O fim do Estado-Nação

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Houve um bom número de referências ao tema “filos” nesta publicação ao longo dos anos. Este ensaio discutirá o tema em detalhes. Especialmente como os filos provavelmente substituirão o Estado-Nação, uma das piores invenções da humanidade.

Agora pode ser um bom momento para discutir o assunto. Teremos um fluxo quase incessante de más notícias, em várias frentes, nos próximos anos. Portanto, pode ser bom manter uma perspectiva esperançosa em mente.

Vamos começar olhando para onde estamos. Creio que você vai desculpar minha passada rápida sobre toda a história política humana em alguns parágrafos, mas meu objetivo é fornecer uma estrutura para onde estamos indo, em vez de uma monografia antropológica.

A humanidade passou, até agora, por três estágios principais de organização política desde o primeiro dia, digamos, há 200 mil anos, quando os homens anatomicamente modernos começaram a aparecer. Podemos chamá-los de Tribos, Reinos e Estados-Nação.

Karl Marx tinha muitas coisas erradas, especialmente sua filosofia moral. Mas uma das observações perspicazes que ele fez foi que os meios de produção são talvez o determinante mais importante de como uma sociedade é estruturada. Com base nisso, até agora na história, apenas duas coisas realmente importantes aconteceram: a Revolução Agrícola e a Revolução Industrial. Todo o resto é apenas uma nota de rodapé.

Vamos ver como essas coisas se relacionam.

A Revolução Agrícola e o fim das Tribos

Na pré-história, o maior grupo político/econômico era a tribo. Nela o homem é uma criatura social, assim era natural ser leal à tribo. Fazia sentido. Quase todos na tribo eram geneticamente relacionados, e o grupo era essencial para a sobrevivência mútua no mundo selvagem. Isso as tornava a totalidade de pessoas que importavam na vida de uma pessoa – exceto por “outros” de outras tribos, que estavam em competição por recursos escassos e poderiam querer matá-lo só por precaução.

As tribos tendem a ser meritocracias naturais, com os mais inteligentes e os mais fortes assumindo a liderança. Mas também são democracias naturais, pequenas o suficiente para que todos possam opinar sobre questões importantes. As tribos são pequenas o suficiente para que todos conheçam todos os outros e saibam quais são seus pontos fracos e fortes. Todos caem em um nicho de vantagem marginal, fazendo o que fazem de melhor, simplesmente porque isso é necessário para sobreviver. Os maus membros são ostracizados ou acordam numa poça de seu próprio sangue, alguma manhã. As tribos são socialmente repressivas, mas, considerando as muitas falhas da natureza humana, uma forma natural e útil de organização em uma sociedade com tecnologia primitiva.

À medida que as pessoas construíram seu pool de capital e tecnologia ao longo de muitas gerações, no entanto, as populações cresceram. No final da última Era do Gelo, há cerca de 12 mil anos, em todo o mundo, houve uma explosão populacional. As pessoas começaram a viver nas cidades e a depender da agricultura, em vez da caça e da coleta. Grandes grupos de pessoas vivendo juntas formavam hierarquias, com algum tipo de rei no topo.

Aqueles que se adaptaram à nova tecnologia agrícola e à nova estrutura política acumularam os recursos excedentes necessários para travar uma guerra prolongada contra tribos que ainda viviam em nível de subsistência. As sociedades mais evoluídas tinham os números e as armas para triunfar completamente sobre os atrasados. Se você quisesse permanecer tribal, é melhor viver no meio do nada, em algum lugar desprovido dos recursos que os outros possam querer. Caso contrário, era certo que um reino próximo o escravizaria e roubaria sua propriedade.

A Revolução Industrial e o fim dos Reinos

De cerca de 12.000 a.C. até aproximadamente meados de 1600, as culturas do mundo foram organizadas sob homens fortes, variando de pequenos senhores a reis, faraós ou imperadores.

É estranho, pelo menos para mim, o quanto o animal humano parece gostar da ideia de monarquia. Ela é mitificada, especialmente em um contexto medieval, como um sistema com reis nobres, princesas justas e bravos cavaleiros saindo de castelos em uma colina para corrigir injustiças. Como meu amigo Rick Maybury gosta de apontar, com muita precisão, a realidade difere bastante do mito. O rei raramente é mais do que um bandido bem-sucedido, um Tony Soprano na melhor das hipóteses, ou talvez um pouco Stalin. A princesa era uma bruxa sem banho em um cinto de castidade, o cavaleiro um assassino de aluguel e o castelo brilhante na colina a sede de um campo de concentração, com muitas masmorras para os politicamente incorretos.

Com os reinos, as lealdades não eram tanto ao “país” – um conceito nebuloso e arbitrário – mas ao governante. Você era súdito de um rei, antes de tudo. Suas afiliações linguísticas, étnicas, religiosas e outras eram secundárias. É estranho como, quando as pessoas pensam no período da história do reino, pensam apenas em termos do que as classes dominantes fizeram e tiveram. Mesmo que, se você nascesse então, as chances eram de 98% de você ser um simples camponês que não possuía nada, não sabia nada além do que seus superiores lhe diziam, e enviava a maior parte de sua produção excedente para seus governantes. Mas, novamente, a acumulação gradual de capital e conhecimento tornou possível o próximo passo: a Revolução Industrial.

A Revolução Industrial e o fim do Estado-Nação

À medida que os meios de produção mudaram, com a substituição de músculos por máquinas, a quantidade de riqueza deu um enorme salto. O homem médio ainda poderia não ter tido muito, mas a possibilidade de fazer algo diferente de capinar na terra com uma vara por toda a sua vida se abriu, em grande parte como resultado do Renascimento.

Depois, o jogo mudou totalmente com as Revoluções Americana e Francesa. As pessoas já não se sentiam propriedade de algum governante; em vez disso, elas agora transferiram sua lealdade a uma nova instituição, o Estado-Nação. Algum atavismo inato, provavelmente datando de antes dos humanos se ramificarem dos chimpanzés cerca de 3 milhões de anos atrás, parece direcionar o Macaco Nu para dar sua lealdade a algo maior do que ele mesmo. E foi isso que nos relegou a norma vigente hoje, o Estado-Nação, um grupo de pessoas que tendem a compartilhar língua, religião e etnia. A ideia de Estado-Nação é especialmente eficaz quando é organizada como uma “democracia”, onde a pessoa média tem a ilusão de que tem alguma medida de controle sobre para onde o leviatã está indo.

No lado positivo, no final do século XVIII, a Revolução Industrial forneceu ao homem comum a liberdade pessoal, bem como o capital e a tecnologia, para melhorar as coisas em um ritmo acelerado.

O que causou a mudança de paradigma?

Vou especular que foi em grande parte devido a um fator intelectual, a invenção da prensa móvel, e um fator físico, o uso generalizado da pólvora. A impressora destruiu o monopólio que as elites tinham sobre o conhecimento; O homem médio podia agora ver que eles não eram mais inteligentes ou “melhores” do que ele. Se ele ia combatê-los (conflito é, afinal, o que é política), não tinha que ser só porque lhe mandaram, mas porque foi motivado por uma ideia. E agora, com a pólvora, ele estava em pé de igualdade com os cavaleiros e soldados profissionais do governante.

Neste momento, acredito que estamos à beira de outra mudança, pelo menos tão importante quanto as que ocorreram há cerca de 12.000 anos e várias centenas de anos atrás. Mesmo que as coisas estejam começando a parecer realmente sombrias para o indivíduo, com estruturas econômicas em colapso e governos cada vez mais virulentos, suspeito que a ajuda esteja a caminho da evolução histórica. Assim como a revolução agrícola pôs fim ao tribalismo e a revolução industrial matou o Reino, acho que estamos caminhando para outra revolução multifacetada que tornará o Estado-Nação um anacronismo. Não vai acontecer no mês que vem, nem no ano que vem. Mas aposto que o padrão começará a ficar claro na vida de muitos que agora leem isso.

De que padrão estou falando? Mais uma vez, uma referência ao gênio maligno Karl Marx, com seu conceito de “definhamento do Estado”. Até o final deste século, suspeito que os EUA e a maioria dos outros Estados-Nação terão, para todos os efeitos práticos, deixado de existir.

O problema com o Estado — e o seu Estado-Nação

Claro, embora eu suspeite que muitos de vocês são simpáticos a esse sentimento, vocês também acham que o conceito está muito distante, e que eu sou culpado de wishful thinking. As pessoas acreditam que o Estado é necessário e, em geral, bom. Elas nem sequer questionam se a instituição é permanente.

A minha opinião é que a própria instituição do Estado é uma coisa má. Não é uma questão de colocar as pessoas certas no governo; a própria instituição é irremediavelmente falha e necessariamente corrompe as pessoas que a compõem, bem como as pessoas que ela governa. Essa afirmação invariavelmente choca as pessoas, que acreditam que o governo é uma parte necessária e permanente do firmamento cósmico.

O problema é que o governo se baseia na coerção, e é, no mínimo, subótimo basear uma estrutura social na coerção institucionalizada. Deixe-me exortá-lo a ler o soberbo O Mercado da Liberdade, dos Tannehills.

Uma das grandes mudanças trazidas pela impressora e avançada exponencialmente pela Internet é que as pessoas são capazes de buscar prontamente diferentes interesses e pontos de vista. Como resultado, elas têm cada vez menos em comum: viver dentro das mesmas fronteiras políticas não é mais suficiente para torná-las compatriotas. Essa é uma grande mudança em relação aos tempos pré-agrícolas, quando os membros da mesma tribo tinham muito – quase tudo – em comum. Mas isso tem sido cada vez mais diluído nos tempos do Reino e do Estado-Nação. Se você for honesto, pode achar que tem muito pouco em comum com a maioria de seus conterrâneos além de superficialidades e trivialidades.

Reflita sobre esse ponto por um minuto. O que você tem em comum com os seus conterrâneos? Um modo de viver, (talvez) uma linguagem comum, possivelmente algumas experiências e mitos compartilhados, e um governante comum. Mas muito pouco de real significado ou importância. Para começar, é mais provável que eles sejam um perigo ativo para você do que os cidadãos de um suposto país “inimigo”, digamos, como o Irã. Se você tem uma boa vida, certamente se você possui um negócio e tem ativos, seus compatriotas são os que realmente posam o perigo claro e presente. O cidadão médio (cerca de 50% deles agora) não paga imposto de renda. Mesmo que ele não seja realmente um empregado direto ou indireto do governo, ele é um beneficiário líquido de sua generosidade, ou seja, sua riqueza, por meio da Previdência Social e outros programas de bem-estar social.

Ao longo dos anos, descobri que tenho muito mais em comum com pessoas de minha própria posição social ou econômica ou ocupação na França, Argentina ou Hong Kong, do que com um sindicalista americano em Detroit ou um morador dos barrios de Los Angeles. Suspeito que muitos de vós concordariam com essa observação. O que é realmente importante nos relacionamentos são valores, princípios, interesses e filosofia compartilhados. A proximidade geográfica, e uma nacionalidade comum, não tem sentido – não mais do que um acidente de nascimento. Tenho muito mais lealdade a um amigo no Congo – embora sejamos de cores diferentes, tenhamos culturas diferentes, línguas nativas diferentes e experiências de vida diferentes – do que aos americanos que vivem em trailers. Eu vejo o mundo da mesma forma que meu amigo congolês; ele é um trunfo para a minha vida. Estou necessariamente em desacordo com muitos dos “meus compatriotas americanos”; são um passivo ativo e crescente.

Alguns podem ler isso e encontrar uma perturbadora falta de lealdade ao Estado. Parece sedicioso. Jingoistas profissionais como Rush Limbaugh, Sean Hannity, Bill O’Reilly, ou quase qualquer pessoa ao redor de Washington ficam brancos de raiva quando ouvem alguém falar essas coisas. O fato é que a lealdade a um Estado, só porque você nasceu em seu distrito administrativo, é simplesmente estúpida.

Até onde sei, há apenas dois crimes federais especificados na Constituição dos EUA: falsificação e traição. Isso está muito longe do mundo de hoje, onde quase todos os crimes reais e imaginários foram federalizados, ressaltando que todo o documento é letra morta sem sentido, pouco mais do que um artefato histórico. Mesmo assim, isso também confirma que a Constituição era bastante imperfeita, mesmo em sua forma original. A falsificação é uma fraude simples. Por que ela deve ser apontada especialmente como crime? Traição é geralmente definida como uma tentativa de derrubar um governo ou retirar a lealdade de um soberano. Uma ressalva bastante estranha de se ter quando os formuladores da Constituição haviam feito exatamente isso poucos anos antes, alguém pensaria.

Do jeito que eu vejo, Thomas Paine tinha razão quando disse: “Meu país está onde a liberdade vive“.

Mas onde vive hoje a liberdade? Na verdade, ela não tem mais casa. Ela tornou-se uma verdadeira refugiada desde que a América, que era uma excelente ideia que criou raízes num país com esse nome, degenerou nos Estados Unidos. O que é apenas mais um infeliz Estado-Nação. E está à beira do precipício.

 

 

 

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