Capítulo I – A teoria positiva do ciclo
Primeira parte
A teoria dos ciclos econômicos
I – A teoria positiva do ciclo
O estudo dos ciclos econômicos tem de basear-se numa teoria satisfatória dos ciclos. Ficar olhando pilhas de estatísticas sem nenhum “pré-julgamento” é uma futilidade. Os ciclos acontecem no mundo econômico, e portanto uma teoria utilizável dos ciclos deve estar integrada à teoria econômica geral. E mesmo assim, o que chama a atenção é que essa integração, ou mesmo a tentativa de integração, seja a exceção e não a regra. A ciência econômica, nas duas últimas décadas, fendeu-se numa multidão de compartimentos impermeáveis — cada esfera praticamente não se relaciona com as outras. Somente nas teorias de Schumpeter e de Mises a teoria dos ciclos foi integrada à ciência econômica geral.[1]
A maioria dos especialistas em ciclos, que rejeitam qualquer integração sistemática como se fosse uma dedução impossível ou uma simplificação excessiva, rejeita (querendo ou não) por essa razão mesma a própria ciência econômica. Afinal, se é possível criar uma teoria do ciclo que tenha pouca ou nenhuma relação com a ciência econômica geral, então a ciência econômica geral deve estar incorreta, já que não consegue explicar esse fenômeno econômico vital. Para os institucionalistas — os puros coletores de dados — essa conclusão é bem vinda, ainda que não seja para outros. Até os institucionalistas, porém, precisam às vezes usar a teoria, na hora de analisar e de recomendar; na verdade, eles acabam usando uma mistura de palpites feitos na hora, intuições etc., colhidos assistematicamente de diversos pomares teóricos. Poucos economistas, ou talvez nenhum, perceberam que a teoria de Mises do ciclo econômico não é só mais uma teoria: que, de fato, ela encaixa perfeitamente numa teoria geral do sistema econômico.[2]
Ciclos econômicos e flutuações econômicas
É importante distinguir em primeiro lugar entre ciclos econômicos e flutuações econômicas comuns. Vivemos necessariamente numa sociedade de mudanças contínuas e perpétuas, mudanças que nunca podem ser mapeadas previamente com precisão. As pessoas tentam prever as mudanças e adiantar-se a elas da melhor maneira que podem, mas essas previsões nunca podem ser reduzidas a uma ciência exata. O negócio dos empreendedores é prever mudanças no mercado, tanto para as condições de demanda quanto de oferta. Aqueles que têm mais sucesso lucram na proporção da precisão de seu juízo, enquanto os que fracassam em suas previsões caem pelo caminho. O resultado é que os empreendedores de sucesso no livre mercado serão aqueles com mais capacidade de se antecipar às futuras condições econômicas. Contudo, a previsão nunca pode ser perfeita, e os empreendedores continuarão a diferir quanto ao sucesso de suas previsões. Se não fosse assim, jamais haveria qualquer lucro ou perda nos negócios.
Portanto, há mudanças continuamente em todas as esferas da economia. As preferências dos consumidores mudam; as preferências temporais e as consequentes proporções de investimento e de consumo mudam; a força de trabalho muda em termos de quantidade, qualidade e lugar; alguns recursos naturais são descobertos, enquanto outros chegam ao fim; as mudanças tecnológicas alteram as possibilidades de produção; as alterações no clima influenciam as colheitas etc. Todas essas mudanças são traços característicos de qualquer sistema econômico. Na verdade, não conseguiríamos conceber verdadeiramente uma sociedade sem mudanças, em que todos fizessem todo dia a mesma coisa, e nenhum dado econômico jamais mudasse. E, mesmo que pudéssemos conceber uma sociedade assim, pode-se duvidar de que muita gente fosse querer torná-la realidade.
É portanto absurdo esperar que toda atividade econômica seja “estabilizada”, como se essas mudanças não estivessem acontecendo. Estabilizar e “aplainar” essas flutuações iria, na verdade, erradicar qualquer atividade produtiva racional. Para tomar um caso simples e hipotético, suponhamos que uma comunidade seja visitada a cada sete anos pelo gafanhoto dos sete anos. Assim, a cada sete anos, muitas pessoas fazem preparativos para enfrentar os gafanhotos: elas produzem equipamentos antigafanhotos, contratam especialistas em gafanhotos etc. Obviamente, a cada sete anos há um boom da indústria de combate aos gafanhotos, que, felizmente, fica “deprimida” durante os outros seis anos. Será que ajudaria ou atrapalharia se todos decidissem “estabilizar” a indústria de combate ao gafanhoto insistindo em produzir o mesmo maquinário todo ano, e tivesse que deixá-lo guardado, empoeirando a ficando obsoleto? Será que as pessoas devem ser forçadas a construir máquinas antes de querê-las, ou a contratar pessoal antes do necessário; ou, por outro lado, a atrasar a construção de máquinas que elas querem — tudo em nome da “estabilização”? Se as pessoas desejarem mais carros e menos casas do que antes, será que elas deveriam ser forçadas a continuar comprando casas e ser impedidas de comprar os carros, tudo por causa da estabilização? Como disse o doutor F. A. Harper:
Esse tipo de flutuação econômica permeia toda a nossa vida cotidiana. Existe, por exemplo, uma violenta flutuação na colheita de morangos em diferentes épocas do ano. Será que deveríamos plantar morangos o suficiente em estufas de modo estabilizar essa parte da economia durante o ano?[3]
Podemos, portanto, esperar flutuações econômicas específicas o tempo inteiro. Não há necessidade de uma “teoria dos ciclos” particular que os explique. Eles são simplesmente os resultados de mudanças nos dados econômicos, e são plenamente explicados pela teoria econômica. Muitos economistas, porém, atribuem a depressão econômica geral a “fraquezas” causadas por “uma depressão no setor de construção” ou “uma depressão no setor agrícola”. Mas quedas em indústrias específicas jamais precipitam uma depressão geral. Mudanças nos dados causarão aumentos de atividade em um campo e diminuições em outro. Não há nada nisso que vá dar conta de uma depressão econômica geral — fenômeno do verdadeiro “ciclo econômico”. Suponhamos, por exemplo, que uma mudança nas preferências dos consumidores, e nas tecnologias, faça com que a demanda por produtos da agricultura se transfira para outros bens. Não faz sentido dizer, como tanta gente faz, que uma depressão no setor agrícola vai provocar uma depressão geral, porque os agricultores vão comprar menos bens, as pessoas nas indústrias que vendem para o setor agrícola vão comprar menos etc. Esse raciocínio ignora o fato de que as pessoas que produzem os outros bens que os consumidores agora preferem vão prosperar; as demandas delas vão aumentar.
O problema dos ciclos econômicos é o problema de boom geral e depressão; não é o problema de investigar indústrias específicas e perguntar-se quais fatores fazem com que cada uma delas esteja relativamente próspera ou deprimida. Alguns economistas, como Warren e Pearson, ou Dewey e Dakin — acreditam que não existem flutuações econômicas gerais — que os movimentos gerais são apenas os resultados de diferentes ciclos acontecendo, ao longo de tempos diferentes, nas diversas atividades econômicas. Na medida em que esses ciclos variados (como um “ciclo da construção” de vinte anos, ou o ciclo de sete anos dos gafanhotos) possam existir, porém, eles são irrelevantes para o estudo dos ciclos econômicos em geral ou para as depressões econômicas em particular. O que estamos tentando explicar são os booms e as quebras gerais da economia.
Ao considerar os movimentos econômicos gerais, é imediatamente claro que esses movimentos devem ser transmitidos pelo meio geral de troca — a moeda. A moeda cria o elo de conexão entre todas as atividades econômicas. Se um preço sobe e outro desce, podemos concluir que a demanda se transferiu de uma indústria para outra; mas se todos os preços sobem ou descem juntos, deve ter ocorrido alguma mudança na esfera monetária. Somente mudanças na demanda por moeda ou em sua oferta causarão mudanças gerais de preços. Se a demanda por moeda permanecer a mesma, um aumento na oferta de moeda provocará uma queda no poder de compra de cada dólar, isso é, uma alta geral de preços; analogamente, uma queda na oferta de moeda causará uma queda geral dos preços. Por outro lado, se a oferta de moeda permanecer a mesma, um aumento na demanda geral por moeda provocará um aumento no poder de compra do dólar (uma queda geral de preços), enquanto uma queda na demanda levará a um aumento geral de preços. As mudanças de preços em geral são portanto determinadas pelas mudanças na oferta de dinheiro e em sua demanda. A oferta de moeda consiste no estoque de moeda que existe na sociedade. A demanda por moeda é, em última análise, a disposição das pessoas de manter saldos líquidos, e isso pode expressar-se na vontade de receber moeda em trocas, e na vontade de reter moeda em saldos líquidos. A oferta de bens na economia é um componente na demanda social por moeda; uma oferta maior de bens, tudo o mais constante, aumentará a demanda por moeda e portanto tenderá a reduzir os preços. A demanda por moeda tenderá a ser menor quando o poder de compra da unidade monetária for mais alto, porque assim cada dólar terá maior efeito sobre o saldo líquido. Analogamente, um poder de compra menor (preços mais elevados) significa que cada dólar tem efeito menor, e mais dólares serão necessários para atender ao mesmo propósito.
Assim, o poder de compra do dólar permanecerá constante quando o estoque de moeda e a demanda por ela estiverem mutuamente equilibrados: isso é, quando as pessoas estiverem dispostas a manter em seus saldos líquidos a exata quantidade de moeda que existe. Se a demanda por moeda exceder o estoque, o poder de compra do dinheiro aumentará até que a demanda não seja mais excessiva e o mercado se equilibre; analogamente, uma demanda menor do que a oferta vai reduzir o poder de compra do dólar, isso é, elevar os preços.
Contudo, as flutuações na economia em geral, na “relação monetária”, por si não explicam o misterioso ciclo econômico. É verdade que qualquer ciclo na economia geral deve propagar-se por meio dessa relação monetária: a relação entre o estoque de moeda e a demanda por ela. Mas por si essas mudanças não explicam muita coisa. Se, por exemplo, a oferta monetária aumenta ou a demanda cai, os preços aumentam; mas por que isso geraria um “ciclo econômico”? Especificamente, por que isso causaria uma depressão? Os primeiros teóricos dos ciclos econômicos tinham razão em concentrar sua atenção na crise e na depressão: essas são as fases que deixam perplexos e chocados tanto economistas quanto leigos, e essas são as fases que mais carecem de explicação.
O problema: um aglomerado de erros
A explicação das depressões portanto não será encontrada na referência a flutuações econômicas específicas, ou mesmo gerais, em si mesmas. O principal problema que uma teoria da depressão precisa explicar é: por que subitamente ocorre um aglomerado de erros? Essa é a primeira questão para qualquer teoria cíclica. A atividade econômica segue tranquila, e a maior parte das empresas obtém bons lucros. De repente, sem qualquer aviso, as condições mudam e a maioria das empresas sofrem perdas; subitamente se revela que elas cometeram graves erros em suas previsões.
Agora cabe rever o que é o empreendedorismo. Grande parte do negócio dos empreendedores é fazer previsões. Eles têm de investir e pagar custos no presente, na expectativa de que vão obter um lucro fazendo vendas ou para os consumidores ou para outros empreendedores mais adiante na estrutura de produção da economia. Os melhores empreendedores, com melhor capacidade de prever as demandas dos consumidores ou de outros produtores, têm lucros; os empreendedores ineficientes têm perdas. O mercado, portanto, oferece um campo de treinamento para a recompensa e a expansão de empreendedores de sucesso, que enxergam longe, e para a eliminação dos empresários ineficientes. Via de regra, apenas alguns empresários sofrem perdas a qualquer momento específico; a maioria ou empata ou têm lucro. Como então explicar o curioso fenômeno da crise, em que quase todos os empreendedores subitamente sofrem perdas? Em suma, como foi que todos os sagazes empresários do país cometeram esses erros todos juntos, e porque esses erros foram todos revelados naquele momento em particular? Eis o grande problema da teoria dos ciclos.
Não é legítimo responder que a responsabilidade é de mudanças súbitas nos dados. Afinal, é tarefa dos empreendedores prever as mudanças futuras, algumas das quais são súbitas. Por que suas previsões fracassaram de modo tão estapafúrdio?
Outro traço comum do ciclo econômico também carece de explicação. É bem sabido que as indústrias de bens de capital têm flutuação mais ampla do que as indústrias de bens de consumo. As indústrias de bens de capital — especialmente as indústrias que fornecem matéria prima, construção e equipamentos para outras indústrias — expandem-se muito mais durante o boom, e sofrem um golpe muito mais forte durante a depressão.
Um terceiro traço de todo boom que carece de explicação é o aumento da quantidade de dinheiro na economia. Analogamente, geralmente, mas não universalmente, há uma queda na oferta monetária durante a depressão.
A explicação: boom e depressão
No mercado puramente livre e desimpedido, não haverá aglomerado de erros, porque empreendedores treinados não vão todos cometer erros ao mesmo tempo.[4] O ciclo “de boom e recessão” é gerado pela intervenção monetária no mercado, especificamente na expansão do crédito bancário para as empresas. Imaginemos uma economia com uma certa oferta monetária. Parte do dinheiro é gasto no consumo; o resto é poupado e investido numa imensa estrutura de capital, em várias ordens de produção. A proporção entre consumo e poupança ou investimento é determinada pelas preferências temporais das pessoas — o grau em que elas preferem satisfações presentes ou futuras. Quanto menos elas as preferirem no presente, menor será sua taxa de preferência temporal, e menor, portanto, a taxa pura de juros, que é determinada pelas preferências temporais dos indivíduos na sociedade. Uma taxa mais baixa de preferência temporal será refletida em maiores proporções entre investimento e consumo, no prolongamento da estrutura de produção, e em formação de capital. Preferências temporais mais altas, por outro lado, refletir-se-ão em taxas de juros puras mais altas e numa proporção menor entre investimento e consumo. As taxas de juros finais do mercado refletem a taxa de juros pura mais ou menos o risco empresarial e os componentes do poder de compra. Graus variados de risco empresariais produzem uma estrutura de taxas de juros em vez de uma única taxa uniforme, e os componentes do poder de compra refletem mudanças no poder de compra do dólar, assim como a posição específica de um empreendedor em relação a mudanças de preços. O fator crucial, porém, é a taxa de juros pura. Essa taxa de juros se manifesta primeiro na “taxa natural”, que é aquilo que costuma ser chamado de “taxa de lucros” corrente. Essa taxa corrente se reflete na taxa de juros no mercado de empréstimos, taxa essa que é determinada pela taxa de lucros corrente.[5]
O que acontece quando os bancos imprimem dinheiro novo (sejam cédulas ou depósitos bancários) e o empresta às empresas?[6] O dinheiro novo jorra no mercado de empréstimo e reduz a taxa de juros dos empréstimos. Parece que a oferta de fundos poupados para investimento aumentou, porque o efeito é o mesmo: a oferta de fundos para investimento aparentemente aumenta, e a taxa de juros diminui. A inflação bancária, em suma, cria para os empresários a ilusão de que a oferta de fundos poupados é maior do que na verdade é. Então, quando os fundos poupados aumentam, os empresários investem em “processos de produção mais longos”, isso é, a estrutura de capital é alongada, especialmente nas “ordens superiores”, as mais remotas em relação ao consumidor. Com seus fundos recém-adquiridos, os empresários provocam o aumento de preços do capital e dos bens de outros produtores, e isso estimula uma transferência do investimentos das ordens “inferiores” (próximas do consumidor) para as ordens “superiores” de produção (mais distantes do consumidor) — das indústrias de bens de consumo para as indústrias de bens de capital.[7]
Se esse fosse o efeito de uma queda verdadeira nas preferências temporais e de um aumento na poupança, não haveria problema nenhum, e a nova estrutura alongada da economia poderia sustentar-se indefinidamente. Mas essa transferência é produto da expansão do crédito bancário. Logo o dinheiro novo começa a descer dos mutuários empresariais para os fatores de produção: nos salários, nos aluguéis, nos juros. Porém, a menos que as preferências temporais tenham mudado, e não há qualquer motivo para achar que isso tenha acontecido, as pessoas logo gastarão suas rendas maiores nas antigas proporções entre investimento e consumo. Em suma, as pessoas logo restabelecerão as antigas proporções, e a demanda vai se transferir das ordens superiores, onde estavam, para as ordens inferiores. As indústrias de bens de capital verão que seus investimentos foram equivocados: que aquilo que eles julgaram lucrativo na verdade não é, porque não há demanda de seus consumidores empreendedores. As ordens superiores de produção revelaram-se um desperdício, e os mal-investimentos têm de ser liquidados.
Uma das explicações preferenciais da crise é que ela deriva do “subconsumo” — da ausência de demanda dos consumidores por bens a preços que seriam lucrativos. Mas isso vai contra o fato geralmente conhecido de que são as indústrias de bens de capital, e não as de bens de consumo, que realmente sofrem durante uma depressão. A ausência é de demanda empresarial pelos bens das ordens superiores, e isso, por sua vez, é causado pelo retorno da demanda às antigas proporções.
Em suma, os empresários foram iludidos pela inflação do crédito bancário a investir demais em bens de capital de ordens superiores, que só poderiam ser mantidos absurdamente, por meio de preferências temporais mais baixas, e maiores poupança e investimento; assim que a inflação chega à massa do povo, a antiga proporção entre consumo e investimento se restabelece, e os investimentos empresariais nas ordens superiores revelam-se um desperdício.[8] Os empresários foram induzidos a esse erro pela expansão do crédito e por sua interferência na taxa de juros do livre mercado.
O boom, então, é na verdade um período de investimentos ruinosamente equivocados. É o momento em que os erros são cometidos, por causa da interferência do crédito bancário no livre mercado. A “crise” chega quando os consumidores vêm restabelecer as proporções que desejam. A “depressão” é na verdade o processo por meio do qual a economia se ajusta após os desperdícios e equívocos do boom, e restabelece o serviço eficiente dos desejos do consumidor. O processo de ajuste consiste na rápida liquidação dos investimentos ruinosos. Alguns serão integralmente abandonados (como as cidades-fantasmas construídas durante o boom de 1816—1818 e abandonadas durante o Pânico de 1819); outros serão transferidos para outros usos. O princípio sempre será não chorar pelos erros pregressos, mas fazer um uso mais eficiente do estoque existente de capital. Em suma, o livre mercado tende a satisfazer desejos do consumidor expressados voluntariamente com eficiência máxima, e isso inclui os desejos relativos do público pelo consumo presente e futuro. O boom inflacionário atrapalha essa eficiência, e distorce a estrutura de produção, que deixa de servir adequadamente os consumidores. A crise assinala o fim dessa distorção inflacionária, e a depressão é o processo por meio do qual a economia volta a servir os consumidores de maneira eficiente. Em suma, e é muito importante entender isto, a depressão é o processo de “recuperação”, e o fim da depressão anuncia o retorno à normalidade e à eficiência ótima. Portanto, longe de ser um flagelo maligno, a depressão é o retorno necessário e benéfico da economia à normalidade após as distorções impostas pelo boom. O boom, então, exige a quebra.
Como, obviamente, leva pouco tempo para que o dinheiro novo passe das empresas para os fatores de produção, por que os booms não terminam todos rapidamente? A razão é que os bancos chegam com o resgate. Vendo os fatores sendo afastados delas pelas indústrias de bens de consumo, vendo que seus custos aumentam e que os fundos acabam, as empresas mutuárias outra vez voltam-se para os bancos. Se os bancos expandirem ainda mais o crédito, podem outra vez salvar a pele desses mutuários. O novo dinheiro é outra vez derramado nas empresas, e elas outra vez podem afastar os fatores das indústrias de bens de consumo. Em suma, o crédito bancário em contínua expansão pode manter os mutuários um passo à frente da retribuição dos consumidores. Nisso, como vimos, é que consiste a crise e a depressão: a restauração, por parte dos consumidores, de uma economia eficiente, e o fim das distorções do boom. Obviamente, quanto maior for a expansão do crédito, e quanto mais ela durar, mais durará o boom. O boom terminará quando a expansão do crédito bancário finalmente parar. Claro que, quanto mais longo for o boom, mais ruinosos serão os erros cometidos, e mais longo e rigoroso será o reajuste depressivo necessário.
Assim, a expansão do crédito bancário principia o ciclo econômico em todas as suas fases: o boom inflacionário, marcado pela expansão da oferta de dinheiro e por mal-investimentos; a crise, que chega quando a expansão do crédito termina e os mal-investimentos tornam-se evidentes; e a recuperação depressiva, o processo necessário de ajuste por meio do qual a economia retoma as maneiras mais eficientes de satisfazer os desejos dos consumidores.[9]
Especificamente, quais são os traços essenciais da fase de recuperação-depressão? Os projetos ruinosos, como dissemos, devem ser abandonados ou usados da melhor maneira possível. As empresas ineficientes, incentivadas pelo boom artificial, precisam ser liquidadas, ou ter suas dívidas reduzidas, ou passar para as mãos de seus credores. Os preços dos bens de consumo devem cair, particularmente nas ordens superiores de produção — isso inclui bens de capital, terras e salários. Assim como o boom foi marcado por uma queda na taxa de juros, isso é, por diferenciais de preço entre os estágios de produção (a “taxa natural” ou taxa corrente de lucro) e também pela taxa de empréstimos, a recuperação depressiva consiste num aumento desse diferencial de juros. Na prática, isso significa uma queda nos preços dos bens de ordens superiores em relação aos preços nas indústrias de bens de consumo. Não só os preços de máquinas específicas devem cair, mas também os preços de agregados inteiros de capital, como por exemplo os valores de ações e de imóveis. Na verdade, esses valores devem cair mais do que os rendimentos dos ativos, por refletir a alta geral na taxa de juros de retorno.
Como os fatores precisam transferir-se das ordens superiores de produção para as inferiores, existe um desemprego “friccional” inevitável em toda depressão, mas ele não precisa ser maior do que o desemprego que acompanha qualquer outra grande mudança na produção. Na prática, o desemprego será agravado pelas muitas falências, e pelos grandes erros revelados, mas ele não precisa ser mais do que temporário. Quanto mais rápido o ajuste, mais efêmero será o desemprego. O desemprego ultrapassará a fase “friccional”, tornando-se realmente agudo e duradouro, somente se os salários forem mantidos artificialmente altos e impedidos de cair. Se os salários ficarem acima do nível de livre mercado que equilibra a oferta de trabalho e a demanda por ele, os trabalhadores ficarão permanentemente desempregados. Quanto maior o grau de discrepância, pior será o desemprego.
Traços secundários da depressão: a contração deflacionária do crédito
Enumeramos os traços essenciais da depressão. Outros traços secundários também podem desenvolver-se. Por exemplo, a deflação (a redução da oferta monetária) não é necessária durante uma depressão. A fase de depressão começa com o fim da inflação, e pode continuar sem quaisquer novas mudanças do lado da moeda. A deflação quase sempre aparece, porém. Em primeiro lugar, a inflação surgiu como expansão do crédito bancário; agora, as dificuldades financeiras e as falências entre os mutuários levam os bancos a baixar a crista e a contrair o crédito.[10] No padrão-ouro, os bancos têm outra razão para contrair o crédito — eles poderiam ter parado com a inflação por causa da fuga do ouro para outros países. A ameaça dessa fuga força-os a contrair seus empréstimos por liquidar. Além disso, a irrupção de falências pode fazer com que os bancos comecem a ser questionados; e os bancos, por serem intrinsecamente falidos, estão longe de poder se dar ao luxo de enfrentar esses questionamentos.[11] Por isso, a oferta monetária vai se contrair por causa de corridas bancárias reais, e porque os bancos vão reforçar sua posição por medo dessas corridas.
Outro traço secundário comum das depressões é um aumento da demanda monetária. Essa “corrida pela liquidez” é resultado de diversos fatores: (1) as pessoas esperam que os preços caiam, por causa da depressão e da deflação, e portanto vão guardar mais dinheiro e gastar menos em bens, esperando a queda dos preços; (2) diante da pressão dos bancos e de outros credores, os mutuários tentarão pagar suas dívidas liquidando outros ativos para obter moeda; (3) a irrupção de perdas empresariais e de falências faz com que os empresários fiquem cautelosos para investir até que o processo de liquidação tenha acabado.
Com a queda na oferta monetária, e com o aumento na sua demanda, a queda geral de preços é por consequência uma característica da maioria das depressões. A queda geral de preços, porém, é causada pelos traços secundários das depressões, e não por seus traços intrínsecos. Quase todos os economistas, até mesmo aqueles que enxergam que se deveria permitir que o processo de ajuste depressivo funcionasse sem impedimentos, têm uma visão muito negativa da deflação secundária e da queda de preços, e afirmam que elas agravam sem necessidade o rigor das depressões. Todavia, essa visão é incorreta. Esses processos não apenas não agravam a depressão, como têm efeitos positivos benéficos.
Por exemplo, não há qualquer justificativa para a hostilidade comum ao “entesouramento”. Não existe critério, em primeiro lugar, para definir “entesouramento”: a acusação inevitavelmente se reduz a Fulano achar que Beltrano mantém um saldo líquido maior do que Fulano julga apropriado para Beltrano. Com certeza não há qualquer critério objetivo para dizer quando um aumento no saldo líquido se torna um “entesouramento”. Em segundo lugar, vimos que a demanda monetária aumenta como resultado de certas necessidades e valores das pessoas; numa depressão, temores de liquidações empresariais e expectativas de quedas de preços dão um incentivo especial a esse aumento. Quais os critérios para dizer que essas estimativas são “ilegítimas”? A queda geral de preços é a maneira de satisfazer um aumento na demanda monetária, pois preços mais baixos significam que os mesmos saldos líquidos terão maior eficácia, maior força “real” diante de bens e serviços. Em suma, o desejo por maiores saldos líquidos reais agora foi satisfeito.
Além disso, a demanda por dinheiro voltará a diminuir assim que terminarem os processos de liquidação e de ajuste. Quando a liquidação se completa, somem as incertezas relacionadas à falências iminentes e acaba a corrida dos mutuários por liquidez. Uma queda rápida e desimpedida nos preços, tanto em geral (com os ajustes para a relação monetária alterada) e nos bens das ordens superiores em particular (com os ajustes para os mal-investimentos do boom) concluirá com celeridade os processos de realinhamento e porá um fim às expectativas de novas quedas. Assim, quanto mais rápido acontecerem os diversos ajustes, primários e secundários, mais cedo voltará a cair a demanda monetária. Isso, é claro, é apenas uma parte do “retorno à normalidade” da economia geral.
Nem o aumento do “entesouramento” nem a queda de preços interferem sob qualquer aspecto no ajuste depressivo primário. O traço importante do ajuste primário é que os preços dos bens de produção caem mais rápido do que os dos bens de consumo (ou, mais precisamente, os preços das ordens superiores caem mais rapidamente do que os dos bens das ordens inferiores); não há interferência no ajuste primário se todos os preços caem numa certa medida. Há, no mais, um mito, comum tanto entre economistas quanto entre leigos, de que os preços em queda têm um efeito depressivo sobre a economia. Isso não é necessariamente verdade. O que importa para a economia é não o comportamento geral dos preços, mas os diferenciais de preços entre os preços de venda e os custos (a “taxa natural de juros”). Se os salários, por exemplo, caem mais rapidamente do que os preços dos produtos, isso estimula a atividade econômica e o emprego.
A deflação da oferta monetária (por meio da contração do crédito) teve uma sorte tão ruim quanto o entesouramento com os economistas. Até mesmo teóricos misesianos deploram a deflação e não veem qualquer benefício saindo dela.[12] Contudo, a contração deflacionária do crédito ajuda muito a acelerar o processo de ajuste, e com isso a conclusão da recuperação econômica, de maneiras ainda por reconhecer. O ajuste consiste, como sabemos, num retorno ao padrão desejado de consumo e poupança. Porém, é necessário menos ajuste se as próprias preferências temporais mudam: isso é, se a poupança aumenta e o consumo cai em relação a ela. Em suma, aquilo que pode ajudar uma depressão não é mais consumo, mas, pelo contrário, menos consumo e mais poupança (e, concomitantemente, mais investimento). A queda nos preços incentiva mais poupança e menos consumo ao alimentar uma ilusão contábil. A contabilidade empresarial registra o valor dos ativos em seu custo original. É bem conhecido que aumentos gerais de preços distorcem o registro contábil: o que parece ser um grande “lucro” pode ser não mais do que suficiente para substituir os ativos que agora têm maior preço. Durante uma inflação, portanto, os “lucros” empresariais são muitíssimo exagerados, e o consumo é maior do que seria sem a ilusão contábil — talvez haja consumo de capital até mesmo sem que o indivíduo saiba. Numa época de deflação, a ilusão contábil se inverte: o que parecem perdas e consumo de capital podem até significar lucros para a empresa, porque agora o custo de substituição dos ativos é muito menor. Esse exagero das perdas, porém, restringe o consumo e incentiva a poupança; uma pessoa pode achar que está meramente substituindo capital, quando na verdade está acrescentando investimentos à empresa.
A contração do crédito terá outro efeito benéfico na promoção da recuperação, porque, como vimos, a expansão do crédito bancário distorce o livre mercado ao reduzir os diferenciais de preços (a “taxa natural de juros” ou taxa corrente de lucros) no mercado. A contração do crédito, por outro lado, distorce o livre mercado em sentido inverso. O primeiro efeito da contração deflacionária do crédito é a redução da oferta monetária nas mãos das empresas, particularmente nos estágios superiores de produção. Isso reduz a demanda por fatores nos estágios superiores, reduz os preços e as rendas dos fatores, e aumenta os diferenciais de preços e as taxas de juros. Ela incita a transferência de fatores, em suma, dos estágios superiores para os inferiores. Mas isso significa que a contração do crédito, quando se segue da expansão do crédito, acelera o processo de ajuste do mercado. A contração do crédito faz com que a economia volte para as proporções do livre mercado muito mais rápido do que seria possível sem ela.
Porém, pode-se objetar: será que a contração de crédito não poderia compensar excessivamente os erros do boom e causar ela mesma distorções que precisam ser corrigidas? É verdade que a contração do crédito pode trazer compensações excessivas e, enquanto continuar a contração, ela pode fazer com que as taxas de juros sejam maiores do que os níveis de livre mercado, e que o investimento seja menor do que no livre mercado. Mas, como a contração não causa nenhum mal-investimento positivo, ela não levará a nenhum doloroso período de depressão e de ajuste. Se os empresários forem erroneamente induzidos a pensar que há menos capital disponível para investir do que realmente há, disso não se seguirão quaisquer perdas duradouras na forma de investimentos desperdiçados.[13] Além disso, na natureza das coisas, a contração do crédito é seriamente limitada — ela não pode progredir além da medida da inflação anterior.[14] A expansão do crédito é que não tem nenhum limite dessa ordem.
A política governamental para a depressão: laissez-faire
Se o governo deseja que uma depressão termine o quanto antes, e que a economia retorne à prosperidade normal, o que deveria fazer? A primeira injunção, e a mais clara é: não interferir no processo de ajuste do mercado. Quanto mais o governo intervém para atrasar o ajuste do mercado, mais longa e mais dolorosa será a depressão, e mais difícil será o caminho para a recuperação completa. Os entraves do governo agravam e perpetuam a depressão. Contudo a política do governo para depressões sempre agravou (e hoje agravaria mais ainda) os males mesmos que alardeou tentar curar. Se, na verdade, listarmos logicamente as diversas maneiras como o governo poderia travar o ajuste do mercado, veremos na lista exatamente o arsenal “antidepressivo” favorito da política governamental. Assim, eis aqui as maneiras de atrapalhar o processo de ajuste:
(1) Impedir ou retardar a liquidação. Emprestar dinheiro para empresas instáveis, instar a que os bancos emprestem ainda mais dinheiro etc.
(2) Inflacionar ainda mais. Mais inflação impede a queda necessária dos preços, retardando assim o ajuste e prologando a depressão. Uma nova expansão do crédito cria mais mal-investimentos, os quais, por sua vez, terão de ser liquidados por alguma depressão posterior. Uma política governamental de “dinheiro fácil” impede que o mercado retorne às taxas de juros necessariamente mais altas.
(3) Manter elevados os salários. A manutenção artificial dos salários numa depressão garante o desemprego em massa permanente. Além disso, numa deflação, quando os preços estão caindo, manter os mesmos salários em moeda significa que os salários reais foram empurrados para cima. Diante da queda na demanda das empresas, isso agrava seriamente o problema do desemprego.
(4) Manter os preços altos. Manter os preços acima de seus níveis de livre mercado vai criar excessos invendáveis, e impedir um retorno à prosperidade.
(5) Estimular o consumo e desincentivar a poupança. Vimos que mais poupança e menos consumo acelerariam a recuperação; mais consumo e menos poupança agravam ainda mais a carência de capital poupado. O governo pode incentivar o consumo com “vales-refeição” e fundos assistenciais. Pode desincentivar a poupança e o investimento com impostos mais elevados, especialmente para os ricos e sobre empresas e propriedades. Aliás, qualquer aumento dos impostos e dos gastos do governo vai desincentivar a poupança e o investimento e estimular o consumo, porque todo o gasto do governo é consumo. Alguns fundos privados teriam sido poupados e investidos; todos os fundos do governo são consumidos.[15] Qualquer aumento no tamanho do governo em relação à economia desloca a proporção social entre consumo e investimento para o lado do consumo, e prolonga a depressão.
(6) Subsidiar o desemprego. Qualquer subsídio ao desemprego (por meio de “seguro” desemprego, assistencialismo etc.) prologará indefinidamente o desemprego, e retardará o deslocamento dos trabalhadores para as áreas em que há empregos disponíveis.
São essas, então, as medidas que vão atrasar o processo de recuperação e agravar a depressão. Contudo, elas são as preferências consagradas da política governamental, e, como veremos, foram as políticas adotadas na depressão de 1929—1933 por um governo que muitos historiadores consideram ter sido “laissez-faire”.
Como a deflação também acelera a recuperação, o governo deveria incentivar a contração do crédito em vez de interferir nela. Numa economia de padrão-ouro, como a que tínhamos em 1929, o impedimento da deflação tem consequências deveras infelizes. Afinal, a deflação aumenta as proporções de reservas do sistema bancário, e gera mais confiança, tanto no entre os nacionais quanto entre os estrangeiros, de que o padrão ouro será mantido. O temor em relação ao padrão ouro precipitará as exatas corridas bancárias que o governo anseia evitar. Há na deflação, e até nas corridas bancárias, outros valores que não devem ser ignorados. Os bancos não deveriam ser, ao contrário das outras empresas, isentados de pagar suas obrigações. Qualquer interferência em seu castigo — as corridas bancárias — estabelecerá os bancos como grupo com privilégios especiais, desobrigado de pagar suas dívidas, e vai levar a inflações posteriores, a expansões do crédito e a depressões. E se, como asseveramos, os bancos são intrinsecamente falidos e as “corridas” simplesmente revelarem essa falência, é benéfico para a economia que o sistema bancário seja reformado, de uma vez por todas, por uma extensiva purgação do sistema bancário de reservas fracionárias. Essa purgação forçosamente exporia para o público os riscos do sistema bancário de reservas fracionárias e, mais do que qualquer teorização acadêmica, daria uma garantia futura contra males bancários do gênero.[16]
O mais importante cânone para uma política governamental sólida durante uma depressão é portanto evitar interferir no processo de ajuste. Será que o governo pode fazer alguma coisa mais positiva para ajudar o ajuste? Alguns economistas defenderam que o governo decretasse um corte nos salários para incentivar o emprego — por exemplo, uma redução de 10% para todas as categorias. Mas o ajuste de livre mercado é o inverso de qualquer política “para todas as categorias”. Nem todos os salários precisam ser cortados; o grau dos ajustes necessários de preços e de salários difere em cada caso, e só pode ser determinado por processos do mercado livre e desimpedido.[17] A intervenção governamental só pode distorcer o mercado ainda mais.
Há, porém, uma coisa que o governo pode fazer positivamente: ele pode reduzir drasticamente seu papel relativo na economia, cortando seus próprios gastos e os impostos, sobretudo os impostos que interferem na poupança e no investimento. A redução de seu nível de impostos e de gastos automaticamente deslocará a proporção social entre poupança, investimento e consumo em favor de poupança e investimento, grandemente reduzindo, desse modo, o tempo necessário para retornar a uma economia próspera.[18] A redução nos impostos que incidem mais fortemente sobre poupança e investimento vai reduzir ainda mais as preferências temporais sociais.[19] Além disso, a depressão é um momento de tensão econômica. Qualquer redução nos impostos, ou nas regulamentações que interferem no livre mercado, estimulará a atividade econômica saudável; qualquer aumento nos impostos ou quaisquer outras intervenções vão deprimir ainda mais a economia.
Em suma, a política governamental adequada numa depressão é o estrito laissez-faire, incluindo um rigoroso corte no orçamento, juntamente, talvez, com incentivos positivos à contração do crédito. Há décadas esse tipo de programa é rotulado de “ignorante”, de “reacionário” ou de “neandertal” pelos economistas convencionais. Pelo contrário: essa é a política claramente ordenada pela ciência econômica àqueles que desejam encerrar a depressão da maneira mais rápida e mais limpa possível.[20]
Poder-se-ia objetar que a depressão só começou quando acabou a expansão do crédito. Por que o governo não poderia continuar expandindo o crédito indefinidamente? Em primeiro lugar, quanto mais tempo durar o boom inflacionário, mais doloroso e rigoroso será o necessário processo de ajuste. Em segundo lugar, o boom não pode continuar indefinidamente, porque em algum momento o público desperta para a política governamental de inflação permanente, e foge do dinheiro indo para os bens, comprando enquanto o dólar vale mais do que valerá no futuro. O resultado será uma inflação “descontrolada” ou hiperinflação, bem conhecida na história, particularmente do mundo moderno.[21] A hiperinflação é, sob qualquer aspecto, muito pior do que qualquer depressão: ela destrói a moeda — o próprio sopro vital da economia; ela arruína e arrasa a classe média e todos os “grupos de renda fixa”; ela causa uma destruição sem limites. E, como se não bastasse, ela acaba levando ao desemprego e a padrões de vida inferiores, já que pouco sentido faz trabalhar se a renda recebida deprecia a cada instante. Para evitar essa calamidade, então, a expansão do crédito tem de parar em algum momento, e isso trará à tona uma depressão.
Para impedir as depressões
Impedir uma depressão é obviamente melhor do que ter de passar por ela. Se a política governamental adequada durante uma depressão é o laissez-faire, o que ele deveria fazer para impedir que uma depressão comece? Obviamente, como a expansão do crédito necessariamente lança as sementes da depressão posterior, o melhor que o governo tem a fazer é impedir qualquer expansão inflacionária do crédito. Essa injunção não é muito difícil, porque a tarefa mais importante do governo é abster-se ele mesmo de gerar inflação. Afinal, o governo é uma instituição intrinsecamente inflacionária, e por conseguinte quase sempre provocou, incentivou e dirigiu os booms inflacionários. O governo é intrinsecamente inflacionário porque, ao longo dos séculos, foi adquirindo o controle do sistema monetário. Ter o poder de imprimir dinheiro (inclusive o poder de “imprimir” depósitos bancários) lhe dá o poder de servir-se de uma fonte imediata de renda. A inflação é uma forma de imposto, porque o governo pode criar dinheiro novo do nada e usá-lo para tirar recursos de indivíduos privados, impedidos por duras penas de praticar “falsificações” similares. Para as autoridades governamentais e para seus grupos favoritos, a inflação é portanto um agradável substituto dos impostos, além de ser um substituto sutil, que o público em geral pode facilmente ignorar — e pode ser incentivado a ignorar. O governo também pode colocar a culpa pelos preços crescentes, que são a consequência inevitável da inflação, no público em geral ou em alguns segmentos indesejados do público, como por exemplo as empresas, os especuladores ou os estrangeiros. Somente a improvável adoção de uma doutrina econômica sólida poderia levar o público a colocar a responsabilidade em seu devido lugar: no colo do próprio governo.
Os bancos privados, é verdade, podem eles mesmos inflacionar a oferta monetária ao emitir mais títulos de crédito de moeda padrão (ouro ou papel do governo) do que jamais poderiam resgatar. Um depósito bancário equivale a um recibo de armazém por dinheiro, recibo que o banco promete resgatar em qualquer momento que o cliente desejar tirar seu dinheiro dos cofres do banco. Todo o “sistema bancário de reservas fracionárias” envolve a emissão de recibos que não têm como ser redimidos. Mas Mises mostrou que, em si mesmos, os bancos privados não conseguiriam inflacionar tanto a oferta monetária.[22] Em primeiro lugar, cada banco veria seus “pseudo”-recibos emitidos sem cobertura (sem cobertura de dinheiro) rapidamente transferidos para os clientes de outros bancos, os quais pediriam o resgate ao banco. Assim, quanto menor a clientela de cada banco, menor seria o escopo para sua emissão de pseudo-recibos. Todos os bancos poderiam reunir-se e concordar em expandir à mesma proporção, mas esse acordo seria difícil de pôr em prática. Em segundo lugar, os bancos ficariam limitados pelo grau em que o público usasse as notas ou depósitos bancários como dinheiro padrão; e, em terceiro lugar, eles seriam limitados pela confiança dos clientes em seus bancos, que poderiam ser arruinados por corridas a qualquer momento.
Em vez de impedir a inflação proibindo o sistema bancário de reserva fracionária por ser uma fraude, os governos caminharam uniformemente na direção oposta, e pouco a pouco foram removendo os freios do livre mercado à expansão do crédito bancário, ao mesmo tempo em que se colocaram na posição de dirigir a inflação. De várias maneiras, eles fortaleceram artificialmente a confiança do público nos bancos, incentivaram o uso, pelo público, de papel e de depósitos em vez de ouro (até que criminalizaram o ouro) e arrebanharam todos os bancos sob um único teto para que todos eles pudessem expandir-se juntos. O principal dispositivo por meio do qual esses objetivos foram atingidos foi o Banco Central, instituição que os Estados Unidos finalmente adquiriram na forma do Federal Reserve System em 1913. O Banco Central permitiu a centralização e a absorção do ouro em cofres do governo, ampliando enormemente a base nacional para a expansão do crédito[23]; ele também garantiu que os bancos agissem de maneira uniforme porque suas reservas deveriam existir como depósitos no Banco Central, e não em ouro. Quando o Banco Central é estabelecido, cada banco privado deixa de guiar sua política por sua reserva de ouro particular; todos os bancos agora estão atados à ação do Banco Central, e por ela são regulados. O Banco Central, além disso, ao proclamar sua função de “emprestador de última instância” aos bancos em dificuldades, aumenta enormemente a confiança do público no sistema bancário, porque todos presumem tacitamente que o governo jamais permitiria que seu próprio órgão — o Banco Central — falisse. Um Banco Central, mesmo no padrão ouro, pouco tem a temer quanto a demandas de ouro de seus próprios cidadãos. Somente fugas do ouro para países estrangeiros (isso é, para não-clientes do Banco Central) poderiam causar preocupação.
O governo assegurou que o Federal Reserve controlaria os bancos (1) dando ao Federal Reserve System (FRS) o monopólio da emissão de cédulas; (2) obrigando todos os “bancos nacionais” que existiam a juntar-se ao Federal Reserve System, e a manter todas as suas reservas legais como depósitos no Federal Reserve[24]; e (3) fixando a proporção mínima entre reservas de depósitos no FRS e reservas de depósitos bancários (moeda em poder do público). Além disso, o estabelecimento do FRS foi inflacionário ao reduzir diretamente as exigências existentes relativas às proporções de reservas mínimas.[25] O FRS podia então controlar o volume de dinheiro regulando duas coisas: o volume de reservas bancárias e as reservas mínimas exigidas por lei. O FRS pode regular o volume de reservas bancárias (de maneiras que serão explicadas posteriormente), e o governo estabelece a proporção legal, ainda que se admita que o controle sobre a oferta monetária não é perfeito, uma vez que os bancos podem manter “um excesso de reservas”. Normalmente, porém, garantido pela existência de um emprestador de última instância, e lucrando por maximizar seus ativos e depósitos, cada banco se manterá totalmente “emprestado” até o limite da proporção legal.
Enquanto o sistema bancário desregulamentado privado seria mantido dentro de estreitos limites e seria muito menos inflacionário do que a manipulação do Banco Central[26], a maneira mais clara de impedir a inflação é criminalizar o sistema bancário de reserva fracionária, e impor uma reserva mínima de 100% de ouro a todas as notas e depósitos. Por exemplo, não é provável que surgissem cartéis bancários em sistemas desregulamentados ou “livres”, mas mesmo assim eles poderiam aparecer. O professor Mises, ao mesmo tempo que reconhece os méritos econômicos superiores do sistema de 100% de reservas de ouro ao sistema bancário livre, prefere este último porque reservas de 100% outorgariam ao governo o controle bancário, e o governo poderia facilmente mudar essas exigências para conformar-se a seu viés inflacionista.[27] Mas um sistema de 100% de reservas mínimas em ouro não seria apenas mais um controle administrativo do governo; seria parte da proibição libertária jurídica à fraude. Todos, excetuando os pacifistas absolutos, admitem que a violência contra a pessoa e a propriedade deve ser criminalizada, e que as agências governamentais, operando sob essa lei geral, deveriam defender pessoas e propriedades de ataques. Os libertários, defensores do laissez-faire, acreditam que os “governos” deveriam restringir-se a ser meras agências de defesa. A fraude equivale ao roubo, porque a fraude é cometida quando uma parte de um contrato de troca é deliberadamente não cumprida após a propriedade do outro ter sido tomada. Os bancos que emitem recibos de ouro inexistente estão na verdade cometendo fraude, porque nesse caso é impossível que todos os proprietários (de títulos de ouro) resgatem sua legítima propriedade. Portanto, a proibição dessas práticas não seria um ato de intervenção do governo no livre mercado; seria parte da defesa jurídica geral da propriedade contra ataques, o que é uma exigência de um mercado livre.[28], [29]
Qual teria sido, então, a política governamental correta durante a década de 1920? O que o governo deveria ter feito para impedir o crash? A melhor política teria sido fechar o Federal Reserve System, e estabelecer um sistema de 100% de reservas monetárias em ouro; se não isso, deveria fechar o FRS e deixar os bancos privados sem regulação, mas sujeitos à falência imediata e rigorosa se não pudessem resgatar suas notas e depósitos. Se não tomasse essas medidas drásticas, e considerando a existência do Federal Reserve System, qual deveria ter sido sua política? O governo deveria vigiar permanentemente para não inflacionar a expansão do crédito nem permitir que ela fosse inflacionada. Vimos que o Fed — o Federal Reserve System — não tem controle absoluto da moeda porque não pode forçar os bancos a emprestar até o limite de suas reservas; mas tem controle anti-inflacionário absoluto sobre o sistema bancário, porque tem o poder de reduzir as reservas a seu bel prazer, e com isso forçar os bancos a parar de inflacionar, e até a contrair, se necessário. Seja reduzindo o volume de reservas bancárias, seja aumentando as reservas mínimas exigidas, o governo federal, na década de 1920 assim como hoje, tem o poder absoluto de impedir qualquer aumento no volume total de dinheiro e de crédito. É verdade que o FRS não tem controle direto sobre criadores de moeda como as caixas econômicas, as associações financeiras e companhias de seguros de vida, mas qualquer expansão do crédito vinda dessas fontes poderia ser contrabalançada pela pressão deflacionária sobre os bancos comerciais. Isso é especialmente verdade porque os depósitos dos bancos comerciais (1) formam a base monetária para o crédito estendido às demais instituições financeiras e (2) são a parte da oferta monetária que circula mais ativamente. Considerando o Federal Reserve System e seu poder absoluto sobre a moeda nacional, cabe o governo federal, desde 1913, assumir toda a responsabilidade por qualquer inflação. Os bancos não podem inflacionar sozinhos; toda expansão de crédito só pode acontecer com o apoio e a aquiescência do governo federal e suas autoridades no Federal Reserve. Os bancos na prática são joguetes do governo, e isso desde 1913. Qualquer culpa pela expansão do crédito e pela consequente depressão cabe exclusivamente ao governo federal, e somente a ele.[30]
Problemas na teoria austríaca do ciclo econômico
A “presunção” de pleno emprego
Antes de passar à discussão de teorias alternativas do ciclo econômico, é preciso esclarecer diversas concepções equivocadas consagradas pelo tempo. Duas delas já foram refutadas pelo professor Mises: (1) que a teoria austríaca “presume” a existência prévia do “pleno emprego”, e portanto não vale se a expansão do crédito começa enquanto há fatores desempregados, e (2) que a teoria descreve o boom como período de “sobre-investimento”. Sobre o primeiro ponto, os fatores desempregados podem ser ou trabalho ou bens de capital. (Sempre haverá terra desempregada, sub-marginal, disponível.) A inflação só vai empregar fatores de trabalho se seus proprietários, apesar de, em outras circunstâncias, poderem ficar esperando um salário real maior do que aquele que o livre mercado pode oferecer, cometam a burrice de aceitar um salário real menor se ele for camuflado por um aumento no custo de vida. Quanto aos bens de capital ociosos, estes podem ter sido total e irremediavelmente mal investidos num boom anterior (ou em algum outro momento) e estarem irremediavelmente perdidos por muito tempo ou para sempre. Uma expansão do crédito pode fazer parecer que o capital sub marginal seja lucrativo novamente, mas isso também será um mal-investimento, e o erro agora ainda maior será revelado quando o boom acabar. Assim, a expansão do crédito gera o ciclo econômico existindo fatores desempregados ou não. A expansão do crédito em meio ao desemprego criará mais distorções e mal-investimentos, retardará a recuperação do boom anterior, e fará com que uma recuperação mais rigorosa seja necessária no futuro. Se é verdade que os fatores desempregados não são agora desviados de usos mais valiosos como seriam os fatores empregados (já que eles estavam ociosos por causa da especulação, ou mal-investidos em vez de empregados), os outros fatores complementares serão desviados para trabalhar com eles, e esses fatores serão mal-investidos e desperdiçados. Além disso, todos os demais efeitos distorcivos da expansão de crédito se seguirão, e será necessária uma depressão para corrigir a nova distorção.[31]
“Sobre-investimento”ou “mal-investimento”?
A segunda concepção equivocada, tornada corrente por Haberler em seu famoso Prosperity and Depression, diz que a descrição misesiana do boom é uma teoria do “sobre-investimento”.[32] Mises demonstrou brilhantemente o erro desse rótulo. Como afirma Mises:
O investimento adicional só é possível na medida em que há uma oferta adicional de bens de capital disponíveis… O boom em si não resulta numa restrição, e sim num aumento no consumo, ele não obtém mais bens de capital para novos investimentos. A essência da expansão do boom de expansão do crédito não é um sobre-investimento, mas investimento equivocado, isso é, mal-investimento… numa escala para a qual os bens de capital disponíveis não são suficientes. Seus projetos são irrealizáveis por causa da oferta insuficiente de bens de capital… O fim inevitável da expansão do crédito faz com que os erros cometidos se tornem visíveis. Existem fábricas que não podem ser utilizadas porque não existem as fábricas necessárias para a produção dos fatores de produção complementares; fábricas cujos produtos não podem ser vendidos porque os consumidores antes preferem comprar outros bens, que, no entanto, não são produzidos em quantidades suficientes.
O observador percebe apenas os mal-investimentos que são visíveis e não nota que esses estabelecimentos são mal-investimentos só porque não existem outras fábricas — aquelas necessárias para a produção dos fatores de produção complementares e aquelas necessárias para a produção de bens de consumo mais urgentemente demandados pelo público… A classe empresarial inteira fica como que na posição de um construtor [que]… superestima a quantidade da oferta disponível [de materiais]… supervisiona a construção das fundações… e só depois descobre… que não tem o material necessário para completar a estrutura. É óbvio que o erro de nosso construtor não foi um sobre-investimento, mas um [investimento] inapropriado.[33]
Alguns críticos insistiram que, se o boom continuar por tempo suficiente, esses processos podem enfim “completar-se”. Mas isso é interpretar a metáfora de modo excessivamente literal. O importante é que a expansão do crédito distorce o investimento ao dirigir uma parte excessiva do capital disponível para as ordens superiores de produção, deixando uma parte pequena demais para as ordens inferiores. O mercado desimpedido garante que uma estrutura complementar de capital se desenvolva harmoniosamente; a expansão do crédito bancário trava o mercado e destrói os processos que criam uma estrutura equilibrada.[34]Quanto mais longo for o boom, maiores serão as distorções e os mal-investimentos.
Bancos: ativos ou passivos?
Durante a década de 1930, houve muito interesse nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, pela teoria de Mises do ciclo econômico, interesse que infelizmente teve morte prematura, causada pela empolgação com a “revolução keynesiana”. Os adeptos estavam divididos em torno de uma questão importante: Mises dizia que o ciclo sempre é gerado por um sistema bancário intervencionista, e seus seguidores diziam que com frequência os bancos erram por ser passivos e não elevar suas taxas de juros rápido o suficiente.[35] Os adeptos diziam que, por alguma razão, a “taxa natural” de juros poderia subir, e que os bancos, que afinal não são oniscientes, poderiam inadvertidamente causar o ciclo simplesmente por manter sua taxa de juros antiga, que agora estaria abaixo da taxa de livre-mercado.
Em defesa da posição “anti-bancos” de Mises, devemos em primeiro lugar observar que a taxa de juros natural, ou “taxa de lucros” não sobe de repente por causa de vagas melhorias em “oportunidades de investimento”. A taxa natural aumenta porque as preferências temporais sobem.[36] Mas como podem os bancos forçar no mercado taxas de juros abaixo das taxas do livre mercado? Somente expandindo seu crédito! Para evitar o ciclo econômico, então, não é necessário que os bancos sejam oniscientes; eles só precisam abster-se de expandir o crédito. Se eles se abstiverem, os empréstimos feitos com seu próprio capital não vão expandir a oferta monetária, mas simplesmente assumir seu lugar entre outras poupanças como um dos determinantes da taxa de juros do livre mercado.[37]
Hayek acredita que a teoria de Mises é de algum modo deficiente porque é exógena — porque ela afirma que a geração de ciclos econômicos deriva dos atos intervencionistas e não de atos do próprio mercado. Eis um raciocínio difícil de compreender. Ou os processos são analisados da maneira correta, ou da incorreta; o único teste de qualquer análise é sua verdade, e se é exógena ou endógena. Se o processo é realmente exógeno, então a análise deveria revelar esse fato; o mesmo vale para os processos endógenos. A teoria não ganha nenhuma virtude particular por ser exógena ou endógena.
Recorrência dos ciclos
Outra crítica comum afirma que a teoria de Mises consegue explicar qualquer ciclo de prosperidade e depressão individualmente, mas não explica outro fenômeno familiar dos ciclos econômicos — sua perpétua recorrência. Por que um ciclo começa quando o outro termina? Contudo, a teoria de Mises explica sim a recorrência, e sem exigir que adotemos a hipótese conhecida, mas jamais provada, de que os ciclos “geram a si próprios” — que certos processos misteriosos dentro de um ciclo levam a outro ciclo sem tender a uma condição de equilíbrio. O pressuposto da autogeração viola a lei geral da tendência da economia para o equilíbrio, ao passo que a teoria de Mises pela primeira vez consegue integrar a teoria do ciclo econômico na concepção estrutural da teoria econômica. A recorrência vem do fato de que os bancos sempre tentarão inflacionar o crédito se puderem, e o governo quase sempre vai apoiá-los e incentivá-los. Os lucros bancários derivam principalmente da expansão do crédito, e por isso eles tenderão a inflacionar o crédito o máximo que puderem, até serem freados.[38] O governo também é intrinsecamente inflacionário. Os bancos são forçados a interromper sua expansão do crédito por causa da força combinada das fugas externas e internas, e, durante a deflação, as fugas, e os temores de falência, forçam-nos a contrair o crédito. Quando acaba a tempestade e chega a recuperação, os bancos e os governos têm novamente a liberdade de inflacionar, e começam a fazê-lo. Daí a recorrência contínua dos ciclos econômicos.
Mudanças no ouro e o ciclo
Em um ponto importante da teoria dos ciclos econômicos este autor é relutantemente forçado a tomar um caminho distinto do de Mises. Em Ação Humana, Mises primeiro investigou as leis de uma economia de livre mercado, e depois analisou as diversas formas de intervenção coerciva no livre mercado. Ele admite que tinha considerado relegar a teoria do ciclo econômico para a parte sobre intervenção, mas depois manteve a discussão na parte do volume sobre o livre mercado. Ele fez isso porque acreditava que um ciclo de boom e recessão também poderia ser gerado por um aumento da moeda em ouro, desde que o ouro entrasse no mercado de empréstimos antes de seus efeitos de aumentos de preços se completarem. Claro que, na prática, a faixa potencial desses efeitos cíclicos é fortemente limitada: a oferta de ouro é limitada pelas fortunas da mineração de ouro, e apenas uma fração do novo ouro entra no mercado de empréstimos antes de influenciar preços e salários. Mesmo assim, resta um importante problema teórico: será que é possível que um ciclo de boom e depressão em qualquer grau seja gerado numa economia que siga 100% o padrão-ouro? Pode um mercado livre puro passar por ciclos econômicos, mesmo que limitados em sua extensão? Uma distinção crucial entre uma expansão de crédito e a entrada de novo ouro no mercado de empréstimos é que a expansão do crédito bancário distorce o reflexo do mercado dos padrões das preferências temporais voluntárias; o influxo de ouro corporifica mudanças na estrutura das preferências temporais voluntárias. Descartando quaisquer mudanças permanentes na distribuição de renda causadas pela mudanças no ouro, as preferências temporais podem cair temporariamente durante o período de transição, antes que o efeito da maior quantidade de ouro no sistema de preços se complete. (Por outro lado, as preferências temporais podem temporariamente aumentar.) É esse o caso observado por Mises.
Eis um exemplo em que se pode esperar que a poupança primeiro aumente e depois diminua. Certamente pode haver outros casos em que as preferências temporais vão mudar subitamente no livre mercado, primeiro caindo, depois subindo. Essa última mudança sem dúvida causará uma “crise” e um reajuste temporário aos mal-investimentos, mas seria mais adequado considerá-los flutuações irregulares como os ciclos econômicos do que processos regulares dele. Além disso, os empreendedores são treinados para avaliar as mudanças e evitar os erros. Eles podem enfrentar flutuações irregulares, e certamente deveriam ser capazes de lidar com os resultados de um influxo de ouro, resultados que são mais ou menos previsíveis. Eles não poderiam prever os resultados de uma expansão do crédito, porque a expansão do crédito interferiu em todas as suas referências, distorceu as taxas de juros e os cálculos de capital. Essa interferência não acontece quando há um influxo de ouro na economia, e a capacidade normal de previsão dos empreendedores pode funcionar a pleno vapor. Devemos, portanto, concluir que não podemos aplicar o rótulo de “ciclo econômico” a quaisquer processos do livre mercado. Certamente ocorrerão flutuações irregulares em resposta a mudanças nas preferências e nos recursos do consumidor, e às vezes seu resultado serão perdas agregadas. Mas a distorção regular e sistemática que invariavelmente termina num aglomerado de erros econômicos e na depressão — o fenômeno característico dos “ciclo econômico” — só pode vir da intervenção do sistema bancário no mercado.[39]
[1] Diversos neokeynesianos têm teorias cíclicas avançadas. Elas se integram, porém, não com a teoria econômica geral, mas com os sistemas holísticos keynesianos – sistemas que realmente são muito parciais.
[2] Por exemplo, na conhecida discussão de Haberler não há o menor sinal de que ela seja conhecida. Ver Gottfried Haberler, Prosperity and Depression (2a ed., Genebra, Suíça: Liga das Nações, 1939).
[3] F. A. Harper, Why Wages Rise (Irvington-on-Hudson, NY: Foundation for Economic Education, 1957), pp. 118–19.
[4] Siegfried Budge, Grundzüge der Theoretische Nationalökonomie (Jena, 1925), apud Simon S. Kuznets, “Monetary Business Cycle Theory in Germany”, Journal of Political Economy (abril de 1930): 127–28.
Nas condições de livre concorrência… o mercado… depende da oferta e da demanda… [não] poderia surgir uma desproporção na produção de bens, o que poderia sugar o sistema econômico inteiro… essa desproporção só pode surgir quando, em algum momento decisivo, a estrutura de preços não se baseia no jogo da competição livre, possibilitando alguma influência arbitrária.
O próprio Kuznets critica a teoria austríaca a partir desse ponto de vista empirista, anti-causa-e-efeito, e também erroneamente considera que essa teoria é “estática”.
[5] Essa é a “teoria da preferência temporal pura” da taxa de juro; ela pode ser encontrada em Ludwig von Mises, Human Action (New Haven, Conn: Yale University Press, 1949) [Ação humana (trad. Donald Stewart Jr.. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990)]; em Frank A. Fetter, Economic Principles (Nova York: Century, 1915), e idem, “Interest Theories Old and New”, American Economic Review (março de 1914): 68–92.
[6] Os “bancos”, para diversos propósitos, incluem também associações de poupança e de crédito; e também companhias de seguro de vida, pois ambas criam novo dinheiro por meio da expensão do crédito para a economia. Ver abaixo a discussão mais extensiva da questão da moeda e dos bancos.
[7] Sobre a estrutura da produção, e sua relação com o investimento e com o crédito bancário, ver F. A. Hayek, Prices and Production (2a ed., Londres: Routledge and Kegan Paul, 1935); Mises, Human Action e Eugen von Böhm-Bawerk, “Positive Theory of Capital”, em Capital and Interest (South Holland, Illinois: Libertarian Press, 1959), vol 2.
[8] “Inflação” se define aqui como aumento da oferta de moeda que não consiste de uma expansão no metal de que se faz a moeda.
[9] Essa teoria “austríaca” dos ciclos resolve a antiga controvérsia econômica a respeito de mudanças na quantidade de dinheiro alterarem ou não a taxa de juros. Ela apoia a teoria “moderna” de que um aumento na quantidade de dinheiro reduz a taxa de juros (se esse dinheiro entra pelo mercado de crédito); por outro lado, ela apoia a visão clássica de que, a longo prazo, a quantidade de dinheiro não afeta a taxa de juros (ou que só pode afetar se as preferências temporais mudarem). Na verdade, o reajuste depressivo é o retorno do mercado à taxa de juros desejada pelo livre mercado.
[10] Com frequência se diz que, como as empresas só conseguem encontrar poucas oportunidades de lucro durante uma depressão, a demanda empresarial por empréstimos cai, e por isso os empréstimos e a oferta monetária se contraem. Mas esse argumento negligencia o fato de que os bancos, se quiserem, podem comprar securities [bônus, ações], e assim, aumentando seus investimentos para compensar pelos empréstimos minguantes, mantêm a oferta monetária. A pressão contracionista, portanto, sempre vem dos bancos e não das empresas mutuárias.
[11] Os bancos são “intrinsecamente falidos” porque emitem muito mais recibos bancários (hoje sob a forma de “depósitos” resgatáveis em dinheiro, sob demanda) do que o dinheiro que possuem disponível. Por isso estão sempre vulneráveis a corridas bancárias. Essas corridas não são como outras falências econômicas, porque consistem em nada mais do que uma demanda, por parte dos depositários, por aquilo que é sua legítima propriedade, que os bancos não possuem. “Falência intrínseca”, portanto, e uma característica essencial de qualquer sistema bancário de reserva fracionária. Nas palavras de Frank Graham:
A tentativa dos bancos de realizar os objetivos incompatíveis de emprestar dinheiro, ou meros títulos que dão direito a dinheiro, e ainda alegar que esse dinheiro está disponível para quem demandá-lo é ainda mais absurda do que… comer um bolo e esperar comer o mesmo bolo no futuro… A suposta convertibilidade é um delírio que depende de os direitos não serem exercidos indevidamente.
Frank D. Graham, “Partial Reserve Money and the 100% Proposal”, American Economic Review (setembro de 1936): 436.
[12] Num país com padrão ouro (como os Estados Unidos durante a depressão de 1929), os economistas austríacos aceitaram que a contração do crédito era talvez um preço necessário para poder continuar no ouro. Mas poucos viram quaisquer virtudes corretivas no processo de deflação em si.
[13] Alguns leitores podem perguntar: por que a contração do crédito não leva a mal-investimentos ao causar um sobre-investimento em bens de ordens inferiores e um sub-investimento em bens de ordens superiores, revertendo assim as consequências da expansão do crédito? A resposta vem da análise austríaca da estrutura da produção. A escolha entre investir em bens de ordens superiores ou inferiores não é arbitrária. Qualquer ampliação nos investimentos tem de ser feita em bens de ordens superiores, tem de alongar a estrutura de produção. A redução nos investimentos na economia simplesmente reduz o capital de ordem superior. Assim, a contração do crédito causará não o excesso de investimento nas ordens inferiores, mas simplesmente uma estrutura mais curta do que aquela que se teria estabelecido.
[14] Numa economia de padrão ouro, a contração do crédito é limitada pelo estoque total de ouro.
[15] Nos últimos anos, especialmente na literatura a respeito dos “países subdesenvolvidos”, houve muita discussão a respeito do “investimento” do governo. Todavia, esse investimento não existe. “Investimento” se define como gastos feitos não para a satisfação direta daqueles que o fazem, mas para outros consumidores, que serão os consumidores finais. As máquinas são produzidas não para servir ao empreendedor, mas para servir aos consumidores finais, que, por sua vez, remuneram os empreendedores. Mas o governo adquire seus fundos tomando-os de indivíduos privados; o gasto dos fundos, portanto, atende aos desejos de autoridades governamentais. As autoridades governamentais transferiram pela força a produção que iria satisfazer consumidores privados para a satisfação deles mesmos; seu gasto é portanto puro consumo, e não há como torcer o termo “investimento” para referir esse gasto. (Claro que, na medida em que as autoridades governamentais não percebem isso, seu “consumo” é na verdade um gasto em desperdícios.)
[16] Para saber mais sobre os problemas do sistema bancário de reservas fracionárias, ver abaixo.
[17] Ver W. H. Hutt, “The Significance of Price Flexibility”, em Henry Hazlitt, ed., The Critics of Keynesian Economics (Princeton, NJ: D. Van Nostrand, 1960), pp. 390–92.
[18] Agradeço ao senhor Ra C. Heiple. II, por me chamar a atenção para isso.
[19] Poderia o governo aumentar a proporção entre investimento e consumo elevando os impostos de algum modo? Ele não poderia cobrar impostos somente sobre o consumo nem se quisesse; pode-se demonstrar (e o professor Harry Gunnison Brown fez um enorme esforço para demonstrá-lo) que qualquer imposto que pretenda atingir apenas o “consumo” se torna, no mercado, um imposto sobre as rendas, ferindo tanto a poupança quanto o consumo. Se presumirmos que os pobres consomem uma proporção maior de sua renda do que os ricos, podemos dizer que um imposto para os pobres usado para subsidiar os ricos vai aumentar a proporção entre poupança e consumo e assim ajudar a curar uma depressão. Por outro lado, os pobres não têm preferências temporais superiores às dos ricos, e os ricos podem perfeitamente tratar os subsídios governamentais como um lucro inesperado a ser consumido. Além disso, Harold Lubell afirma que os efeitos de uma mudança na distribuição de renda para o consumo da sociedade seriam desprezíveis, mesmo quando a proporção absoluta do consumo é maior entre os pobres. Ver Harry Gunnison Brown, “The Incidence of a General Output or a General Sales Tax”, Journal of Political Economy (abril de 1939); 254–62; Harold Lubell, “Effects of Redistribution of Income on Consumers’ Expenditures”, American Economic Review (março de 1947): 157–70.
[20] A defesa de qualquer política governamental tem de basear-se, em última análise, num sistema de princípios éticos. Neste livro não se tenta discutir ética. Aqueles que desejarem prolongar uma depressão, por quaisquer razões, naturalmente vão apoiar com entusiasmo essas intervenções governamentais, assim como aqueles cuja prioridade é aumentar o poder nas mãos do estado.
[21] Para o tratamento clássico da hiperinflação, ver Costantino Bresciani-Turroni, The Economics of Inflation (Londres: George Allen and Unwin, 1937).
[22] Ver Mises, Human Action, pp. 429–45, e The Theory of Money and Credit (New Haven, Conn.: Yale University Press, 1953).
[23] Quando o ouro – que anteriormente compunha as reservas bancárias – é transferido para um banco central recém-estabelecido, este mantém apenas uma reserva fracionária, e assim a base total de crédito e a oferta monetária potencial são ampliadas. Ver C. A. Phillips, T. F. McManus e R. W. Nelson, Banking and the Business Cycle (Nova York: Macmillan, 1937), pp. 24ss.
[24] Muitos “bancos estaduais” foram induzidos a participar do FRS por apelos patrióticos e por ofertas de serviços gratuitos. Mesmo os bancos que decidiram não participar são, porém, controlados de facto pelo FRS, porque, para obter papel-moeda, eles precisam manter reservas em algum banco membro.
[25] A média das reservas mínimas de todos os bancos antes de 1913 estava estimada em cerca de 21%. Em meados de 1917, quando o FRS já estava plenamente formado, a proporção média exigida era de 10%. Philips et al. estimam que o impacto inflacionário intrínseco do FRS (observado duas notas atrás) triplicou a capacidade expansionista do sistema bancário. Assim, os dois fatores (o impacto intrínseco e a redução deliberada das reservas mínimas) combinaram-se para inflacionar o potencial monetário do sistema bancário americano como resultado da criação do FRS. Ver Phillips et al., Banking and the Business Cycle, pp. 23ss.)
[26] Os horrores do “wildcat banking” nos Estados Unidos antes da Guerra Civil derivaram de dois fatores, ambos originados do governo e não do sistema bancário livre: (1) Desde os primórdios do sistema bancário, em 1814 e em todas as corridas que se seguiram, os governos estaduais permitiram que os bancos continuassem a operar, fazendo e cobrando empréstimos etc., sem ter de oferecer seu resgate em espécie. Em suma, os bancos tinham o privilégio de operar sem pagar suas obrigações. (2) Proibições de filiais bancárias em outros estados (que ainda existem), junto com o transporte ruim, impediam que os bancos demandassem o resgate imediato de suas notas de bancos distantes. [Nota de Leandro Roque: Bancos wildcat eram bancos que emitiam suas próprias notas bancárias (papel-moeda). Muitos desses bancos foram organizados mais com o propósito de emitir notas do que receber depósitos e fazer empréstimos. Muitos falharam. O nome vem do fato de eles estarem localizados em áreas de difícil acesso, habitadas por gatos selvagens.]
[27] Mises, Human Action, p. 440.
[28] Uma analogia comum diz que os bancos simplesmente contam com o fato de que as pessoas não vão redimir toda a sua propriedade de uma vez, e que os engenheiros que constroem pontes também trabalham com a premissa de que nem todo mundo numa cidade vai querer cruzar a ponte ao mesmo tempo. Mas esses exemplos são totalmente diferentes. As pessoas que cruzam uma ponte estão simplesmente pedindo um serviço; elas não estão tentando tomar posse de sua legítima propriedade, assim como os depositantes bancários. Uma analogia mais adequada defenderia os fraudadores que nunca seriam pegos se ninguém fosse inspecionar seus registros. O crime acontece quando o roubo ou a fraude são cometidos, não quando enfim são descobertas.
[29] Talvez um sistema jurídico libertário considerasse que “recibos gerais de depósitos” (que permitem que um armazém devolva qualquer bem homogêneo ao depositante) são “recibos específicos de depósito”, que, como os recibos de cargas, as cautelas de penhores, recibos de docas etc., estabelecem a propriedade de objetos específicos e identificados. Nas palavras de Jevons, “costumava-se aceitar, como regra geral de direito, que qualquer atribuição ou doação de bens inexistentes não tinha eficácia”. Ver W. Stanley Jevons, Money and the Mechanism of Exchange (Londres: Kegan Paul, 1905), pp. 207–12. Para uma excelente discussão dos problemas de um sistema de reserva fracionária de dinheiro,ver Amasa Walker, The Science of Wealth (3aed., Boston: Little, Brown, 1867), pp. 126–32, especialmente pp. 139–41.
[30] Alguns autores fazem muito barulho a respeito da ficção jurídica de que os bancos membros são “donos” do Federal Reserve System. Na prática, isso significa simplesmente que esses bancos pagam impostos para ajudar a pagar pelo funcionamento do Federal Reserve. Se os bancos privados realmente são “donos” do Fed, então como suas autoridades são nomeadas pelo governo, e seus “proprietários” são obrigados a “possuir” o Federal Reserve por força de um estatuto governamental? Os bancos do Federal Reserve deveriam ser considerados nada mais do que agências governamentais.
[31] Ver Mises, Human Action, pp. 576–78. O professor Hayek, em sua conhecida (e excelente) exposição da teoria austríaca, logo mostrou como a teoria se aplica inteiramente à expansão do crédito em meio a fatores desempregados. Hayek, Prices and Production, pp. 96–99.
[32] Haberler, Prosperity and Depression, cap. III.
[33] Mises, Human Action, pp. 556–57. Mises também refuta a antiga ideia de que o boom é caracterizado por uma conversão indevida de “capital em circulação” em “capital fixo”. Se isso fosse verdade, então a crise revelaria uma carência de capital em circulação, e aumentaria enormemente os preços de, por exemplo, matérias primas para a indústria. Contudo, essas matérias primas estão precisamente entre aquelas que a crise revelou serem superabundantes, isso é, recursos que foram mal investidos no capital “em circulação” e também “fixo” nos estágios superiores da produção.
[34] Para uma estimulante discussão de alguns desses processos, ver Ludwig M. Lachmann, Capital and Its Structure (Londres: London School of Economics, 1956).
[35] Para a posição “pró-bancos” relativa a essa questão, ver F. A. Hayek, Monetary Theory and the Trade Cycle (Nova York: Harcourt, Brace, 1933), pp. 144–48; Fritz Machlup, Stock Market, Credit and Capital Formation (Nova York: Macmillan, 1940), pp. 247–48; Haberler, Prosperity and Depression, pp. 64–67. Para o outro lado, ver os breves comentários de Mises, Human Action, pp. 570, 789n; e Phillips et al. Banking and the Business Cycle, pp. 139ss.
[36] O erro dos seguidores vem de eles não adotarem a teoria da preferência temporal pura dos juros de Fetter e Mises, e de aferrarem-se a elementos ecléticos de “produtividade”em sua explicação dos juros. Ver as referências mencionadas na nota 13.
[37] Mises observa (Human Action, p. 789n) que se os bancos simplesmente reduzissem as cobranças de juros sobre seus empréstimos sem expandir o crédito, eles estariam dando presentes aos devedores, e não estariam gerando um ciclo econômico.
[38] Walker, The Science of Wealth, pp. 145ss.; ver também p. 159.
[Os b]ancos devem constantemente desejar aumentar seus empréstimos, emitindo seu próprio crédito na forma de circulação e de depósitos. Quanto mais eles conseguirem pôr para fora, maior a renda. É esse o motivo de poder que garante a expansão constante de uma moeda mista [de reserva fracionária] até o máximo limite possível. Os bancos sempre aumentarão seu endividamento enquanto puderem, e só o contrairão quando precisarem.
[39] Para uma análise um tanto similar dos fluxos de ouro internacionais, ver F. A. Hayek, Monetary Nationalism and International Stability (Nova York: Longmans, Green, 1937), pp. 24s. Ver também Walker, The Science of Wealth, p. 160.