Congestionamento nos aeroportos: Um caso de falha de mercado?

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[N. do T.: o texto a seguir, embora seja da década de 1980, mostra que os problemas do setor aéreo ainda continuam os mesmos — tanto nos EUA, como no Brasil —, bem como as soluções que devem ser adotadas.]

A imprensa novamente reporta tudo como sendo mais um capítulo do interminável caso de sucesso envolvendo a “cooperação entre governo e empresas.” A estória tradicional é a de que um problema óbvio surge – sempre causado pelas ações livres e egoístas da cobiça capitalista -, e então uma agência governamental, esperta e previdente, de visão aguçada e tendo apenas o interesse público em mente, entra em cena e corrige essa falha – com suas sábias regulamentações consertando, de maneira gentil, porém firme, as ações privadas em nome do bem comum.

O capítulo mais recente começou no verão de 1984, quando veio à luz que o povo estava sofrendo com um aumento de 73% no número de vôos atrasados em relação ao ano anterior. Para a Federal Aviation Agency (FAA)[1] e outras agências do governo, o vilão da peça era evidente: as cotas que a própria FAA havia imposto no número de vôos nos aeroportos do país haviam sido abolidas no início do ano e, como consequência dessa desregulamentação, as imprevidentes companhias aéreas, cada uma buscando seus próprios lucros, marcaram vários vôos nos mesmos horários de pico, que são os mais lucrativos do dia. Como consequência, houve congestionamento e atraso nesses horários, a maioria ocorrendo nos maiores e mais utilizados aeroportos. A FAA logo deixou claro que estava pronta para impor limites máximos nos atrasos para decolagens e aterrissagens em cada aeroporto – limites detalhados em termos de minutos; e ameaçou fazer isso caso as próprias companhias aéreas não criassem um plano aceitável. Sob essa ameaça, as companhias aéreas conceberam um plano “voluntário” que foi devidamente aprovado no final de outubro, um plano que impôs cotas máximas de vôos nos horários de pico. A cooperação entre governo e empresas supostamente triunfou mais uma vez.

A saga real, no entanto, é bem menos animadora. Desde a criação do setor aéreo, até 1978, a Civil Aeronautics Board (CAB)[2] impôs coercivamente uma cartelização do setor, separando algumas rotas para empresas favorecidas, limitando severamente a competição e mantendo os preços bem acima dos preços de livre mercado. Em grande parte devido ao esforço do presidente do CAB e também economista Alfred E. Kahn, o Ato de Desregulamentação Aérea (Airline Deregulation Act) foi aprovado em 1978, desregulamentando rotas, vôos e preços; e também abolindo o CAB ao final de 1984.

O que realmente aconteceu foi que a FAA – que até então estava limitada à regulamentação da segurança e à nacionalização dos serviços de controle do tráfego aéreo -, assumiu desde então algumas das funções que eram da CAB, principalmente a cartelização. Quando o Presidente Reagan demitiu os controladores aéreos durante a greve da PATCO[3] em 1981, uma consequência pouco mencionada foi que a FAA entrou em cena para impor coercivamente um número máximo de vôos aos vários aeroportos, tudo em nome do racionamento dos então escassos serviços de controle aéreo. O fim da crise do PATCO levou a FAA a remover esses controles no início de 1984, mas agora aqui estão eles novamente, com força total, como resultado do congestionamento.

Mais ainda, as cotas estão agora à toda nos seis principais aeroportos. Liderando o movimento que pedia por esses controles estava a Eastern Airlines, cujos serviços nos aeroportos Kennedy e LaGuardia foram, em anos recentes, superados pela combativa e nova People’s Express, cujas operações catapultaram o aeroporto de Newark de uma condição de aeroporto fantasma para ser um dos seis principais do país (junto com LaGuardia, Kennedy, Denver, Atlanta e O’Hare em Chicago). Ao impor as cotas “voluntárias”, não parece acidental que os vôos no horário de pico no aeroporto de Newark se reduziram drasticamente (de 100 para 68), enquanto que no Kennedy e no LaGuardia eles na verdade aumentaram.

Mas, em qualquer caso, será que o congestionamento no horário de pico foi um caso de falha de mercado? Sempre que economistas vêem uma escassez de um bem, eles são treinados para imediatamente estabelecer um preço máximo – que esteja abaixo do preço de livre mercado – no qual esse bem possa ser congelado. E certamente foi isso o que aconteceu. É preciso deixar claro que todos os aeroportos comerciais deste país pertencem aos governos e são operados por eles – todos são operados pelos governos locais exceto os aeroportos Dulles e National (ambos em Washington, D.C.), que pertencem ao governo federal. E os governos não estão interessados – ao contrário das empresas privadas – em preços racionais, isto é, preços que levam aos maiores lucros. São outras considerações políticas que invariavelmente predominam. E então, como consequência, todos os aeroportos cobram taxas por suas “janelas” (tempo que uma aeronave permanece no solo entre a aterrissagem e a decolagem) a um preço bem abaixo do preço de equilíbrio de mercado que seria cobrado sob controle privado. Daí ocorrerem os congestionamentos nas valiosas horas de pico, com jatinhos particulares tomando os espaços das grandes empresas aéreas – o que em condições reais de mercado eles obviamente não teriam condições de fazer.

A única solução genuína para o congestionamento nos aeroportos é permitir que se estabeleçam preços de equilíbrio de mercado, cobrando-se taxas bem maiores por suas “janelas” nos horários de pico, e taxas menores nos horários de baixa atividade. E isso iria cumprir a tarefa de aumentar a concorrência, ao invés de diminuir – que é o que ocorre devido ao racionamento compulsório imposto pela FAA das “janelas” que são usadas a preços abaixo dos de mercado. Mas esse uso racional dos preços só será atingido quando os aeroportos forem privatizados – tirados do controle político e ineficiente do governo.

Há também outra área importante a ser privatizada. Os serviços de controle do tráfego aéreo são um monopólio compulsório do governo federal, sob os auspícios da FAA. Mesmo tendo prometido que até 1983 voltaria à capacidade pré-greve dos controladores aéreos, a FAA ainda emprega 19% menos controladores do que antes da greve, sendo que estes têm que controlar um tráfego 6% maior.

Mais uma vez, a solução correta é privatizar o controle de tráfego aéreo. Não há nenhum motivo pelo qual pilotos, companhias aéreas e todos os outros componentes do setor aéreo sejam privados, e o controle aéreo permaneça para sempre como um serviço estatal. Ao se privatizar o controle aéreo, será possível mandar a FAA se juntar à CAB no entulho de coisas inúteis da história.

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[1] Equivalente à Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).  (N. do T.)

[2] A CAB foi criada por Franklin Delano Roosevelt em 1938. A ela foi dada a autoridade de criar regras seguras, investigar acidentes e fazer a regulamentação das companhias aéreas. A intenção principal era eliminar a “competição destrutiva” entre as companhias, evitando que novas entradas levassem a uma queda nos preços, diminuindo os lucros.  (N. do T.)

[3] Professional Air Traffic Controllers Organization (PATCO) era um sindicato que representava os controladores de tráfico aéreo dos EUA em assuntos relacionados a salários, horas de trabalho e outros termos empregatícios.  (N. do T.)

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