Aula XXIX – Elementos da Teoria Austríaca da Justiça: Responsabilidade e Punição

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Teoria da Responsabilidade

 

A responsabilidade se origina do descumprimento de uma obrigação – a pessoa responde, é responsável, por isso. A única obrigação que existe, fundamentalmente, é o dever de respeitar a propriedade privada. Logo, responsabilidade surge de uma violação de propriedade. Interessante notar que a única obrigação fundamental é não fazer algo. Isso significa que o cumprimento dessa lei é algo automático, natural e não requer nenhum esforço positivo. Todos nós já estamos, agora mesmo, cumprindo esse dever. Eu, enquanto escrevo esta aula, e você, enquanto a lê, estamos respeitando-o. Todas as pessoas, enquanto vivem as suas vidas, trabalhando, estudando, educando os filhos, indo à igreja, fazendo amor, celebrando contratos – em tudo isso eles estão cumprindo esse dever. Apenas quando alguém decide fazer algo com aquilo que já tem dono – isto é, com aquilo que já tem alguém para decidir sobre seu uso – é que se descumpre esse mandamento.

Todo descumprimento de um dever é uma ação. E toda ação é o uso de meios físicos (causais) para concretizar fins internos (intencionais). Logo, todo descumprimento de um dever é um ato que envolve meios externos e fins internos. Em suma, causação + intenção.[1] Assim, pode-se dizer que alguém é responsável por um resultado quando a sua conduta guarda uma relação de causalidade e intencionalidade com esse resultado. Por exemplo, se um indivíduo usar um machado para cortar uma árvore, ele estará usando um meio para atingir um fim, e, caso obtenha esse fim, ele será o responsável pelo tombamento da árvore. Se não houver relação de causalidade, não poderá se falar em responsabilidade, pois não se poderá dizer que alguém de fato causou um resultado. E, se não houver intenção, também não haverá responsabilidade, pois nesse caso não se poderá dizer que alguém sequer agiu.

Para entender bem, considere o seguinte cenário. O sujeito A empurra no rio o sujeito B, que morre. Há aí uma relação de causalidade, um nexo causal, entre a conduta de A e a morte de B. Caso B tivesse caído no rio sozinho e se afogado, não haveria nenhum nexo causal entre o comportamento de A e o resultado de B. Como de fato o houve, então existem duas possibilidades: A empurrou B com a intenção de causar dano ou sem a intenção de causar dano. Se A o fez com a intenção de causar dano, logo ele agiu com dolo. E, se o fez sem a intenção de causar dano, mas conhecendo os riscos envolvidos nessa ação, logo agiu com culpa. Por fim, se agiu sem a intenção de causar dano e tampouco estava ciente de qualquer risco, logo agiu sem dolo e sem culpa.[2] Nos dois primeiros casos, ele cometeu um crime doloso e um culposo, respectivamente. No último, ele causou um acidente. É evidente que, num caso concreto, é muito mais difícil determinar a responsabilidade, pois não sabemos o que se passa na cabeça de ninguém, mas podemos tão somente especular sobre isso com base na experiência e no bom senso. Além disso, é claro que um homem adulto que empurra outro no rio sabe dos riscos que essa atitude envolve.

Desse modo, podemos concluir que os elementos da responsabilidade são: conduta ilícita, nexo causal e culpa lato sensu.

A conduta ilícita é aquela proibida. A única conduta proibida é violar direitos de propriedade. Logo somente uma violação de direitos de propriedade pode gerar responsabilidade. O nexo causal é o liame físico-externo entre a conduta do sujeito e o resultado obtido. E a culpa lato sensu é a existência de intenção com deliberação (dolo) ou intenção sem deliberação (culpa stricto sensu, ou seja, negligência, imprudência ou imperícia).

Assim, mera intenção, sem causação, não gera responsabilidade.[3] Quando alguém, por exemplo, põe em risco a vida de outrem, mas não ocasiona nenhum resultado, como quando um motorista dirige bêbado, então nenhuma responsabilidade é criada, pois a ação daquele sujeito não produziu nenhum efeito. Por outro lado, se um comportamento produz efeitos deletérios, mas sem nenhuma intenção, isso não chega nem mesmo a ser uma ação (pois ação é comportamento propositado), e logo nenhuma responsabilidade é gerada. É o caso, por exemplo, de duas pessoas distraídas que se trombam na rua e uma delas se fere na colisão. Trata-se de um acidente, pelo qual ninguém é responsável.

Os livros de Direito costumam trazer o dano como um dos elementos da responsabilidade. Mas esse elemento não parece estar implicado na dedução. Pois basta que alguém viole um direito de propriedade, mesmo que isso não cause dano, para que surja a responsabilidade. Danos se verificam tanto mediante violações de propriedade quanto mediante o devido cumprimento da lei. O elemento do dano parece ser indiferente aqui, a não ser enquanto sinal para que o proprietário perceba que houve invasão à sua propriedade. Para deixar clara a indiferença do dano no contexto da geração de responsabilidade, tomemos os seguintes exemplos. Imagine que um homem invada a sua casa, mas não quebre nada. Pode-se dizer que houve um dano na medida em que você se sentiu invadido, sentiu violada sua privacidade, e então, mesmo que nenhum estrago tenha sido feito, o invasor é responsável. Agora imagine que um criminoso furte o seu carro, que você já queria trocar de qualquer maneira, e o seguro lhe possibilite comprar um carro muito melhor, de maneira que você enxergou esse furto como uma bênção. Nesse caso, não houve dano, e sim benefício (que pode ser definido como valor positivo causado por outrem), e o criminoso é, ainda assim, responsável. Uma vez que o próprio conceito de propriedade já é definido em termos físicos, toda invasão de propriedade já deve ser um ato objetivamente verificável, e a existência ou não de dano é algo subjetivo.

Costuma-se também distinguir entre responsabilidade civil e penal. Essa distinção, no entanto, também não encontra respaldo a priori. Ela surge conforme a moral e os costumes de cada lugar e varia ao longo do tempo. Uma conduta é considerada criminosa segundo o seu grau de reprovabilidade social. Por isso os ordenamentos jurídicos costumam separar infrações penais e civis, e puni-las conforme a sua gravidade percebida. Então, o que hoje é considerado civilmente punível, amanhã pode se tornar um crime ou indiferente para o Direito.

 

 

Teoria da Punição

 

O que acontece, todavia, quando o sujeito descumpre o dever de respeitar a propriedade? Como justificar uma punição para esse indivíduo? E até que ponto pode ir essa punição? De que adianta uma teoria jurídica fundamentada em um dever absoluto se aqueles que o descumprem podem sair ilesos? De fato, uma teoria legal sem uma teoria da pena é como uma arma sem munição: é bela, mas inútil. Deve haver sanções para aqueles que descumprem a lei. Mas como definir isso a priori?

Com efeito, não há um dever de punir. Porque, se houvesse, a não punição seria um crime, e ter-se-ia de punir o inocente que não puniu o criminoso, o que é um absurdo. Não punir alguém que cometeu um crime é um direito, já que o único dever que existe é o de respeitar a propriedade. Mas, se não há um dever transcendental de punir, como justificar as sanções legais?

Para fazer isso, utilizaremos dois conceitos, um dos quais já abordamos: o de preferência demonstrada e o de preclusão dialógica.

A lei da propriedade é uma lei da razão. A razão é uma faculdade comum a todo ser racional. Sendo uma faculdade comum, é algo objetivo, como a lógica, e não algo subjetivo, como gostos e preferências pessoais. Portanto, a lei da propriedade é algo objetivo. Quando um indivíduo age conforme objetivamente não deve agir, então ele demonstra, através da sua atitude, que prefere agir fora do âmbito do dever objetivo. Ele demonstra que prefere agir de uma maneira objetivamente injustificável. Assim, através da sua preferência demonstrada, ele se coloca fora da comunidade jurídica. Ele se torna um fora-da-lei.[4]

Pode-se argumentar que a preferência demonstrada apenas se refere a uma atitude passada do agente, e não serve para definir como ele pensa agora. Assim, pode-se dizer que ele de fato preferiu sair da comunidade jurídica naquele momento em que descumpriu a lei, mas que atualmente ele já se encontra de volta a ela. Porém, uma vez que o indivíduo tenha demonstrado preferência por ser um fora-da-lei, só há uma maneira de fazê-lo demonstrar preferência por tornar a integrar-se à comunidade jurídica: aplicando-lhe uma sanção.

Como já vimos, respeitar a lei é uma atitude natural, que não envolve nenhum esforço positivo. É simplesmente não invadir a propriedade de ninguém e cumprir as promessas contratuais. Por isso, enquanto a pessoa está vivendo normalmente, pode-se dizer que está demonstrando a sua preferência por cumprir a lei; mas, quando a descumpre, não há como saber se agora ela voltou a demonstrar sua preferência pela legalidade a não ser impondo-lhe uma pena. Até lá, uma vez que tenha descumprido a lei, ela se exclui da comunidade jurídica. E, ao fazer isso, ela não pode mais, sem se contradizer, argumentar que deve ser tratada conforme um sujeito de direito. Ela sofre, por esse modo, uma preclusão dialógica, conceito proposto por Stephan Kinsella. A preclusão é uma espécie de impedimento. Observe o que diz Kinsella:

Por que, então, é esse o caso? Por que um criminoso é precluído [impedido] dessa maneira? Considere: se é um agressor violento, tal como um assassino ou um estuprador, como ele poderia não consentir a qualquer punição que A, a vítima (ou a agência da vítima), tentar impingir? Para objetar a sua pena, deve entrar num diálogo com A; ele deve, pelo menos temporariamente, adotar a posição de uma pessoa pacífica, civilizada, tentando mostrar a A, através do uso da razão e de princípios universais consistentes, por que A não deveria puni-lo. Mas para fazer isso, B deve em essência reivindicar que A não deveria usar força contra ele (B), e para fazer isso B deve reivindicar que é errado usar força. Mas, uma vez que B iniciou o uso de força, ele admitiu (acreditou nisto) que é apropriado usar força, e B iria se contradizer se afirmasse o oposto. Dado que contradições são sempre falsas e que um objetivo inegável do discurso é estabelecer a verdade, tais contradições são excluídas do discurso, já que não podem tender a estabelecer a verdade. Desse modo, B é impedido de fazer essa afirmação contraditória e é, portanto, incapaz de objetar sua punição.

Sob a teoria da preclusão, então, nós podemos impingir nossos direitos aos agressores violentos, uma vez que eles não podem objetar à imposição dos direitos sem autocontradição.[5]

Em resumo, quando o sujeito pratica um crime, ele se retira da comunidade jurídica e não pode mais, sem se contradizer, argumentar que seus direitos sejam respeitados.

A partir desse raciocínio, Kinsella apresenta um novo formato do princípio da proporcionalidade da pena. Ele diz que, se A estapeia B, isso não significa que B pode agora matar A, dizendo que A, ao agredi-lo, não pode mais objetar a ser agredido também, em qualquer grau.

Logo B teria uma justificativa para estapear A de volta, mas não para matá-lo. Eu não estou dizendo que B pode só estapear A e não fazer mais nada, mas certamente B tem uma justificativa para, pelo menos, dar um tapa em A, e não tem para assassiná-lo.[6]

O indivíduo A poderia argumentar que a sua conduta admitiu somente que “dar um tapa é certo”, e não que “matar é certo”. Assim, Kinsella propõe um limite máximo da pena.

Há portanto limitações ao total da pena que pode ser aplicada pela vítima contra o agressor, que tem relação com a extensão da agressão cometida pelo agressor, porquanto é a natureza de um ato de agressão em particular que determina a extensão do estoppel [preclusão] que opera contra o agressor. Quanto mais séria é a agressão e as consequências que se seguem dela, tanto mais o agressor é impedido de objetá-la, e consequentemente é maior o nível da pena que pode ser legitimamente aplicada.[7]

No entanto, parece haver uma falha nesse argumento. Pois, da mesma forma que A poderia dizer, em sua defesa, que sua conduta apenas demonstrou que ele acredita que “dar um tapa é certo”, B poderia argumentar que essa mesma conduta demonstrou que “violar direitos de propriedade é certo”. Por que B deveria adotar a proposição mais estreita em vez de assumir a mais larga? Não é verdade que dar um tapa é invadir um direito de propriedade – pior ainda: o direito de propriedade sobre o próprio corpo – tanto quanto matar alguém? Então, argumentativamente, não há diferença. Observamos que não há graus de violação de propriedade. Quebrar uma janela com uma pedrada e atear fogo na casa inteira representam igualmente uma violação: nos dois casos há descumprimento do dever de respeitar a propriedade. Atear fogo não é descumprir mais esse dever. Um dever só pode ser cumprido ou descumprido. Não há terceiro termo, nem muito menos graus de cumprimento. Há graus sim de dano, e somente a vítima pode, em qualquer caso, saber o quanto foi prejudicada – o que nos conduz de novo à impossibilidade de estabelecer uma proporção.

Assim, de acordo com esse raciocínio – e estamos aqui buscando uma teoria a priori pura, isenta de qualquer juízo de valor –, o sujeito se retira da comunidade jurídica e perde os seus direitos mediante qualquer violação de direito de propriedade privada. Com isso se conclui que a pena é facultativa e discricionária, ou seja, pode-se sempre perdoar o infrator ou aplicar-lhe qualquer sanção. Não havendo perdão, então a pena se faz o meio de o infrator sanar a sua dívida diante da vítima e provar à comunidade jurídica, por preferência demonstrada, que tornou a respeitar as leis.

Isso significa que um ladrão de comida poderia ser punido com a mesma severidade que um estuprador? Teoricamente, sim. Porém, na prática, a moral e os costumes estabelecerão esses limites. Esta teoria apenas estabelece que não existem limites a priori, racionalmente estipuláveis e objetivos para a punição. Nem máximos, nem mínimos. Não é possível determinar a priori nenhum quantitativo de punição. A única coisa que podemos saber a priori é que o indivíduo se retira da comunidade jurídica através de sua preferência demonstrada por não seguir a lei, e por preferência demonstrada, de novo, insere-se de volta nela, ao cumprir a pena. Disso não se conclui que ele deva ser punido, nem se pode definir qualquer medida de punição. Por isso, a pena é sempre facultativa e discricionária.

Pode-se dizer que essa teoria seja por demais severa, por não estabelecer um limite máximo da pena. Mas, se ela é por demais severa por não estabelecer um limite máximo, por que não dizer então, em vez disso, que ela é por demais branda por não estabelecer um limite mínimo? Tanto Kinsella quanto Rothbard defendiam a lex talionis, isto é, o olho por olho, a justiça retaliativa. Essa doutrina estimula a vingança e faz a sociedade se esquecer de que o criminoso pode ser perdoado ou até mesmo corrigido. Já a teoria da pena discricionária deixa tudo em aberto – o que é tanto mais justo para a vítima quanto muito mais aterrorizante para o potencial criminoso. Veja-se que, na prática, cada sociedade desenvolveria seu próprio sistema de leis e sanções. Afinal, existem infinitas maneiras de aplicar e fazer cumprir o Direito, e nossa teoria apenas diz que todas elas são válidas, desde que o direito de propriedade privada seja o núcleo do ordenamento.

Essa teoria justifica a aplicação de penas brandas e até mesmo benéficas para um agressor, mas, dada a nossa época, acredito que o estudante desta teoria esteja mais preocupado com a possibilidade de se aplicarem penas brutais por crimes pequenos, então farei um comentário sobre isso.

Em primeiro lugar, uma vez que homens capazes podem assumir relações contratuais, então eles podem criar a sociedade que quiserem com as leis que quiserem, impondo as sanções que julgarem cabíveis. Qualquer associação voluntária é justa de acordo com a lei da propriedade. Assim, toda sociedade voluntária terá suas leis e cominações de pena, e aquele que aceitou participar dessa sociedade aceitou esses leis.

Em segundo lugar, considerando o caso de uma sociedade em que se permite a aplicação de penas brutais, por que alguém que não concorda com isso participaria dela? Se ele for obrigado a participar, então se tem aí um Estado, e não uma sociedade voluntária. E, se participa dela voluntariamente, então ele deve ser tão mau quanto seus legisladores. A ordem política sempre espelha o caráter do povo. O que faz a lei são as pessoas, e não o contrário. Então a lei será tão justa e harmoniosa quanto o forem as pessoas que a instituírem. “As regras não governam aos homens, estes é que governam as regras”.[8]

Para finalizar, considerando o caso de uma sociedade constituída de pessoas decentes na qual, ainda assim, é permitida a aplicação de penas desumanas, nesse caso haveria uma pressão social no sentido de se agir com justiça e clemência. Todo mundo sabe que aplicar a pena capital a um mero ladrão de comida é algo sumamente cruel. Alguém que fizesse isso em uma sociedade composta principalmente por pessoas de razoável caráter seria imediatamente malvisto por todos e execrado. Se se julgam pessoas por fazerem muito menos que isso, que pensar de um indivíduo desses? Quem iria querer se envolver em trocas e negociações com ele? Quem iria querer contratá-lo? Perceba que haveria uma pressão natural para se agir com justiça e razoabilidade.[9]

 

Teoria da Punição – Parte II: O Jus Puniendi

 

Quando alguém comete um crime, concluímos que ele perde os seus direitos, e somente isso. Não concluímos que ele deva ser punido assim e assado ou “reeducado”. Isso dá ao detentor do jus puniendi (direito de punir) carta branca para fazer o que quiser com o agressor, inclusive obrigá-lo a sair em viagem em um cruzeiro com tudo pago. Percebe-se, assim, que o que caracteriza a punição não é o sofrimento, mas ser obrigado a fazer algo por aquele que detém o direito de punir.

Mas quem teria esse direito?

Quebrar a lei significa violar um direito de propriedade. O direito de propriedade é o direito de decidir exclusivamente sobre o modo de uso de um recurso escasso. Logo, quebrar a lei é decidir sobre o modo de uso de um recurso escasso alheio. É não respeitar essa exclusividade de decisão sobre o uso de um recurso já apropriado. Porém, como a decisão sobre aquele recurso cabia à vítima, somente ela pode dizer se houve violação, pois ela pode consentir posteriormente (convalidar) sobre algo feito em sua propriedade anteriormente sem o seu conhecimento. E, se ficar provado que houve violação, então somente a vítima, que tinha o direito de decisão exclusiva sobre aquele bem, poderá dizer o que pode ser feito para se restaurar o status quo ante, isto é, o estado anterior à violação. Só que, como a restauração do passado é impossível, a vítima só poderá exigir uma compensação por isso. Novamente, não há maneira racional e objetiva de definir limites para essa exigência, e pode ser que nada no mundo compense aquela perda, mas foi o próprio agressor que criou essa situação. O agressor é o único responsável por essas inconveniências. “A responsabilidade por esta situação recai inteiramente sobre o agressor, que por suas próprias ações causou danos à vítima”.[10]

Isso abre um leque de infinitas possibilidades. Há, por exemplo, casos registrados de agressores que literalmente compraram sua liberdade. Uma vítima pode decidir que uma compensação monetária é o suficiente para ressarci-la. Imagine quão melhor não é isso do que gastar bilhões para manter cadeias cheias de presos? No sistema atual, a vítima sai sem compensação, o criminoso perde a possibilidade de ressarcir a vítima ou ser perdoado e o povo inteiro sustenta compulsoriamente uma desumana e brutal estadia na prisão de alguém que sairá de lá uma pessoa muito pior do que entrou. A vítima perde duas vezes – uma para o agressor, outra para o Estado – e terceiros que não tinham nada a ver com a situação são obrigados a financiar a temporada do criminoso no inferno.

 

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Desse modo, temos que a punição é discricionária e facultativa e que o titular do jus puniendi é sempre a vítima ou seus herdeiros.

A teoria legal aqui apresentada está evidentemente incompleta. Nestas aulas eu lancei apenas os seus elementos mais fundamentais, e decerto muitas dúvidas e questionamentos surgirão. Falta escrever uma obra mais completa e detalhada que contenha todas as implicações a priori desses elementos e dirima as principais polêmicas envolvidas nessa teoria austríaca do direito.

 

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Notas

[1] Hoppe, “Propriedade, causalidade e responsabilidade legal”. Disponível em: < https://rothbardbrasil.com/propriedade-causalidade-e-responsabilidade-legal/>.

[2] Idem.

[3] Idem.

[4] Frank van Dun, “Argumentation Ethics and The Philosophy of Freedom”. Disponível em: < https://mises.org/library/argumentation-ethics-and-philosophy-freedom >.

[5] Stephan Kinsella, “Novas Direções Racionalistas nas Teorias Libertárias do Direito”. Disponível em: < https://rothbardbrasil.com/novas-direcoes-racionalistas-nas-teorias-libertarias-do-direito/>.

[6] Stephan Kinsella, “Agressão, pena e proporcionalidade – Como estabelecer os limites?”. Disponível em: <https://rothbardbrasil.com/agressao-pena-e-proporcionalidade-como-estabelecer-os-limites/>.

[7] Idem.

[8] Matias Aires, Reflexões sobre a vaidade dos homens.

[9] Em uma sociedade voluntária, haveria pressão não só para se agir com razoabilidade na aplicação das penas, mas sobretudo para se manter uma conduta moral decente. Sobre isso, veja Hans-Hermann Hoppe, “Sobre o Conservadorismo e o Libertarianismo”.

[10] Kinsella, idem.

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