O declínio econômico está seguindo uma trajetória tão previsível, dia após dia, que as pessoas que realmente entendem o mecanismo dos ciclos econômicos nem precisam ler as notícias. É perfeitamente possível intuir o que vai acontecer em seguida, pois tudo está acontecendo como se fosse um exemplo saído de um livro-texto – ainda que a mídia insista em reportar tudo com aquela contínua sensação de surpresa.
As reportagens da imprensa sobre a recessão têm sido como os relatórios de um hipotético comitê que, sem saber nada sobre a lei da gravidade, tenha sido designado para observar e comentar o que acontece quando objetos são abandonados de lugares altos.
Eles se põem a escrever inúmeros e repetitivos relatórios sobre como os objetos caem – uma mudança bizarra e indesejável dos eventos -, e em seguida saem formulando maneiras de impedir que isso aconteça, sempre por meio de alguma intervenção externa. No caso, eles recomendam pacotes de socorro financeiro, gastança, pacotes de estímulo, mais regulamentações e inflação.
Tudo o que você quer é um pouco da atenção deles para poder explicar uma coisa simples: o que está ocorrendo é parte da estrutura da realidade em si, e não há nada que vocês possam fazer para parar isso. Podem tapar os olhos, trocar os espelhos, dar cambalhotas, conjeturar, falar e reclamar o quanto quiserem. No final, a verdade é uma só: a recessão é uma reação necessária e inevitável ao boom anterior. E ela deve poder seguir desobstruidamente seu caminho até o final.
Na semana retrasada, por exemplo, vimos a taxa de desemprego dos EUA subir para 6,7%, de acordo com as estatísticas oficiais. É aí que vemos a face humana da recessão. Trata-se também de uma inevitável reação ao boom. As pessoas que estavam empregadas em excesso nas indústrias estimuladas pela bolha agora serão levadas dos setores em declínio para os setores viáveis – a um sério custo de transição. Os salários se ajustarão para baixo e as pessoas abandonarão os empreendimentos economicamente insustentáveis e irão para aqueles mais economicamente viáveis.
Mas a maneira como tudo isso é reportado é o suficiente para enlouquecer qualquer um. A imprensa faz parecer que tudo é algo perfeitamente corrigível. É como se as ordens do comitê político central, uma vez executadas, restabelecessem de pronto a normalidade. Um banco está quebrando? É melhor alguém socorrê-lo logo! Os preços dos imóveis estão caindo? Que se gaste trilhões para estimulá-los! As pessoas estão perdendo seus empregos? Ora, vamos criar trabalhos para elas – ou vamos simplesmente subsidiar o desemprego com mais auxílios-desemprego, fazendo com que ele dure mais tempo.
Falando particularmente sobre o desemprego, esse é de longe o quesito que mais trouxe calamidades durante o século XX. O problema em si é largamente artificial, no sentido de que o desemprego é criado pelos ciclos econômicos (ciclos de expansão e recessão). E estes, por sua vez, são conseqüência direta de uma política monetária frouxa implementada pelo banco central. Qualquer sociedade que tenha uma moeda sólida e estável não terá problemas de desemprego. E assim seria porque, como Mises explicou, em um livre mercado todo o desemprego é puramente voluntário.
Como assim? Ora, trata-se de uma característica inerente ao mundo em que vivemos. Afinal, vivemos em um mundo de escassez ou de abundância? Se vivêssemos em um mundo de abundância, ninguém precisaria fazer absolutamente nada. As coisas se transformariam sozinhas. Madeira milagrosamente viraria papel; minério de ferro viraria aço, que viraria carro e por aí vai. Nesse mundo, sim, haveria desemprego involuntário. Mas como vivemos em um mundo de escassez, sempre e em todo lugar haverá algum trabalho a ser feito. O trabalho economicamente útil irá pagar em retorno um salário, que funciona como recompensa pelo custo de oportunidade de se trabalhar ao invés de se dedicar ao lazer, além de refletir o valor desse trabalho em relação ao produto global. E pelo fato de haver sempre algum trabalho a ser feito por algum preço, o desemprego não é uma característica da economia de mercado. E é por essa razão que foi apenas no século XX que começamos a observar a existência de longos períodos de desemprego. A tentativa de “curar” o problema serviu apenas para reforçá-lo.
Mas, nas economias flageladas pelos ciclos econômicos, não é apenas o capital que é erroneamente direcionado para setores insustentáveis; o trabalho também é atraído pelas bolhas criadas pelo crédito subsidiado. Quando essas bolhas estouram, os empregos são eliminados. E esse é um efeito dominó, que flui de um setor a outro. A conseqüência disso é a ocorrência maciça de alterações por toda a estrutura da economia.
Não há razão alguma para supor que a mão-de-obra seja menos capaz de se transferir de uma linha de produção para outra do que o capital. Porém, quando você tem sindicatos, pisos salariais mínimos, benefícios obrigatórios, custos trabalhistas, encargos salariais e outras intervenções, essas transferências acabam levando mais tempo do que deveriam – e é aí que começamos a ver o alto desemprego que vem perdurando cada vez mais.
A maneira mais segura de garantir que o problema piore é tentar consertá-lo por meio de seguro-desemprego, gastos governamentais, empregos públicos e coisas do tipo. Todas essas intervenções apenas atrasam o necessário e inevitável ajuste, além de prolongar e piorar a crise.
Os economistas Vedder e Gallaway dedicaram vários anos ao estudo de questões relacionadas ao desemprego no século XX, e acabaram provando – fazendo uso de uma massa de detalhes históricos – que o todo o problema se deve à tentativa de consertar o problema. Os resultados estão descritos em seu livro Out of Work – um trabalho que deveria sepultar em definitivo todas as intervenções trabalhistas.
Infelizmente, a classe política não dá a mínima para fatos e lógica. Assim, ela segue em frente com seu arsenal de medidas destrutivas, sob o sempre entusiasmado apoio da mídia, repetindo todos os trágicos erros do passado. A conclusão lógica é que essas pessoas podem criar todo o desemprego que quiserem, desde que elas continuem tentando “fazer algo” quanto a isso. O público apóia as medidas porque esse é um assunto que está entre os mais alarmantes e assustadores de todo o campo econômico. Afinal, “certamente a classe política pode fazer alguma coisa para resolver isso!”.
Se realmente não quisermos repetir a década de 1930, a única atitude da classe política deveria ser o corte de impostos e de gastos, além de dar plena liberdade ao mercado de trabalho. Fora isso, ela não deveria fazer mais nada com a bondosa intenção de “ajudar” o problema. Assim como os objetos caem quando você os solta, os mercados se ajustam durante recessões – desde que não haja empecilhos.
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