O capitalismo e os historiadores brasileiros (Concurso IMB)

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Nota do IMB: o artigo a seguir faz parte do concurso de artigos promovidos pelo Instituto Mises Brasil (leia mais aqui).  As opiniões contidas nele não necessariamente representam as visões do Instituto e são de inteira responsabilidade de seu autor.

Nos ambientes acadêmicos do mundo desenvolvido em geral, é geralmente reconhecido que os marxistas sofreram um golpe do qual não se recuperaram até hoje.  Mesmo o surto de desconfiança no (assim chamado) livre-mercado que se seguiu aos trancos de 2008 não foi o suficiente para trazer vida de volta aos cadáveres acadêmicos dos marxistas “sérios”: as respostas políticas à já tediosa crise, apesar de seu caráter socialista mal disfarçado, não foram sistematicamente acompanhadas daquelas explicações presunçosas insinuando o fim do capitalismo.

O igualitarismo ainda é endêmico no mundo desenvolvido, e pode ser que os marxistas ainda vejam suas idéias renascerem por lá: a fragilidade econômica tende a aumentar com as políticas de intervenção maciças, e em períodos turbulentos as idéias mais sensatas parecem não prover um caminho fácil o suficiente para longe dos problemas.  A possibilidade de uma renascença de teorias arrogantes a ponto de se dizerem “historicamente inevitáveis”, e que de quebra provêem uma solução essencialmente milagrosa para todos os problemas do mundo, não pode ser descartada.

Mas é fato que, em outras paragens, o marxismo como orientação acadêmica está anêmico se comparado com seus dias de glória em que o triunfo do “planejamento” parecia inevitável.  Existe alguma explicação objetiva para sua persistência nos trópicos?  Como foi que o sonho socialista se esquivou da onda de choque resultante do período 1989-1991?  Os alunos de escolas e universidades pelo Brasil afora podem atestar que seus professores marxistas, que são legião, não têm nenhum pudor em avançar suas idéias, as quais são recebidas com a maior seriedade; continuam gozando de enorme popularidade entre seus alunos; e se referem ao fracasso do socialismo com todo o sarcasmo do mundo, como se não passasse de propaganda neoliberal.

Em um artigo recente no site LewRockwell.com, Gary North disse que os “acadêmicos respeitam o poder” – e enquanto a União Soviética tinha poder, marxistas eram levados a sério pelo mundo afora. Sem dúvida, há uma tendência que poderia ser considerada natural, mas nem por isso menos lamentável por parte daqueles que deveriam ser os buscadores incansáveis da verdade científica, de pender para o lado com o arsenal mais impressionante (metafórica e literalmente). No Brasil e na América Latina em geral, os planejadores centrais têm estado entrincheirados no aparato estatal desde que o país se formou como tal. O setor privado, em todas as escalas, sempre viveu numa relação simbiótica ou de conflito com os ilustres guardiões do bem público – e o setor acadêmico não é exceção.

O positivismo reinante nos primórdios da República brasileira era supostamente inimigo mortal do marxismo e outras “anarquias”, e os jovens são ensinados que foi com o movimento representado pela – e é doloroso citar este clichê da intelectualidade tupiniquim – Semana da Arte Moderna que deu ao Brasil uma identidade, superando o que é geralmente tratado (não sem merecimento, apesar de pelas razões erradas) como um período de imitação medíocre dos piores modismos europeus.

Na verdade, se trata de uma transição um tanto quanto natural, de uma utopia crua e com pouca beleza para outra, elaborada e declarando-se científica ao mesmo tempo em que inspirava o romantismo naqueles que se abriam para ela. Quando um professor esquerdista de colégio discursa sobre a importância simbólica da Semana, ele está pagando tributo à penetração do marxismo & cia. na matriz intelectual do país – apesar de isso ser eufemisticamente interpretado como uma abertura para “novas idéias”.

Mas por que o marxismo, de todas as fantasias estatistas, emergiu como a tendência dominante? Pois ele o é, se não por contar com o maior número de seguidores abertos, ao menos por sua influência penetrante na visão de mundo da maioria esmagadora daqueles com alguma formação acadêmica. Esse lamentável estado das coisas provavelmente tem sua origem em uma demonstração quase perfeita dos efeitos colaterais do intervencionismo: a ditadura militar.

Os militares se arrogaram o “dever” de liderar o país em uma estrada que levasse à prosperidade e para longe de conceitos perigosos como o “comunismo”. E para isso adotaram métodos idênticos em qualidade, se não em intensidade, aos que se dispunham a realizar as façanhas mais infames em nome do triunfo do proletariado. O resultado disso no mundo das idéias foi uma martirização da esquerda em geral, que, evidentemente, bate o pé no chão insistindo que a ditadura encarnava tudo de horrível que havia no capitalismo.

O prestígio da esquerda socialista light ao fim da ditadura militar teve momento suficiente para carregá-la com status de VIP através do período pós-ditadura, incluindo o colapso da União Soviética. Vestindo o manto da Inquisição, os marxistas tiveram carta branca para apontar qualquer evento impopular como obra do capitalismo, neoliberalismo, fascismo, nazismo, et cetera (geralmente usados, comicamente, de forma intercambiável).

Se os militares procuravam defender o livre mercado – o que é duvidoso, visto que a violência não pode ser um “meio” para atingir o “fim” da liberdade – dificilmente poderiam ter feito um trabalho pior. Na hipótese muito mais provável de que eles não tivessem a menor intenção de preservar a liberdade dos brasileiros, mesmo assim eles fracassaram espetacularmente, e a ala estatista oposta, a dos socialistas em geral (das quais o marxismo “científico” é a vertente acadêmica mais difundida) tinha infiltrado o aparato estatal, a matriz educacional, e o mundo intelectual quase que completamente. Essa corrupção sistemática não é exclusiva do Brasil, ou outros países “emergentes”, mas é notória a tendência dos latino-americanos em particular de se referir à mais-valia ou outro termo que dá calafrios na espinha para clamar por mudança social.

Pelo menos em parte devido ao zelo dos militares no combate ao comunismo, os brasileiros seguiram contaminados pelo resíduo deste por uma geração além dos países chamados desenvolvidos. E, apesar de o marxismo ser apenas um, e talvez não o mais insidioso, dos estatismos modernos, certamente é o que mais tem enlouquecido os brasileiros da última geração, de forma que é (quase) uma lufada de ar fresco ver o jargão do Keynesianismo vagarosamente suplantar a luta de classes como justificativa favorita dos políticos para atacar o livre mercado.

Não que a Grande Depressão seja remotamente agradável, mas sem dúvida é uma alternativa superior aos Gulags.

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