Imaginem a seguinte cena: um siderúrgico brasileiro vende X toneladas de aço a um empreiteiro suíço. Não contente com o volume vendido, o siderúrgico resolve presentear o suíço com mais 5% de aço grátis, free of charge. Quem sai ganhando neste arranjo? Para os economistas domainstream resta claro que o siderúrgico brasileiro é o grande malandro e esperto da jogada.
Este exemplo extremo serve apenas para demonstrar que é exatamente isso que ocorre quando um país tem sua moeda valorizada. Momentaneamente os detentores de uma moeda apreciada poderão adquirir mais bens pelas mesmas unidades monetárias. Ou inversamente, os exportadores receberão menos dos residentes suíços do que previamente, e entregarão a mesma quantidade de bens. Agora pergunto: quem sai beneficiado? Ninguém em plena consciência diria que os suíços sãos os coitados e prejudicados deste arranjo.
Mas é exatamente isso que defende a imprensa e os economistas que ainda vivem na era do mercantilismo. “Pobre Suíça!” escreveu Alan Beattie (Financial Times, numa notícia publicada pelo Valor Econômico do dia 11 de agosto de 2011) lamentando o fato de o franco suíço ter valorizado muito nos últimos dias, semanas e anos. Mas alto lá! Pobre Suíça? Como assim? É claro que alguns setores não poderão exportar tanto como antes, ainda que temporariamente. Mas o que falar do altíssimo poder de compra que os suíços poderão aproveitar? Imaginem as barganhas de produtos e ativos, mundo afora? Exportadores poderão importar maquinário a preço de liquidação e adquirir concorrentes no exterior. Investidores poderão aproveitar a oferta e recompor seus portfólios. E consumidores terão a chance de importar mais bens, elevando o padrão de vida, e viajar ao exterior comprando vinhos e outras especiarias a preço de banana.
Será que estou louco? Deixe-me ver se entendi bem: empresas e indivíduos, residentes na Suíça, têm a belíssima oportunidade de comprar produtos, empresas, imóveis, ações e uma infinidade de ativos no exterior a preços excelentes, tudo fruto do altíssimo poder de compra do franco suíço, em grande parte gerada propositalmente por banqueiros centrais ao redor do mundo, e devemos sentir pena dos suíços?
Definitivamente vivemos num mundo bizarro. Como dizia George Orwell: Guerra é Paz, Liberdade é Escravidão e Ignorância é Força. Sugiro mais uma: moeda fraca é uma benção.
Os banqueiros centrais do mundo todo já não seguem Keynes, Friedman ou qualquer outro apologético de bancos centrais. A filosofia de Bernanke e Cia agora é Lênin: “A melhor maneira de destruir o sistema capitalista é a destruição de sua moeda”.
O pior de tudo é que nem mesmo o invejável Banco Nacional Suíço (SNB) está livre deste mal. Não contente com as intervenções para desvalorizar o franco, o SNB estaria estudando fixar o valor do franco suíço ao euro, o famoso currency peg. Esta vai definitivamente entrar para a história. Pela primeira vez um país fixaria o valor de sua moeda nacional a uma moeda moribunda. Levado ao ridículo, é como se o Uruguai, em 1989, olhasse para o Brasil e resolvesse usar o Cruzado Novo como âncora cambial.
O marco alemão e o dólar foram e são utilizados como âncora por serem moedas estáveis (ok, o dólar não mais). Por que diabos um banco central utilizaria uma moeda “instável” como âncora? Ah sim, lembrei. As exportações. Como sempre a ótica mercantilista e uma teoria econômica decadente impedem que os banqueiros centrais enxerguem a insanidade de suas medidas.
Qual a lição disso tudo? Não podemos confiar em banqueiros centrais. Se alguém achava que o franco suíço poderia ser considerado uma reserva de valor, pense novamente. Não existe moeda forte. Ou melhor. Não existe moeda forte de papel. Sem exceção, nenhum Banco Central está livre de suas ingerências monetárias. Alguns inflam mais. Outros menos. Neste cenário de guerra cambial, dólar desmoralizado, euro na beira do precipício, o único refúgio monetário continua sendo o mesmo há milhares de anos: o ouro.
Um consultor de investimentos provavelmente diria que o ouro não rende juros, não faz nada, apenas fica lá, parado e brilhando. É exatamente por isso que devemos comprá-lo, porque ele fica lá, parado, brilhando e envergonhando os banqueiros centrais.