A doença do ódio às máquinas
Indubitavelmente, não são frágeis as doenças intelectivas sofísticas que perpetuam a ignorância econômica na sociedade; porém, o ódio irracional às maquinas (aos auxiliadores capitalísticos de produção, como conceituava Eugen von Böhm-Bawerk) aparenta ser a absolutamente indestrutível entre as que se fazem notar.
Cabe, portanto, examiná-la, já que o problema que nela há é de natureza lógico-histórica e não somente proposicional, de forma que as bases sobre as quais se faz operar continuadamente se veem refutadas miseravelmente tanto pelos dados históricos quanto pela teoria econômica sólida.
As máquinas como fatores originários de novos empregos
O fator que naturalmente há de motivar a perpetuação dessa doença sofística diz respeito à crença popular de que a introdução de máquinas nos processos produtivos econômicos gera desemprego.
À luz do que preconiza a teoria econômica, porém, essa doença vê-se apartada da relevância que lhe é erroneamente delegada.
O capitalista (o empresário/especulador) obtém lucro à medida que, com sucesso, acresce valor à vida dos consumidores na forma de produtos e serviços. Portanto, o capitalista que não proporciona ao consumidor uma mercadoria valorada pelo mesmo superiormente ao seu dinheiro acaba por falir; e o indivíduo com capacidades aquisitivas apenas insuficientes à compra da mercadoria ofertada é impelido à abstenção da sua consecução, já que se o capitalista valorasse o dinheiro do indivíduo numa quantidade inferior ao preço que exige pela mercadoria, ele espontaneamente a poria num preço menor, o que implica que uma troca, sendo um evento fenomênico interativo, só se fará ocorrer se se mostrar rendosa a ambas as partes atuantes. Dessa forma, é vantajoso ao capitalista que o consumidor tenha poder aquisitivo, para que compre os seus bens e, assim, lucre; e é vantajoso ao consumidor que o capitalista oferte mais bens, para que possa acessá-los mais amplamente, de maneira mais barata, o que implica que é do interesse de ambos acrescer tanto quanto possível a oferta de bens disponível, já que, por um lado, o capitalista pode ver aumentada a sua clientela diminuindo o preço da sua oferta proporcionalmente aos acréscimos que nela se fizeram, tornando-a mais atrativa competitivamente, posto que é mais preferível ao consumidor comprar mais a menos bens, e já que, por outro, o consumidor terá acesso a bens dos quais não fruía anteriormente.
Ora, é sempre preferível ao homem suplantar o máximo possível das suas necessidades. O meio é, praxeologicamente, o que supre dado fim humano. Pelo fato, portanto, de os meios serem escassos, o número de finalidades humanas efetivamente alcançáveis sempre se verá limitado à quantidade de meios disposta ao controle do homem (forçando-o a escalá-las), o que implica que um aumento da quantidade de meios disponíveis (oferta disponível) sempre operará aumentando o número de fins efetivamente alcançáveis ao homem, o tornando, por conseguinte disso, mais feliz materialmente à proporção do montante quantitativo de finalidades que pode realisticamente alcançar.
Além do mais, a força de trabalho é um meio do qual dispõe o homem no processo de alcance da maioria das suas finalidades, o que implica que, ao poder dispender menos força de trabalho na consecução de um fim particular, o homem disporá de um excedente não previsto de força de trabalho com a qual poderá alcançar finalidades que antes não alcançava, o que o fará mais feliz materialmente; e o mesmo se dá com o meio tempo, isto é, quando a adição de um dado bem ao processo de supressão de um fim particular reduz o tempo necessário à consecução do mesmo, instantaneamente se dispõe ao homem um excedente de tempo por intermédio do emprego do qual poderá alcançar fins que antes lhe permaneciam completamente inacessíveis.
Ademais, os bens necessários à introdução de instrumentos capitalísticos sofisticados no processo de alcance de um fim particular devem ser valorados sempre inferiormente ao montante de bens totalmente novo que a tal introdução é capaz de adicionar ao disponível, posto que, contrariamente, a introdução de instrumentos capitalísticos sofisticados em questão não seria compensatória, já que não proveria ao homem um adicional de meios valorizável; o que implica que, p. ex., um capitalista somente introduzirá instrumentos capitalísticos mais sofisticados no processo de produção das suas mercadorias se um excedente destas, resultante de tal introdução, for vendável, isto é, somente se as mercadorias produzidas adicionalmente pela introdução de novos auxiliadores capitalísticos de produção acrescerem valor à vida dos consumidores – i. e., apenas se elas tornarem mais felizes os consumidores (seja por, em função do aumento da oferta com referência à demanda, estarem mais baratas, o que naturalmente possibilita a aquisição duma maior quantidade de bens; ou seja por serem qualitativamente mais súperas (utilitariamente mais aprazíveis)).
As implicações econômicas do que até agora se expôs, no entanto, são melhor observáveis via exemplos.
Suponhamos que um capitalista descobriu um invento maquinal mediante a introdução produtiva do qual pode produzir a mesma quantidade de bens que produz empregando somente a metade da quantidade de funcionários que assalaria. Assim, de forma a evitar assalariar superfluamente, o capitalista resolve por reduzir a quantidade de funcionários da sua empresa desempregando a proporção que a introdução do referido invento tornou operacionalmente improfícua, o que implica que o número de desempregados local medrará proporcionalmente ao que o capitalista pôde, em função da inserção de ferramentas maquinais tecnologicamente mais avançadas, desempregar sem diminuir a montante de bens produzidos.
“Vislumbra a tragédia originada pelas máquinas!”, berra o sindicalista. No entanto, cabe nos atentar aos efeitos não imediatos da inserção do invento maquinal em questão no processo de produção da empresa do capitalista a que nos referimos.
Suponhamos, de primeiro, que o capitalista não reduza o preço dos bens que oferta de forma a fruir privativamente do aumento da diferença entre o preço de custo e o de venda do bem ofertado adicionando às suas economias pessoais um montante totalmente novo de bens simétrico ao que pôde poupar desempregando certa quantidade de funcionários que, em decorrência de avanços técnicos, passaram a operar apenas superfluamente e ou de maneira não compensatória ao pagamento dos seus salários.
A princípio, há de parecer que a introdução produtiva do novo invento maquinal em questão beneficia somente o capitalista, o qual, nota-se, pôde melhorar grandemente as suas economias pessoais acrescendo às mesmas o montante de bens que poupou com o desemprego dos que o novo invento tornou inteiramente inúteis.
Entretanto, fato é que o ponto fundamental aqui está em quais destinos o capitalista pode possivelmente delegar ao aumento das suas economias pessoais, que o emprego do novo invento em foco possibilitou.
O capitalista pode, assim, por um lado, poupar o que pôde deduzir do desemprego da metade dos seus antigos funcionários, que tornou-se inaproveitável produtivamente em função da introdução do novo invento, podendo, conseguintemente, desse modo, adicionar à poupança uma quantidade de bens simétrica à que derivou do desemprego dos seus funcionários mais improficientes, de modo que a taxa de juros, configurada pela relação oferta-demanda de crédito, se vê reduzida de forma inversamente proporcional ao que se acresceu à oferta de crédito (poupança) disponível, posto que a oferta de crédito aumentou com referência à demanda, o que opera viabilizando empreendimentos produtivos antes impraticáveis financeiramente; e, em lembrança do fato de que o que se fez acresceu à oferta de crédito é simétrico ao que o capitalista pôde poupar e, idem, do fato de que o que ele pôde poupar se mostra só proporcionalmente ao que desempregou, posto que guardou o que deixou de pagar como salário aos que se tornaram desempregáveis (improdutivos) pela inserção do novo invento, é sabido que tais empreendimentos, por terem as suas respectivas viabilidades resultadas do que se acresceu à oferta de crédito (poupança), empregarão, muito provavelmente, uma quantidade de funcionários quantitativamente quase idêntica à que o capitalista desempregou.
É-nos, em contrapartida, um tanto quanto incorreto presumir que os novos empreendimentos produtivo-empresariais empregarão a exata mesma quantidade de funcionários que o capitalista em foco desempregou, mas dado que foram viabilizados pela diminuição da taxa de juros, que se faz apenas simetricamente ao aumento da poupança, decorrente da melhora das economias pessoais do capitalista, dada em função do desemprego dos funcionários que o novo invento referido tornou improfícuos no processo produtivo sobre o qual introduziu-se, seria inteiramente não razoável pressupor que a quantidade de funcionários empregados por esses novos empreendimentos fosse descomedidamente destoante da desempregada pelo capitalista; o que implica que os ganhos econômicos oriundos da inserção do novo invento são apenas muito momentaneamente privados ao capitalista, já que hão de se socializar naturalmente ao curso de uma extensiva rede mercadológica em forma de novos empreendimentos, novos empregos, consequentemente, e em forma de uma maior oferta de bens, uma vez que tais novos empreendimentos predominarão, por efeito de fatores puramente concorrenciais, somente enquanto ofertantes producentes e não enquanto desperdiçadores de bens de capital.
O capitalista, por outro lado, pode, por efeito da melhora das suas economias pessoais, simplesmente consumir mais, gastando o que deduziu do desemprego da metade dos seus funcionários em bens de consumo direcionados à melhora do seu padrão de vida. Estará, portanto, comportando-se desse modo, a estimular a demanda à proporção do adicional de bens que lhe dispôs a inserção do referido novo invento no processo de produção da sua empresa, o que implica que os produtores dos bens que o capitalista cogita comprar, diante de um aumento repentino da demanda das suas mercadorias, se verão naturalmente impelidos a empregar um montante comparavelmente maior de funcionários para pô-los na linha de frente do processo de produção, de modo a alinhá-la à nova demanda em voga, maior que a anterior.
O capitalista, pela inserção do novo invento referido no processo de produção da sua empresa, por um lado, desemprega funcionários, mas, por outro, ao demandar mais, faz com que os produtores doutros setores necessitem de empregar mais funcionários para suprir as suas maiores necessidades de consumo; e como demandará mais somente à proporção da melhora das suas economias pessoais, e como esta faz-se apenas proporcionalmente ao que poupou desempregando um montante de funcionários tornado improdutivo pela introdução de um novo invento maquinal, certo é que a quantidade de recursos monetários mediante a qual demandará maiormente não será demasiadamente distinta da que mediante a qual os produtores estimulados empregarão novos funcionários nas suas linhas produtivas de modo a medrá-las ao ponto no qual exige a maior demanda.
Senhores, o “desemprego” gerado pelas máquinas, além de ser extremamente temporário, configura um fruto de um avanço econômico, posto que, num cenário, temos um certo número de postos de trabalho e condições aquisitivas não muito variáveis e, noutro, temos, no mínimo, um número quase igual de postos de trabalho e condições aquisitivas melhores e/ou empreendimentos produtivos antes completamente inviáveis (em razão da redução da taxa de juros (preço do crédito), consequente da maior taxa de poupança, possibilitada pela introdução de meios de produção maquinais mais proficientes), sendo tais empreendimentos (empresas empregadoras, nota-se) mercadologicamente preponderantes só enquanto ofertantes de mercadorias utilitariamente aprazíveis aos indivíduos e não enquanto desperdiçadores de bens de capital; o que implica que, no último cenário, tem-se a mesma quantidade de bens que o capitalista produzia e mais o montante de bens que os tais novos empreendimentos produtivos, possíveis pelo aumento da quantidade de recursos capitalísticos disposta à poupança, acrescem à oferta disponível, elevando esta apreciavelmente em relação à demanda e, por conseguinte disso, diminuindo os preços dos bens, o que, por sua parte, opera os tornando mais acessíveis e elevando os salários reais de toda a população, apesar de os nominais se manterem inalterados.
Ora, não é o último cenário mais desejável aos quereres humanos que o primeiro?
Temos de nos lembrar, adicionalmente, que a diminuição do nível relativo dos preços, decorrente do aumento da oferta com referência à demanda gerado por esses novos empreendimentos, operará possibilitando aos indivíduos medrar as suas respectivas poupanças pessoais por poderem extrair um montante adicional de dinheiro da maior inferioridade dos preços dos bens em relação aos preços dos salários, o que, por sua vez, se dará diminuindo consideravelmente a taxa de juros, o que viabilizará financeiramente mais novos empreendimentos, os quais, pelas vias que lhe são próprias, gerarão novos empregos e ofertarão mais bens, o que operará diminuindo mais ainda os preços e assim por diante, fazendo, então, girar mais velozmente a grande roda do desenvolvimento econômico.
Logo, a introdução de máquinas mais profícuas que os homens no processo de produção de qualquer objeto útil há de ser vantajosa não somente ao capitalista, mas à sociedade em sua totalidade.
Note: o que nos impede de duvidar de que os novos empregos gerados se mostrarão quantitativamente insuficientes ao abarcamento do integral de desempregados é o fato de que não estamos a lidar somente com cadeias relacionais elementares, mas, acima de tudo, com simetrias.
Há o modo igualmente exemplificativo pelo qual Henry Hazlitt, em Economia Numa Única Lição, sintetiza o assunto, elucidando, ainda, que a dita não elasticidade da demanda está longe de ser um problema teoricamente apreciável:
“Suponhamos que um fabricante de roupas venha a saber da existência de uma máquina capaz de fazer sobretudos para homens e mulheres, pela metade da força trabalho que antes empregava. Instala a máquina e despede metade de seu operariado.
Isso, à primeira vista, parece evidente perda de emprego. Mas a própria máquina exigiu trabalho para ser construída; de sorte que, em compensação, foram criados empregos que, de outro modo, não existiriam. O fabricante, porém, somente adotará a máquina se ela fizer melhores roupas com metade da mão-de-obra, ou a mesma espécie de roupas por menor custo. Se admitirmos esse segundo ponto, não poderemos admitir que a quantidade de mão-de-obra para construção da máquina seja tão grande, em termos de folha de pagamento, quanto a quantidade de mão-de-obra que o fabricante de roupas espera, afinal, economizar, adotando a máquina; de outro modo não haveria economia e o fabricante de roupas não a teria adotado.
Tem-se ainda, portanto, que levar em conta, uma perda líquida de emprego. Mas devemos, pelo menos, lembrar a real possibilidade de que o primeiro efeito da introdução da maquinaria poupadora de trabalho pode ser, em última instância, o de aumentar o emprego, porque, geralmente, é só a longo prazo que o fabricante de roupas espera economizar dinheiro ao adotar a máquina; poderá levar vários anos até que a máquina “seja paga por si mesma”.
Depois que a máquina tiver produzido economia suficiente para compensar seu custo, o fabricante de roupas terá mais lucro que antes. (Admitiremos que ele apenas venda suas roupas pelo mesmo preço dos concorrentes e não faça esforço algum para vender mais barato que eles.) A essa altura, pode parecer que a mão-de-obra tenha sofrido perda líquida de emprego, ao passo que somente o fabricante, o capitalista, é quem tenha ganho. Mas é precisamente desse lucro extra que devem vir os subsequentes ganhos sociais. O fabricante estará usando esse lucro extra, em pelo menos, um destes três caminhos e, possivelmente, usará parte dele em todos três: 1) usará o lucro extra na expansão de suas operações, comprando outras máquinas para confeccionar maior número de casacos; ou 2) investirá o lucro extra em alguma outra indústria; ou 3) despenderá o lucro extra aumentando seu próprio consumo. Em qualquer uma das três direções estará aumentando o emprego.
Em outras palavras: o fabricante, como resultado de sua economia, tem lucros que antes não tinha. Todo dólar, que economizou em salários diretos com os antigos operários, tem agora que pagar, em salários indiretos, ou aos que fabricam a nova máquina ou a operários de outra indústria ou aos construtores de uma nova casa ou pelo automóvel que comprar para si ou pelas jóias e casacos de pele que adquirir para a esposa. Em qualquer caso (a menos que seja um simples amealhador), proporcionará, indiretamente, tantos empregos quantos os que deixou de proporcionar diretamente.
A questão, entretanto, não termina aqui. Se esse fabricante empreendedor, comparado com seus competidores, faz grandes economias, começará a expandir suas operações, a expensas deles, ou eles também começarão a comprar máquinas. Novamente, mais trabalho será dado aos fabricantes destas. Mas a concorrência e a produção começarão, então, a forçar a baixa do preço dos sobretudos. Dentro em breve não mais haverá lucros tão grandes para aqueles que adotam as novas máquinas. A taxa de lucro dos fabricantes que as empregam começa a cair, ao mesmo tempo em que os fabricantes, que ainda não as adotaram, talvez não obtenham lucro algum. As poupanças, em outras palavras, começarão a passar para os compradores de sobretudo — os consumidores.
Como, porém, os sobretudos são agora mais baratos, maior número de pessoas passa a comprá-los. Significa isso que, embora seja menor o número de pessoas necessárias para a fabricação da mesma quantidade anterior de sobretudos, maior número destes é feito agora. Se a demanda de sobretudos for o que os economistas denominam “elástica”— isto é, se uma queda no preço faz com que maior quantidade de dinheiro seja agora despendida em sobretudos— então, maior número de operários pode ser empregado na fabricação de sobretudos que antes da introdução das novas máquinas. Já vimos como isso na verdade aconteceu, historicamente, com as meias e com outros tecidos.
Mas o novo emprego não depende da elasticidade da demanda de determinada mercadoria. Suponhamos que, embora o preço dos sobretudos sofra um corte de quase 50%— um preço antigo de, digamos, US$150 cai para US$100—, não se venda um único sobretudo adicional. O resultado seria que, enquanto os consumidores estivessem bem providos de novos sobretudos, tanto quanto antes, cada comprador teria agora US$50 deixados de lado, o que antes não se verificava. Despenderá, portanto, esses US$50 em outra coisa, proporcionando, assim, aumento de empregos em outros ramos.
Em síntese: bem pesado tudo, as máquinas, os aperfeiçoamentos tecnológicos, a automação, as economias e a eficiência não deixam os homens sem trabalho.”
Ainda em Economia Numa Única Lição, apresenta dados históricos mais que plausíveis de o porquê de as premissas sindicalistas serem absolutamente insuportáveis:
“Para não irmos muito longe, consideremos The Wealth of Nations, de Adam Smith, livro publicado em 1776. O primeiro capítulo dessa notável obra intitula-se “Da divisão do trabalho”, e na segunda página desse primeiro capítulo o autor conta que um operário, não familiarizado com o uso da máquina utilizada numa fábrica de alfinetes, “dificilmente faria um alfinete por dia e, certamente, não poderia fazer vinte”, mas poderia, com o uso dessa máquina, fazer 4.800 por dia. Assim, já ao tempo de Adam Smith— que lástima!— a máquina havia posto fora de trabalho 240 a 4.800 operários fabricantes de alfinetes para cada um que permanecesse trabalhando. Na indústria de alfinetes já havia, se por causa das máquinas os homens ficassem sem trabalho, 99,98% de desemprego. Poderia haver situação mais negra que esta?
A situação podia tornar-se mais negra, pois a Revolução Industrial estava apenas na infância. Consideremos alguns dos incidentes e aspectos dessa revolução. Vejamos, por exemplo, o que aconteceu na indústria de meias. Ao serem introduzidas novas máquinas de meias, foram elas destruídas pelos operários manufatureiros (mais de 1.000 numa única desordem), incendiaram-se casas, os inventores foram ameaçados de morte e obrigados a fugir, e a ordem somente foi restabelecida depois de chamados os militares e presos ou enforcados os cabeças das desordens.
Ora, é importante ter em mente que, enquanto os desordeiros estavam pensando em seu futuro imediato ou, mesmo, em seu futuro mais remoto, sua oposição à máquina era racional, pois William Felkin, em History of the Machine— Wrought Hosiery Manufactures (1867), contanos (embora sua declaração não pareça plausível) que a maior parte dos 50.000 tecelões de meias inglesas e suas famílias não ficaram totalmente livres da fome e da miséria, causadas pela introdução da máquina, durante os quarenta anos seguintes. Mas quanto à crença dos desordeiros, cuja maioria estava indubitavelmente imbuída de que a máquina estava substituindo permanentemente os homens, era errada, pois antes do fim do século XIX a indústria de meias estava empregando pelo menos cem homens para cada um dos que empregara em começos daquele século. Arkwright inventou, em 1760, sua máquina de tecer algodão.
Calculava-se haver na Inglaterra, a esse tempo, 5.200 fiandeiros usando rocas de fiar e 2.700 tecelões, ao todo, 7.900 pessoas empregadas na produção de tecidos de algodão. Houve oposição à invenção de Arkwright, sob a alegação de que ela ameaçava a subsistência dos operários, e essa oposição teve que ser dominada pela força. Entretanto, em 1787— vinte e sete anos depois do aparecimento da invenção— uma investigação parlamentar mostrou que o número de pessoas que estava trabalhando em fiação e tecelagem de algodão havia subido de 7.900 para 320.000: um aumento de 4.400%.”
Ademais, se as demandas sindicais fossem minimamente lógicas, ser-nos-ia mais que cabível presumir que, mesmo ao nômade, as ferramentas facilitadoras do trabalho seriam odiosas, uma vez que, alegar-se-ia, o privariam de empregar maior volume de trabalho no alcance dos seus objetivos.
Ora, qual ser militaria desfavoravelmente aos avanços tecnológicos hodiernos?
Se fôssemos aceitar as razões dos sindicalistas relativamente às máquinas, teríamos de, por coerência, repudiar todo o avanço técnico do qual goza o homem; teríamos de, por congruência, arguir que seria melhor ao nômade caçar os javalis não pelo emprego de lanças ou flechas, mas pelo emprego da força destrutiva dos seus próprios braços a fim de, supostamente, não se privar de trabalhar.
Há, senhores, coisa mais absurda? O que é mais contra-intuitivo? Deixo a oportunidade de resposta aos detratores das máquinas?
Excelente artigo!
A respeito da poupança e o decréscimo da taxa de juros. A percepção dos empresários é de que a tecnologia muda todos os dias, novas máquinas são inventadas etc… não é um processo simples acompanhar isso – existem feiras, mas o fato é que os mais precavidos tem fundos reservados para a aquisição de novas máquinas, ou seja, é quase que uma poupança forçada. Os benefícios disso são evidentes.
A propósito do desemprego causado pelas máquinas. Estima-se que em Paris existiam 20.000 aguadeiros, profissionais responsáveis por levar água até os andares superiores. Quando um sujeito inventou bombas hidraúlicas que enviavam elas mesmos a água, do nada, esses empregos foram extintos. Eu não sei, mas provavelmente a quantidade de pessoas envolvidas na construção e instalação de bombas, encanamentos etc… superou em número aquelas que ficaram desempregadas. Duvido que algum sindicalista não ligue correndo para a empresa de abastecimento quando falta água.
A palavra sabotagem tem origem em um tamanco de madeira “sabots” que os vándalos atiravam nas engrenagens das primeiras máquinas a vapor – ou o que valha, de modo a destrui-las, por causa da ladainha do desemprego.
Miilton Friedmam estava na Índia, se não me engano, observando centenas de homens escavando um buraco para fazer um túnel ou algo assim utilizando pás. Ele perguntou pro capataz porque não usavam uma retro-escavadeira. O sujeito disse que com pás haveira mais empregos. No que mestre Friedmam retrucou:
– se o objetivo são mais empregos, que usem colheres de chá ao invés de pás!
Tem se notado muito nos últimos anos um sensacionalismo infantil e risível sobre inteligência artificial e “perigos” inexistentes de máquinas usurparem o controle e ameaçarem a sociedade e idiotices do tipo facilmente engolíveis por gente ignorante que não entende nem de tecnologia nem de psicologia ou qualquer coisa. A ideia é regredir o avanço das IAs que terão papel fundamental no mercado e otimização de serviços de empresas, inclusive no campo da segurança cibernética.