CAPÍTULO II – Economia 0.0 (Do escambo até o dinheiro sólido)

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Introdução                    

Depois de ter completado o capítulo primeiro devem ter surgido algumas dúvidas. O que significa verdadeiramente o dinheiro? Quem o controla? Como? Que significa o ouro? Que tem a ver o dinheiro com o ouro? Como foi construído o sistema monetário contemporâneo?

Para entender sobre um assunto temos que entender o contexto desse assunto e para entender dito contexto precisamos conhecer seu passado. Neste capítulo, portanto, introduziremos mais alguns conceitos de Economia importantes enquanto iniciamos um breve percurso ao longo da história da economia que nos levará os próximos três capítulos.

Neste segundo capítulo analisaremos como o sistema econômico foi se tornando gradualmente mais eficiente, partindo de um sistema de trocas voluntárias baseadas no escambo para se transformar em uma economia baseada no dinheiro sólido, principalmente ouro e prata.

Inicialmente essas trocas, seja por escambo, seja em dinheiro sólido, eram feitas entre indivíduos agindo de maneira livre, mas o poder central, enxergando oportunidades de lucro, começou a interferir nessas trocas voluntárias em benefício próprio.

O SURGIMENTO DA ECONOMIA

Bens de consumo e bens de capital

Como foi estudado no capítulo anterior, de maneira geral, a procura pela satisfação pessoal e, de maneira particular, a otimização dos recursos escassos, especificamente tempo e dinheiro, é a força natural que leva aos indivíduos a tomarem suas decisões e agirem. Essas ações, tanto no nível individual quanto em estruturas hierárquicas superiores, podem ser divididas em duas:

  • As ações que envolvem o uso dos recursos escassos para sobreviver, graças as quais se criam e comercializam os chamados bens de consumo.
  • As ações que envolvem o uso dos recursos escassos para otimizar sua gestão, aprimorando assim a qualidade de dita sobrevivência; ações graças as quais se criam e comercializam os chamados bens de capital.

Por exemplo, em um contexto pré-histórico, no nível hierárquico mais baixo, o nível do indivíduo, um mamute seria um bem de consumo, pois para consegui-lo foi usado um recurso escasso, um tempo, com a intenção de conseguir alimento e assim sobreviver. Já uma arma como uma lança seria um bem de capital, pois com ela seria possível caçar maior quantidade de mamutes em menos tempo e, portanto, estaríamos otimizando o tempo empregado e, em consequência, aprimorando a qualidade da sobrevivência do indivíduo, pois agora poderá usar esse tempo sobrante para outra atividade diferente.

Num contexto mais moderno, um padeiro usa seu tempo para produzir pão, um bem de consumo importante para sobreviver. Se, nessa produção, o padeiro visualizar oportunidade de lucro, ele será incentivado a investir seus recursos escassos, seu tempo para procurar um bem de capital como um forno, e seu dinheiro para adquiri-lo. Agora, graças a esse forno ele poderá obter um lucro maior usando um tempo menor. Portanto, nessa decisão e posterior ação, ele terá otimizado seus próprios recursos escassos e, em consequência, a qualidade da sua sobrevivência.

Curva de aprendizado e especialização

A capacidade humana de aprender algo está limitada pelo que se conhece como curva de aprendizado. Segundo esta função logística, em pouco tempo seremos capazes de aprender muito sobre uma técnica determinada, mas se requererá muito tempo para nos tornar especialistas nessa mesma técnica.

Sendo assim, já que é fisicamente impossível ser bom em tudo, a maneira mais eficiente dos indivíduos se auto-organizarem dentro de uma sociedade é quando cada um se torna especialista em produzir itens exclusivos: os itens de consumo ou de capital que o mercado demandar.

O progresso através dos incentivos pelo lucro

Dada as limitações impostas pela curva de aprendizagem, entende-se que não faz muito sentido que um indivíduo A se torne experto em oferecer um produto ou um serviço que já é fornecido por um indivíduo B por um preço baixo e de qualidade, pois se tornar melhor que B lhe levaria muito tempo. Efetivamente, é mais vantajoso que o indivíduo A dedique seu tempo a se tornar experto em produzir outro produto ou serviço, que seja altamente demandado e/ou pouco ofertado pelo mercado, pois neste caso o preço será alto. E sendo assim, a oportunidade de obter lucro exerce um grande incentivo no indivíduo A para ele empreender nesse novo projeto.

Neste processo de especialização, sempre haverá trade-offs individuais de curto prazo, porém que resultam beneficiosos para o conjunto da sociedade a longo prazo. Neste caso, o sujeito A efetivamente sairá perdendo porque terá que dedicar seus recursos limitados, neste caso seu tempo, para se tornar experto em outra coisa. Contudo, o conjunto da sociedade sairá ganhando, pois agora, graças a que A teve que procurar outro nicho de mercado, a sociedade como um todo terá mais um novo produto ou serviço ofertado pelo sujeito A, ou o mesmo produto feito de maneira mais barata ou de maior qualidade, e que antes não estava disponível. Este processo de invenção de novos produtos pode até gerar um efeito cascata de subsequentes inovações e consequente geração de empregos. Portanto, a procura pelo lucro, num ambiente de livre concorrência, é a força natural que empurra aos indivíduos a se especializarem e essa especialização é a que faz uma sociedade progredir através das inovações que emergem natural e espontaneamente dentro dela.

É interessante notar que este processo de avanço de uma sociedade é efetuado de maneira natural desde baixo (os indivíduos) para cima (a própria sociedade na sua totalidade) e não de cima (através de ordens impostas) para baixo, como é habitualmente pretendido por nossos dirigentes. Não adianta nem mandar, nem ordenar, nem intervir nas interações particulares que acontecem entre os indivíduos. Uma sociedade não progride graças às ordens vindas de líderes iluminados e sim graças à chamada “mão invisível do mercado”, ou seja, uma organização autônoma e espontânea que emerge naturalmente dos indivíduos na sua procura pelo lucro.

O escambo

A especialização dos indivíduos, cada um sendo experto num nicho de mercado diferente e específico, fez com que entre eles emergisse o que se conhece como uma economia de escambo. Numa economia de escambo, os excedentes de produção de um sujeito A são trocados diretamente pelos excedentes de produção de um sujeito B.

Por exemplo, um sujeito A que pesca atum pode desejar uma baguete de pão, mas já que ele não é especialista em criar pão e sim em pescar, o mais eficiente para ele é pescar além do que for consumir para assim trocar esse excedente de atum por baguetes de pão. O sujeito B, que cozinha baguetes de pão, acabará pensando da mesma maneira, pois já que ele não sabe pescar, o mais eficiente para ele é se dedicar ao que sabe fazer, aumentando sua produção para assim trocar esses excedentes de baguetes de pão pelo atum do sujeito A.

O escambo é a forma mais primitiva de economia, pois neste sistema não é necessário o dinheiro. Como veremos, a maneira em que os indivíduos fazem trocas voluntárias irá evoluindo ao longo do tempo, mas isso não quer dizer que o escambo deixe de existir. Até nos dias de hoje, sem percebermos, quando, por exemplo, afirmamos que “devolverei esse favor”, estaremos realizando escambo, pois estaremos trocando um bem ou serviço recebido no presente, por outro serviço futuro em forma de favor.

A ineficiência do escambo

A economia do escambo apresenta, porém, um grande problema de fluidez. Imagine-se o seguinte impasse: um sujeito A deseja os bens ou serviços produzidos por um sujeito B, mas este sujeito B não deseja em troca os bens ou serviços produzidos pelo sujeito A. Ou seja, as trocas por pares estão atreladas a uma coincidência dupla de vontades, sem a qual a troca direta não seria efetivada.

Este problema de dupla coincidência de vontades pode ser resolvido se fosse introduzido um sujeito C, do qual B deseje seus produtos ou serviços, e C deseje os de A. Desta maneira, os itens que A deseja de B, B estaria disposto a transferi-los para A, desde que, em contrapartida, A transferisse seus itens para C, e logo em seguida, C transferisse os seus para B, fechando com isso o círculo de trocas, realizados desta vez de maneira indireta.

Este círculo de trocas indiretas, porém, é muito ineficiente, pois é extremamente lento e muito dependente da confiança entre as partes. Pense-se em que aconteceria se o sujeito B transferisse seu item para o sujeito A, esperando que A transfira os seus para C (para finalmente B receber os itens de C), mas nesse meio tempo C decide mudar de opinião. Se essa suposição já se torna provável entre 3 sujeitos, o problema se agrava mais ainda ao serem introduzidas mais partes envolvidas nessas trocas indiretas.

O surgimento do livre mercado

Com o propósito de agilizar tais trocas, aumentando também o número de possibilidades de transferência, os indivíduos das primeiras comunidades da pré-história deram naturalmente com uma solução: o mercado.

O mercado era um lugar físico onde todos os interessados coincidiam para trocar seus bens ou oferecer seus serviços de maneira voluntária. Foi assim então como, naturalmente, devido às necessidades e desejos dos indivíduos, surgia a economia de livre mercado.

Tal economia de livre mercado solucionava o problema da lentidão do escambo, porém um novo problema começou a emergir, pois para realizar tais trocas de maneira mais diligente se tornava necessário estabelecer um mecanismo em comum para quantificar o valor, em termos absolutos, de cada produto ou de cada serviço.

O SURGIMENTO DO DINHEIRO

Os meios de troca

Quando as pessoas realizam trocas voluntárias por escambo é natural que alguns dos itens trocados, devido a suas características particulares, se tornem mais desejados que outros. Gradualmente, com o passar do tempo, esses itens desejados acabam se tornando bastante úteis para qualquer troca, pois todo indivíduo aceitará prazerosamente cambiar seus excedentes de produção por esse item especial.

Esse item especial, particularmente útil para fazer negócios, é o que se chama meio de troca. Os meios de troca resolvem as ineficiências do escambo, pois como eles são desejáveis, os indivíduos aceitam receber diretamente eles como meio de pago por seus produtos ou por seus serviços. Desta maneira, a própria economia, devido às necessidades dos usuários, resolve o problema da dupla coincidência de vontades, e também o problema de como quantificar o valor dos produtos e serviços, cujo valor agora passa a ser medido em função deste meio de troca, neutral para todos os cidadãos de uma sociedade específica.

Dependendo das circunstâncias, diferentes e curiosos meios de troca foram usados ao longo da história: animais de granja, grãos de trigo ou objetos decorativos como pedras ou conchas, ou até cigarros, durante a Segunda Guerra Mundial.

O dinheiro

Dentre estes itens que funcionavam como meio de troca, alguns deles, devido às propriedades que descreveremos a seguir, acabaram se consolidando na economia, tornando-se no que se conhece como dinheiro.

Para que um determinado item, inicialmente usado como meio de troca, seja escolhido naturalmente pelo mercado como dinheiro, tipicamente esse item deve ter as seguintes propriedades:

  1. Ser durável, pois se o item perecesse ou estragasse o sujeito perderia todo o estocado.
  2. Ser fungível, pois se um item usado como meio de troca é diferente de outro, os indivíduos seriam reticentes a realizar essa negociação, preferindo estocar o item de melhor aspecto.
  3. Ter valor intrínseco, porque se um item não tiver valor intrínseco os indivíduos se desfariam dele ao invés de estocá-lo.
  4. Ser divisível, pois isso facilita sua troca e seu transporte.
  5. Ser escasso, pois caso contrário não teria nenhum valor.

O dinheiro sólido: os metais preciosos

Observe-se como os metais preciosos como o ouro ou a prata satisfazem estes 5 requisitos:

  1. Os metais preciosos são duráveis, pois eles não enferrujam nem evaporam.
  2. Os metais preciosos são fungíveis, pois, por exemplo, um anel e um brinco de prata, apesar de serem itens diferentes, possuem a mesma composição química. Neste sentido, prata sempre será prata independentemente da forma.
  3. Os metais preciosos possuem valor intrínseco, pois objetivamente eles são ótimos condutores elétricos. Entretanto, eles são principalmente usados para aparentar um alto status social e, portanto, seu valor intrínseco é realmente subjetivo.
  4. Os metais preciosos podem ser divididos em partes menores, facilitando sua troca e seu transporte.
  5. Os metais preciosos são escassos, pois no existem minas de ouro nem de prata em qualquer lugar.

O fato de ser escasso é talvez a característica mais importante. Veja que se um bem é escasso (difícil de encontrar ou de criar) isso evita que alguém consiga facilmente quebrar as regras do jogo. Efetivamente, se alguém pudesse criar um item com as características de se tornar dinheiro (e de fato, já foi tentado ao longo da história pelos chamados alquimistas), então esse indivíduo teria um grande incentivo a criar inúmeras cópias para se enriquecer, deturpando com isso o valor do mesmo.

Primeiros sistemas monetários

As primeiras moedas, ou mais bem proto-moedas, foram as chamadas moedas-ferramenta, as quais surgiram na região da China entre o segundo e o primeiro milênio a.C. Estas proto-moedas, feitas em metal, tipicamente bronze, chumbo ou estanho, consistiam em utensílios de uso diário como facas, pás ou enxadas.

Para facilitar as trocas, durante a China do primeiro milênio a.C., estas proto-moedas evoluíram naturalmente para moedas arredondadas, as quais se caracterizavam por serem furadas no centro para assim serem coletadas com cordas.

Em ocidente, as primeiras cunhagens de moedas datam do século VII a.C. na região de Lídia, na atual Turquia. A moeda lidiana consistia numa liga de ouro e prata, daí o nome de electro. O uso da moeda como sistema de troca se espalhou posteriormente para o oeste até as regiões do atual Egito, Grécia e Itália, que acabaram cunhando suas próprias moedas. Inicialmente, desde o século IV até o III a.C., algumas cidades centrais da atual Itália usaram um sistema monetário baseado no chamado aes grave, formado por uma liga de bronze e ferro. Um aes grave pesava uma libra ou libra pondo em latim, de onde surgirá o nome para futuras moedas, como a libra esterlina (pound). Uma duodécima parte do aes grave era uma uncia em latim, de donde se deriva a palavra onça, que formará parte do peso troy, um sistema de medidas de massa, procedente da cidade francesa de Troyes, surgido durante a época medieval, e muito usado ainda hoje para medir o conteúdo em metais preciosos de alguma peça.

Tal sistema foi posteriormente adotado pela república romana, que atuava como seladora de qualidade, daí o nome de aes signatum. A medida que o império se expandia, os novos espólios dos territórios conquistados permitiram a cunhagem em outros metais preciosos: ouro e principalmente prata. Estas moedas eram inicialmente cunhadas por ourives privados que trabalhavam nos arredores do templo de Juno Moneta, ou Juno “a admoestadora”, construído na honra da deusa Juno. Precisamente, da palavra latina Moneta é de onde se deriva a palavra espanhola moneda, a palavra moeda em português e money em inglês.

Por volta do ano 211 a.C. emergia em Roma um novo sistema baseado principalmente em prata. Este sistema trouxe uma moeda que perdurou durante a maior parte do império romano: o sestércio e principalmente o denário, de onde surge a palavra dinheiro. O sistema baseado no denário só foi substituído por Constantino I a partir do século III d.C. por outro sistema baseado no soldo ou solidus, forjado em ouro.

A INTERVENÇÃO DO ESTADO

Apropriação da cunhagem da moeda

Deixe-me emitir e controlar o dinheiro de uma nação e não me importarei com quem redige as leis.” Mayer Amschel Rothschild

Com a adoção dos metais preciosos como moeda, a metalurgia se converteu em uma das especializações mais prestigiosas ao longo da história. Os ourives conseguiam fundir os metais para separar estes nas suas componentes e assim forjar a moeda, dando o tamanho, a forma e a pureza adequadas.

O poder de cunhagem não passou, porém, despercebido para os imperadores. Há, de fato, vários registros históricos da proibição e apropriação dessa cunhagem. Na China imperial do ano 186 a.C. a cunhagem privada foi efetivamente proibida, passando a ser monopólio da dinastia. Também, ao redor do ano 766 d.C. no Japão, ourives privados foram apreendidos e escravizados por desafiar a cunhagem oficial da corte nipônica.

No império romano, como acabamos de relatar, a cunhagem da moeda foi inicialmente feita também por ourives privados. Entretanto, diante da cada vez maior insegurança, eles aceitaram a proteção imperial que cuidava do templo de Juno Moneta. Com isso, o império foi tomando gradualmente o controle da cunhagem da moeda para si próprio.

Com a moeda sob controle, o império romano podia comprar todos os produtos ou serviços que quiser, dentre eles pagarem a soldados para expandir as fronteiras do império, conseguindo com isso mais riqueza através de espólios e impondo tributos aos habitantes das terras conquistadas.

A apropriação e o monopólio da cunhagem da moeda ou, em outras palavras, o controle da emissão do dinheiro, é algo claramente benéfico para qualquer estado. Não deve então resultar estranho que todo governo acabe mais cedo ou mais tarde se apropriando desse poder.

Desvalorização da moeda no império romano

O fato da cunhagem da moeda ficar nas mãos do imperador criava um grande incentivo para a criação de mais moeda a um custo menor.

No caso do império romano, tal fraude não demorou em chegar, pois o império enfrentava cada vez mais problemas para se manter:

  1. A região italiana não tinha minas de metais preciosos. Estes tinham que vir de fora, especificamente, da região grega ou da Hispânia.
  2. Fronteiras mais amplas trazia maior arrecadação, mas também maiores despesas militares.
  3. A balança comercial com a Índia era deficitária, a qual sugava a prata do império.
  4. A despreocupação dos imperadores em manter um equilíbrio fiscal.

Esses problemas levaram ao imperador Nero, e a todos os imperadores subsequentes, a abusar da confiança de seus súditos diminuindo o tamanho do denário e reduzindo gradualmente a porcentagem de prata contida nele, criando assim mais moedas com a mesma quantidade de prata, ou seja, criando mais moeda não respaldada por um aumento real de riqueza. Durante este processo que levou séculos, o denário de prata ao 100%, inicialmente criado no século II a.C., acabou contendo apenas um 0,02% de prata por volta do ano 270 d.C. no reinado de Cláudio II.

Fonte: “The Metrology of the Roman Silver Coinage” D.R. Walker (1976-78). A porcentagem em prata do denário romano foi diminuindo continuamente durante o império romano. Esta desvalorização da moeda produziu uma inflação dos preços. A inflação no império romano, devida ao abuso dos governantes, foi um dos primeiros e melhor relatados eventos de inflação da história.

Podemos entender os efeitos de uma desvalorização da moeda usando os conceitos estudados no capítulo anterior. Podemos ainda usar dois pontos de vista: o ponto de vista dos produtos ou serviços e o ponto de vista do dinheiro como um produto em si.

Do ponto de vista dos bens ou serviços, os produtores, que percebem a desvalorização da moeda, exigirão mais quantidade de moedas para vender esses mesmos bens ou oferecer esses mesmos serviços, o qual desloca a curva da oferta para cima, desembocando em inflação nos preços. Já do ponto de vista do dinheiro como um produto, se o império aumenta a quantidade de dinheiro circulante na economia (mais dinheiro pelo mesmo valor em prata), a curva da oferta do dinheiro se deslocará para baixo, produzindo uma desvalorização do mesmo.

Como sabemos, ambos os pontos de vista são realmente equivalentes, pois o efeito líquido da desvalorização da moeda é sempre o mesmo: a perda de poder aquisitivo dos cidadãos, os quais enfrentarão preços mais altos ou, equivalentemente, dispor de um dinheiro desvalorizado, ou seja, um dinheiro que compra menos.

A desvalorização da moeda levou aos próprios soldados a exigir aumentos salariais gradativamente. De fato, o salário de um soldado era de 900 sestércios por ano na época do imperador Augusto por volta do ano 1 d.C., o qual aumentou até 2000 sestércios durante o reinado de Lúcio Sétimo Severo, 200 anos depois. O problema foi que o preço do grão aumentou até mais do triplo e, portanto, nem o aumento de salários se tornou suficiente para enfrentar a inflação dos preços.

Este processo de inflação nos preços, ou de desvalorização da moeda, que aconteceu durante império romano, contribuiu a aumentar a disparidade social entre as classes, separando os detentores de ativos, tipicamente as classes altas, dos que não detinham nada, as classes baixas. Tal disparidade social debilitou a estrutura do império romano, o qual contribuiu à sua derrocada.

 

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Borja Ruiz Reverter
é físico com mestrado e doutorado em física pela Universidad de Granada (Espanha). Sua formação é na área de micrometeorologia e turbulência de fluidos, de onde passou a se interessar por áreas correlatas como complexidade, auto-organização e fenômenos cooperativos, incluídas as interações econômicas. Nas horas vagas foi trader, empresário, devorador de livros, e atualmente é professor permanente na Universidade Federal da Paraíba - Campus II, onde de maneira intercalada ministra disciplinas de Física Geral, Biofísica, Mecânica, Eletromagnetismo e Física Experimental. Borja é um apaixonado pelas criptomoedas, pois elas lhe fizeram entender o que significa o dinheiro e como este é usado como uma ferramenta de manipulação de massas, e seu objetivo profissional é divulgar ciência de um ponto de vista holístico.

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