Por que as pandemias de 1918 e 1957 não destruíram a economia? Dica: Os lockdowns

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Especialistas da mídia e políticos  têm agora o hábito de afirmar que foi a própria pandemia que fez o desemprego disparar e o crescimento econômico despencar. A alegação é de que trabalhadores doentes e moribundos, consumidores com medo e cadeias de suprimentos interrompidas causariam caos econômico. Alguns até afirmaram que os fechamentos da economia realmente ajudam a economia, porque alegam que permitir a propagação da doença destrói o emprego e o crescimento econômico.

Deixando de lado o fato de que não há evidências de que os lockdowns realmente funcionem, no entanto, ao olhar para pandemias passadas – onde intervenções governamentais coercitivas eram no máximo esporádicas –, deveríamos ver imensos danos econômicos. Especificamente, podemos olhar para a pandemia de 1957-1958, que foi mais mortal do que a pandemia do COVID-19 até agora. Também podemos olhar para a pandemia de 1918-1919. No entanto, veremos que nenhuma das duas produziu danos econômicos em uma escala que agora vemos como resultado das quarentenas impostas pelo governo. Isso mina completamente as alegações de que os lockdowns são apenas um fator menor na destruição econômica e que o próprio vírus é o verdadeiro culpado.

Reações econômicas em 1957-1958 e 1918-1919

O CDC[1] estima que, em 18 de maio deste ano, aproximadamente noventa mil americanos morreram de COVID-19[2]. Ajustado pelo tamanho da população, chega a uma taxa de mortalidade de 272 por milhão.

Isso é (até agora) menos da metade da taxa de mortalidade da pandemia de gripe de 1957 a 1958. Nessa pandemia, estima-se que 116.000 americanos tenham morrido. No entanto, a população dos EUA era muito menor, totalizando apenas 175 milhões. Ajustada pelo tamanho da população, a mortalidade como resultado da pandemia da “gripe asiática” de 1957-1958 foi superior a 660 por milhão.

Isso é o equivalente a 220.000 mortes nos Estados Unidos hoje.

No entanto, em 1957, os americanos não reagiram fechando o comércio, forçando as pessoas a ficar em casa ou elevando o desemprego aos níveis da era da Grande Depressão. De fato, os relatórios mostram que os americanos tomavam pouco além das medidas usuais envolvidas na tentativa de retardar a propagação da doença: lavar as mãos, ficar em casa quando doente, etc.

Embora o vírus pareça ter sido um fator na recessão de 1958, os efeitos econômicos foram minúsculos em comparação com o que os EUA enfrentam agora pela reação ao vírus COVID-19. Isso sugere que a maior parte dos danos econômicos que estão sendo vivenciados por trabalhadores e famílias nos EUA é mais um produto da reação política ao vírus do que ao próprio vírus.

A pandemia de 1957-1958 foi um problema sério e mortal para muitos. Quando os casos de gripe asiática começaram a se espalhar, ficou claro para muitos cientistas e outros observadores que havia algo diferente e mortal nessa gripe. De fato, de acordo com D.A. Henderson et al. em “Public Health and Medical Responses to the 1957–58 Influenza Pandemic”, “Seres humanos com menos de 65 anos não possuíam imunidade a essa estirpe de H2N2”. Isso significava que “as maiores taxas de ataque eram em crianças em idade escolar através de jovens adultos de até 35 ou 40 anos de idade”. O total de mortes devido à gripe nesse período varia de 70.000 a 116.000. Isso é motivo de preocupação, para dizer o mínimo. Com os americanos mais jovens, muitos deles em idade de trabalhar, suscetíveis à doença, um antecipar de custos significativos em termos de crescimento econômico e saúde.

Qual foi a reação política a isso? Henderson et al. continua:

“A pandemia de 1957-1958 foi uma doença tão rapidamente disseminada que se tornou imediatamente claro para os funcionários de saúde pública dos EUA que os esforços para interromper ou retardar sua propagação eram inúteis. Portanto, não foram feitos esforços para colocar indivíduos ou grupos em quarentena e uma decisão deliberada foi tomada para não cancelar ou adiar grandes aglomerações, como conferências, reuniões da igreja ou eventos esportivos com o objetivo de reduzir a transmissão. Nenhuma tentativa foi feita para limitar as viagens ou rastrear os viajantes. Ênfase foi dada à prestação de cuidados médicos às pessoas que adoeciam e à manutenção do funcionamento contínuo dos serviços comunitários e de saúde… não havia relatos de que grandes eventos foram cancelados ou adiados, exceto nos jogos de futebol do ensino médio e da faculdade, que costumavam ser adiados por causa do número de jogadores afetados. “

Em 1957-1958, houve preocupação com a disponibilidade de serviços médicos. Porém, a ênfase estava no aumento dos serviços médicos, em vez de nas quarentenas impostas pelo Estado e nas medidas de “distanciamento social”. Nem a vacina ofereceu solução fácil:

“Os funcionários de saúde pública esperavam que os suprimentos significativos de vacina pudessem estar disponíveis no devido tempo, e foram feitos esforços especiais para acelerar a produção da vacina, mas quando ficaram disponíveis era tarde demais para afetar o impacto da epidemia.”

Escolas e locais de trabalho foram afetados por estudantes e trabalhadores ausentes, mas a abstenção nas escolas era um fator maior, com algumas escolas fechadas por curtos períodos, como resultado de tantos estudantes ausentes. A abstenção não chegou ao nível de causar escassez:

“Os dados disponíveis sobre capacidade industrial ociosa indicam que as taxas foram baixas e que não houve interrupção de serviços ou produção essenciais. O impacto geral no PIB foi insignificante e provavelmente dentro da variação econômica normal.”

No geral, a economia declinou aproximadamente 2% durante o primeiro e o segundo trimestre de 1958[3], mas isso não pôde ser atribuído aos efeitos do vírus. O desemprego na época também aumentou, atingindo 7,5% em julho de 1958. No entanto, o crescimento econômico foi novamente positivo no quarto trimestre de 1958 e subiu para mais de 9% em 1959. O desemprego caiu para 5% em junho de 1959.

Mas o impacto econômico geral do vírus em si não foi desastroso. Henderson et al. conclui:

“Apesar do grande número de casos, o surto de 1957 não pareceu ter um impacto significativo na economia dos EUA. Por exemplo, uma estimativa da Agência do Orçamento do Congresso descobriu que uma pandemia da escala que ocorreu em 1957 reduziria o PIB real em aproximadamente 1%’, mas provavelmente não causaria uma recessão e pode não ser distinguível da variação normal da atividade econômica.'”

A pandemia de 1918-1919, que causou dez vezes mais mortes por milhão do que a pandemia de 1957 a 1958, também não produziu desastre econômico. Embora os EUA tenham entrado na pandemia de 1918-1919 em péssimas condições econômicas graças à Primeira Guerra Mundial, segundo os economistas Efraim Benmelech e Carola Frydman,

“A gripe espanhola quase não deixou marca discernível na economia agregada dos EUA … De acordo com algumas estimativas, o produto nacional bruto real cresceu em 1919, embora em um modesto 1% (Romer, 1988). Em novo trabalho, Velde (2020) mostra que a maioria dos indicadores da atividade econômica agregada sofreu modestamente e os que declinaram mais significativamente logo após o surto de gripe, como a produção industrial, se recuperaram em meses.”

A pandemia também não pode ser responsabilizada pela recessão de 1921, porque “nessa época o declínio da produção tinha tudo a ver com o colapso dos preços das commodities quando a produção europeia do pós-guerra finalmente se recuperou”.

Como as pandemias afetam o crescimento econômico?

Não é de surpreender que encontremos estimativas relativamente moderadas em um relatório do Banco Mundial de 2009 que estima as consequências econômicas de novas pandemias. Os autores concluíram que pandemias moderadas e severas levariam a declínios do PIB de 2% a 5%. Ou, como um relatório da Reuters de 2009 resumiu:

“Se formos atingidos por algo como a gripe asiática de 1957, diga adeus a 2% do PIB. Algo tão ruim quanto a gripe espanhola de 1918-1919 reduziria a produção econômica do mundo em 4,8% e custaria mais de US$ 3 trilhões.”

Nem mesmo uma pandemia do tamanho da de 1918 era esperada que produzisse o tipo de carnificina econômica que vemos agora no COVID-19.

A reação em 2020

Podemos facilmente dizer que a economia hoje parece estar em muito pior estado após a pandemia de 2020 do que nos dias seguintes ao surto de 1957-1958, ou mesmo em 1919.

Em abril de 2020, a taxa de desemprego aumentou para 14,4%, a maior taxa registrada desde a Grande Depressão. Enquanto isso, o Federal Reserve de Atlanta prevê uma queda no PIB de mais de 40%. Estimativas mais brandas sugerem quedas de 8 a 15%. Se as previsões mais brandas forem verdadeiras, a atual crise é “apenas” a pior desde a Grande Depressão. Se o Fed de Atlanta estiver certo, estamos em um desastre econômico sem precedentes.

As estimativas do Banco Mundial mesmo de uma pandemia “severa”, que previa uma queda do PIB de cerca de 5%, nem chegam perto das estimativas para o colapso de 2020. E por que deveriam? O relatório do Banco Mundial não antecipou a paralisação econômica global imposta a bilhões de seres humanos pelos regimes mundiais. Assim, as estimativas do banco supunham que as perdas econômicas seriam limitadas ao absenteísmo, interrupção do comércio e viagens e declínio da demanda devido diretamente a doenças ou medo de doenças.

Então, por que a enorme diferença nos efeitos econômicos? A resposta quase certamente está no fato de que os governos em 2020 – ao contrário de qualquer outro período da história – se envolveram em fechamentos generalizados de negócios, ordens de “ficar em casa” e outras ações obrigatórias e impostas pelo Estado que levaram a demissões generalizadas e queda da produção econômica.

Os defensores de “quarentenas” coagidas pelo governo insistiram que o medo do vírus teria destruído a economia mesmo sem quarentenas, mas não há precedentes históricos para essa alegação e nenhuma evidência atual para apoiá-la. Embora alguns dados da pesquisa possam sugerir que mais de 60% dos americanos dizem que planejam cumprir as ordens de ficar em casa, isso apenas nos diz como as pessoas fazem planos quando ameaçadas por multas, assédio policial e outras medidas coercitivas.

Na realidade, a experiência da pandemia de 1957-1958 – ou mesmo da pandemia de 1918-1919 – não nos dá motivos para acreditar que o desemprego deveria aumentar a taxas sem precedentes e que o PIB entraria em colapso por níveis catastróficos. Em uma economia industrializada moderna, esse tipo de dano econômico só é possível através da intervenção do governo, como golpes socialistas, guerras e paralisações econômicas forçadas em nome do combate a doenças.

O custo em termos de vida humana será significativo. Um estudo afirma que a atual crise econômica pode levar a setenta e cinco mil “mortes de desespero”. Isso não é chocante, no entanto, uma vez que os efeitos fatais do desemprego e do declínio econômico são conhecidos há décadas.

Os defensores dos lockdowns provavelmente continuarão alegando que “não temos escolha”, a não ser continuar as quarentenas por longos períodos de tempo. No mínimo, muitos afirmam que as quarentenas até agora valeram “a pena”. No entanto, a eficácia dos lockdowns continua sendo uma questão em aberto e dificilmente comprovada. Enquanto isso, o mundo enfrenta o pior desastre econômico experimentado em séculos. Não precisava ser assim.

 

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Notas e observações:

[1] CDC é sigla para Centers for Disease Control and Prevention, agência federal submetida ao Departamento de Saúde (este último uma versão americana do Ministério da Saúde).

[2] No dia de hoje, estima-se a morte de 160 mil americanos aproximadamente. A mortalidade ficou em 483,5 mortes por milhão (usando regra de três).

[3] A economia brasileira cresceu no período a uma média de 8,1% ao ano, segundo consta o livro “Economia brasileira contemporânea: 1945 – 2010”, dos autores Fábio Giambiagi, André Villela, Lavinia Barros de Castro e Jennifer Hermann.

O PIB per capita brasileiro não apenas não declinou após (e com) a Gripe Espanhola e Primeira Guerra Mundial, como cresceu até 1929, quando a economia sofreu uma queda graças à crise de 1929.

 

Tradução de Felipe Lange

Artigo original aqui.

4 COMENTÁRIOS

  1. Poxa, que susto!

    Não sabia que o artigo que traduzi (eu coloquei dia 5 desse mês) iria parar aqui… tenho uma seção de textos só de coronavírus no blog (principalmente do Mises Institute, o qual eu gosto demasiado).

    Obrigado por divulgarem.

    PS: Espero que o meu comentário não saia duplicado.

  2. Ah, só para lembrar, essas notas sobre o Brasil e afins do fim do texto eu que pus mesmo, não são do Ryan McMaken, porque ele abordou a economia americana.

    De todo modo, agradeço.

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