A Revolução Americana foi um erro

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british-grenadierEu não celebro o 4 de julho. E vem sendo assim desde que escrevi uma monografia quando ainda estava em minha pós-graduação. A monografia era sobre a tributação imposta pela Grã-Bretanha sobre as colônias americanas em 1775. Sem considerar a tributação local, que era de total responsabilidade das colônias, descobri que a carga tributária total imposta pelo Império Britânico era de aproximadamente 1% da renda nacional. Nas colônias do sul do país, o total pode ter chegado a, no máximo, 2,5%.
Em 2008, o cientista político Alvin Rabushka publicou um livro de quase 1.000 páginas chamado Taxation in Colonial America (Princeton University Press). Em uma resenha sobre o livro publicada no periódico Business History Review, o revisor resumiu desta forma as descobertas do livro:

A contribuição mais original e impressionante de Rabushka é sua mensuração das alíquotas de impostos e da carga tributária total. Em determinado ponto do livro, ele conclui que, no período de 1764 a 1775, “os aproximadamente dois milhões de colonos brancos na América pagaram o equivalente a aproximadamente 1% dos tributos anuais incidentes sobre os quase 8,5 milhões de residentes da Grã-Bretanha — ou um vinte e cinco avos em termos per capita, mesmo sem levar em consideração a maior renda média e o maior consumo médio das colônias” (p. 729). Logo depois, ele escreve que, nas vésperas da Revolução, “a carga tributária vigente na Grã-Bretanha era, no mínimo, dez vezes mais pesada do que a carga tributária imposta pela Grã-Bretanha sobre suas colônias americanas” (p. 867). Outros pesquisadores talvez queiram refinar estes números baseando-se em outras fontes, ou fazendo uma abordagem mais detalhada de assuntos técnicos — como uma comparação intercolonial e transatlântica levando em conta a taxa de câmbio —, ou apresentando novas estimativas da renda e da riqueza dos dois lados. Não obstante, ninguém até agora se mostrou apto a desafiar sua mais importante descoberta: a enorme disparidade entre a carga tributária imposta às colônias americanas e a carga tributária vigente no núcleo do Império Britânico.

Sim, os colonos americanos tinham uma situação invejável. A Grã-Bretanha era a segunda nação mais livre da terra. A Suíça provavelmente era a mais livre, mas eu não saberia identificar qualquer outra nação que, em 1775, estivesse à frente da Grã-Bretanha. E, dentro do Império Britânico, os colonos americanos eram, de longe, os mais livres.

Vou repetir isso, em alto e bom som: a sociedade mais livre da face da terra em 1775 era a América colonizada pela Grã-Bretanha, com a exceção do sistema escravocrata. Qualquer um que não fosse um escravo gozava de incomparáveis liberdades.

Thomas Jefferson escreveu estas palavras na Declaração de Independência:

A história do atual Rei da Grã-Bretanha é uma história de reiteradas injustiças e usurpações, sempre com o objetivo direto de estabelecer uma Tirania absolutista sobre estes Estados.

Não consigo pensar em nenhuma outra avaliação política emitida por algum líder proeminente na história dos EUA que seja mais equivocada e ilusória do que essa. Em minha concepção, dentre todas as palavras que tiveram grande impacto na história dos EUA, estas foram as menos verdadeiras de todas. Nenhum político que seja rotineiramente acusado de “o mentiroso do século” jamais disse algo tão comprovadamente falso quanto estas palavras de Jefferson.

O Congresso Continental declarou independência no dia 2 de julho de 1776. Alguns membros assinaram a Declaração no dia 4 de julho. O povo americano em geral acreditou nos líderes do Congresso Continental. Ele certamente não fazia a mais mínima ideia de que estava prestes a abrir mão de suas maiores liberdades. Ele não foi capaz de prever o preço que logo em seguida pagaria em termos de sangue, riqueza e endividamento. E ele certamente não previu a nova carga tributária que seria imposta sobre a nova nação após 1783.

Em um artigo sobre a tributação daquela época, Rabushka vai direto ao ponto.

Todos os grandes historiadores já escreveram que os impostos na nova nação americana subiram e permaneceram consideravelmente mais altos — talvez em torno de três vezes mais altos — do que eram sob o domínio britânico. O novo governo arrecadou mais dinheiro para a defesa nacional do que o total coletado pelo Império Britânico para defender as fronteiras dos índios e dos franceses. Adicionalmente, a nova nação teve de lidar com vários outros gastos.

Logo, como resultado da Revolução Americana, a carga tributária triplicou no país.

O fardo da dívida disparou assim que a Revolução começou. A inflação monetária, agora sob total controle dos revolucionários, destruiu o sistema monetário. O controle de preços imposto em 1777 levou à derrocada do Vale Forge [local onde ficava o acampamento militar do exército liderado por George Washington]. Percy Greaves, um discípulo de Ludwig von Mises e que por 17 anos frequentou seus seminários, escreveu isto em 1972:

Nosso Congresso Continental autorizou a impressão das novas cédulas de dinheiro, o Continental, em 1775. O Congresso foi alertado de que não deveria abusar da impressão. Em um panfleto de 1776, Pelatiah Webster, o primeiro economista americano, disse aos seus companheiros que a moeda Continental iria rapidamente se tornar inútil caso nada fosse feito para coibir novas impressões e emissões do papel-moeda.

O povo e o Congresso se recusou a aceitar este sábio conselho. Com cada vez mais dinheiro de papel em circulação, os consumidores continuaram gastando e pressionando os preços. A libra do porco subiu de 4¢ para 8¢. A libra da carne bovina disparou de 4¢ para100. Como nos informa um historiador, “Já em novembro de 1777, os preços das commodities estavam 480% maiores em relação à média do período anterior à guerra de Revolução”.

A situação se tornou tão ruim na Pensilvânia, que o povo e a legislatura deste estado decidiram tentar “um período de controle de preços, limitado às mercadorias domésticas essenciais para o uso do exército”. Imaginou-se que isso iria reduzir o custo da alimentação e dos suprimentos do Exército Continental. Esperava-se que tal medida fosse reduzir o fardo da guerra.

Os preços dos bens importados, que não estavam submetidos ao congelamento, dispararam, e era quase impossível a aquisição das mercadorias domésticas necessárias para o exército. Os controles eram bastante arbitrários. Muitos agricultores se recusavam a vender seus bens aos preços estipulados. Poucos aceitavam os continentais de papel. Aqueles agricultores que tinham famílias numerosas para alimentar e vestir venderam seus produtos agrícolas sorrateiramente para a Grã-Bretanha em troca de ouro. Era somente com ouro que eles conseguiam comprar itens essenciais para sua sobrevivência, os quais eles não eram capazes de produzir por conta própria.

No dia 5 de dezembro de 1777, o general-intendente do exército, que se recusava a pagar preços mais altos do que os valores estipulados pelo governo, emitiu uma declaração em nome do quartel-general da Pensilvânia afirmando que “Se os agricultores não concordam com os preços estipulados pelo governo, que então escolham homens mais sábios na próxima eleição”.

Este foi o inverno do Vale Forge, o grande nadir da história americana. No dia 23 de dezembro de 1777, George Washington escreveu para o presidente do Congresso que “temos não menos do que 2.898 homens nos quartéis em condições totalmente inapropriadas para o serviço, pois estão descalços e até mesmo nus…. Estou hoje convencido, sem a menor sombra de dúvidas, de que, a menos que haja uma grande e repentina mudança, este exército terá inevitavelmente de ser reduzido a uma destas três situações: morrer de inanição, dissolver ou dispersar com o intuito de obter meios de subsistência da melhor maneira possível.”

Foi somente após a lei de controle de preços ter sido revogada em 1778 que o exército se tornou capaz de comprar bens novamente. Mas a hiperinflação do Continental e de todas as outras moedas de papel emitidas pelos estados substituiu o sistema monetário vigente antes da Revolução: um sistema baseado em moedas de prata, as quais eram chamadas de dólar espanhol ou peso de ocho.

Os proponentes da independência invocaram a tirania britânica sobre a América do Norte. Não havia nenhuma tirania britânica, certamente não na América do Norte.

Em 1872, Friedrich Engels escreveu um artigo intitulado “Sobre a Autoridade”. Ele criticava os anarquistas, a quem ele chamava de anti-autoritários. Sua descrição do caráter autoritário de todas as revoluções armadas deveria nos lembrar dos custos de uma revolução:

Uma revolução é certamente a coisa mais autoritária que se possa imaginar; é o ato pelo qual uma parte da população impõe a sua vontade à outra por meio das espingardas, das baionetas e dos canhões — meios autoritários como poucos. E o lado vitorioso, se não quiser ter combatido em vão, deve manter o seu poder por meio do medo que as suas armas incutem nos reacionários.

Após a Revolução Americana, 46.000 colonos americanos leais à monarquia britânica fugiram para o Canadá. Eles não estavam dispostos a jurar obediência aos novos governos coloniais. Eles mantiveram sua lealdade à nação que havia lhes dado a maior liberdade já vivenciada na terra. Ao contrário do que dizem os historiadores modernos, tais pessoas não cometeram nenhuma traição.

Já os revolucionários não são tidos como traidores. John Harrington, político britânico, já havia explicado, aproximadamente por volta do ano 1600, por que é assim: “A traição nunca prospera. Por qual motivo? Ora, se prosperasse, ninguém ousaria chamar de traição.”

São os vitoriosos que escrevem os livros de história.

O que os libertários — e até mesmo os conservadores — dariam hoje para poder retornar a um arranjo em que o governo central se apropriasse de apenas 1% da riqueza da nação? Um arranjo em que não havia imposto de renda?

Será que eles descreveriam tal sociedade como ‘tirânica’?

O fato de que a principal assinatura da Declaração da Independência pertence ao mais rico contrabandista da América do Norte, John Hancock, não foi nenhuma coincidência. Ele estava muito furioso. Em 1773, o Parlamento britânico havia reduzido o imposto sobre o chá que era importado pela Companhia Britânica das Índias Orientais, o que fez com que o custo do chá britânico se tornasse menor do que o custo do chá não-britânico trazido para os EUA pelo contrabandista. Isso havia custado muito dinheiro a Hancock. O evento do Tea Party impediu que um navio britânico descarregasse uma carga de chá nos EUA. Tal evento nada mais foi do que uma pilhagem a um navio privado para destruir sua carga privada, arremessando-a ao mar. O navio britânico espoliado era um navio que estava fazendo concorrência aos navios de Hancock. O evento do Tea Party ocorrido em Boston foi, na realidade, um protesto muito bem organizado contra os preços baixos resultantes de uma redução de impostos.

Por tudo isso é que não celebro o 4 de julho.

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