O mundo tem precisado desse livro para que tenhamos a visão geral da revolução que está ocorrendo, e Wendy McElroy é a pessoa exata para escrever isso. Seu trabalho tem sido imerso na história da liberdade e da luta contra o controle autoritário. Ela traçou essa luta desde o século XIX até o presente, tendo escrito artigos pioneiros e livros contemplando a amplitude da experiência humana. Em A Revolução Satoshi, ela voltou a atenção dela ao que estou convencido ser uma das inovações mais memoráveis da história: criptomoedas, ativos e serviços relacionados. Ela explica como, em nosso próprio tempo, essa tecnologia pressagia mudanças fundamentais, grandes mudanças, na relação entre o indivíduo e o estado. Nos últimos dez anos – historiadores futuros notarão isso – observamos a criação de uma nova arquitetura monetária e financeira que poderá servir como uma substituição para tudo que tem sido conhecido e usado no tempo de vida de todas as pessoas hoje presentes.
Experienciamos um dinheiro seguro e útil que funciona em todo o mundo, não é conectado ao estado, e não precisa do atual sistema bancário. O mesmo sistema pode servir como substituição a todo sistema atual de pagamentos que usam moedas nacionais. Esse dinheiro é uma criação puramente mercadológica que adiciona às funções de contabilidade e de reserva de valor uma característica adicional: ser também um meio de pagamento global peer-to-peer.
Uma década atrás, até mesmo teóricos de alto nível disseram que isso não poderia acontecer. E então aconteceu.
Vimos a criação de um sistema de contratos inteligentes, que pode gerenciar um vasto número de acordos, comprometimentos e interações humanas. Até mesmo pessoas que aceitaram que o Bitcoin era real duvidaram que a Ethereum poderia alcançar isso. Mas isso aconteceu de qualquer forma.
Nós até observamos como esse sistema se tornou um instrumento para levantar capital e substituir as funções de empréstimo tradicionais. Três anos atrás, isso era meramente uma ideia especulativa. Então isso se tornou uma realidade de cem bilhões de dólares, e novas formas de capital estão sendo levantadas através da tokenização.
Aparentemente do nada, temos agora todo um conjunto de tecnologias que poderiam concebivelmente deslocar e até mesmo substituir a moeda nacional, opções de pagamento tradicionais, e até mesmo mercados de capitais regulados, e trazer algo novo.
Você está lendo isso e pensando: aqui vamos nós de novo com o cripto-utopismo. Mas esse é o pulo do gato: não é mais apenas teoria. Essas tecnologias existem, ao vivo e em cores, mesmo que estejam em seus estágios iniciais. É por isso que há tantos bitcoiners por aí que falam tão exuberantemente sobre o futuro. Eles já experimentam isso. Eles são motoristas de Maseratis em estradas cheias de Ford T’s, e eles sabem disso. Uma melhoria do status quo que é tão impressionante que não será suprimida.
Você pode não ter usado qualquer uma dessas novas tecnologias. E está tudo bem. Com todas as falhas do atual sistema, as antigas estruturas cumprem seu trabalho. Na medida em que não há uma grande crise no sistema, as pessoas confiam nele. Não há razões fortes para mudar, mesmo que o novo sistema seja mais seguro, mais rápido, mais democrático, mais inclusivo e menos arriscado e comprometedor da privacidade individual. Ainda assim, o antigo sistema goza do ímpeto que vem a partir do efeito manada. Todo mundo confia no antigo sistema, então você continua confiando nele também.
A Regulação é a Chave
Há outro fator que está atrasando a mudança do antigo para o novo. As regulações estão tentando forçar a nova tecnologia a se comportar como a tecnologia antiga. Nos Estados Unidos, para comprar Bitcoin ou qualquer criptomoeda, você precisa cumprir com regulações know-your-customer, cedendo cada detalhe sobre a sua pessoa. Qualquer dinheiro que você faça de movimentos dos preços em ascensão em um novo ativo precisa ser registrado e você precisa pagar impostos sobre ele. Companhias que desejam prestar assistência no onboarding e no offboarding de cripto para moeda fiduciária têm de se registrar no governo como casas de câmbio. E, com as funções de alavancamento de capital da tecnologia blockchain, os reguladores estão ameaçando acabar com todas e fazê-las se comportar como títulos tradicionais.
Eu assisti enquanto essas regulações, gradualmente impostas e arbitrariamente reforçadas, introduziram um elemento de medo em uma tecnologia sem medo, distorcendo o setor e fazendo dele menos inovador e menos competitivo. Toda vez que um novo uso das redes distribuídas é revelado e começa a se espalhar, alguns mandachuvas surgem do alto para advertir sobre a conformidade com leis de décadas atrás designadas para diferentes tecnologias.
Os consumidores ficam com medo, e a experiência de usuário final não é aprimorada o tanto quanto ela poderia ter sido na ausência de tantos custos de compliance. Eu vi o quanto a incerteza legal fez com que os mercadores e os consumidores perdessem acesso a uma variedade de serviços. Eu vi empreendedores interromperem seus planos, esperando algum édito administrativo vindo de Washington, DC.
O quão mais avançados estaríamos no caso da ausência dessas regulações? É impossível ver as inovações que não experienciamos. Sabemos apenas que as coisas seriam diferentes. Mas uma vez que você considera o quão diferente seriam, a realidade se torna algo além do incrível. E ainda não chegamos nisso.
Quanto Tempo Vai Demorar?
Considere o que acontece quando o poder é usado para parar o progresso de uma nova tecnologia. Isso realmente funcionaria no longo prazo? Para responder à questão, temos de nos engajar nos contrafactuais.
Imagine se os governos na Europa tivessem se empenhado para parar a prensa. E se as cidades ao redor do mundo tivessem banido os automóveis? Qual teria sido o destino das ferrovias, da iluminação doméstica e do encanamento fechado se interesses especiais houvessem sido suprimidos em favor das tecnologias prevalecentes?
Podemos apenas especular, porque nada disso realmente aconteceu. É verdade que nem todo mundo recebeu bem a prensa. Escribas em monastérios se preocuparam com o futuro de seus talentos. Algumas pessoas perguntaram se a velha fé poderia sobreviver às pessoas tendo acesso aos textos antigos. Mas, em geral, o advento da prensa foi visto como uma inovação bem-vinda. Assim também se deu com a combustão interna, eletricidade e encanamento. Algumas pessoas ficaram receosas em adotar elas, é claro, mas os governos em sua maioria deixaram a inovação acontecer.
E se eles não tivessem? Alguém realmente acredita que essas inovações poderiam ser paradas e não meramente atrasadas? Eu penso que não. Há casos na história em que garantias de monopólios por parte do governo retardam competidores de adentrarem no mercado com melhorias. Isso aconteceu com os navios a vapor na Inglaterra, com os aviões nos EUA, e com algumas aplicações de software nas últimas décadas. Mas esses retardamentos são temporários; patentes expiram e a história vai para frente.
Regulações são diferentes. Os empreendedores têm de inovar ao redor delas. Os mercados cinza e negro emergem. Aventureiros encaram as autoridades. Mas, eventualmente, alguém cede. Considere, por exemplo, os resultados caso todo lorde e barão na Europa do século XII tivesse banido a ferradura. Você acha que isso teria parado a implementação dessa tecnologia por séculos? Altamente duvidoso, e a razão é fundamental: ideias são mais fortes que governos. Eventualmente, os custos de imposição excedem vastamente os benefícios da classe governante existente.
Um Mundo Criptonizado
À luz do que temos visto nos últimos dez anos, aqui está um experimento mental com o qual eu venho brincando. Ele ocorreu a mim numa divagação, enquanto meu advogado tributário estava explicando-me profundamente sobre eventos tributáveis nos acordos cotidianos com cripto. Eu estava considerando o quão incompatíveis eram essas imposições com uma tecnologia que emergiu de e opera dentro de uma estrutura de perfeita liberdade.
Algumas legislações entenderam isso. O Wyoming, por exemplo, isentou a cripto de toda tributação, definiu certos tokens de um modo que faz deles isentos de leis de títulos, e fizeram provisões especiais para formas corporativas que são distribuídas, entre outras mudanças. A legislação fez o seu melhor para tornar o estado atrativo para essa nova indústria.
Agora, deixe-nos entrar no campo da fantasia. Digamos que o congresso dos EUA passe uma legislação que isente toda criptomoeda, todo criptotrading e criptoativos de toda tributação e regulação. A legislação estabeleceria laissez-faire completo nesse setor, enquanto todo o resto no mundo normal (o dólar, o FED, a SEC, o Tesouro, e todo o resto que conhecemos) permaneceria o mesmo.
O que você acha que aconteceria? Dez anos atrás, se o Congresso tivesse feito a mesma coisa, pouca coisa teria mudado, obviamente. A tecnologia não existia, e nós realmente não sabíamos que ela poderia existir.
O que aconteceria hoje se todas as intervenções ao redor dessa tecnologia fossem repelidas? Você não seria mais punido por comprar e vender em cripto, emitir novos tokens, desenvolver novos aplicativos em plataformas de contratos inteligentes, inovar novos sistemas de pagamentos e assim em diante. Companhias poderiam tokenizar em vez de vender ações. Os negócios poderiam pagar em cripto e fazer sua contabilidade em cripto e evitar qualquer penalidade. Considere com cuidado: você poderia manter um terço a mais dos seus ganhos justos simplesmente mudando para uma tecnologia melhor.
Quanto tempo levaria para a criptoeconomia substituir todo o resto? Se essa mudança legislativa realmente acontecesse – e não, obviamente não vai – poderíamos observar o deslocamento geral dos sistemas econômicos e financeiros do velho mundo para os sistemas do século XXI, e talvez isso acontecesse muito mais cedo do que qualquer poderia esperar, talvez de 12 a 48 meses, dado que a infraestrutura da cripto poderia escalar a tempo de satisfazer a nova demanda.
Forçando o Passado no Presente
Agora, se esse experimento mental estiver correto, há algumas implicações poderosas. Isso sugere que o mundo financeiro e monetário, tal como existe hoje, está sendo mantido de pé pela força que está nos prendendo aos velhos modos. Essa força está impondo limitações e ineficiências; ela está literalmente mantendo uma vasta infraestrutura no lugar daquilo que de outro modo cessaria de dominar ou até de existir, e impedindo o início de um novo modo de viver. E esse novo modo não é somente sobre comprar e vender. Tão central para nossas vidas públicas são a moeda nacionalizada e os mercados de capital regulados que o advento de um mundo criptonizado mudaria fundamentalmente a relação do indivíduo com o estado.
Estaria eu errado em estar maravilhado com essa percepção?
Manter um sistema vasto vivo apenas pela força não me parece tão sustentável no longo prazo. Se você possui um conjunto massivo de tecnologias que estão esperando para assumir o controle e estão apenas sendo atrasadas por meios puramente artificiais, esse cenário não parece sustentável dada a improbabilidade de que o passado possa para sempre ser preservado. O futuro não pode para sempre ser adiado mesmo pelos governos mais poderosos do mundo. Eventualmente as ideias vencem.
Wendy McElroy, a partir de seus estudos passados de história e de seu mergulho profundo na cripto-tecnologia, entende o poder dessas ideias. O Bitcoin e tudo que é relacionado a ele estão entre as ideias mais revolucionárias da história. Ela demonstra como eles vão transformar para melhor a estrutura da economia, da política, e das relações humanas num geral. Ir daqui para lá requer o entendimento mais amplo possível do que está acontecendo. McElroy é a guia expert e erudita pela qual estávamos esperando.
Jeffrey A. Tucker é Diretor Editorial do American Institute For Economic Research e antigo Diretor de Conteúdo pela Foundation for Economic Education. Ele é parceiro de gestão da Vellum Capital: Blockchain Financial Management, fundador da Liberty.me, Membro Honorário Distinto do Mises Brasil, conselheiro econômico da FreeSociety.com, companheiro de pesquisa no Acton Institute, conselheiro político do Heartland Institute, fundador da CryptoCurrency Conference, membro da bancada editorial da Molinari Review, um conselheiro para a desenvolvedor de aplicativos blockchain Factom. Ele é o autor de milhares de artigos na imprensa acadêmica e popular e é autor de oito livros em oito línguas, o mais recente sendo The Market Loves You. Ele fala amplamente sobre economia, tecnologia, filosofia social, e cultura.