Definindo a liberdade

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2- Ajuda Externa

 

 

Houve um tempo em que a república se opunha a todo tipo de ajuda externa. O tempo passou e atualmente o único debate é sobre que país deve receber ajuda e qual o montante. Há muito poucos membros do congresso que, por princípio, se opõem a toda ajuda externa.

 

A crença de que ajudas externas contribuem para a segurança nacional tem permitido o desperdício de bilhões de dólares, encorajando uma política externa que inevitavelmente conduz a efeitos indesejados que voltam para nos assombrar.

 

O apoio à ajuda externa tem várias origens. Uma delas é que devemos dar suporte aos nossos aliados para mantê-los fortes. Nós devemos, por motivos humanitários, ajudar nações em dificuldades. É nosso dever. Outra afirma que temos obrigação de ajudar financeiramente as nações que, a nosso pedido, concedem a presença de nossas bases militares em seu território. Não raramente, empresas e universidades dos Estados Unidos fazem forte lobby por gastos com ajuda externa, na esperança de obterem um contrato de pesquisa, ou para vender certos produtos no país beneficiário de nossa ajuda.

 

Uma coisa é certa: toda ajuda externa é uma forma de alocação de crédito. Os cidadãos americanos são taxados para financiar esses programas de doação estrangeira. Isso significa que dinheiro é tomado à força, das mãos de cidadãos particulares, os quais são impedidos de decidir como ele deveria ser gasto. Permitir ao governo ou aos burocratas decidirem como gastar capital é sempre inferior à capacidade de decisão das empresas privadas e dos indivíduos sobre decidir como o dinheiro deve ser usado.

 

Mais importante ainda, é que a ajuda externa nunca funciona para obter os objetivos originais de ajudar os pobres de outras nações. As decisões, nas duas pontas do processo, sobre quem deverá receber o dinheiro, são puramente políticas: nossos políticos resolvem para onde o dinheiro deve ir, e os políticos do outro país se encarregam de como ele será gasto.

 

Em países pobres, doação de alimentos se torna ferramenta para manter poder político. Frequentemente, os que estão com maiores necessidades, são aqueles envolvidos em guerra civil. Nesse ambiente, a ajuda literalmente se transforma em arma para uma das facções usar contra a outra. Isso geralmente atrasa a necessária tentativa de paz, por subvencionar um lado e não o outro.

 

Muitas das grandes alocações em ajuda externa são dirigidas estritamente por interesses políticos especiais e sob a falsa alegação de que elas atendem a nossos interesses de segurança nacional. Desde os acordos de Camp David sob Jimmy Carter, Israel recebeu mais de 100 bilhões de dólares, e o Egito recebeu mais de 50 bilhões. Foi bom que eles tenham parado com a matança recíproca, mas uma paz que dependa desse fluxo de dinheiro para os dois países, não é muito estável. Ambos se tornam dependentes de nós e têm menos incentivos para cuidar de suas próprias necessidades. Quem sabe a paz tivesse sido alcançada mesmo sem o nosso dinheiro.

 

Ajuda externa sempre tem algumas implicações. Gastos com armas compradas nos Estados Unidos é trivial, e esta é uma das principais razões pelas quais os republicanos sempre foram patrocinadores da ajuda externa. É bom para nosso complexo industrial militar, e é justificável, porque as nações beneficiadas passam a ser aliados militares confiáveis e bem armados. Porém não raramente ocorre que países subvencionados e armados por nós se revoltem, e usem nossas próprias armas contra nós. Há inúmeros exemplos disso.

 

Além das ajudas dadas direta e individualmente pelos Estados Unidos, centenas de bilhões de dólares foram liberados através de organizações multilaterais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, e outras entidades de estímulo ao desenvolvimento internacional. Empréstimos e garantias de empréstimos são também frequentemente utilizados.

 

O Fed é livre para fazer acordos secretos com governos estrangeiros, bancos centrais de outros países e com instituições financeiras internacionais. Uma vez que nenhuma auditoria desses acordos jamais foi permitida até hoje, não há como saber ao certo se o Fed participa das diretrizes da política externa. Apesar disso, em novembro de 2010, o Fed foi coagido a liberar algumas informações sobre suas práticas, e muita gente ficou chocada ao saber que muito do dinheiro recém-criado nas impressoras do Fed tinham ido diretamente para grandes instituições do setor bancário e entidades estrangeiras. Eu não fiquei chocado. Eu li as revelações como sendo mera confirmação do que há muito tempo já suspeitava.

 

Com seu poder de fornecer empréstimos secretos e dar garantias a outros países, o Fed poderia muito bem estar implicado financeiramente num nível muito superior ao do congresso no processo de apropriação orçamentária. Mas assim como o congresso cobra “propinas” por seus presentes feitos com o dinheiro dos pagadores de impostos, eu tenho certeza que o Fed pode arrumar uma maneira de se favorecer em troca dos fundos entregues à comunidade financeira.

 

Nada há de errado com a ajuda externa em si, como quando países ricos ajudam pessoas em países pobres que tenham sido acometidos por um desastre natural. Mas isso tem que ser feito diretamente pela iniciativa privada. As chances são muito maiores de que os fundos serão alocados de modo mais construtivo do que quando feitos pela via das transferências governamentais.

 

O único benefício de longo prazo que um país pode dar a outro que está sofrendo privações decorrentes de políticas governamentais socialistas, é exportar ideias de liberdade, de livre economia de mercado, de moeda sólida, e de direitos sobre a propriedade privada. Exatamente como se faz com a assistência financeira, essas ideias devem ser levadas a eles de modo voluntário, e não pelo governo.

 

Muito frequentemente, nossa ajuda financeira é dada com a condição de que os beneficiários a usem em educação. Mas não raro este esforço resulta bastante negativo: fizemos esforços para ensinar nações em desenvolvimento a implantar um sistema tributário baseado no imposto de renda, um banco central, e outros programas de bem-estar. O extremo disso ocorre quando os neoconservadores se dedicam eles mesmos a “divulgar a bondade americana” usando balas e bombas. Eles alegam que temos obrigação de difundir a democracia pelo mundo. Isso é apenas uma desculpa para que suas práticas violentas aparentem ser mais humanitárias.

 

A ajuda externa internacional deveria servir para refletir o direito que todos têm de viver com dignidade, um nobre objetivo, mas inatingível pela abordagem autoritária de distribuição de riqueza através de impostos. Esse método não fornece benefícios vantajosos. Este direito internacional para viver com dignidade é uma extensão do Freedom from Want (Liberdade de passar necessidades) expresso nos Four Freedoms (as quatro liberdades) de Roosevelt, anunciadas em 1941. O direito à vida e à liberdade de forma alguma implicam o direito de um sobre a propriedade do outro, seja no âmbito doméstico ou internacionalmente.

 

A ajuda externa continuará existindo enquanto o povo americano continuar aceitando a noção de que seu dinheiro, tomado através do sistema de impostos e presenteado por nossos políticos a estrangeiros, em terras estrangeiras, contribui de alguma forma para o nosso interesse nacional. Quando o povo exigir que esse processo se interrompa, sendo mais seletivo em quem escolhem para representá-los, ou quando formos à falência e não mais pudermos bancar essas ajudas, essa política irá se extinguir.

 

Os funcionários do governo instilam no povo um sentimento de culpa que o torna complacente a ponto de permitir a transferência de riquezas dessa maneira. É mais fácil conseguir o apoio do eleitor quando o país é razoavelmente próspero. Muitos são convencidos, pelo argumento de que a ajuda externa americana é um montante pequeno — uns US$50 bilhões por ano — e que são os ricos que pagam.

 

Mas a verdade é que o dinheiro emprestado e o aumento da quantidade de moeda circulante para pagar o déficit que a ajuda externa contribui para gerar, acabam caindo nas costas da classe média e dos pobres. Tragicamente, os argumentos humanitários estão longe de serem realistas. A ajuda externa pode ser melhor descrita como tirar dinheiro dos pobres de um país rico para doá-lo aos ricos e poderosos de um país pobre. Um processo desses, sem freios, garante que tanto o país doador como o receptor se tornem mais pobres no final.

 

 

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Blanchette, Jude. 2003. “The Futility of Foreign Aid”. [A Futilidade da Ajuda Externa.] in The Free Market, Vol. 23, No. 7. Mises Institute.

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Ron Paul
é médico e ex-congressista republicano do Texas. Foi candidato à presidente dos Estados Unidos em 1988 pelo partido libertário e candidato à nomeação para as eleições presidenciais de 2008 e 2012 pelo partido republicano. É autor de diversos livros sobre a Escola Austríaca de economia e a filosofia política libertária como Mises e a Escola Austríaca: uma visão pessoal, Definindo a liberdade, O Fim do Fed – por que acabar com o Banco Central (2009), The Case for Gold (1982), The Revolution: A Manifesto (2008), Pillars of Prosperity (2008) e A Foreign Policy of Freedom (2007). O doutor Paul foi um dos fundadores do Ludwig von Mises Institute, em 1982, e no ano de 2013 fundou o Ron Paul Institute for Peace and Prosperity e o The Ron Paul Channel.

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