Entrevista concedida a Brett Owens direto de Cingapura, onde Rogers vive com sua mulher e suas duas filhas.
Jim Rogers já era otimista em relação à China décadas antes daquele país se tornar badalado no mercado financeiro, e ele ainda continua amplamente otimista quanto ao seu futuro.
“Creio que a China irá se tornar a próxima grande nação do mundo”, diz ele.
“As pessoas dizem que a China é ‘comunista’… A Califórnia e o Massachusetts são muito mais comunistas que a China”, observou ele com um sorriso galhofeiro.
“O Partido Comunista chinês é muito esperto — assim como são os líderes aqui de Cingapura. Há todo um criterioso processo de inscrição para quem requer se candidatar a algo — todos os candidatos são minuciosamente checados.” Ele diz que o processo é bastante rigoroso, como “querer estudar em Princeton”, e acrescentou que “um sujeito como Obama jamais conseguiria concorrer a alguma coisa aqui (Cingapura)”.
Rogers já viajou de carro de um extremo ao outro da China três vezes, e testemunhou grande parte da evolução do país desde o início. Ele se tornou um entusiasta da China desde então — pelo menos desde sua viagem ao redor do globo em 2000, a qual se transformou em livro, Adventure Capitalist: The Ultimate Road Trip. Um investidor que, desde aquela época, tenha compartilhado de suas visões otimistas e de longo prazo em relação à China certamente colheu belos retornos.
Ele diz que, segundo a lenda local, Cingapura foi o exemplo seguido pela China; a China inspirou-se no desenvolvimento de Cingapura para criar o seu próprio desenvolvimento. Cingapura evoluiu e desenvolveu-se muito rapidamente ao longo das últimas quatro décadas, deixando de ser um país periférico e esquecido do sudeste asiático na década de 1960 para se transformar em um dos mais prósperos países no mundo atual.
“Há rumores de que Deng Xiaoping visitou o país (Cingapura) em 1978 — quando ele viu o que estava acontecendo aqui, voltou correndo pra China e começou o processo de abertura da economia do país,” Rogers me disse. “Com efeito, se você perguntar a algumas pessoas daqui, elas dirão que os chineses continuam observando cuidadosamente tudo o que se passa aqui.”
Um palpite interessante que ele tem para os anos e décadas vindouros é o turismo chinês.
“Os chineses não puderam viajar pelos últimos 300 anos. Agora eles podem — e o mundo será inundado por turistas chineses ao longo dos próximos vários anos,” diz ele.
Os turistas chineses terão um enorme poder de compra em decorrência de uma moeda forte, caso Rogers esteja certo. Ele cita o yuan chinês como uma de suas escolhas favoritas de investimento atualmente, e diz que, dentro do mundo dos investimentos, o yuan é a escolha mais certa possível.
“Aqui em Cingapura, eles permitiram que a moeda se valorizasse frente ao dólar para que a inflação de preços fosse atenuada. Creio que os chineses, com o tempo, farão a mesma coisa.”
“Qualquer país estará em melhor situação caso opte por reduzir seu crescimento econômico antes de permitir que a inflação saia do controle. Se o crescimento for reduzido para 3%, quem se importa? É melhor do que permitir que a inflação fique fora de controle, pois, uma vez que isso ocorre, é muito difícil refreá-la.”
“Porque aí você teria de incorrer em uma recessão ou coisa ainda pior apenas para controlar a inflação.”
Perguntei se a inflação realmente está na casa dos 5% como noticiado na China e nas adjacências asiáticas.
“Quem pode saber? Mas pelo menos eles admitem que estão com inflação! Eles não tentam negar a existência desse problema, como fazem os EUA”, satirizou.
Ele culpa os EUA por “imprimirem dinheiro como loucos e exportarem inflação para o resto do mundo”.
As commodities devem continuar bastante atraentes
“A maior parte do meu portfólio é formada por commodities e moedas”, confessou. “Presumo que vou ganhar dinheiro com commodities, pois, se a demanda continuar subindo, isso manterá o mercado em alta, e com os preços em contínua ascensão”.
Mas e se ocorrer uma repetição do colapso financeiro de 2008?
“Se a demanda entrar em colapso, prevejo que os bancos centrais mundiais irão imprimir ainda mais dinheiro, e isso também fará com que os preços das commodities subam”, contra-argumenta Rogers.
Produtos agrícolas ainda são sua escolha favorita, graças a restrições na oferta que não estão nem perto de serem resolvidas — incluindo-se aí uma escassez de agricultores.
“O agricultor médio dos EUA tem 57 anos de idade”, disse Rogers. “Quem vai cultivar a terra daqui a 10 anos? Esses caras já estarão com 67 anos… se ainda estiverem no ramo. E praticamente ninguém está se formando em agricultura (ou ciências agrárias) atualmente”.
“Simplesmente não há agricultores suficientes no mundo. Há vastas extensões de terra ociosa no Japão, acredite se quiser — e não há ninguém para cultivá-las.”
Ele acredita que esse mercado altista para as commodities pode continuar ascendente por um bom tempo porque “pouca ou nenhuma oferta adicional tem sido produzida”. Ele relembra que o setor de commodities estava começando a atrair a atenção dos investidores antes de 2008, e que seu movimento altista começou por volta de 1999; porém, a crise financeira de 2008 acabou com a possibilidade do surgimento de novas ofertas — algo que, obviamente, prepara o terreno para futuros aumentos de preços.
Pessimista quanto aos EUA e Reino Unido — crises no horizonte?
“Os EUA já chegaram ao ápice do poder relativo mundial, se não do poder absoluto também”, disse Rogers. Ele acredita que os EUA estão agora naquela trajetória descendente que caracteriza todos os impérios que chegaram ao fim, assim como ocorreu com o Reino Unido no século passado.
“Por volta de 1918, o Reino Unido entrou em declínio. Já em meados da década de 1970, estava falido. A partir de 1979, ele começou a vivenciar um tipo de recuperação — graças aos campos petrolíferos do Mar do Norte. As maioria das pessoas dá a Margaret Thatcher o crédito por essa recuperação, mas o verdadeiro agente estimulante para o Reino Unido foi a descoberta de petróleo no Mar do Norte”, disse ele.
“Dê-me a maior jazida de petróleo do mundo, e eu serei capaz de lhe propiciar bonanças econômicas também”, disse ele com outro sorriso galhofeiro.
“Mas os EUA necessitariam de quatro ou cinco jazidas de petróleo tipo Mar do Norte para salvar o país da atual situação”, ele diz.
Por que tantas assim?
“Porque a dívida federal é impagável.” A depravação financeira dos EUA deixa Rogers bastante inquieto — ele acredita que o país já chegou a um ponto sem retorno, e crê que outra crise poderia começar já no próximo semestre.
“Os estrangeiros já estão começando a se arrepender e a ficar temerosos de investir nos EUA”, diz ele, citando o fato de que alguns bancos suíços não mais estão comprando ações americanas. Nenhum tipo de ação americana, na verdade.
Perguntei se ele acreditava que o atual sistema de governo dos EUA poderia ser salvo de alguma forma — ele parou pra pensar, e acabou dizendo com um pouco de remorso: “Não acho que seja, infelizmente. Não sem algum tipo sério de falência ou de choque completo no sistema.”
“Platão disse que a progressão natural de um governo é: ditadura, oligarquia, democracia, caos. Assim, os EUA já podem estar no caminho da democracia para o caos. Seria necessário uma enorme onda de choque para acordar as pessoas.”
O fim do programa QE2 realmente importa?
Com o “Quatitative Easing 2” (literalmente, “afrouxamento quantitativo”, eufemismo para mera criação de dinheiro) programado para acabar, perguntei se haveria algum impacto.
“Não, pois o programa não vai acabar, na prática. Eles vão simplesmente continuar imprimindo dinheiro. Talvez agora deem o nome de QE3, ou bolinho assado, ou qualquer coisa idiota assim” — mas ele acredita que o Fed continuará imprimindo.
Dado que o próximo ano será de eleições, ele espera que os detentores do poder nos EUA irão fazer todo o necessário para que a economia continue parecendo bonita. “Ninguém quer ser responsabilizado por uma economia em aparente desarranjo”, ele me disse, na crença de que o governo dos EUA irá continuar simplesmente escondendo os problemas, talvez até mesmo acelerando seus esforços para tal.
Medidas a serem consideradas — para investimentos e de cunho pessoal
Com essa perspectiva sombria para os americanos e para outros ocidentais, quais medidas deveríamos tomar para proteger nossos portfólios — para não mencionar nossa poupança e, ainda mais importante, nossas liberdades pessoais?
Como foi discutido, as commodities ainda são o investimento favorito de Rogers — especialmente agricultura e energia, pois os gargalos na oferta que já existiam no começo dessa fase altista do mercado de commodities ainda não começaram a ser atacados. E pode levar de cinco a dez anos para que a oferta comece a ser expandida, disse ele, citando novamente o espaço de 10 anos entre a descoberta de petróleo no Mar do Norte e sua transformação em uma jazida produtiva.
Moedas estrangeiras são sua proteção favorita contra futuras depreciações do dólar americano, sendo que sua preferível é o yuan chinês.
Mas e se as coisas ficarem realmente feias nos EUA? Perguntei a ele como proteger ativos contra potenciais confiscos “patrióticos” feitos pelo governo americano (caso o Tio Sam, digamos, decida que ele precisa de alguma ajuda à força para pagar um pouco de sua dívida).
“Controle de capitais já estão no radar dos EUA. O Reino Unido impôs controle de capitais em 1939, e eles foram mantidos até Thatcher os repelir”, disse ele.
“Eles nunca funcionam. Mas os políticos sempre recorrem a eles.”
“Portanto, enquanto ainda é legítimo, e ético, fazer isso, eu recomendaria diversificar seu dinheiro fora dos EUA.”
(Tomei esse conselho como uma espécie de tarefa escolar. Mais tarde naquele dia, entrei em um banco de Cingapura apenas com meu passaporte americano em mãos, e perguntei se poderia abrir uma conta. Sem chance, me disseram — eu teria de mostrar algum documento que comprovasse que eu tinha permissão para trabalhar em Cingapura. Não obstante, ainda consegui criar algum agito junto ao caixa do banco — e era visível que ele não estava nem um pouco ansioso para abrir uma conta estrangeira para um americano).
“Até onde sei, nenhum país até hoje expropriou dinheiro que já estava no exterior antes de algum controle de capital ser instituído — mas os EUA sempre são uma exceção,” declarou Rogers a respeito da segurança do dinheiro fora do solo americano.
Tendo recentemente lido o livro Wealth, War and Wisdom, de Barton Biggs — um excelente estudo sobre preservação de riqueza durante a Segunda Guerra Mundial —, perguntei se seria mais difícil confiscar alguma empresa do que, por exemplo, uma quantidade de dinheiro na conta de algum banco estrangeiro.
“É claro”, concordou Rogers. “Seria mais difícil expropriar uma fazenda no estrangeiro, por exemplo.”
Sendo assim, o que fazer de agora em diante?
“Não sei o que lhe dizer”, Rogers me aconselhou, “exceto que você deve se mudar para a Ásia e ensinar mandarim aos seus filhos”.
“Ensine a eles como cultivar terras também, para serem bons agricultores.”
Ele certamente tem seguido seu próprio conselho — hoje ele vive em Cingapura com sua esposa e suas duas filhas, de 3 e 7 anos de idades. São garotinhas loiras, fofinhas e incrivelmente espertas que divertem e assombram os nativos (70% da população de Cingapura é formada por chineses) com seu mandarim fluente.
Mas e quanto à minha esposa? Ela trabalha na Intel, na Califórnia.
“Sua esposa deveria sair da Intel… e ir estudar ciências agrárias”, disse ele com um último sorriso galhofeiro.
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