[Este artigo é o prefácio do livro Economia, Sociedade & História, que está sendo publicado hoje em nosso website]
Em junho de 2004, a convite de Lew Rockwell, passei uma semana no Mises Institute em Auburn, Alabama, para apresentar uma série de palestras: uma pela manhã e outra à tarde, durante cinco dias, em um ambiente intimista, perante uma plateia de mais de cinquenta alunos e profissionais.
O objetivo, conforme estabelecido por Lew Rockwell, era ambicioso: apresentar minha visão do mundo e seu funcionamento interno. Consequentemente, as palestras deveriam ser um esforço intelectual amplo e interdisciplinar, abordando questões de filosofia, economia, antropologia, sociologia e história.
Minhas palestras não foram baseadas em um texto escrito, mas em notas, complementadas por apenas algumas apostilas. Daí o tom um tanto informal do texto a seguir e seus ocasionais apartes pessoais e conversacionais. Com base na experiência pessoal, não espero que esse fato diminua, mas, na verdade, aumente o apelo e a acessibilidade do presente trabalho, portanto, não senti necessidade agora de quaisquer mudanças estilísticas.
Além disso, cheguei à mesma conclusão não apenas em relação ao estilo, mas também ao conteúdo. Já faz quase vinte anos que apresentei as seguintes palestras. Elas foram gravadas em áudio na época e um CD foi produzido. Mas nunca olhei para trás nem ouvi essas gravações. Na verdade, quase nunca ouço gravações de minhas próprias falas e, em geral, no que se refere a questões intelectuais e não teatrais ou artísticas, prefiro muito mais a escrita à falada. Revisitando agora, pela primeira vez, em sua forma escrita o que havia apresentado oralmente em 2004, fiquei agradavelmente surpreso e cheguei à conclusão de que não devo mexer em nada, mas deixar que tudo fique como está. Isso não quer dizer, é claro, que não haja mais nada a dizer sobre os assuntos abrangentes do trabalho seguinte, mas sim, se posso ser tão indecente em dizer, que é um trampolim notavelmente sólido para mais e melhores coisas ainda por vir.
Na verdade, não parei de ler, escrever e dar palestras desde 2004, e o leitor curioso já pode encontrar algumas observações, considerações e deliberações adicionais em meus próprios trabalhos subsequentes, repletos de referências adicionais. Entre outros, há a segunda edição ampliada de A Economia e a Ética da Propriedade Privada (2006), Uma breve história do homem: progresso e declínio (2015), Manual para entender direito o Libertarianismo (2018) e, mais recentemente, a segunda edição muito ampliada de A Grande Ficção (2021). Da mesma forma, aqueles que preferem coisas ao vivo e em cores podem querer dar uma olhada em algumas das muitas gravações em vídeo feitas de minhas palestras nos últimos anos, principalmente minhas apresentações regulares nas reuniões anuais da Property and Freedom Society (PFS), todas que estão disponíveis eletronicamente em minha página pessoal, www.HansHoppe.com.
Finalmente, o leitor pode achar interessante aprender um pouco sobre as circunstâncias pessoais e o contexto histórico-temporal, no qual a presente obra deve ser inserida. Conforme mencionado brevemente na quarta aula, quando apresentei minhas palestras, em junho de 2004, eu estava no meio de alguns grandes problemas com a UNLV, minha universidade. Um aluno me acusou de ter violado algum padrão do “politicamente correto” e, portanto, de criar um “ambiente de aprendizado hostil” para ele, e a universidade iniciou então uma investigação oficial sobre o assunto que se arrastaria por quase mais um ano. Depois, em 2005, contei toda a história sórdida em um artigo intitulado “Minha batalha com a polícia do pensamento”. No entanto, embora eu finalmente tenha saído triunfante do caso escandaloso, ele teve um impacto duradouro em minha vida. Como resultado, não apenas um ano da minha vida foi roubado de mim, mas também perdi muito do meu antigo entusiasmo como professor e minha apreciação pela vida acadêmica. Eu já tinha visto sinais nefastos da crescente disseminação do “politicamente correto” por toda a sociedade antes, é claro, mas me sentia, aos meus olhos, imune a esta doença mental. Em minhas aulas, não havia reconhecido e aceito nenhum tabu intelectual e, fosse por causa disso ou apesar disso, gozava de grande popularidade entre meus alunos. O tempo todo, em minha posição de professor titular efetivo, me considerava bem protegido por minha universidade de toda e qualquer interferência na liberdade acadêmica. Essa crença foi seriamente abalada e, à luz de um número crescente de eventos semelhantes em outras universidades ao redor do país ao mesmo tempo, cheguei à conclusão de que, para mim, com meus interesses intelectuais amplos e interdisciplinares, o ensino universitário doravante sempre significaria ter que escolher entre a autocensura, por um lado, ou o assédio, por outro.
Felizmente, eu seria rapidamente resgatado desse dilema por alguma reviravolta favorável em minha vida pessoal, no entanto, que me permitiu renunciar ao meu cargo na universidade e continuar meu trabalho acadêmico fora da academia oficial. Olhando para traz agora, eu diria que foi “na hora certa”, porque as coisas só pioraram, e pioraram rapidamente. Durante meus dias de estudante, na Alemanha, as universidades constituíam em grande parte ordens ainda anárquicas compostas por dezenas de pequenos reinos e feudos intelectuais autônomos, competindo livremente ou cooperando uns com os outros, e os estudantes universitários constituíam não mais que 7 ou 8% de uma faixa etária. Desde então, as universidades têm se transformado cada vez mais em organizações enormes e altamente centralizadas, governadas por um comitê central de burocratas e uma massa cada vez maior de assistentes administrativos, enquanto os alunos agora, nos Estados Unidos, representam mais de 50% de uma faixa etária. Nessas circunstâncias, com um comitê central burocrático no comando, e seja por comissão ou omissão, as universidades, então, pressionadas pelas chamadas turbas estudantis antifascistas e por marginais do Black Lives Matter e instigadas neles por algumas fraudes professorais, falsos e tolos assim catapultados para a proeminência pública, têm sido cada vez mais transformadas em campos de doutrinação do “ politicamente correto” ou “wokeness“, conforme definido por alguns teóricos do “marxismo cultural”. E não muito diferente da antiga revolução cultural de Mao com seus Guardas Vermelhos, então, esse movimento wokeness deu grandes passos em direção ao seu objetivo de subverter e, por fim, destruir todos os padrões ocidentais tradicionais de excelência humana, mérito, realização e, de fato, normalidade e de todas as coisas normais, e silenciar, expulsar ou espancar até a submissão qualquer um que ouse discordar da única e correta linha do partido político woke.
Hoje, na universidade contemporânea, nos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e muitos outros países ocidentais, então, muitas coisas ditas ou constatadas a seguir não podem mais ser ditas ou constatadas sem medo de repercussões graves: sem campanhas de cancelamento, censura, pedido de desculpas, confissão de culpa ou mesmo assédio, ameaça e perda do emprego e meios de subsistência. Mais uma razão, então, para agradecer a Lew Rockwell, ao Mises Institute e, em particular, aos muitos doadores generosos, que tornaram possível a presente publicação.