Nos últimos meses, um debate informal sobre economia está ocorrendo na Internet entre os católicos. A questão, colocada de forma simples, tem sido se o livre mercado está ou não em conformidade com os princípios católicos. Tendo já ponderado sobre este assunto de forma considerável em um artigo para a Conferência de Estudiosos Austríacos do ano passado (“Doutrina social católica e direito econômico: uma tensão não resolvida“), vou me limitar a alguns pontos básicos.
Há alguns conservadores católicos que parecem pensar que estão desferindo um golpe a favor do catolicismo tradicional e contra o liberalismo e o Iluminismo ao se oporem ao livre mercado e favorecerem alguma alternativa – geralmente o chamado “distributivismo” de GK Chesterton e Hilaire Belloc, segundo qual o melhor sistema social é aquele no qual a propriedade produtiva é amplamente dispersa em vez de concentrada. Essas duas figuras gozam de grande renome em todo o mundo católico por seus excelentes escritos sobre uma variedade de assuntos, embora, é claro, não tivessem nenhum treinamento formal em economia.
Em 1871, Carl Menger havia escrito seus Princípios de Economia Política, uma obra de profundo gênio que lançou essencialmente a Escola Austríaca de economia, mas relativamente poucos católicos que falavam sobre a chamada “questão social” se esforçaram para absorver os ensinamentos dessa obra, ou mesmo estavam cientes da existência dela. Aqueles que escreveram sobre distributivismo nos últimos meses parecem compartilhar dessa ignorância, nunca citando sequer um único texto de economia – como se uma disciplina dedicada à aplicação da razão humana aos problemas de escassez no mundo pudesse realmente ser antagônica à fé católica.
Mesmo admitindo a premissa distributivista de que empresas menores foram engolidas por empresas maiores, não é de forma alguma óbvio que seja sempre preferível para um homem operar seu próprio negócio a trabalhar para outro. Pode ser que um homem seja mais capaz de cuidar de sua família precisamente se não for dono de seu próprio negócio ou se não cumprir o cronograma cansativo de administrar sua própria fazenda, em parte porque ele não estará arruinado se a empresa para a qual trabalha tiver que fechar, e em parte porque ele sem dúvida desfruta de mais tempo de lazer que pode passar com sua família do que se tivesse a responsabilidade de cuidar de seu próprio negócio. Certamente, portanto, estamos lidando aqui com uma questão de circunstâncias individuais e não de generalização grosseira.
Suponha, além disso, que o “distributivismo” estivesse em vigor enquanto a Revolução Industrial se desenvolvia na Grã-Bretanha no final do século XVIII. Teríamos ouvido lamentos incessantes sobre a crescente concentração do poder econômico e o crescimento dramático do número de trabalhadores assalariados. O que provavelmente não teríamos ouvido falar era a condição real daquelas pessoas que procuravam emprego nas fábricas. Elas não tiveram a sorte de ganhar a vida com lucro na agricultura, e suas famílias não lhes forneceram as ferramentas necessárias para abrir um comércio independente e operar uma das pequenas lojas que tanto prazer dão aos distributivistas.
Se não tivessem tido a oportunidade de trabalhar por um salário, elas e suas famílias simplesmente teriam morrido de fome. É tão simples quanto isso. O capitalismo, e não o distributivismo, literalmente salvou essas pessoas da miséria total e possibilitou o enorme crescimento da população, da expectativa de vida, da saúde e dos padrões de vida em geral que a Inglaterra experimentou na época e que mais tarde se espalhou para a Europa Ocidental em geral.
Em um livro que corrige os preconceitos esquerdistas em histórias mais antigas da Revolução Industrial, o Prêmio Nobel FA Hayek ampliou esse ponto.
“O proletariado que se pode dizer que o capitalismo ‘criou’ não era, portanto, uma proporção que teria existido sem ele e que ele havia degradado a um nível inferior; era uma população adicional que pôde crescer pelas novas oportunidades de emprego que o capitalismo forneceu”.
Ludwig von Mises faz o mesmo ponto crucial:
” É uma distorção dos fatos dizer que as fábricas arrancaram as donas de casa de seus lares ou as crianças de seus brinquedos. Essas mulheres não tinham como alimentar os seus filhos. Essas crianças estavam carentes e famintas. Seu único refúgio era a fábrica; salvou-as, no estrito senso do termo, de morrer de fome…. o fato é que, para o excedente populacional — reduzido à mais triste miséria pela apropriação das terras rurais, e para o qual, literalmente, não havia espaço no contexto do sistema de produção vigente —, o trabalho nas fábricas representava uma salvação. Representava uma possibilidade de melhorar o seu padrão de vida, razão pela qual as pessoas afluíram em massa, a fim de aproveitar a oportunidade que lhes era oferecida pelas novas instalações industriais. “
O distributivismo, em tal contexto, significaria a ruína certa para o proletariado que afirma defender.
Também está sob ataque dos distributivistas o tão difamado “motivo do lucro”, um tema que dominou muitos filmes sinistros de Hollywood. “Se você acha que agir visando o lucro é meritório aos olhos de Cristo”, escreveu um crítico, “você está tristemente enganado”.
Porém, mesmo um distributivista não negaria – já que não pode – que é moralmente lícito para um homem querer melhorar sua posição, tanto para seu próprio bem quanto para o de sua família. Além disso, a restauração do catolicismo em meio às dificuldades atuais certamente exigirá a ajuda de homens ricos para dotar faculdades e outros empreendimentos salutares, e essa riqueza terá de ser adquirida de alguma forma.
Mas sem um “motivo de lucro”, não há como ter certeza de que esse desejo moralmente legítimo de melhorar a própria sorte e sustentar sua família seja perseguido de uma forma que beneficie a sociedade como um todo, e não apenas a si mesmo. Uma pequena indústria surgiu ao longo dos anos dedicada a zombar da “mão invisível” de Adam Smith, a imagem pela qual Smith procurou descrever o processo salutar pelo qual o desejo de cada homem de melhorar sua condição também beneficia aqueles ao seu redor; e alguns moralistas argumentaram que o fato de o padeiro assar seu pão não por benevolência universal, mas por desejo de lucro é muito pior para ele do ponto de vista moral.
Mas há apenas duas opções aqui: ou o homem pode perseguir seus objetivos sem se importar com as necessidades e desejos de seus semelhantes, ou pode agir de acordo com essas necessidades. Não há terceira opção. Ao buscar “maximizar os lucros” – uma motivação que é rotineiramente tratada como um terrível flagelo da civilização – o homem garante que seus talentos e recursos sejam direcionados para áreas nas quais seu semelhante indicou a necessidade mais urgente.
Em outras palavras, o sistema de preços, e o sistema de lucros e prejuízos que dele decorre, obriga-o a planejar sua atividade em conformidade com as necessidades expressas da sociedade e no interesse de uma administração genuína das coisas da terra. É assim que uma sociedade racional e civilizada garante que seus recursos sejam distribuídos não de acordo com algum esquema arbitrário, mas de acordo com as necessidades das pessoas. Sinais de lucro, então, contribuem para uma cooperação social pacífica e o uso mais eficiente de recursos escassos. Sem eles, como Mises mostrou em seu ensaio clássico sobre a impossibilidade de cálculo econômico sob o socialismo, a civilização literalmente reverte à barbárie.
Além disso, nenhum católico negaria que uma vida de pura auto-indulgência é moralmente inferior àquela em que a riqueza de alguém é colocada em uso duradouro e produtivo. Mas mesmo levantar esse ponto é desviar a atenção do problema real. Deveria ser óbvio que reconhecer a “motivação do lucro” não é dizer que as pessoas devem pensar apenas em dinheiro, ou que o dinheiro é mais importante do que Deus, ou qualquer outra bobagem.
Como explica Mises,
” A imensa maioria da humanidade se esforça para ter uma maior e melhor abundância de comida, roupas, casas e outros bens materiais. Ao considerarem como melhoria e progresso uma elevação no nível de vida das massas, os economistas não estão aderindo a um materialismo mesquinho. Estão simplesmente reconhecendo o fato de que as pessoas são motivadas pelo desejo de melhorar as condições materiais de sua existência. Julgam as políticas do ponto de vista dos objetivos que os homens querem atingir. Quem desdenha a queda na taxa de mortalidade infantil e o gradual desaparecimento da fome e das epidemias, que atire a primeira pedra no materialismo dos economistas.” (grifo do autor).
A questão é que, uma vez que sabemos que o homem tem razões perfeitamente válidas para buscar o maior retorno em seu investimento, ou ganhar o maior salário, em vez de perder tempo com lamentações tolas e irrelevantes sobre as pessoas gananciosas do mundo – uma questão de filosofia moral em vez de economia – devemos empregar a razão humana para aprender como esse desejo perfeitamente moral de ganho redunda em benefício da sociedade, garantindo que as pessoas produzam o que a sociedade precisa urgentemente, em vez de mais de algo que a sociedade já desfruta em abundância. Dito desta forma, o sistema de lucros e prejuízos de uma economia baseada na divisão do trabalho, uma instituição indispensável da sociedade civilizada, de repente parece não apenas profundamente moral, mas também obrigatório, e é provavelmente por isso que os oponentes do capitalismo nunca o afirmam dessa maneira.
Para que o motor da enorme melhoria nos padrões de vida que todos no mundo desenvolvido desfrutaram nos últimos dois séculos não pare, é essencial que entendamos os mecanismos que a tornaram possível. Tal apreciação desses aspectos indispensáveis da economia livre está totalmente ausente da maioria dos expoentes do distributivismo – que, em sua ânsia de caricaturar o mercado como o local de “exploração” e ganância incessantes, consistentemente negligenciam reconhecer suas conquistas e virtudes.
A caracterização de Richard Tawney da raiva e ignorância de Lutero em relação à economia pode ser adequada aqui:
“Confrontado com as complexidades do comércio exterior e das organizações financeiras, ele é como um selvagem apresentado a um dínamo ou a uma máquina a vapor. Ele está muito assustado e com raiva até mesmo para sentir curiosidade. As tentativas de explicar o mecanismo apenas o enfurecem; ele pode apenas repetir que há um demônio nisso, e que bons cristãos não se intrometerão no mistério da iniquidade”.
Os papas observaram repetidamente que é mais difícil para um homem crescer em virtude e salvar sua alma quando vive em total miséria, então seria de se esperar que os católicos de hoje apreciem o valor de um sistema que tornou possível a maior explosão de riqueza que o mundo já viu – incluindo aumentos impressionantes na expectativa de vida, ingestão calórica, qualidade da moradia, educação, alfabetização e inúmeras outras coisas boas, bem como reduções dramáticas na mortalidade infantil, fome e doenças. E ao contrário do que afirmam os propagandistas, nada poderia ser mais óbvio do que o fato de que os benefícios do capitalismo beneficiaram esmagadoramente os pobres.
Donald Boudreaux recentemente ofereceu um experimento mental útil: suponha que pudéssemos mostrar a um antepassado do ano de 1700 como é um dia típico da vida de Bill Gates. Ele sem dúvida ficaria impressionado com o que torna a vida de Bill Gates única, mas
“um bom palpite é que as características da vida de Gates que causariam a impressão mais profunda são que ele e sua família nunca se preocupam em morrer de fome; que eles tomam banho diariamente; que eles têm várias mudas de roupas limpas; que eles têm dentes limpos e saudáveis; que doenças como varíola, poliomielite, difteria, tuberculose, tétano e coqueluche não apresentam riscos substanciais; que as chances de Melinda Gates morrer durante o parto são cerca de um sessenta avos do que teriam sido em 1700; que cada criança nascida na família Gates tem cerca de 40 vezes mais probabilidade do que uma criança pré-industrial de sobreviver à infância; que os Gates têm uma geladeira e um freezer domésticos (para não mencionar forno de micro-ondas, lava-louças, rádios e televisões); que a semana de trabalho dos Gates é de apenas cinco dias e que a família tira várias semanas de férias a cada ano, que cada uma das crianças Gates receberá mais de uma década de escolaridade formal, que os Gates viajam rotineiramente pelo ar para terras distantes em questão de horas; que conversam sem esforço com pessoas a quilômetros ou oceanos de distância; que eles frequentemente apreciam as performances impressionantes dos maiores atores e atrizes do mundo; que os Gates possam, quando e onde quiserem, ouvir uma sonata para piano de Beethoven, uma ópera de Puccini ou uma balada de Frank Sinatra.”
Em outras palavras, o que mais impressionaria nosso visitante são os aspectos da vida de Gates que o gigante do software compartilha com as pessoas comuns. Quando você considera as diferenças que caracterizavam ricos e pobres antes da Revolução Industrial, por outro lado, o mito do “capitalismo-promove-a-desigualdade” é ainda mais exposto como a farsa ignorante que é.
Escondida sob toda essa crítica ao mercado está uma ingenuidade em relação ao estado que é inacreditável que pertença a um católico sério. O atual aparato federal, seja ocupado pela direita ou pela esquerda, dificilmente pode ser outra coisa senão um anátema para qualquer pessoa com sensibilidade conservadora, católica ou não. Corporações privadas, mesmo as maiores entre elas, podem ir à falência – como aconteceu com a Kmart não faz muito tempo, o que sem dúvida deu satisfação aos críticos das grandes cadeias de lojas. Mas há pouca perspectiva de que o governo vá à falência.
Mesmo supondo que a regulamentação econômica seja uma boa ideia, a sugestão de que o atual regime deveria receber ainda mais poder, ou que esse poder certamente não seria abusado (os apoiadores da campanha podem achar seus negócios misteriosamente imunes a processos?), realmente requer muito justificativa maior do que até agora foi dada. Diga o que quiser sobre a Home Depot, mas ela não é responsável por confiscar 40% de minha renda para propósitos que considero moralmente repugnantes; nem trava uma guerra agressiva contra as nações do Terceiro Mundo ou supervisiona um sistema educacional que produz idiotas “multiculturais” estúpidos. O fato de alguém querer dar a essa criatura ainda mais poder, por qualquer motivo, sugere uma profunda falta de prudência, julgamento e bom senso.
Aqueles que se preocupam em apoiar a agricultura local e de menor escala já o fazem há duas décadas por meio da agricultura comunitária, que está crescendo. De forma puramente voluntária, as pessoas que desejam apoiar a agricultura local pagam várias centenas de dólares no início do ano para fornecer ao agricultor o capital de que ele precisa; eles então recebem produtos cultivados localmente pelo resto do ano. Os organizadores desse movimento, em vez de desperdiçar seu tempo e o nosso reclamando da necessidade de uma intervenção do Estado, na verdade fizeram algo: montaram um programa voluntário que teve grande sucesso em todo o país. Talvez, se os distributivistas se sentirem tão seguros de sua posição quanto afirmam, este exemplo pode fornecer um modelo de como seu tempo pode ser melhor gasto.
Em sua notável história do pensamento econômico, Murray Rothbard fez um grande esforço para destacar as contribuições dos escolásticos espanhóis, cujas percepções críticas sobre uma variedade de assuntos econômicos cruciais os católicos podem muito bem considerar uma fonte de orgulho. Mas, como esses escritores frequentemente se posicionam do lado da liberdade econômica, os distributivistas tratam os escolásticos espanhóis como o velho tio maluco da família que você espera que seus amigos nunca descubram.
Esta é a verdadeira vergonha, pois aqui estavam os teólogos que expuseram princípios morais e procuraram entender os mecanismos que estavam discutindo. As encíclicas papais mais recentes, como a Centesimus Annus do Papa João Paulo II, também começaram a refletir uma compreensão do papel dos preços, do empreendedorismo e de vários outros aspectos da economia de mercado, reconhecendo assim o que as pessoas instruídas em todo o mundo começaram a entender. Somente por meio de uma compreensão genuína dos mecanismos da economia livre, e não por meio de caricaturas deles, a dimensão moral da economia pode ser discutida de forma sensata.
Artigo original aqui
O texto estava bom de ler até parte onde o autor chama o Karol Wojtyła de Papa… se esse aí é papa imposto é o preço que pagamos para viver em sociedade…. pelo o que eu lembro esse Karol Wojtyła era amigo daqueles que mataram Nosso Senhor Jesus Cristo, beijou o livro da religião da paz e até recebia uma turma que acredita em reencarnaçã…
Mas o texto poderia ser pior e citar o argentino…ao menos as heresias do polonês são mais sutis…
Tem que ter coragem de se declarar católico hoje em dia, quando se tem a seita conciliar dona de nossos lugares de culto…
João Paulo II não foi papa realmente. Na doutrina católica um herege não pode ser papa, e ele cometeu heresia e apostasia publicamente diversas vezes. O mosteiro da sagrada família explica muito bem sobre ele.
Fico feliz em saber q vc tb compartilha com vários católicos a postura sedevacantista. O Kogos em um vídeo recente (dentre vários nos quais ele aborda a questão) sugeriu q a unica parte boa dessa implosão lenta por dentro da santa Igreja é, que mais cedo ou mais tarde, estimulará mais e mais católicos a adotar a postura anti CVII e contra os anti-papas.
Mas, infelizmente, como ja estamos acostumados a ver em Bananoa, ainda há de haver um alçapão no fundo do poço e esse caldo fervente demoníaco ainda vai puxar muitas almas para o lodo… Espero estar errado…