Venezuela e o golpe mais escancarado da história

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Houve um tempo, não faz muito tempo atrás, em que os Estados Unidos tinham a etiqueta social para conduzir seus golpes clandestinamente. Isso é importante porque significa que eles reconheciam que isso é errado. Golpes foram realizados pela CIA, e muitas vezes só descobrimos anos depois. Agora, eles são realizados pela Marinha dos EUA para que o mundo inteiro assista na televisão. A mudança reflete a arrogância de Washington e a crença de que eles podem fazer o que quiserem.

Talvez nunca tenha havido um golpe mais público e óbvio do que a tentativa de golpe que acontece na Venezuela. Mal sob a cobertura da escuridão da noite, o maior porta-aviões do mundo, o USS Gerald R. Ford, movido a energia nuclear, trouxe pelo menos seus quarenta F/A-18E/F Super Hornets, seus EA-18G Growlers, seus dois esquadrões de helicópteros, seus cinco contratorpedeiros e seu B-52 Stratofortress e muito mais para St. Thomas, nas Ilhas Virgens Americanas, cerca de 900 quilômetros da costa da Venezuela. Seus mais de 4.500 soldados se juntam a mais de 10.000 soldados com seus destróieres guiados por mísseis Aegis, um submarino de ataque rápido movido a energia nuclear, caças a jato F-35B, drones MQ-9 Reaper, aviões espiões P-8 Poseidon, navios de assalto e um navio de operações especiais secreto que já estavam nas águas da costa da Venezuela.

O reforço militar dos EUA é pequeno demais para uma invasão em larga escala e grande demais para impedir pequenos barcos transportando drogas. Mas é perfeito para um golpe. A ameaça e a pressão que exerce sobre o presidente venezuelano Nicolás Maduro são esmagadoras e insuportáveis.

Golpes dos EUA na Venezuela não são novidade. Eles não eram novidades em 2002, quando o democraticamente eleito Hugo Chávez foi brevemente removido do cargo em um golpe antes que o povo e os militares restaurassem o líder popular ao poder.

Mas o roteiro mudou pouco desde que surgiram em 1908, quando os Estados Unidos ajudaram a derrubar o esquerdista Cipriano Castro após suas objeções ao poder e influência americanos na América Latina.

Desde seu nascimento, a Venezuela, junto com Cuba, representou um desafio inaceitável à disseminação da visão americana de forma de governo e liderança no território que os EUA percebem como seu próprio quintal. Concebida quase em paralelo com a constituição americana 23 anos mais velha, a primeira constituição da Venezuela, como Greg Grandin apontou em America, América: A New History of the New World, buscou equilibrar a preocupação dos Estados Unidos com a liberdade individual com o bem comum. A constituição exige a “renúncia ao perigoso direito à liberdade ilimitada” e insiste que “porque os governos são constituídos para o bem comum e para a felicidade dos homens, a sociedade deve fornecer ajuda aos desamparados e desfavorecidos e educação a todos os cidadãos.”

De Francisco de Miranda e Simón Bolívar, que lutaram primeiro pela independência da Venezuela e depois por uma América Latina unida, até Hugo Chávez, que uniu e galvanizou a esquerda latino-americana, a Venezuela tem sido um desafio à disseminação da ideologia e hegemonia americana no hemisfério ocidental.

Mas a resposta americana nunca foi tão pública e belicosa. No final de novembro, o presidente Donald Trump conversou com Maduro por telefone. A ligação durou menos de quinze minutos. O que exatamente aconteceu nessa ligação telefônica permanece desconhecido. Mas uma coisa é clara. Como um xerife em um filme ruim de faroeste, Trump, com armas em punho, mandou Maduro sair da cidade. Ele disse que Maduro tinha uma semana para sair.

O que aconteceu depois não está claro. Não está totalmente claro se Maduro se recusou a sair ou se Trump recusou as condições de Maduro para sair. Segundo reportagens do The Miami Herald e Reuters, Trump disse a Maduro que a passagem segura seria concedida a ele, sua esposa e seu filho caso ele concordasse em renunciar imediatamente e fugir da Venezuela rumo ao destino de sua escolha.

Segundo a reportagem, Maduro disse a Trump que estava disposto a sair sob três condições. Ele e sua família teriam que receber anistia legal completa. As sanções contra mais de cem autoridades venezuelanas teriam que ser suspensas. E ele pediu que seu vice-presidente, Delcy Rodriguez, pudesse liderar um governo interino até que as eleições pudessem ser realizadas. Trump rejeitou as condições e deu a Maduro até 28 de novembro para sair.

Esse prazo já passou. Trump fechou o espaço aéreo da Venezuela, designou formalmente o Cartel de los Soles da Venezuela como uma organização terrorista estrangeira, declarou que Maduro é o chefe dessa organização terrorista estrangeira e ameaçou fazer ataques terrestres à Venezuela “muito em breve.”

Mas Maduro ainda está na Venezuela. O Washington Post, embora tenha confirmado que “Trump indicou que gostaria de ver Maduro renunciar”, nega que tenha havido um “ultimato”. Eles relatam que Maduro, embora “sentindo a pressão”, optou por “se firmar e esperar que as ameaças do presidente Donald Trump de um ataque iminente passem.” Nem o povo nem os militares na Venezuela se voltaram contra ele e, segundo o Post, o “círculo íntimo de Maduro não mostra sinais de colapso iminente.” Houve resistência diplomática contra a ameaça americana do presidente colombiano Gustavo Petro, do presidente brasileiro Lula e da presidente do México, Claudia Sheinbaum.

Quem recuará primeiro, Maduro ou Trump, ainda está para ser visto. Mas a pressão pública e flagrante para forçar a queda de Maduro sugere que os Estados Unidos e o governo Trump não sentem mais a necessidade de esconder do mundo que podem impor sua vontade às nações soberanas e fazer o que quiserem.

 

 

 

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1 COMENTÁRIO

  1. Nem fodendo que vão defender o Maduro, que fase.

    Isso não significa que eu ache os EUA santos ou que eles estão fazendo isso por caridade, mas tem certas brigas que nenhum lado é bom ou certo. Dicotomia burra.

    A abertura do cu do instituto pra esquerda ficou evidente não só no debate com o Gustavo Machado, quando só faltou dar flores pra um comunista, mas com a publicação de autores como o “China Austríaca”. Este último que não passa de um militante, provavelmente pago, que vive passando vergonha no twitter ao defender o indefensável.

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