O sofrimento gerado pela imposição de um salário mínimo

1
Tempo estimado de leitura: 6 minutos

3632426859_70b61ae665_b2Há certos ruídos que tendem a deixar as pessoas malucas e desorientadas.  Pense em unhas arranhando um quadro-negro.  Ou em uma criança gritando ininterruptamente durante um longo voo.  Ou em um assobio agudo e lancinante que simplesmente não acaba.

Agora já podemos acrescentar a essa lista mais um ruído irritante: um presidente americano que julga poder legislar salários mais altos e transformar isso em lei.  Para qualquer pessoa que saiba o básico de economia — e cuja mentalidade não foi distorcida pela tentação do planejamento central —, ouvir algo assim é como uma tortura.  É doloroso.  Tal sandice vai deixando você crescentemente insano, até que chega um momento em que você finalmente quer gritar “Por favor, pare com isso! Eu suplico!”

Foi assim que me senti quando Obama, naquele tom pomposo típico de políticos que se julgam grandiosos, disse o seguinte em seu discurso anual sobre o Estado da União:

Proclamemos que, na nação mais rica do planeta, ninguém que trabalhe em tempo integral tenha de viver na pobreza, e elevemos o salário mínimo federal para US$9,00 a hora.  Esta simples e única medida aumentaria as rendas de milhões de famílias trabalhadoras.

Mas por que parar por aí?  Por que tamanha parcimônia?  Vamos declarar de uma vez que todo mundo tem o direito de ganhar US$9.000 ou US$9 milhões por hora.  Se o único obstáculo que existe entre nós e a riqueza total pode ser removido pela palavra de um presidente e por uma medida do Congresso, então sejamos felizes!  A vida é fácil!

Será que Obama realmente não entende o que há de errado nesta sua abordagem?  Eu sempre discordei dele, mas nunca realmente imaginei que ele fosse um ignaro.  Mas desde suas primeiras entrevistas já estava manifesto que ele de fato parece ter um ouvido seletivo para tópicos sobre economia.  Ele parece não entender sobre como a riqueza é realmente produzida.  Ele parece achar que riqueza é algo que poder ser criada via decretos políticos.  Ele também parece não entender como o sistema de preços funciona.  E agora já podemos ter a certeza de que, se ele entende como os salários funcionam, ele não está disposto a deixar que eles funcionem.

É claro que ele também poderia estar apenas mentindo.  Não seria a primeira vez que um político faz isso.

Grande parte do atual problema com o desemprego juvenil nos EUA advém dos substanciais aumentos ocorridos no salário mínimo nos últimos cinco anos.  Quando a crise estourou em 2008, o salário mínimo era de US$5,85.  Vários empregos foram abalados.  Trabalhadores pouco produtivos em empregos que pagavam baixos salários foram demitidos.  Quando as coisas pareciam estar se acalmando, o governo chegou chutando as portas.  No ano seguinte, eles decretaram que era ilegal aceitar um salário menor do que US$7,25 a hora.  E ainda há gente estranhando que existam tantas pessoas desempregadas?  Não há mistério algum nisso.  Empregos que pagam salário mínimo normalmente empregam pessoas pouco produtivas.  Se você aumenta forçosamente o salário de pessoas pouco produtivas, passa a ser custoso empregá-las.  No limite, você simplesmente não obterá retorno nenhum com a sua mão-de-obra empregada.  Passa a ser irracional manter um empregado nestas condições.  O acentuado aumento no piso salarial não explica tudo, é claro, mas é um fator contribuinte que não pode ser negligenciado.

Em termos metafóricos, estabelecer qualquer tipo de piso salarial faz com que várias pessoas fiquem presas no porão.  Quanto mais alto o piso, maior será o porão.  Atualmente, milhões de pessoas estão presas no porão, assustadas e sem saber como sair dele.  E agora, para piorar as coisas, o presidente americano, julgando estar ‘criando empregos’, quer fazer com que mais desempregados se tornam permanentemente desempregados.

A questão do salário mínimo é uma que me abala de maneira muito peculiar, e não é por causa de algum livro de economia que já li.  Trata-se de um assunto cujas consequências vivenciei de maneira muito intensa.

O primeiro emprego real que tive foi em uma loja de departamentos.  Eu fazia os serviços de manutenção.  Eu tinha 15 anos (sim, eu menti a minha idade para conseguir o emprego; naquela época, você podia fazer isso; o governo ainda não nos amava tanto a ponto de nos impedir de trabalhar).  Meu trabalho era limpar as latrinas, amassar as caixas de sapatos e roupas, recolher alfinetes e broches dos provadores, encerar o piso da seção de louças, aspirar todo o recinto, e limpar os vidros.

Era um trabalho fantástico.  Para mim, era realmente grandioso.  E eu adorava esta minha função porque a considerava extremamente importante.  Afinal, se eu não limpasse bem os banheiros e não repusesse as toalhas e o papel higiênico, os clientes do dia seguinte poderiam se sentir enojados e nunca mais voltariam ali.  Desta forma, eu tinha um papel crucial em garantir a lucratividade daquela loja.

Em especial, eu adorava o meu colega de trabalho.  Seu nome era Tad.  Quando a loja de departamentos fechava ao final do dia e ficávamos apenas nós dós ali para efetuar todo aquele trabalho magnífico, nossa diversão era enorme.  Tudo era sensacional.  A gente cantava alto enquanto trabalhava, vibrava com os perigos da enceradeira, ficava enojado com o estado sórdido dos banheiros, se divertia com as coisas mais simples possíveis — em suma, a gente simplesmente desfrutava aquela fantástica sensação de ter um real colega de trabalho.

Veja bem: Tad não era um garoto normal.  Ele possuía algumas deformidades físicas.  Seu rosto tinha um formato bastante esquisito e metade dele era coberto por uma enorme mancha, a qual eu jamais pude identificar o que era.  Ele também tinha dificuldades de locomoção.  Além de ajudá-lo a se locomover de um lado para o outro, eu tinha de selecionar cuidadosamente as tarefas que podia atribuir a ele.  Ele também sofria de retardo mental.  Ele falava de uma forma bem abafada e difícil de ser entendida, o que me obrigava ser extremamente claro em minhas instruções.

Mas uma coisa eu posso dizer: quando ele ficava feliz, eu ficava feliz.  Ver aquele enorme sorriso surgir em seu rosto quando eu elogiava a maneira como ele havia encerado um balcão ou um guichê era algo que elevava enormemente meu estado de espírito.

Um belo dia, um cartaz foi afixado na nossa sala de trabalho.  Era do Ministério do Trabalho.  O salário mínimo seria elevado em 50 cents.  Tad me apontou aquilo e disse, “Olha, vamos ter um aumento!”.  Fiquei desconfiado.  Eu tinha a certeza de que era o patrão quem determinava o salário, e não uma esquisita e distante burocracia estatal.  Não acreditei muito que aquilo fosse verdade.  Ainda assim, fiquei feliz por vê-lo feliz.

No dia seguinte, cheguei ao trabalho no horário de sempre, logo após a escola.  Preparei o esfregão e enchi o balde com água quente enquanto me concentrava para o início de mais uma jornada.  Mas Tad não estava lá.  Perguntei para o meu patrão, “Tad ainda não chegou?”

E aí ele me explicou que havia contratado Tad apenas porque ele era um garoto que conhecera na igreja e que precisava de um emprego.  Meu patrão sabia que Tad iria requisitar muita ajuda, e este era um dos motivos de ele ter se entusiasmado tanto por eu ter podido trabalhar com Tad.  No final, disse meu patrão, era tudo uma questão de caridade, pois ele sabia que eu poderia realizar todo aquele trabalho sozinho.  Empregar nós dois era algo que ele podia se dar ao luxo de bancar apenas a um determinado custo.  Mas o novo salário mínimo alterou as coisas.  A margem de lucro da loja era muito pequena, e ele foi obrigado a tomar essa difícil decisão.

Em suma: Tad havia sido dispensado.

Fiquei devastado.  Olhei novamente para aquele cartaz do Ministério do Trabalho.  Maldita coisa!  Aquele cartaz havia arruinado a vida de um garoto.  Havia também interrompido um grande ato de caridade.  E olha o que fez comigo.  Agora eu tinha de trabalhar sozinho.

A gerência saiu, as luzes foram diminuídas e eu ouvi aquele familiar estalido das portas externas sendo fechadas.  Teria de fazer o serviço solitariamente naquela noite.  Fiz todas as tarefas que tinha de fazer.  Mas não havia músicas.  Não havia risadas.  Não havia inocentes palhaçadas.  Não havia belos e edificantes sorrisos.  Tad estava em algum outro lugar naquela noite, provavelmente em casa, confuso e triste.

Alguns anos depois, ele morreu.

É isso que a lei de salário mínimo significa para mim.  Sim, você pode dizer que sou movido por um espírito de vingança.  Quando um político anuncia que irá elevar o salário mínimo para melhorar a vida de todos, não consigo deixar de imaginar os milhões de Tads que perderão aquela oportunidade de fazer coisas maravilhosas neste mundo e com suas vidas.

 

Veja também: Salário mínimo, estupidez máxima

1 COMENTÁRIO

  1. História triste. Essa história nem vai tão a fundo sobre as tragédias que uma medida dessas é capaz de realizar. Aqueles vídeos de pessoas com chinelo havaianas tendo seus abacaxis roubados pelo governo são bem piores. O Tad possivelmente tinha uma família e a dispensa do emprego foi apenas um sofrimento passageiro pra ele.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui