer sovereignty) ao descrever a natureza da relação entre os consumidores e as empresas que, para ele, é quase uma relação de servidão. Cada detalhe dos produtos e serviços são definidos pelos consumidores e os empresários que não atenderem as preferências demandadas estão fadados ao fracasso.
Ao contrário do pensamento comum da população, os empresários não são esses seres que manipulam a vida alheia e escolhem o que as pessoas gostam e consomem. Na realidade, o que acontece é o inverso; as figuras dos poderosos empresários existem porque são eles os que atendem com mais eficácia os caprichos dos consumidores; e sua posição sempre é ameaçada quando se acham poderosos o suficiente para ignorar isso. E a história está cheia desses exemplos. Esse caso é particularmente tratado no filme “Vontade Indômita”, no qual o dono de um jornal, se achando em condição de mudar a opinião pública, é levado à falência por insistir em defender uma opinião oposta ao entendimento do público leitor do jornal.
Conclusão
Ao unir a teoria que explica o processo de mercado pelo âmbito econômico com as técnicas de gestão atual, podemos concluir que apenas uma economia de mercado não obstruído é capaz de atender satisfatoriamente as demandas individuais, e que o marketing é o meio usado pelo mercado para operacionalizar essa função. Por isso, não é necessária a existência de órgãos governamentais para regular a relação entre consumidor e empresas ou determinar preferências de mercado.
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Notas
[1]Um fato interessante sobre essa teoria é que Ludwig Von Mises credita ao conhecimento dessa teoria uma parte de seu conhecimento da realidade do mercado. Sendo assim, mesmo Hutt se declarando apenas um apreciador da Escola Austríaca, sua influência no pensamento da escola é relevante.
Referências
RABAÇA, Carlos; BARBOSA, Gustavo. Dicionário de comunicação.
Rio de Janeiro: Editora Campus, 2001, p. 464 (fragmento)