A refutação misesiana de Keynes

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É meu objetivo reconstruir algumas verdades básicas quanto ao processo de desenvolvimento econômico e o papel desempenhado nesse processo pelo emprego, pela moeda e pelo juro. Essas verdades não se originaram com a Escola Austríaca de Economia, nem são uma parte integral apenas dessa tradição de pensamento econômico. Na verdade, a maioria delas foi parte integrante do que é chamado de economia clássica, e foi unicamente o reconhecimento de suas validades que distinguiu o economista do louco. Porém a Escola Austríaca, em particular Ludwig von Mises e, mais tarde, Murray N. Rothbard, forneceu a mais clara e completa apresentação dessas verdades.[1] Além disso, eles apresentaram também sua mais rigorosa defesa ao mostrá-las serem dedutíveis a partir de proposições básicas, incontestáveis (tais como a de que o homem age e sabe o que significa agir), de maneira a estabelecê-las como verdades cuja negação não apenas seria factualmente incorreta, mas seria também, de modo muito mais decisivo, equivalente a contradições e absurdidades lógico-praxeológicas.[2]

Primeiro, eu reconstruirei sistematicamente essa teoria austríaca do desenvolvimento econômico. Depois me voltarei para a teoria “nova” de Keynes, a qual pertence, como ele mesmo não pode senão reconhecer, à tradição do “submundo” econômico (como o mercantilismo) e da heterodoxia econômica justamente considerada como tal (como Silvio Gesell).[3] Eu mostrarei que a economia nova de Keynes também é justamente considerada heterodoxa: um conjunto de falsidades lógico-praxeológicas obtido por meio de jargões obscuros, definições variáveis e inconsistências lógicas objetivando criar uma mentalidade anticapitalista, anti-propriedade-privada e antiburguesa.

 

I.

1. Emprego

“O desemprego, no mercado desimpedido, é sempre voluntário”.[4] O homem trabalha porque ele prefere o resultado esperado disso à desutilidade do trabalho e ao rendimento psíquico derivado do lazer. Ele “para de trabalhar naquele ponto em que ele começa a valorar o lazer, a ausência da desutilidade do trabalho, mais elevadamente do que o incremento de satisfação esperado de mais trabalho.”[5] Obviamente, então, Robinson Crusoé, o produtor autossuficiente, só pode ser desempregado voluntariamente (porque ele prefere permanecer ocioso e consumir valores presentes a gastar trabalho adicional na produção de valores futuros).

O resultado não é diferente quando Sexta-Feira entra e a economia da propriedade privada é estabelecida baseada no reconhecimento inicial dos direitos de cada pessoa de controle exclusivo sobre aqueles recursos que reconheceu como escassos e apropriou (por apropriação original) ao misturar com eles seu trabalho, antes que alguém já o tenha feito, e de todos os bens produzidos com a ajuda desses recursos. Nessa situação, tornam-se possíveis não somente as razões de troca – os preços – por compra ou aluguel de bens materiais, como também os preços (salários) pelo aluguel de serviços de trabalho. Sucederá emprego sempre que o salário oferecido for valorado pelo trabalhador mais altamente do que a satisfação a ser derivada de trabalhar de modo autossuficiente, com seus próprios recursos e/ou consumindo-os (ou a ser derivada de apropriar previamente recursos submarginais). O emprego aumentará, e o salário se elevará, tão logo os empreendedores percebam os salários existentes como mais baixos do que o valor do produto marginal (descontado pela preferência temporal)[6] que um acréscimo correspondente no emprego do trabalho possa esperar trazer. Por outro lado, sucederá e aumentará o desemprego tão logo uma pessoa valore o produto de valor marginal obtido por meio do autoemprego mais elevadamente do que um salário que reflita a produtividade marginal de seus serviços de trabalho.

Nessa construção, não há espaço lógico para algo como desemprego involuntário. Na medida em que o emprego é sempre voluntário, assim também o é o desemprego (autoemprego).[7]

Desemprego involuntário só é logicamente possível uma vez que a situação seja fundamentalmente alterada e introduza-se uma pessoa ou instituição que possa exercer, com sucesso, controle sobre recursos que ela não apropriou originalmente nem adquiriu por meio de troca voluntária entre apropriadores originais. Tal instituição extramercado, ao impor, por exemplo, um salário mínimo maior do que a produtividade marginal do trabalho, pode proibir efetivamente uma troca entre um fornecedor de serviço de trabalho e um capitalista a qual seria preferida pelos dois, se ambos tivessem controle irrestrito sobre sua propriedade originalmente apropriada. O trabalhador em potencial torna-se, então, desempregado involuntariamente, e o empregador em potencial é forçado a deslocar fatores complementares de produção de usos produtivos mais valorizados para usos menos valorizados. De fato, uma instituição extramercado pode, em princípio, criar qualquer quantidade desejada de desemprego involuntário. Um salário mínimo de, digamos, $1 milhão por hora, se implantado, iria desempregar de maneira involuntária praticamente todo mundo e, ao longo desse caminho em direção ao autoemprego compulsório, condenaria a maior parte da população atual à morte por inanição.

Na ausência de uma instituição isenta das regras do mercado, o desemprego involuntário é logicamente impossível, e sucederá prosperidade ao invés de empobrecimento.

2. Moeda

O homem participa de uma economia de troca (ao invés de permanecer em isolamento autossuficiente) na medida em que é capaz de reconhecer a maior produtividade de um sistema de divisão de trabalho e prefere mais a menos bens. Como um resultado da sua participação no mercado, surge seu desejo por um meio de troca (dinheiro). De fato, a menos que se assuma o humanamente impossível (que o homem tenha presciência perfeita do futuro), não haveria para ele propósito em ter dinheiro. Pois, com todas as incertezas removidas, na fantasiosa terra do equilíbrio, saber-se-iam precisamente os termos, os tempos e os locais de todas as futuras trocas, e tudo poderia se pré-arranjar conformemente e tomaria a forma de trocas diretas ao invés de indiretas.[8] Sob a inescapável condição humana da incerteza, contudo, quando tudo isso não é sabido e a ação deve, por natureza, ser especulativa, o homem começa a demandar bens não mais exclusivamente em virtude de seu valor de uso, mas também por causa de seu valor como meio de troca.

Confrontado com uma situação em que sua demanda de reserva por alguns bens e serviços fornecidos é baixa ou inexistente, e onde uma troca diretamente satisfatória, devido à ausência de dupla coincidência de desejos, está fora de questão, ele também considerará trocar sempre que os bens a ser adquiridos forem mais comerciáveis que aqueles a ser entregues, de modo que sua posse facilitaria então a aquisição de bens e serviços diretamente úteis em datas futuras ainda não conhecidas.

Além disso, uma vez que é a função mesma de um meio de troca facilitar compras futuras de bens diretamente úteis, o homem naturalmente irá preferir a aquisição de um meio de troca mais comerciável e, no limite, universalmente comerciável a um menos ou não universalmente comerciável, de maneira que haveria uma tendência inevitável de os bens menos comerciáveis, dentre uma série de bens usados como meios de troca, serem rejeitados um por um até sobrar uma única mercadoria, que seria empregada universalmente como um meio de troca; numa palavra, dinheiro.[9]

No caminho em direção a esse objetivo final, em se selecionando dinheiros que são usados de maneira cada vez mais ampla, a divisão de trabalho é estendida, e a produtividade, aumentada.

No entanto, uma vez que uma mercadoria se estabeleceu como um meio de troca universal e os preços de todos os bens de troca diretamente úteis vieram a ser expressos em termos de unidades desse dinheiro (enquanto o preço da unidade do dinheiro é seu poder de comprar uma quantidade de bens não monetários), o dinheiro não mais exerce nenhuma influência sistemática na divisão de trabalho, no emprego nem na renda produzida. Uma vez estabelecido, qualquer quantidade de dinheiro é compatível com qualquer quantidade de emprego e renda.[10] Decerto, como explicado acima, na fantasiosa terra do equilíbrio não haveria dinheiro, mas haveria ainda emprego e renda. Isso demonstra que o dinheiro, por um lado, e o emprego e a renda, por outro, devem ser considerados conceitos lógico-praxeologicamente independentes e não relacionados. Por exemplo, caso o fornecimento de dinheiro aumente, sendo tudo o mais constante, isso certamente teria efeitos redistributivos, dependendo de onde e como o dinheiro adicional entrou na economia; mas isso, tão certamente quanto, não iria surtir nenhum efeito sistemático na quantidade de emprego nem no tamanho do produto social. Os preços e os salários geralmente subiriam, e o poder aquisitivo do dinheiro cairia. Porém, não se seguiria nada com respeito ao emprego e ao produto social. Eles podem ser diferentes, ou podem ser idênticos. O mesmo é verdadeiro para mudanças na demanda por dinheiro. Um aumento na demanda por dinheiro (i.e., um valor relativamente maior atribuído a dinheiro adicional em comparação com a adição de algo que não seja dinheiro), decerto alteraria os preços relativos; porém não implicaria nada no que concerne a emprego e produto social. Ao equilibrar uma crescente demanda por dinheiro com um dado estoque de dinheiro, o nível geral de preços e salários deve cair, e o poder aquisitivo da unidade do dinheiro deve aumentar, mutatis mutandis. Mas não existe razão alguma para supor que isso teria qualquer impacto sobre o emprego ou a renda. Caem os salários, mas simultaneamente o poder de compra do dinheiro aumenta, deixando os salários reais e o produto social real intactos.

O resultado não é diferente se forem consideradas mudanças no lado não monetário. Tudo o mais constante, um aumento no fornecimento de bens e serviços, por exemplo, acarreta uma elevação do poder aquisitivo do dinheiro; os preços em dinheiro caem. Isso reduz a quantidade de dinheiro demandada (dada a demanda por dinheiro), porque o custo de conservar o dinheiro ao invés de gastá-lo com outra coisa se elevou; e essa demanda menor por dinheiro implica, por seu turno, uma tendência reversa em direção a um aumento de preços e a um poder de compra reduzido. Nada se segue quanto ao emprego e ao produto social. O quadro tampouco muda quando as expectativas são levadas em conta. Expectativas inflacionárias (deflacionárias) reduzem (aumentam) a demanda por dinheiro imediatamente e assim aceleram o ajuste para o que quer que se tenha esperado; e se algo foi erroneamente esperado (i.e., algo em desacordo com a realidade subjacente), então o processo de ajustes autocorretivos é acelerado através do funcionamento das expectativas. Mas nenhum desses fenômenos monetários tem qualquer conexão praxeológica sistemática com o emprego e o produto social, os quais podem muito bem permanecer os mesmos ao longo de todas as mudanças monetárias.

Invariavelmente, o dinheiro é “neutro” ao emprego e ao produto social.

3. Juro

O dinheiro é “neutro” também ao juro. Porém, o juro, diferentemente do dinheiro, está praxeologicamente relacionado com o emprego e o produto social.

Da mesma forma que o dinheiro resulta da incerteza, assim o juro resulta da preferência temporal, que é tão essencial à ação quanto a incerteza (e ainda mais, num sentido a ser explicado brevemente). Ao agir, um agente não só invariavelmente visa a substituir um estado de coisas menos satisfatório por um mais satisfatório e assim demonstrar preferência por mais bens ao invés de menos; ele deve também, invariavelmente, considerar quando no futuro seus objetivos serão atingidos (i.e., o tempo necessário para realizá-los), bem como a duração da serventia de um bem, e toda ação, assim, também demonstra uma preferência universal por bens mais adiantados frente aos menos adiantados e pelos mais duráveis frente aos menos duráveis. Toda ação requer algum tempo para atingir seu objetivo; já que o homem deve consumir algo de vez em quando e não pode parar completamente de consumir, o tempo é sempre escasso. Desse modo, ceteris paribus, bens presentes ou adiantados são e devem invariavelmente ser valorados mais elevadamente do que bens futuros ou atrasados.[11] De fato, se o homem não fosse restringido pela preferência temporal e a única restrição operando fosse a de preferir mais a menos, ele invariavelmente iria escolher aqueles processos de produção que fossem render a maior produção por insumo, independentemente do espaço de tempo exigido para que esses métodos frutifiquem. Por exemplo, em vez de produzir primeiro uma rede de pesca, Crusoé iria imediatamente começar a construir um barco de pesca, como o método economicamente mais eficiente para apanhar peixes. Que ninguém, inclusive Crusoé, aja dessa forma torna evidente que o homem não pode senão “valorar frações de tempo da mesma extensão de uma maneira diferente conforme estejam mais próximas ou mais distantes do momento da decisão do agente”.[12]

Assim, restringido pela preferência temporal, o homem só irá trocar um bem presente por um bem futuro se ele esperar desse modo aumentar sua quantidade de bens futuros. A taxa de preferência temporal, que pode ser diferente de pessoa para pessoa e em pontos distintos do tempo, mas que jamais pode ser senão positiva para todo mundo, determina simultaneamente a importância do prêmio que bens presentes ordenam sobre bens futuros e a quantidade de poupança e de investimento. A taxa de mercado do juro é a soma agregada de todas as taxas individuais de preferência temporal, refletindo, por assim dizer, a taxa social de preferência temporal e equilibrando a poupança social (i.e., o suprimento de bens presentes oferecidos para troca frente a bens futuros) e o investimento social (i.e., a demanda por bens presentes capazes de render retornos futuros).

Nenhum suprimento de fundos emprestáveis poderia existir sem prévia poupança, i.e., sem a abstenção de algum possível consumo de bens presentes. Além disso, nenhuma demanda por fundos emprestáveis existiria se ninguém percebesse qualquer oportunidade de empregar bens presentes de maneira produtiva (i.e., investi-los de modo a produzir um produto futuro que ultrapassaria o insumo atual). Decerto, se todos os bens presentes fossem consumidos e nenhum fosse investido em processos de produção com consumo de tempo, não haveria juro nem taxa de preferência temporal, ou melhor, a taxa de juros seria infinitamente alta, o que, fora do Jardim do Éden, equivaleria a fazer perdurar um modo de vida subsistente primitivo, encarando-se a realidade com nada senão as próprias mãos e um desejo de gratificação instantânea.

Um suprimento de fundos emprestáveis e uma demanda por eles apenas crescem uma vez que é reconhecido – e esta é a condição humana –  que processos de produção indiretos, mais tortuosos, mais longos podem render uma produção maior ou melhor por insumo do que os processos diretos e curtos;[13] e é possível, por meio da poupança, acumular a quantidade de bens presentes necessários para prover todos aqueles desejos cuja satisfação, durante o prolongado tempo de espera, seja considerada mais urgente do que o acréscimo em bem-estar futuro esperado da adoção de um processo de produção consumidor de mais tempo.[14]

Tão logo esse seja o caso, a formação de capital e a acumulação se iniciam e prosseguem. Em vez de se sustentarem por processos de produção instantaneamente gratificantes e se empregarem neles, os fatores originais de produção, terra e trabalho, são sustentados por um excesso da produção sobre o consumo e empregados na produção de bens de capital. Estes não possuem valor, exceto como produtos intermediários no processo de criação de bens finais (de consumo). Em outras palavras, seu valor depende do fato de quem quer que os possua pode usá-los para produzir outros bens de capital de maneira mais eficiente. O excesso de valor (preço) de um bem de capital sobre a soma gasta nos fatores complementares originários exigidos para sua produção se deve a essa diferença de tempo e ao fato universal da preferência temporal. É o preço pago por comprar tempo; por se aproximar da consecução do objetivo final em vez de ter que começar do início. Por causa da preferência temporal, o valor do produto final deve exceder a soma gasta em seus fatores de produção (o preço pago pelo bem de capital e todos os serviços complementares de trabalho).

Quanto menor, então, for a taxa de preferência temporal, mais cedo se estabelecerá o processo de formação de capital, e mais rápido isso alongará a estrutura de produção indireta. Qualquer aumento na acumulação de bens de capital e na estrutura de produção indireta, por sua vez, eleva a produtividade marginal do trabalho. Isso leva a taxas maiores de emprego e/ou salários e, em todo caso (mesmo que a curva de oferta de trabalho se tornasse uma parábola aberta à esquerda com o aumento dos salários), a um salário total mais elevado.[15] Provida de uma quantidade aumentada de bens de capital, então, uma população mais bem paga produzirá um produto social – futuro – globalmente aumentado, elevando, finalmente, os rendimentos reais dos proprietários do capital e da terra, depois de elevar os dos empregados. Enquanto o juro (a preferência temporal) dessa maneira possui uma relação praxeológica direta com o emprego e a renda social, ele não tem nada que ver com o dinheiro. Deixando claro que numa economia monetária também existe uma expressão monetária para a taxa social de preferência temporal. Ainda assim isso não muda o fato de que juro e moeda são sistematicamente independentes e não relacionados e que o juro é um fenômeno “real”, e não monetário. De fato, na terra fantástica do equilíbrio, não haveria lugar para o dinheiro, porque o futuro, por definição, seria certo e, com toda a incerteza removida, ninguém teria necessidade de guardar dinheiro (cujo propósito único, não sendo o dinheiro nem produtivo e nem consumível, é o da precaução para compras ainda não conhecidas a tempos ainda não sabidos). A preferência temporal e o juro, porém, não podem ser concebidos como desaparecendo mesmo aí. Pois, mesmo no equilíbrio, a estrutura de capital existente necessita de ser mantida constantemente ao longo do tempo (de modo a impedi-la de ser gradualmente consumida no decurso da repetição sem fim de um padrão de operações produtivas). Não pode haver tal manutenção, entretanto, sem poupança e reinvestimentos contínuos: e estes não podem existir sem a expectativa de uma taxa positiva de juro. (De fato, se a taxa de juros paga fosse zero, ocorreria consumo de capital, e se sairia do equilíbrio).[16]

As coisas tornam-se um pouco mais complexas sob condições de incerteza, com o dinheiro efetivamente em uso, mas a independência praxeológica entre dinheiro e juro permanece inteiramente intacta. Sob essas condições, o homem invariavelmente possui três em vez de duas alternativas quanto a como alocar sua renda atual. Ele deve não só decidir quanto alocar para comprar bens presentes e quanto para bens futuros (i.e., quanto consumir e quanto investir), como também quanto guardar em dinheiro. Não existem outras alternativas. Ainda assim, embora o homem deva, em todos os tempos, fazer ajustes relativos a três margens ao mesmo tempo, o resultado invariavelmente é determinado por dois fatores distintos e praxeologicamente não relacionados. A proporção de investimento/consumo é determinada pela preferência temporal. A fonte da demanda por dinheiro, por outro lado, é a utilidade vinculada ao dinheiro (i.e., sua serventia em permitir compras imediatas de bens diretamente úteis em datas futuras incertas). Ambos os fatores podem variar, independentemente um do outro.

Se a oferta de dinheiro se alterar, ou se a demanda por dinheiro se alterar com dado estoque social de dinheiro, o poder aquisitivo do dinheiro também mudará. No entanto, além de causar mudanças nas rendas relativas, nenhuma dessas mudanças no poder aquisitivo da unidade da moeda teria algum efeito na renda real global. Rendas, em termos de moeda, aumentam ou diminuem, mas o poder de compra da moeda cai ou sobe correspondentemente, deixando as rendas reais inalteradas. Ou, com as rendas monetárias inalteradas, mais ou menos delas será mantido em dinheiro (acumulado), mas então o poder aquisitivo da moeda se eleva ou decai, correspondentemente, de novo deixando a renda real adquirida inalterada, com uma soma maior ou menor em dinheiro. É a esse rendimento real, no entanto, não ao dinheiro como tal, que a preferência temporal de um homem está relacionado, e é, ainda, à luz desse rendimento que sua taxa efetiva de preferência temporal é determinada. Já que a renda real não se altera ao longo de todas as mudanças monetárias, não há razão alguma para supor que a taxa de preferência temporal irá mudar. Se, por exemplo, o pesadelo keynesiano de acúmulo aumentado se tornar realidade e os preços em geral caírem enquanto o poder de compra da moeda crescer correspondentemente, isso deixará a proporção real de investimento/consumo inteiramente não afetada. A menos que se assuma que a preferência temporal mudou ao mesmo tempo, o acúmulo adicional será retirado de fundos que foram gastos anteriormente com consumo e de fundos que foram anteriormente investidos na mesma proporção pré-estabelecida, de maneira a deixar o consumo real e o investimento real precisamente em seus níveis antigos. Porém, se se assume que a preferência temporal muda concomitantemente, então tudo é possível. De fato, se o acúmulo adicional vem exclusivamente de gasto prévio em consumo, uma demanda aumentada por dinheiro pode andar de mãos dadas mesmo com uma queda na taxa de juros e investimento aumentado. Contudo, isso se deve não a mudanças na demanda por dinheiro, mas exclusivamente a uma mudança (uma queda) na preferência temporal.[17]

4. O Processo Capitalista

Com a divisão de trabalho estabelecida e estendida até seu limite máximo por meio do desenvolvimento de um meio de troca universal, o processo de desenvolvimento econômico é determinado, essencialmente, pela preferência temporal.

Decerto, existem outros fatores que são importantes: a qualidade e a quantidade da população, a fartura em recursos naturais e o estado da tecnologia. Ainda assim, dentre esses fatores, a qualidade de um povo está além do controle de qualquer um e deve-se tomar como um dado: a quantidade de uma população pode ou não fazer avançar o desenvolvimento econômico, dependendo de se a população está abaixo ou acima do seu tamanho ótimo para dado tamanho de um território: e recursos naturais e know-how tecnológico só podem ter um impacto econômico se descobertos e utilizados. Para fazer isso, contudo, deve haver poupança prévia e investimento. Não é a disponibilidade de recursos e o conhecimento técnico ou científico que impõem limites à exploração de recursos efetivamente disponíveis e à utilização de conhecimento existente (da mesma forma que não as impõem ao progresso científico sobre o assunto de interesse, na medida em que atividades de pesquisa, outrossim, devem ser sustentadas com fundos poupados).

Desse modo, o único caminho viável para o crescimento econômico é por meio de poupança e investimento, governados como são pela preferência temporal. Em última análise, não há caminho para a prosperidade exceto por um aumento na quota per capita de capital investido. Essa é a única maneira de aumentar a produtividade marginal do trabalho, e somente se isso for feito é que pode a renda futura, por sua vez, aumentar. Com rendas reais crescendo, a taxa efetiva de preferência temporal cai (sem, no entanto, jamais chegar a zero ou tornar-se negativa), adicionando ainda mais doses de investimento e pondo em movimento um processo de desenvolvimento econômico em espiral ascendente.

Não há razão para supor que esse processo deveria chegar a um fim antes de alcançar o Jardim do Éden, onde toda a escassez desapareceu – a não ser que as pessoas deliberadamente escolham o contrário e comecem a valorar lazer adicional mais elevadamente do que qualquer acréscimo posterior em rendimentos reais. Tampouco há qualquer razão para supor que o processo de desenvolvimento capitalista seria qualquer coisa exceto regular e que a economia se ajustaria flexivelmente não só a toda mudança monetária mas também a todas as mudanças na taxa social de preferência temporal. É claro, na medida em que o futuro é incerto, haverá erros empreendedoriais, prejuízos e falências. Mas não existe nenhuma razão sistemática pela qual isso deveria causar mais que perturbações temporárias, ou pela qual essas perturbações deveriam exceder uma “taxa natural” de fracassos em negócios, ou flutuar drasticamente em torno dela.[18]

As coisas ficam diferentes somente se uma instituição extramercado, como o governo, for introduzida. Ela não só torna possível, como explicado acima, o desemprego voluntário: a própria existência de uma agência que pode, efetivamente, reivindicar propriedade sobre recursos que ela não apropriou originalmente, não produziu, nem adquiriu contratualmente, também eleva a taxa social de preferência temporal para apropriadores originais, produtores e contratantes, e desse modo cria empobrecimento, estagnação ou mesmo retrocesso involuntário. É somente através do governo que a humanidade pode ser interrompida no seu curso natural em direção a uma libertação gradual da escassez muito antes mesmo de chegar ao ponto de um crescimento zero voluntariamente escolhido.[19] E é tão somente na presença de um governo que o processo capitalista pode tomar um padrão cíclico (em vez de regular), com busts se seguindo após booms. Isento das regras de aquisição e transferência de propriedade privada, o governo naturalmente anseia por um monopólio sobre a moeda e a atividade bancária e não deseja nada mais que se engajar em atividade bancária de reserva (depósito) fracionária – em termos não técnicos: falsificação monopolista – de maneira a se enriquecer à custa dos outros através dos muito menos visíveis meios da fraude, em lugar da franca confiscação.[20] Ciclos de retração e expansão são o resultado de fraudulenta atividade bancária de reserva fracionária. Se e na medida em que o recém-criado dinheiro falsificado entrar na economia como suprimento adicional ao mercado de crédito, a taxa de juros terá que cair abaixo do que de outra maneira estaria. O crédito deve se tornar mais barato. Porém, a um preço menor, mais crédito é tomado e mais recursos então são investidos na produção de bens futuros (ao invés de serem usados para consumo presente) do que seriam de outro modo. A estrutura inteira de produção indireta é alongada. Para concluir todos os projetos de investimento que agora estão em andamento, mais tempo é preciso do que aquele exigido para concluir aqueles iniciados antes da expansão de crédito. Todos os bens que teriam sido criados sem expansão creditícia devem ser produzidos, mais aqueles que foram recém-adicionados. Para isso ser possível, entretanto, requer-se mais capital. A maior quantidade de bens futuros só pode ser produzida com sucesso se poupanças adicionais proverem um fundo de meios de sustentação suficientemente grande para atravessar o tempo de espera mais longo, e levar por ele os trabalhadores. Mas, por suposição, aumento nenhum na poupança ocorreu. A taxa de juros mais baixa não é o resultado de uma oferta maior de bens de capital. A taxa social de preferência temporal não mudou de forma alguma. É unicamente o resultado de dinheiro falsificado entrando na economia através do mercado de crédito. Segue-se logicamente que deve ser considerado impossível concluir, de maneira bem-sucedida, todos os projetos de investimento em andamento depois de uma expansão creditícia, devido a uma falta sistemática de capital real. Projetos terão que ser liquidados de modo a encurtar a estrutura global de produção e reajustá-la a uma taxa inalterada de preferência temporal social e à proporção investimento-consumo real correspondente.[21]

Os movimentos cíclicos não podem ser evitados ao ser antecipados (conforme o lema “um ciclo antecipado é um ciclo evitado”): eles são a consequência praxeologicamente necessária de falso crédito adicional sendo posto de maneira bem-sucedida. Uma vez que esse seja o caso, um ciclo de expansão e retração é inevitável, independentemente de no que os agentes creiam ou do que esperem correta ou incorretamente. O ciclo é induzido por uma mudança monetária, mas produz efeitos no campo dos fenômenos “reais” e será um ciclo “real”, não importa quais crenças as pessoas venham a ter.[22]

Também não se pode realisticamente esperar que os movimentos cíclicos inevitáveis resultantes de uma expansão de crédito algum dia chegarão a um fim: na medida em que uma instituição extramercado como o governo esteja no controle da moeda, uma série permanente de movimentos cíclicos irá marcar o processo de desenvolvimento econômico. Pois, por meio da criação de crédito fraudulento, um governo pode engendrar uma distribuição de renda e riqueza sutis e altamente imperceptíveis em benefício próprio. Não há razão (além de pressupostos angelicais) para supor que ele cessará deliberadamente de usar essa varinha mágica meramente porque a expansão creditícia tem o “infeliz” efeito colateral de gerar ciclos econômicos.

II.

Após essa reconstrução da teoria clássica e, em especial, austríaca do emprego, da moeda, do juro e do processo capitalista, eu irei agora voltar-me para Keynes e sua teoria “nova”. Diante do pano de fundo de nossa explicação da antiga, deve ser fácil reconhecer a “nova” Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda de Keynes como fundamentalmente falha e a revolução keynesiana como um dos principais escândalos intelectuais do século vinte.[23]

1. Emprego

Keynes começa com uma falsa teoria do emprego. Ao contrário da visão clássica, ele afirma que pode haver desemprego involuntário no livre mercado; e, além disso, que um mercado pode atingir um equilíbrio estável com desemprego involuntário persistente. E, ao alegar que tais falhas de mercado são possíveis, ele sustenta ter descoberto o raciocínio econômico derradeiro em favor da interferência nas operações dos mercados por forças extramercado.

Uma vez que o livre mercado é definido em termos de propriedade privada apropriada originalmente ou produzida e de voluntariedade de todas as interações entre proprietários, deveria ser claro que o que Keynes alega mostrar é grosseiramente equivalente a deixar um círculo quadrado.

Keynes começa com a afirmação falsa de que a teoria clássica assume “que não existe tal coisa como desemprego involuntário em sentido estrito”.[24] Na verdade, ela não assumiu isso. A teoria clássica assumiu que desemprego involuntário é lógico-praxeologicamente impossível na medida em que um livre mercado esteja em operação. O desemprego involuntário, de fato qualquer quantidade dele, pode existir na presença de uma instituição extramercado, leis de salário mínimo, etc., isso nunca foi seriamente posto em dúvida.

Após essa falsidade, Keynes prossegue dando sua definição de desemprego involuntário:

Existem desempregados involuntários quando, no caso de uma ligeira elevação dos preços dos bens de consumo de assalariados [i.e., bens de consumo] relativamente aos salários nominais, tanto a oferta agregada de mão-de-obra disposta a trabalhar pelo salário nominal corrente quanto a procura agregada da mesma ao dito salário são maiores que o volume de emprego existente.[25]

Traduzindo para o português claro, o que Keynes está dizendo, à sua maneira tipicamente obscura, é que existem desempregados involuntários quando um aumento de preços em comparação com as taxas salariais leva a mais emprego.[26] Porém, tal mudança em preços relativos é logicamente equivalente a uma queda nas taxas de salários reais; e uma queda em salários reais pode ser realizada, num mercado desimpedido, por assalariados a qualquer tempo que estes desejarem, simplesmente ao aceitar taxas de salários nominais menores, com os preços das mercadorias permanecendo onde estão. Se os trabalhadores decidirem não fazê-lo, não há nada de involuntário nisso tudo. Dada sua demanda de reserva por trabalho, eles escolhem ofertar aquela quantidade de trabalho que é efetivamente ofertada. A classificação disso como emprego-desemprego voluntário também não mudaria muita coisa se, em outro ponto do tempo, com taxas salariais reais menores, a quantidade de emprego crescesse. Em virtude da lógica, esse resultado só pode ocorrer se no meio tempo os trabalhadores tiverem aumentado sua avaliação relativa de uma dada taxa salarial em comparação com sua demanda de reserva de trabalho (caso contrário, se essa mudança não ocorreu, o emprego se reduziria ao invés de aumentar). O fato, contudo, de que o sujeito pode mudar a sua opinião de uma hora para a outra dificilmente implica que sua escolha anterior foi involuntária, como Keynes assumiria. É claro, podem-se definir os próprios termos da maneira que se desejar, e num estilo verdadeiramente orwelliano pode-se até mesmo escolher chamar o voluntário de involuntário e o involuntário de voluntário. No entanto, através desse método tudo sob o sol pode-se “provar”, embora na verdade nada de substancial seja mostrado. A maneira de Keynes de demonstrar a possibilidade do desemprego involuntário é uma prova verbal absurda que deixa intocado o fato de que não pode existir tal coisa como desemprego involuntário, no sentido usual desse termo, no mercado desimpedido.

Como se isso não bastasse, Keynes ainda por cima alega que desemprego involuntário é concebível mesmo na fantástica terra do equilíbrio. De fato, ele critica seu anterior Tratado Sobre a Moeda dizendo: “Eu não havia entendido que, sob determinadas condições, o sistema poderia estar em equilíbrio com menos que pleno emprego”.[27] Todavia, equilíbrio é definido como uma situação na qual mudanças em valores, tecnologia e recursos não ocorrem mais, na qual todas as ações estão completamente ajustadas a uma constelação final de informações; e na qual todos os fatores de produção, inclusive o trabalho, estão empregados na sua mais plena extensão possível (dadas essas informações inalteráveis) e são repetida e eternamente empregados no mesmo padrão de produção constante. Logo, como observou H. Hazlitt, a descoberta de um equilíbrio de desemprego por Keynes, na sua Teoria Geral, é como a descoberta de um círculo triangular – uma contradição em termos.[28]

2. Moeda

Tendo lançado fora a lógica em seu tratamento do emprego e desemprego, Keynes, em sua discussão sobre a moeda, lança fora então o raciocínio econômico ao desenvolver a afirmação de que a moeda e as mudanças monetárias têm (podem ter) um efeito sistemático sobre o rendimento do trabalho e o juro.

Dado o fato de que “moeda” aparece no título da Teoria Geral, a teoria positiva da moeda de Keynes é incrivelmente sucinta e pouco desenvolvida. A brevidade, é claro, pode ser uma virtude. No caso de Keynes, isso oferece a oportunidade de identificar com bastante facilidade seus erros elementares. Para Keynes, “a importância da moeda decorre essencialmente do fato de consistir ela num elo entre o presente e o futuro“.[29] “A moeda, considerada em seus atributos mais significativos, é sobretudo um processo sutil de ligar o presente ao futuro”.[30] Que isso é falso se segue do fato de que, na terra fantástica do equilíbrio, dinheiro algum iria existir,[31] porém mesmo sob condições de equilíbrio ainda haveria um presente e um futuro, e ambos ainda estariam ligados. Em vez de funcionar como um elo para o futuro, a moeda serve como um meio de troca, uma função que está inextricavelmente ligada à incerteza do futuro.[32] A ação, que invariavelmente se inicia no presente e visa a algum objetivo futuro, mais ou menos distante no tempo do seu ponto de partida, constitui o verdadeiro elo entre o presente e o futuro. E é a preferência temporal, enquanto categoria universal da ação, que dá a esse elo entre o presente e o futuro sua forma específica. A moeda, ao contrário do juro, não relaciona o presente com o futuro mais do que outros fenômenos econômicos, como bens não monetários. O valor presente destes últimos, também, reflete antecipações sobre o futuro, nem mais nem menos do que o faz a moeda.

A partir desse primeiro equívoco quanto à natureza da moeda, todos os outros equívocos emanam automaticamente. Sendo definido como um elo sutil entre o presente e o futuro, a demanda por moeda (sendo dada sua oferta), a qual Keynes, alinhado com sua inclinação geral por interpretar mal categorias lógico-praxeológicas como psicológicas, denomina “preferência pela liquidez” ou “propensão a poupar”,[33] é dita ser funcionalmente relacionada à taxa de juros (e vice-versa).[34] “O juro”, escreve Keynes, “é a recompensa por não entesourar”,[35] “a recompensa pela renúncia à liquidez”,[36] o que, por seu turno, faz da preferência pela liquidez a falta de vontade de investir em ativos que rendam juros. Que isso é falso torna-se óbvio tão logo se faça a pergunta: “E quanto aos preços, então?” A quantidade de cerveja, por exemplo, que pode ser comprada com uma soma definida em dinheiro obviamente não é menos uma recompensa pela renúncia à liquidez do que o é a taxa de juros, o que faria então da demanda por dinheiro a falta de vontade de comprar cerveja tanto quanto a falta de vontade de investir.[37] Formulada em termos gerais, a demanda por dinheiro é a falta de vontade de comprar ou alugar não-dinheiro, incluindo ativos que rendam juros (terra, trabalho e/ou bens de capital, ou bens futuros) e ativos que não rendam juros (bens presentes ou de consumo). Reconhecer isso é reconhecer que a demanda por dinheiro não tem nada que ver com investimento ou consumo; tampouco tem que ver com a razão entre despesas de investimento e consumo, ou com a diferença entre os preços dos insumos e os dos produtos (o desconto de bens de ordem superior ou futuros em comparação com os de ordem inferior ou presentes). Aumentos ou decréscimos na demanda por dinheiro, tudo o mais constante, reduzem ou elevam o nível global de preços em dinheiro, mas o consumo e o investimento reais, bem como a real proporção consumo-investimento, permanecem não afetados; e sendo esse o caso, o emprego e o rendimento social mantêm-se não afetados também. A demanda por dinheiro determina a proporção entre o dinheiro gasto e o de caixa. A proporção entre o investimento e o consumo, segundo Keynes, é uma questão inteiramente diferente e não relacionada. É determinada unicamente pela preferência temporal.[38]

Chega-se à mesma conclusão se se considerarem mudanças na oferta de dinheiro (sendo dada a preferência pela liquidez). Keynes afirma que um aumento na oferta de dinheiro, tudo o mais constante, pode ter um efeito positivo sobre o emprego. Ele escreve que “tão logo haja desemprego, o emprego mudará na mesma proporção da quantidade de dinheiro”.[39] No entanto, esse é um pronunciamento altamente curioso, por assumir a existência de recursos não empregados em vez de explicar por que tal coisa deveria poder acontecer – pois, obviamente, um recurso só pode não ser empregado porque não foi reconhecido como escasso e, desse modo, não tem valor, ou porque seu dono voluntariamente lhe atribui um preço muito acima do de mercado e então o seu não emprego não é um problema que clamaria por uma solução.[40]

Mesmo que se dispensasse essa crítica, a afirmação ainda assim seria falaciosa. Pois se tudo o mais realmente se mantivesse constante, a oferta adicional de dinheiro simplesmente levaria a preços gerais aumentados e a um simultâneo e proporcional aumento nas taxas salariais, e absolutamente nada mudaria. Se, ao contrário disso, o emprego aumentasse, isso somente seria possível se as taxas salariais não crescessem juntamente com os outros preços e na mesma medida. Mas então não se pode mais dizer que tudo o mais se manteve constante, porque as taxas de salários reais se reduziriam, e, enquanto os salários reais caem, o emprego só pode crescer se a avaliação relativa do emprego em comparação com o autoemprego (i.e., desemprego) se assumir ter mudado. Mas, se isso é assumido, nenhum aumento na oferta de dinheiro seria requerida. O mesmo resultado (emprego aumentado) também poderia ser realizado pelos trabalhadores aceitando taxas salariais nominais menores.

3. Juro

Tendo jogado a lógica e a teoria econômica pela janela, Keynes, em sua discussão do fenômeno do juro, abandona inteiramente a razão e o bom senso.

De acordo com Keynes, já que o dinheiro possui um efeito sistemático sobre emprego, renda e juro, este último deve ser concebido, por sua vez – de maneira bastante consistente para essa questão –, como um fenômeno puramente monetário.[41] Eu não preciso explicar a falácia elementar dessa visão. Aqui basta dizer de novo que o dinheiro desapareceria no equilíbrio, mas o juro não, o que demonstra que o juro deve ser considerado um fenômeno real, e não um fenômeno monetário.

Ademais, Keynes, ao falar de “relações funcionais” e “determinação mútua” de variáveis em vez de relações unidirecionais, causais, enreda-se em inescapáveis contradições no que diz respeito à sua teoria do juro.[42] Como foi explicado acima, por um lado Keynes concebe a preferência pela liquidez (e a oferta de dinheiro) como determinadora da taxa de juros, de tal modo que um aumento na demanda por dinheiro, por exemplo, elevaria a taxa de juros (e uma oferta maior de dinheiro iria diminuí-la) e que isso então reduzirá o investimento “ao passo que se pode esperar que um declínio na taxa de juros, ceteris paribus, aumente o volume de investimento”.[43] Por outro lado, caracterizando a taxa de juros como “a recompensa pela renúncia à liquidez”, ele sustenta que a demanda por dinheiro é determinada pela taxa de juros, de maneira que uma queda na taxa de juros, por exemplo, elevaria a demanda por dinheiro (e também, deve-se acrescentar, a propensão para o consumo) e por isso levaria a uma redução do investimento. Obviamente, no entanto, uma taxa de juros menor dificilmente pode aumentar e reduzir o investimento ao mesmo tempo. Algo aqui deve estar errado.

Keynes, contudo, combina falsidade e contradição em uma das teorias conspiratórias mais fantásticas já ouvidas.

Já que o juro, de acordo com Keynes, é um fenômeno puramente monetário, só é natural assumir que ele pode ser manipulado à vontade através de políticas monetárias (contanto, é claro, que não se esteja limitado pela existência de um dinheiro-mercadoria a 100% de reservas como o padrão-ouro).[44] “Não existe”, escreve Keynes, “nenhuma virtude especial na taxa de juros pré-existente”.[45] Na verdade, se a oferta de dinheiro for suficientemente aumentada, a taxa de juros pode supostamente ser trazida a zero. Keynes reconhece que isso implicaria uma superabundância de bens de capital, e se iria pensar que essa realização deveria ter-lhe dado motivo para reconsiderar. Não é bem assim! Ao contrário, com toda a seriedade ele nos diz

que uma comunidade racionalmente dirigida e provida de recursos técnicos modernos, e cuja população não cresça rapidamente, seria capaz, no espaço de uma única geração, de reduzir a eficiência marginal do capital a um nível de equilíbrio próximo de zero.[46]

É “relativamente fácil tornar os bens de capital tão abundantes que sua eficiência marginal seja zero, este pode ser o caminho mais razoável para eliminar gradualmente a maioria das características repreensíveis do capitalismo”.[47] “Não há razões intrínsecas para a escassez do capital”.[48] Ao invés disso, “o Estado ainda teria o recurso de manter uma poupança agregada a um nível que permitisse o crescimento do capital até que sua escassez desaparecesse”.[49]

Não se preocupe se isso implicaria que nenhuma manutenção ou reposição de capital seria mais necessária (pois, se fosse esse o caso, os bens de capital ainda seriam escassos e por isso exigiriam um preço) e que, ao invés disso, os bens de capital teriam que ser “bens livres” no mesmo sentido em que o ar é usualmente “livre”. Não se preocupe se, caso os bens de capital não sejam mais escassos, os bens de consumo também não mais poderiam ser escassos (pois, se fossem, os meios empregados para produzi-los também teriam que ser escassos). E não se preocupe se, nesse Jardim do Éden, o qual Keynes promete estabelecer no espaço de tempo de uma geração (por que tanto tempo?!), não mais haveria qualquer uso para o dinheiro. Porque, como ele nos informa, “eu mesmo estou impressionado pelas grandes vantagens sociais que adviriam do crescimento do estoque de capital suficiente para pôr fim à sua escassez”.[50] Quem se atreveria a discordar disso![51]

No entanto, mais está por vir. Porque, conforme Keynes o enxerga, existem alguns obstáculos na estrada para o paraíso. O padrão-ouro coloca-se no caminho, pois torna impossível a expansão de crédito (ou pelo menos difícil, já que uma expansão de crédito iria levar a um efluxo de ouro e a uma subsequente contração econômica). Daí das repetidas polêmicas de Keynes contra essa instituição.[52] Além disso, há o já explicado problema de sua própria criação: que uma taxa de juros mais baixa supostamente aumenta e diminui o investimento simultaneamente. E é para sair dessa bagunça lógica que Keynes vem com uma teoria conspiratória: porque, enquanto a taxa de juros deve ser reduzida a zero para eliminar a escassez, como acabamos de dizer, quanto menor a taxa de juros, menor também a recompensa pela renúncia à liquidez. Isto é, quanto menor a taxa de juros, menor o incentivo para os capitalistas investirem, porque seus lucros serão reduzidos na mesma medida. Assim, eles tentarão enfraquecer e conspirarão contra qualquer tentativa de ressuscitar o Jardim do Éden.

Guiados por “espíritos animais”,[53] “instintos de troca”[54] e “viciados na paixão por fazer dinheiro”,[55] eles irão conspirar para “que o capital tenha de ficar escasso o bastante”.[56] “A agudeza e a peculiaridade de nossos problemas contemporâneos emanam, portanto”, escreve Keynes,

do fato de que a taxa média de juros compatível com um volume médio razoável de emprego pode ser inaceitável para os possuidores de riqueza, de forma que seja impossível estabelecê-la facilmente por meio de simples manipulações da quantidade de dinheiro.[57]

Na verdade,

o elemento mais estável e o mais difícil de modificar em nossa economia contemporânea tem sido até agora, e poderá continuar a sê-lo no futuro, a taxa mínima de juros aceitável pela maioria dos possuidores de riqueza.[58]

Felizmente, somos informados, existe uma saída para essa situação; através da “eutanásia do rentista e, consequentemente, à eutanásia do poder cumulativo de opressão do capitalista em explorar o valor de escassez do capital”.[59] E certamente eles merecem tal destino. Pois “o mundo dos negócios” é governado por uma “psicologia incontrolável e desobediente”,[60] e os mercados de investimento privado são

sob a influência de compradores em sua maioria ignorantes do que compram e de especuladores mais interessados nas previsões da próxima mudança de opinião do mercado do que numa estimativa racional do futuro rendimento dos bens de capital.[61]

Como uma questão de fato, não sabemos todos que “não há evidência clara tirada da experiência a demonstrar que a política de investimento socialmente mais vantajosa coincida com a mais lucrativa”;[62] que, de fato, as decisões dos investidores privados levam em conta amplamente “os nervos e a histeria, além das digestões e das reações às condições climáticas das pessoas”[63], em vez do cálculo racional?! Desse modo, conclui Keynes, “o dever de regular o volume corrente de investimento não pode ser, com segurança, abandonado a mãos privadas”.[64] Em vez disso, para transformar a presente miséria numa terra de leite e mel, ” socialização algo ampla dos investimentos será o único meio”.[65]

Encontrando-se o Estado em situação de poder calcular a eficiência marginal dos bens de capital a longo prazo e com base nos interesses gerais da comunidade, espero vê-lo assumir uma responsabilidade cada vez maior na organização direta dos investimentos.[66]

Eu creio que nada disso requer mais comentários. É demasiado óbvio que essas são as efusões de alguém que merece ser chamado de qualquer coisa, exceto de economista.

4. O Processo Capitalista

Tal veredicto encontra ainda mais suporte quando a teoria de Keynes do processo capitalista é finalmente considerada. Que Keynes não é nenhum amigo do capitalismo e dos capitalistas deveria ser óbvio pelas citações acima. Na verdade, ao advogar “uma socialização do investimento” ele se mostra abertamente um socialista.[67] Para Keynes, capitalismo significa crise.

Ele identifica essencialmente duas razões para isso. A primeira, à qual Keynes atribui a natureza cíclica do processo capitalista, já foi abordada. Com certeza, na medida em que o curso da economia é amplamente determinado por capitalistas que, como ouvimos, são “em sua maioria ignorantes do que compram” e que conspiram “para manter as coisas escassas”, tal curso não pode ser tranquilo e constante. Dependendo principalmente de pessoas que baseiam suas decisões nas suas “digestões e reações às condições climáticas”, o processo capitalista deve ser errático. Movidos pelo “crescer e minguar” do otimismo e pessimismo empresariais, o que, por sua vez, é determinado pela “psicologia incontrolável e desobediente do mundo dos negócios”, booms e busts são inevitáveis. Ciclos econômicos – conforme a mensagem central do capítulo 22 da Teoria Geral de Keynes, “Notas Sobre o Ciclo Econômico” – são fenômenos psicologicamente determinados. Isso com certeza é incorreto. Uma explicação psicológica do ciclo econômico é estritamente impossível, e pensá-la como uma explicação envolve um erro de categoria: ciclos econômicos obviamente são eventos reais, vivenciados por indivíduos, mas são vivenciados por eles como acontecendo fora deles, no mundo de bens reais e riqueza real. Crenças, sentimentos, expectativas, otimismo e pessimismo, por outro lado, são fenômenos psicológicos. Pode-se pensar um fenômeno psicológico como afetando ou influenciando algum outro, mas é impossível conceber um fenômeno psicológico como tendo qualquer impacto direto sobre resultados no mundo exterior de coisas e bens reais. Somente através de ações é que pode o curso de eventos reais ser influenciado; e portanto qualquer explicação do ciclo econômico deve necessariamente ser praxeológica (em oposição a psicológica). A teoria psicológica do ciclo econômico de Keynes, na realidade, não pode explicar se algo realmente aconteceu. Entretanto, conforme as coisas aconteçam, as pessoas devem agir, e alocar e realocar recursos escassos para objetivos valorizados. Não se pode agir tão arbitrariamente, porém, como Keynes o assumiria, porquanto ao agir o sujeito está restringido por escassez real que em absoluto não pode ser afetada por sua psicologia. Keynes também não explica com sua teoria por que mudanças de humor empresariais resultariam em qualquer padrão particular de flutuações de negócios – tais como o ciclo de expansão e retração econômica, que ele supostamente quer elucidar – em vez de em qualquer outro padrão concebível de flutuações.

O segundo motivo para a instabilidade do capitalismo e o desejo por uma solução socialista, de acordo com Keynes, são as tendências estagnacionistas inerentes do capitalismo. Sua teoria da estagnação gira em torno da noção que ele toma de Hobson e Mummery e endossa, segundo a qual “no estado normal das comunidades industriais modernas, é o consumo que limita a produção e não a produção que limita o consumo”.[68] Com isso sendo um de seus axiomas, apenas absurdos podem se seguir.

A estagnação se deve a uma falta de consumo. “Dentro dos limites da existência do pleno emprego”, ele escreve, “o crescimento do capital não depende absolutamente de uma baixa propensão a consumir, mas é, ao contrário, reprimido pela mesma”.[69] Combinada a essa tese subconsumista está uma “lei psicológica fundamental em que podemos basear-nos com inteira confiança, tanto a priori, partindo do nosso conhecimento da natureza humana, como a partir dos detalhes dos ensinamentos da experiência, [a qual] consiste em que os homens estão dispostos, de modo geral e em média, a aumentar o seu consumo à medida que a sua renda cresce, embora não na mesma proporção do aumento de sua renda”.[70] “Como regra geral . . . uma proporção maior de renda [será] salva à medida que a renda real cresce.”[71]

Por si só, essa segunda lei, que aqui é aceita como plausível pelo bem do argumento (mas acrescentando-se que o consumo jamais pode, é claro, chegar a zero), não pareceria indicar qualquer problema. E daí? Se a poupança cresce mais que proporcionalmente com rendas crescentes, tanto melhor para o produto social.[72] Mas Keynes, com sua característica maneira de pensar despreocupada com a lógica, junta essa lei à tese de que a produção é limitada pelo consumo, e então ele não tem dificuldade em provar nada que deseje.

Se o consumo limita a produção, e se o não consumo cresce com rendas crescentes, então de fato parece se seguir que rendas crescentes implicam sua própria anulação por aumentar o não consumo, o que, por sua vez, limita a produção, etc. E se é assim, também parece se seguir que sociedades mais ricas, que consumem menos, deveriam ser afligidas de maneira especialmente mais pesada por essa “stagnitis“; e que, em qualquer dada sociedade, deveria ser o rico, que consume menos, o que mais contribui para a estagnação econômica (exceto pelo “pequeno” problema de que não se pode explicar, de acordo com essa teoria, por que sociedades ou indivíduos poderiam ser mais ricos do que outros em primeiro lugar!). Em todo caso, Keynes aceita essas conclusões como verdadeiras.[73] Em conformidade, ele apresenta suas recomendações sobre como sair da estagnação. Em adição à “socialização algo ampla dos investimentos”, Keynes sugere medidas para estimular o consumo, em particular uma redistribuição de renda do rico (pessoas com propensão a consumir mais baixa) para o pobre (aqueles com propensão a consumir mais alta).

Embora procurando conseguir um fluxo de investimento controlado socialmente com vista à baixa progressiva da eficiência marginal do capital, estou disposto a apoiar, ao mesmo tempo, toda sorte de medidas para aumentar a propensão a consumir. Como é improvável que o pleno emprego possa ser mantido com a propensão a consumir existente, façamos o que fizemos com relação ao investimento. Há condições, portanto, para que ambas as políticas funcionem juntas; promover o investimento e ao mesmo tempo o consumo, não apenas até o nível que corresponderia ao acréscimo do investimento com a propensão a consumir existente, mas também a um nível ainda maior.[74]

Como que isso de promover o investimento e o consumo simultaneamente para elevar a renda é concebivelmente possível? Na verdade, Keynes nos dá suas próprias definições formais dos termos envolvidos: “renda = consumo + investimento; poupança = renda – consumo; portanto, poupança = investimento”.[75] Sob tais definições, um aumento simultâneo no consumo e no investimento fora de dada renda é conceitualmente impossível!

Keynes não é terrivelmente perturbado por “detalhes” como esses. Para conseguir o que ele quer, ele simplesmente troca, completamente despercebido, os significados dos seus termos. Ele abandona as definições formais citadas há pouco, as quais tornariam esse resultado impossível, e adota um novo significado para o termo poupança. Em vez de renda não consumida, poupança vem discretamente a significar acumulação (i.e., o ato de não gastar dinheiro nem com consumo e nem com bens de capital).[76] Desse modo facilmente podem-se fazer os resultados darem certo. Pois assim poupança não é mais igual a investimento; e poupança, sendo definida como o ato de não gastar, automaticamente adquire uma conotação negativa, enquanto consumo e investimento ganham uma positiva. Ademais, agora se deve quase ficar naturalmente preocupado quanto à poupança exceder o investimento, ou assim parece, pois isso pareceria implicar que alguma coisa está escoando para fora da economia, e que a renda (definida como investimento + consumo) de alguma forma deve ser reduzida. Keynes certamente se preocupa com essa possibilidade. Ele a chama de “uma tendência crônica que a propensão a economizar apresenta, ao longo de toda a história da humanidade, a ser maior que o incentivo a investir”.[77] E essa tendência crônica deve ser, decerto, particularmente pronunciada se as rendas forem altas, pois assim, como dissemos, a poupança atinge uma proporção particularmente alta da renda. Mas não se desespere. Onde algo pode escoar para fora, algo certamente pode escoar para dentro. Se poupança é dinheiro não gasto, então se pode fazer surgir poupança, simples assim, por meio da criação governamental de dinheiro, de maneira a compensar os escoamentos externos que tendem a aumentar com rendas crescentes. Existe o perigo, é claro, de essas “poupanças comunitárias” imediatamente escoarem de novo para fora ao ser adicionadas ao dinheiro de caixa do setor privado (porque, segundo Keynes, a poupança recém-criada poderia diminuir a taxa de juros, e isso por sua vez aumentaria a preferência pela liquidez dos capitalistas de modo a neutralizar essa tendência e artificialmente “manter o capital escasso”). Mas pode-se cuidar disso pela “socialização do investimento”, como sabemos, e por alguns esquemas gesellianos de dinheiro carimbado (“A ideia por trás do dinheiro carimbado é sólida”).[78] E uma vez que a poupança e o investimento são feitos publicamente – através da agência do estado, como Keynes diria – e todo o dinheiro é gasto, e mais nenhum motivo para manter as coisas escassas está no caminho, não há mais nenhum problema com aumentar o consumo e o investimento simultaneamente. Já que poupança é dinheiro não gasto e dinheiro e crédito recém-criados são tão genuínos quanto quaisquer outros por não serem “forçados” sobre ninguém, poupança pode ser criada por uma canetada.[79] E já que o estado, ao contrário dos capitalistas exploradores da escassez, pode se certificar de que essa poupança adicional genuína esteja realmente sendo despendida (ao invés de se acumular em reservas), qualquer aumento na oferta de dinheiro e crédito através da falsificação governamental eleva o consumo e o investimento ao mesmo tempo e assim promove rendimento duas vezes. Inflação permanente é o cura-tudo de Keynes. Isso ajuda a superar a estagnação; e mais disso supera a crise de estagnação mais severa das sociedades mais avançadas. E uma vez derrotada a estagnação, ainda mais inflação abolirá a escassez dentro de uma geração.[80]

Mas as maravilhas não cessam. O que é esse escoamento, esse excedente de poupança em relação ao investimento, que constitui todos esses perigos? Alguma coisa deve escoar de algum lugar para um outro, e deve desempenhar algum papel aqui e outro lá. Keynes tenta dispersar esses pensamentos pedindo-nos novamente para não aplicarmos a lógica à economia. “O pensamento contemporâneo”, ele escreve, “está ainda fortemente impregnado da noção de que, se o dinheiro não for gasto de uma forma, o será de outra”.[81] Parece difícil imaginar como esse pensamento contemporâneo poderia estar errado, mas Keynes o crê falso. Para ele existe uma terceira alternativa. Alguma coisa, dir-se-ia um bem econômico, simplesmente deixa de existir, e isso significa problema.

Um ato de poupança individual significa – por assim dizer – uma decisão de não jantar hoje, mas não implica, necessariamente, a decisão de jantar ou de comprar um par de sapatos daqui a uma semana ou um ano, ou de consumir uma coisa específica numa data especificada. Assim sendo, produz um efeito depressivo sobre as atividades econômicas aplicadas na preparação do jantar de hoje, sem estimular as que prepararam algum ato futuro de consumo. Não é uma substituição da demanda de consumo presente por uma demanda de consumo futuro, mas apenas uma diminuição líquida desta demanda.[82]

Entretanto, as estruturas de uma lógica binária não chegam a desmoronar ainda. Como pode haver qualquer diminuição líquida de alguma coisa? O que não é gasto em bens de consumo ou bens de capital deve ainda ser gasto em alguma outra coisa – ou seja, em dinheiro. Isso esgota todas as possibilidades. Renda e riqueza podem e devem ser alocadas para consumo, investimento ou dinheiro. A diminuição de Keynes, o escoamento, o excedente de poupança sobre investimento são renda gasta em ou adicionada a dinheiro de caixa. Mas esse aumento da demanda por dinheiro não tem efeito sobre a renda, o consumo ou o investimento, como já foi explicado. Com dado estoque social de dinheiro, uma elevação geral na demanda por dinheiro só pode ser gerada ao se jogarem para baixo os preços de bens não monetários. Mas e daí?[83] A renda nominal (i.e., a renda em termos de dinheiro) irá cair; mas a renda real e a real proporção entre consumo e investimento permanecerão completamente inalteradas. E as pessoas ao longo do caminho conseguem o que querem: um aumento no valor real de seus saldos em caixa e no poder aquisitivo da unidade da moeda. Não há nada estagnado aqui, ou se drenando, ou se escoando, e Keynes não ofereceu de modo algum uma teoria da estagnação (e com isso, é claro, também nenhuma teoria de como sair da estagnação). Ele meramente deu a um fenômeno perfeitamente normal como a queda de preços (causada por um aumento na demanda por dinheiro, ou por uma economia produtiva em expansão) um nome ruim, chamando-o de estagnação, ou depressão, ou o resultado de uma falta de demanda efetiva, só para achar outra desculpa para seus próprios esquemas inflacionários.[84]

Aqui nós temos Keynes em sua inteira grandiosidade: o mais famoso “economista” do século vinte. Das falsas teorias do emprego, da moeda e do juro, ele destilou uma teoria fantasticamente errada do capitalismo e de um paraíso socialista erigido sobre papel-moeda.

 

Tradução de João Marcos Theodoro

 

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NOTAS:

[1]Veja em particular Ludwig von Mises, Human Action (Chicago: Regnery, 1966); Murray N. Rothbard, Man, Economy, and State (Los Angeles: Nash, 1970).

[2]Sobre os fundamentos da economia veja Ludwig von Mises, Epistemological Problems of Economics (New York: New York University Press, 1981); idem, Theory and History (Auburn, Ala.: Ludwig von Mises Institute, 1985); idem, The Ultimate Foundation of Economic Science (Kansas City: Sheed Andrews and McMeel, 1978); Murray N. Rothbard, Individualism and the Philosophy of the Social Sciences (San Francisco: Cato Institute, 1979); Hans-Hermann Hoppe, Kritik der kausalwissenschaftlichen Sozialforschung. Untersuchugen zur Grundlegung von Soziologie und Ökonomie (Opladen: Westdeutscher Verlag, 1983); idem, Praxeology and Economic Science (Auburn, Ala.: Ludwig von Mises Institute, 1988).

Sobre a visão contrária, positivista, de acordo com a qual as leis econômicas são hipóteses sujeitas a confirmação e falseamento empírico (bem similarmente às leis da física), veja Milton Friedman, “The Methodology of Positive Economics”, em idem, Essays in Positive Economics (Chicago: University of Chicago Press, 1953).

[3]John Maynard Keynes, The General Theory of Employment, Interest, and Money (New York: Harcourt, Brace and World, 1964), esp. chap. 23.

[4]Mises, Human Action, p. 599.

[5]Ibid., p. 611.

[6]Sobre preferência temporal, veja a seção 1.3 a seguir.

[7]A afirmação de que desemprego involuntário é possível no quadro de uma economia da propriedade privada como caracterizada acima deve-se a uma confusão lógico-conceitual elementar: ignorar o fato de que o emprego é um negócio bilateral; i.e., uma troca que, como toda troca voluntária, só pode acontecer se for considerada mutuamente, bilateralmente benéfica. Classificar alguém como involuntariamente desempregado caso ele não consiga achar ninguém disposto a atender às suas exigências de emprego unilateralmente fixadas não faz mais sentido do que chamar um indivíduo em busca de uma esposa, uma casa ou uma Mercedes de involuntariamente sem esposa, sem casa ou sem Mercedes, por ninguém querer casar-se com ele ou lhe dar uma casa ou uma Mercedes nos termos que esse indivíduo determinou unilateralmente como aceitáveis para ele. Haveria absurdo e contradição se alguém o fizesse. Porque assim não só se teria que aceitar, como o outro lado da moeda, que o empregador, a mulher e os donos da casa ou da Mercedes, os quais estão boicotando aquele sujeito, deveriam, por seu turno, ser considerados não empregador, não esposa e não doador de casa ou Mercedes involuntários, por suas exigências unilaterais não serem atendidas pelo potencial empregado, marido ou dono da casa ou Mercedes, do mesmo jeito que aqueles não atendem às exigências destes últimos. Além disso, com o potencial empregado e o potencial empregador sendo classificados como involuntários por não terem chegado a um acordo mutuamente benéfico, criar um “emprego voluntário” implicaria coagir uma das partes ou ambas a aceitar uma troca cujos termos uma das partes ou ambas consideram inaceitáveis. Logo, dizer que desemprego involuntário é possível no mercado desimpedido é dizer que coerção significa voluntariedade, e voluntariedade, coerção, o que é absurdo.

[8]Veja Mises, Human Action, pp. 244–50.

Em um sistema sem mudança no qual não existe incerteza alguma sobre o futuro, não há qualquer necessidade de encaixe. Cada indivíduo sabe precisamente de que quantidade de dinheiro ele precisará em qualquer data futura. Ele está, portanto, em condição de emprestar todos os seus fundos recebidos de tal modo que os empréstimos vencerão na data em que precisará deles. (p. 249)

Veja também Rothbard, Man, Economy, and State, p. 280.

[9]Ludwig von Mises, The Theory of Money and Credit (Irvington, N.Y.: Foundation for Economic Education, 1971), pp. 32–33; veja também Carl Menger, Principles of Economics (New York: New York University Press, 1981); idem, Geld, em Carl Menger, Gesammelte Werke, ed. F. A. Hayek (Tübingen: Mohr, 1970), vol. 4.

[10]Veja Rothbard, Man, Economy, and State, pp. 669–71.

Bens são úteis e escassos, e qualquer acréscimo em bens é um benefício social. Mas o dinheiro não é útil diretamente, mas apenas em trocas. . . . Quando há menos dinheiro, o valor de troca da unidade monetária aumenta; quando há mais dinheiro, o valor de troca da unidade monetária cai. Nós concluímos que não existe tal coisa como dinheiro “demais” ou “muito pouco” dinheiro e que qualquer que seja o estoque social de dinheiro, os benefícios do dinheiro serão sempre utilizados ao máximo. (p. 670)

Veja também Murray N. Rothbard, The Mystery of Banking (New York: Richardson and Snyder, 1983).

[11]Sobre a teoria da preferência temporal do juro, veja William Stanley Jevons, Theory of Political Economy (New York: Augustus M. Kelley, 1965); Eugen von Böhm-Bawerk, Capital and Interest, 3 vols. (South Holland, Ill.: Libertarian Press, 1959); Richard von Strigl, Kapital und Produktion (Vienna: Julius Springer, 1934 [Engl. trans., Ludwig von Mises Institute, 1988]); Frank Fetter, Capital, Interest, and Rent (Kansas City: Sheed Andrews and McMeel, 1971); Roger Garrison, “In Defense of the Misesian Theory of Interest”, Journal of Libertarian Studies 3, no. 2 (1979); idem, “Professor Rothbard and the Theory of Interest”, em Walter Block and Llewellyn H. Rockwell, Jr., eds., Man, Economy, and Liberty: Essays in Honor of Murray N. Rothbard (Auburn, Ala.: Ludwig von Mises Institute, 1988).

[12]Mises, Human Action, p. 483.

[13]Para deixar claro, nem todos os processos de produção longos são mais produtivos que os curtos; mas, sob a assunção de que o homem, restringido pela preferência temporal, irá invariavelmente e sempre selecionar os métodos de produção mais curtos concebíveis de determinado produto, então qualquer aumento na produção só pode – praxeologicamente – ser obtido se a estrutura da produção for prolongada.

[14]Mises, Human Action, pp. 490ff.

[15]Veja também Rothbard, Man, Economy, and State, pp. 663f.

[16]Veja também Mises, Human Action, pp. 530–32; Rothbard, Man, Economy, and State, pp. 385–86.

[17]Veja também Murray N. Rothbard, America’s Great Depression (Kansas City: Sheed and Ward, 1975), pp. 39–41.

[18]Veja também Rothbard, America’s Great Depression, pp. 12–17.

[19]Sobre o papel do governo enquanto destruidor da formação de riqueza, veja em particular Murray N. Rothbard, Power and Market (Kansas City: Sheed Andrews and McMeel, 1977); Hans-Hermann Hoppe, A Theory of Socialism and Capitalism (Boston: Kluwer Academic Publishers, 1989); idem, “The Economics of Sociology and Taxation”, Journal des Economistes et des Etudes Humaines (1990); supra chap. 2.

[20]Veja em particular Rothbard, The Mystery of Banking; Hans-Hermann Hoppe, “Banking, Nation States, and International Politics”, Review of Austrian Economics 4 (1990); supra chap. 3; idem, “Marxist and Austrian Class Analysis”, Journal of Libertarian Studies 9, no. 2 (1990); supra chap. 4; idem, “European Economic Integration and the ECU”, Austrian Economics Newsletter (1989).

[21]Sobre a teoria dos ciclos econômicos veja a contribuição original de Mises em seu Theory of Money and Credit, part III, chap. 5; sua primeira versão elaborada é Geldwertstabilisierung und Konjunkturpolitik (Jena: Gustav Fischer, 1928), cuja tradução para o inglês não apareceu até 1978 em Ludwig von Mises, On the Manipulation of Money and Credit (Dobbs Ferry, N.Y.: Free Market Books, 1978); F.A. Hayek, Monetary Theory and the Trade Cycle (New York: A.M. Kelley, 1966); idem, Prices and Production (New York: Augustus M. Kelley, 1967); os trabalhos de Hayek foram publicados primeiro em 1929, resp. 1931; é interessante notar que Hayek, que recebeu o prênio Nobel em 1974, o ano posterior ao da morte de Mises, por suas contribuições à teoria Mises-Hayek dos ciclos econômicos, obviamente deturpa as conquistas de Mises no que diz respeito a essa teoria: no seu Prices and Production de 1931, primeira apresentação da teoria austríaca dos ciclos econômicos a aparecer em inglês, ele reconhece a reivindicação anterior de Mises à fama. Porém, embora ele cite o trabalho de 1928 de Mises acima mencionado, ele afirma falsamente que as contribuições de Mises à teoria estavam essencialmente confinadas a poucas observações em seu trabalho original de 1912; veja chap. 3 fn. 1 em Prices and Production; Strigl, Kapital und Produktion; Lionel Robbins, The Great Depression (Freeport, N.Y.: Books for Libraries Press, 1971); Rothbard, America’s Great Depression; Ludwig von Mises, et al., The Austrian Theory of the Trade Cycle and Other Essays (Auburn, Ala.: Ludwig von Mises Institute, 1983); Hoppe, Kritik der kausalwissenschaftlichen Sozialforschung, chap. 3; Roger Garrison, “Hayekian Trade Cycle Theory: A Reappraisal”, Cato Journal 6, no. 2 (1986); idem, “The Austrian Theory of the Business Cycle in the Light of Modern Macroeconomics”, Review of Austrian Economics 3 (1988).

[22]Veja também Roger Garrison, “‘Rational Expectations’ Offers Nothing That’s Both New and True”, Austrian Economics Newsletter 6, no. 1 (1985); idem, “The Austrian Theory of the Business Cycle in Light of Modern Macroeconomics”, esp. pp. 19–23. Veja também as críticas às teorias psicológicas – em oposição a praxeológicas – dos ciclos econômicos abaixo.

[23]Para literatura pró-keynesiana veja em particular Seymour P. Harris, ed., The New Economics (New York: Alfred Knopf, 1947); Alvin Hansen, A Guide to Keynes (New York: McGraw-Hill, 1953); para literatura anti-keynesiana veja em particular Henry Hazlitt, The Failure of the “New Economics” (Princeton, N.J.: D. Van Nostrand, 1959); idem, ed., The Critics of Keynesian Economics (Lanham, Md.: University Press of America, 1983).

[24]Keynes, The General Theory, p. 21; also pp. 6, 15.

[25]Ibid., p. 15. A essa altura Keynes promete que uma definição alternativa será dada na p. 26; de forma reveladora, definição alguma desse tipo aparece nem nesse e nem em qualquer outro lugar do livro!

[26]Veja também Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, p. 30.

[27]Keynes, The General Theory, pp. 242–43; também a p. 28.

[28]Veja também Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, p. 52

[29]Keynes, General Theory, p. 293.

[30]Ibid., p. 294.

[31]Mises explica:

Suponhamos que exista apenas ouro em moeda e apenas um banco central. Na medida em que se avança na direção de uma economia uniformemente circular, todos os indivíduos e firmas restringem passo a passo seus encaixes e as quantidades de ouro assim liberadas fluirão para uma utilização não monetária – industrial. Quando o equilíbrio da economia uniformemente circular é finalmente atingido, não há mais encaixes; o ouro não é mais usado com propósitos numéricos. Os indivíduos e as firmas possuem direitos contra o banco central, cuja maturidade corresponde precisamente às suas necessidades nas respectivas datas de suas obrigações. O banco central não precisa de reservas, já que a soma total dos pagamentos de seus clientes é igual à soma total das retiradas. Todas as transações podem ser efetuadas por simples transferência na contabilidade do banco, sem que seja necessário recorrer à moeda. Assim sendo, o “dinheiro” desse sistema não é um meio de troca; nem mesmo é dinheiro; é meramente um numerário, uma unidade contábil etérea e indeterminada, com o caráter vago e indefinido que a ilusão de alguns economistas e os erros de muitos leigos têm equivocadamente atribuído à moeda. (Ação Humana, p. 305-6)

[32]Keynes reconhece que dinheiro tem algo que ver com incerteza. O erro fundamental em sua teoria apontado aqui, no entanto, vem à tona de novo quando ele relaciona dinheiro não com incerteza, mas, mais especificamente, com a incerteza das taxas de juros. “A condição necessária” [para a existência do dinheiro], ele escreve, “é a existência de incerteza quanto à taxa futura de juros” (General Theory, p. 168; also p. 169). Veja também a subsequente discussão.

[33]Ibid., p. 174.

[34]Sobre as implicações absurdas da assunção de relações funcionais – em vez de causais –, veja a discussão abaixo.

[35]Keynes, The General Theory, p. 174.

[36]Ibid., p. 167.

[37]Veja também Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, pp. 188f.

[38]Veja também Rothbard, America’s Great Depression, pp. 40–41; Mises, Human Action, pp. 521–23.

[39]Keynes, The General Theory, p. 296.

[40]Veja também W. H. Hutt, The Theory of Idle Resources (Indianapolis: Liberty Fund, 1977).

[41]Keynes, The General Theory, p. 173; veja também suas elogiosas observações sobre economia mercantilista e, em particular, Silvio Gesell, como precursores dessa visão nas pp. 341, 355.

[42]Sobre isso veja também Rothbard, Man, Economy, and State, pp. 687–89.

[43]Keynes, The General Theory, p. 173.

[44]Veja também abaixo.

[45]Keynes, The General Theory, p. 328.

[46]Ibid., p. 220.

[47]Ibid., p. 221.

[48]lbid., p. 376.

[49]Ibid., p. 376.

[50]Keynes, The General Theory, p. 325.

[51]Veja também Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, pp. 231–35. E a objeção aparentemente óbvia de que a expansão de crédito monetário através do que Keynes quer trazer a redução da taxa de juros a zero não é nada senão uma expansão de papel e de que o problema da escassez é uma questão de bens “reais” que só pode ser superado por meio de “poupança genuína”? Para isso ele tem a seguinte resposta engraçada no The General Theory:

A ideia de que a criação de crédito pelo sistema bancário permite que sejam realizados investimentos aos quais “nenhuma poupança genuína” corresponde, i.e., a ideia de que poupar e investir … podem se diferenciar um do outro, deve ser explicada, penso eu, por uma ilusão de óptica. (p. 81)

As poupanças que resultam dessa decisão são tão genuínas quanto quaisquer outras poupanças. Ninguém pode ser compelido a possuir o dinheiro adicional correspondente ao novo crédito bancário a não ser que ele deliberadamente prefira guardar mais dinheiro em vez de outra forma de riqueza. (p. 83)

O novo dinheiro não é “forçado” a ninguém. (p. 328)

Como Henry Hazlitt observa,

Seguindo o mesmo raciocínio, nós podemos criar qualquer quantidade de “poupanças” novas que quisermos da noite para o dia simplesmente ao imprimir essa quantidade de papel-moeda novo, porque alguém irá necessariamente reter esse papel-moeda novo! (The Failure of the “New Economics”, p. 227)

[52]Veja Keynes, The General Theory, pp. 129ff., 336ff., 348f. Sobre o papel de Keynes na atual destruição do padrão-ouro veja Henry Hazlitt, From Bretton Woods to World Inflation (Chicago: Regnery, 1984).

[53]Keynes, The General Theory, p. 161.

[54]Ibid., p. 157.

[55]Ibid., p. 374.

[56]Ibid., p. 217.

[57]Keynes, The General Theory, pp. 308–09.

[58]Ibid., p. 309, e ele acrescenta, numa nota de rodapé, “O dito de século dezenove, citado por Bagehot, de que ‘John Bull’ pode suportar muitas coisas, mas não pode suportar 2 porcento”. Sobre a teoria da conspiração de Keynes, veja também Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, pp. 3, 16–18.

[59]Keynes, The General Theory, p. 376, also p. 221.

[60]Ibid., p. 317.

[61]Ibid., p. 316.

[62]Ibid., p. 157.

[63]Ibid., p. 162.

[64]Ibid., p. 320.

[65]Ibid., p. 378.

[66]Ibid., p. 164.

[67]O socialismo de Keynes, porém, não é a versão igualitária-proletária como esposada pelos bolcheviques. Quanto a isso Keynes não tem senão desprezo. Seu socialismo é da variedade fascista ou nazista. No prefácio da edição alemã do seu Teoria Geral (que apareceu em 1936) ele escreve:

A teoria da produção agregada, que é o objetivo do presente livro, pode ser muito mais facilmente aplicada às condições de um estado totalitário do que a teoria da criação e distribuição de um dada produção surgida sob as condições de livre competição e de um grau considerável de laissez-faire. (citado de Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, p. 277).

[68]Keynes, The General Theory, p. 368. Sobre a teoria keynesiana da estagnação, veja também Alvin H. Hanson, Fiscal Policy and Business Cycles (New York: Norton, 1941); para uma crítica, veja George Terborgh, The Bogey of Economic Maturity (Chicago: Machinery and Allied Products Institute, 1945); também Murray N. Rothbard, “Breaking Out of the Walrasian Box: The Cases of Schumpeter and Hansen”, Review of Austrian Economics 1 (1987).

[69]Keynes, The General Theory, pp. 372–73.

[70]Ibid., p. 96.

[71]Ibid., p. 97; também pp. 27f.

[72]Na verdade, Keynes nos informa que poupança é, por definição, idêntico a investimento (p. 63), “que o excesso de rendimento sobre o consumo, que chamamos de poupança, não pode diferir da adição de bens de capital que chamamos de investimento” (p. 64). Então, porém, uma proporção reduzida de gastos com consumo deve, por definição, andar lado a lado com investimentos correspondentemente aumentados, e isso levaria a um rendimento futuro maior, para consumo absoluto ainda maior e ainda mais poupança e investimento absolutos e relativos. Onde está, na realidade, o problema aqui?

[73]Keynes escreve,

Se em uma comunidade potencialmente rica o incentivo para investir for fraco, a insuficiência da demanda efetiva a obrigará a reduzir sua produção real até que, a despeito de sua riqueza potencial, ela se torne tão pobre que os excedentes sobre o consumo diminuam até chegar ao nível correspondente ao seu fraco incentivo para investir. (The General Theory, p. 31)

Ou:

Mais do que isso, quanto maior for a provisão que façamos com antecedência para o consumo, maior será a dificuldade em encontrar novas necessidades para prover, e maior a nossa dependência do consumo presente como fonte de procura. Entretanto, quanto maiores forem as nossas rendas, maior, infelizmente, será a margem entre essas rendas e o nosso consumo. Na ausência de algum novo expediente, não há, como veremos, maneira de resolver o enigma, exceto a que consiste num desemprego suficiente para provocar um empobrecimento bastante para que a diferença, entre nosso consumo e a nossa renda, não seja maior que o equivalente da provisão física para o consumo futuro que seja lucrativo constituir hoje. (p. 105)

[74]Ibid., p. 325; ou “o remédio consistiria em tomar várias medidas capazes de aumentar a propensão a consumir através de uma redistribuição da renda ou de um processo semelhante” (p. 324).

[75]Ibid., p. 63. É típico da filosofia da abundância de Keynes que ele tome as coisas de ponta cabeça também aqui. Pois as definições corretas são: produto produzido = rendimento; rendimento – consumo = poupança; poupança = investimento. De onde vem a renda de Keynes?

[76]Veja também Hazlitt, The Failure of the “New Economics”, pp. 120–23.

[77]Keynes, The General Theory, p. 347.

[78]Ibid., p. 357.

[79]Sobre isso veja a nota 51.

[80]Sobre seu programa de inflação permanente, veja também esta observação sobre o ciclo econômico: “O verdadeiro remédio para o ciclo econômico não consiste em evitar o auge das expansões e em manter assim uma semidepressão permanente, mas em abolir as depressões e manter deste modo permanentemente em um quasi-boom” (p. 322). Ou seja, a resposta à expansão de crédito é ainda mais expansão de crédito.

[81]Ibid., p. 20.

[82]Ibid., p. 210; segunda ênfase acrescentada.

[83]Ao contrário dos medos fantasiosos de Keynes, a demanda por dinheiro não pode jamais ser infinita, porque todo mundo deve obviamente consumir às vezes (e não pode atrasar ainda mais o consumo); e nesses pontos a preferência por liquidez é definitivamente finita.

[84]O segundo elemento da teoria da estagnação de Keynes é igualmente falso. Pode ser que aquela poupança, na definição de ser igual a investimento, aumente desproporcionalmente com rendimentos crescentes – embora nunca possa chegar a 100 por cento. No entanto, essa situação certamente não deveria dar preocupação a ninguém com respeito ao produto social produzido. Não é verdade, todavia, que poupanças no sentido de acumulação aumentam com rendimentos crescentes e que a maior fuga, então, ocorra entre os ricos e em sociedades ricas. O oposto é verdade. Se a renda real aumentar porque a economia, suportada por poupanças adicionais, está se expandindo, o poder de compra do dinheiro cresce (dado o estoque de moeda). Mas, com um poder aquisitivo maior da unidade da moeda, a quantidade de dinheiro demandado na verdade cai (dada a demanda por dinheiro). Desse modo, o não problema da estagnação e da fuga deveria na verdade diminuir ao invés de aumentar com uma riqueza crescente.

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