Mais sobre Hiroshima e Nagasaki

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Estou recebendo uma quantidade considerável de feedback dos leitores sobre meu artigo “Hiroshima e Nagasaki foram crimes de guerra vergonhosos”. Não surpreendentemente, alguns leitores concordam com minha posição e outros discordam. Neste artigo de acompanhamento, abordarei os argumentos daqueles que expressam desacordo com minha posição.

Meus críticos usam o argumento popular e padrão que há muito é usado para justificar os bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki. Dizem que, se não fossem os bombardeios, teria sido necessária uma invasão do Japão, que teria custado, dizem eles, a vida de inúmeros soldados americanos. Portanto, eles sustentam, era moral e legalmente permissível alvejar as pessoas em Hiroshima e Nagasaki com bombas nucleares a fim de trazer uma rendição mais rápida do Japão, o que, por sua vez, salvou a vida dos soldados que teriam sido mortos em uma invasão do Japão.

Claro, existem aqueles especialistas militares que defendem o contrário. Eles sustentam que o Japão estava em suas últimas forças e que já estava abordando os Estados Unidos para tratar de uma rendição. O obstáculo, dizem esses especialistas, foi a exigência de “rendição incondicional” do presidente Truman. Se Truman tivesse deixado claro que as forças americanas garantiriam que não executariam ou torturariam o imperador japonês, considerado uma divindade pelo povo japonês, o Japão estaria disposto a se render, pelo menos para evitar ser conquistado e ocupado pelo parceiro de guerra e aliado dos Estados Unidos da América, a União Soviética.

Dado que as bombas foram lançadas e o Japão se rendeu, é impossível provar, sem sombra de dúvida, se uma invasão teria sido necessária ou não.

No entanto, vale ressaltar que ninguém forçou Truman a adotar a política de “rendição incondicional” do presidente Franklin Roosevelt. Essa foi uma política escolhida pelo próprio Truman. Se uma invasão do Japão se tornasse necessária e se Truman decidisse que haveria uma taxa de baixas extraordinariamente alta, ele poderia ter tentado negociar um tratado de paz que envolvesse algo menos do que uma “rendição incondicional”.

No entanto, gostaria de enfatizar que essa questão específica exposta acima não era o ponto central do meu artigo, que era o seguinte: é imoral e ilegal atingir mulheres, crianças, idosos, inválidos e outros não combatentes na guerra.

Alguns de meus críticos discordam veementemente disso. Eles dizem que a guerra é “maldosa” e, portanto, vale tudo, inclusive alvejar não-combatentes.

Curiosamente, quando respondi perguntando se eles apoiavam o assassinato de mulheres, crianças, idosos e outros não combatentes pelo tenente William Calley em My Lai, eles imediatamente responderam deixando claro que se opunham a esse massacre. Portanto, é óbvio que, embora apoiem os bombardeios atômicos de mulheres, crianças, idosos e outros não combatentes em Hiroshima e Nagasaki, eles não querem ser associados ao assassinato de mulheres, crianças e outros não combatentes por Calley em My Lai.

No entanto, qual é a diferença? Se é aceitável para um piloto mirar em não-combatentes com bombas, por que não é igualmente aceitável para um soldado de infantaria mirar em não-combatentes com balas? Se a “maldade” da guerra justifica um, por que não justifica o outro?

Alguns de meus críticos mencionaram o bombardeio de Dresden e cidades japonesas para justificar sua posição. Eles disseram que, uma vez que não havia problema em matar não-combatentes nessas cidades com bombas incendiárias, também não havia problema em matar não-combatentes em Hiroshima e Nagasaki com bombas nucleares.

Eu defendo o oposto. Sustento que, uma vez que é ilegal e imoral atingir não-combatentes em tempo de guerra (é por isso que Calley foi processado e condenado), é igualmente ilegal e imoral atingir não-combatentes com bombas incendiárias e bombas nucleares.

Na verdade, aqui está uma pergunta interessante: o que os defensores dos ataques a Dresden e às cidades japonesas dizem sobre os ataques da Alemanha às cidades inglesas? Eles dizem que a Alemanha estava agindo dentro de seus “direitos” quando os pilotos alemães bombardearam essas cidades? Ou eles estão dizendo que esse princípio se aplica apenas aos Estados Unidos e não a nações estrangeiras?

Aqui está outra pergunta: vamos supor que a Alemanha nazista tivesse a bomba primeiro e a tenha jogado em Washington, DC, o que resultou em uma rápida rendição do governo dos Estados Unidos, salvando assim a vida de inúmeros soldados alemães que teriam sido mortos em uma invasão ataque alema dos EUA O que os defensores dos bombardeios de Hiroshima e Nagasaki diriam sobre isso?

De fato, e se a Rússia decidir que lançar uma bomba nuclear em Kiev traria a rápida rendição da Ucrânia, o que salvaria a vida de inúmeros soldados russos (assim como soldados ucranianos). O que os defensores dos ataques a Hiroshima e Nagasaki dizem sobre isso? Eles apoiariam o “direito” da Rússia de lançar uma bomba nuclear em Kiev pela mesma razão ostensiva que as bombas foram lançadas em Hiroshima e Nagasaki? Ou eles diriam que apenas os Estados Unidos têm o “direito” de atingir mulheres, crianças, idosos, inválidos e outros não combatentes com o objetivo de trazer uma rendição rápida do lado oposto?

 

 

 

Artigo original aqui

2 COMENTÁRIOS

  1. Esse argumento é do tipo que traz uma falsa legitimidade, ele só se começou à se espalhar, com amplo apoio da imprensa, anos depois da guerra, tanto para enfiar essas falácias nas escolas quanto para ajudar os EUA na legitimidade de suas futuras crusadas pela “liberdade e democracia” mundo à fora. Não faz qualquer sentido ético dizer que um bombardeio massivo em uma nação é melhor do que uma invasão violenta, ambas são péssimas e devem ser evitadas, e Truman seguia uma política de rendição incondicional pois ele não gostaria de deixar brechas para seus inimigos, e para garantir que o Japão caísse de joelhos era necessário mais violência e morte na visão dele. Claro, se um pais invasor fizesse o mesmo com o EUA, eu dúvido que os americanos ficariam muito felizes com à tal justificativa, felizmente para o governo dos EUA, o Japão se tornou curiosamente subserviente e os Niponeses em maioria engoliram à narrativa ou esqueceram da história já que estavam mais interessados em reconstruir o país e se enriquecerem, e fizeram-no bem enquanto o governo japonês estava em frangalhos, nos anos 80 diziam que o Japão ia dominar o mundo, mas a bolha financeira que o governo vinha inflando estourou e o pais entrou em estagnação perpétua devido às medidas estatistas e centralizadoras, não atoa, à máfia da Yakuza se tornou basicamente um órgão não oficial do governo. Fora às bombas, à segunda pior coisa que os EUA fizeram pelo Japão foi exportar o Keynesianismo para lá – apesar que os economistas japoneses também importaram bastante keynesianismo britânico -.

  2. Aqui no Brasil um clássico defensor dos EUA jogarem as bombas contra civis inocentes são os randianos, um inclusive amigo do Hélio Petrolao.

    Eu faria mais uma pergunta: seria moral para a Polónia, entregar todos os judeus para os nazistas, para evitar que o país fosse invadido? Certamente pouparia a vida de muitos soldados alemães…

    A questão é que quando falamos do estado, tudo – e sempre, perde o sentido. O estado não está envolvido com éitica, moral, lei ou direito. O estado americano que estava supostamente preocupado com as baixas da invasão ao Japão, é o mesmo que não se importou em sacrificar milhares de marinheiros em Pearl Harbor para forçar a entrada na guerra.

    O estatista que fica horrorizado com as bombas de Hiroshima e Nagasaki, acharia que os crimes de guerra da União Soviética na Letonia, Estônia, Lituânia, Polônia etc… são propaganda imperialista.

    Esse tipo de artigo é muito bom porque demonstra que a agenda estatal não tem nada a ver com a realidade. Não que esses caras sejam alienados, mas que a estratégia estatal se transforma na realidade. É dividir, pois o estado sabe que é uma minoria.

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