1- O Caráter de Mises e sua Influência
O valor da minha ligação com o pensamento econômico da Escola Austríaca tem sido inestimável para mim, assim como os testemunhos pessoais acerca do caráter de Mises. Ele jamais sucumbiu a qualquer tentação de atenuar sua posição para ser mais aceito na comunidade econômica convencional, comprovando ser um homem de vontade e de caráter firmes. Se tivesse atenuado suas posições, teria obtido maior reconhecimento durante sua vida. Mas seu objetivo era a verdade econômica, e não um posto acadêmico de prestígio ou elogios superficiais. Sua determinação e consistência estavam balizadas pela confiança de que estava certo, e essa retidão era tudo que importava. Mises sempre foi um cavalheiro, gentil e atencioso com todos, e tenho tentado imitá-lo. Quando o mundo dos economistas e dos políticos está enlouquecendo, é difícil reagir com debates tranquilos e ponderados. No entanto, essa reação lhe era útil e aumentava sua capacidade de lecionar. Em seu devido tempo, sua voz tranquila e as de seus alunos serão ouvidas, apesar da gritaria e da demagogia que afligem Washington, D.C.
Quando ficamos exasperados com o atual estado de coisas, temos de nos lembrar da admoestação de Mises: “Ninguém deve esperar que qualquer argumento lógico ou qualquer experiência possa sequer sacudir o fervor quase religioso daqueles que acreditam na salvação através da gastança e da expansão do crédito.”[3]
Mas temos de nos lembrar também de que é a aceitação do intervencionismo econômico que alimenta essa doença da demagogia que flagela o pensamento e o discurso dos políticos.
Após passarem a crer em si mesmos como planejadores e tomadores de decisão para consumidores, homens de negócio e trabalhadores, os políticos logo podem racionalizar arrogantemente qualquer posição porqualquer razão. Não seria tão ruim se eles soubessem que são demagogos — ao menos, isso seria honesto. Mas essa arrogância se torna um modo de vida e o instrumento para levar a cabo sua próxima intervenção “importante e necessária.”
É apenas com a segurança integral obtida com a Economia Austríaca, e com o exemplo do caráter de Mises, que consigo tolerar o circo cotidiano do Congresso.
O conhecimento econômico não é tão escasso em Washington como alguém poderia imaginar ao observar o Congresso em sessão. Outros parlamentares com frequência compartilham comigo, em caráter privado, julgamentos bem fundados a respeito de déficits e de gastos descontrolados. O que lhes falta é a força de vontade de resistir aos grupos de pressão. Por mais que precisemos desesperadamente de uma melhor compreensão econômica, precisamos ainda mais da característica misesiana da firmeza cavalheiresca a respeito de questões de princípio. O caráter é mais necessário do que a eloquência na teoria econômica.
Jacques Rueff descreveu bem essa qualidade de Mises:
Com um entusiasmo incansável, e com coragem e fé destemidas, ele nunca deixou de denunciar as razões falaciosas e as inverdades oferecidas em justificação da maioria de nossas novas instituições. (…) Nenhuma consideração consegue desviá-lo o mínimo do caminho reto e íngreme pelo qual sua razão objetiva o guia. Em meio ao irracionalismo de nossa época, ele se manteve uma pessoa puramente racional.[4]
Murray Rothbard, em O Essencial von Mises, escreve que Mises:
respondeu ao obscurecimento do mundo econômico à sua volta com uma vida de grande coragem e integridade pessoal. Jamais se curvaria a tendências de mudança que percebia serem desastrosas e estarem fadadas ao fracasso. Nenhuma alteração, fosse de economia política, fosse da ciência econômica, seria capaz de fazê-lo desviar-se um milímetro sequer da busca e da apresentação da verdade tal como a via.[5]
[3] Ludwig von Mises, “As pedras viram pães: o milagre keynesiano,” Planning for Freedom (South Holland, Illinois: Libertarian Press, 1974), p. 63.
[4] Jacques Rueff, “The Intransigence of Ludwig von Mises,” in On Freedom and Free Enterprise, Mary Sennholz, ed. (Princeton, New Jersey: D. Van Nostrand, 1956), p. 15.
[5] Murray Rothbard, O Essencial von Mises (São Paulo, Instituto Mises Brasil, 2010).