O “sonho de Keynes” é o nosso pesadelo

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photoComo se sabe, os principais bancos centrais do mundo, a saber, o Fed, o BCE e os da Inglaterra, Suíça, Japão e Canadá resolveram cingir suas cinturas com o manto de “salvadores das economias do planeta” e decidiram intensificar (ainda mais!) o provimento de liquidez e “amparo” ao sistema financeiro global.  Decretaram também a redução dos custos de carregamento das carteiras em dólares, para o que não titubearão em emitir papéis pintados com o retrato de George Washington e outros pais da pátria, “sempre que isto se tornar necessário” (eles têm a arrogância de julgarem que sabem quando “isto” se tornará ser “necessário”)…

Além disso, como mencionou Jeffrey Tucker em seu excelente artigo A união dos bancos centrais mundiais e a transição para o sonho keynesiano, decretaram que os bancos deverão ter “acesso imediato ao dinheiro em qualquer moeda, de acordo com as condições de mercado” (eles também julgam que sabem o que realmente significa o processo de mercado)…

É um passo, sem dúvida, em direção à criação de um banco central mundial e, segundo alguns, ao estabelecimento de uma moeda global, pretensa solução advogada por Lord Keynes nos últimos anos de sua vida. Keynes chegou inclusive a dar um nome a essa excrescência: bancor.  Sua idéia era retirar o poder inflacionário de cada país e entregar esse poder, imensamente multiplicado, a um banco central mundial, o que, segundo pensava, livraria o mundo dos problemas de “ausência de coordenação” (“coordenação”, para Keynes, significava manipulação de políticas de “sintonia fina”).

Na época, como observa Tucker no mencionado artigo,“a ideia não vingou, mas as instituições que supostamente deveriam administrar tal sistema foram de fato criadas: o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial”, que acabaram se transformando progressivamente em algo como que Ongs assistencialistas, assim como a ONU.  Todos esses organismos deveriam ser sumariamente extintos, porque se transformaram em redutos de política e, em alguns casos, até, de corrupção.

O “sonho keynesiano” é na realidade um pesadelo! Um banco central mundial é uma idéia que vai contra tudo o que os economistas austríacos sempre defenderam em suas teorias dos mercados, da moeda, do capital, dos juros e dos ciclos econômicos. Sob o manto do sonho de Keynes, as recentes decisões dos bancos centrais na verdade representam, claramente, um presente para os bancos do mundo inteiro, tal como as rodadas deQuantitative Easing.

Que o sistema bancário anda há anos beirando a bancarrota não é segredo nem para um mosquito que ronda uma vaca sonolenta em um pasto qualquer, conforme mostrou Fernando Ulrich em artigo muito esclarecedor, O dilema do sistema bancário e as regras da Basileia, em que expõe claramente a fragilidade do sistema de reservas fracionárias e o caráter de “clube de banqueiros” do comitê da Basileia.

Sugiro fortemente a leitura desses dois artigos.  Mas minha preocupação aqui é outra, certamente complementar às de Tucker e Ulrich: é mostrar que esses passos no sentido da criação de um banco central e de uma moeda mundial são um ataque, já não direi apenas aos ensinamentos austríacos, mas ao bom senso e, embora muitos não o percebam, às liberdades individuais.

Comecemos pelo bom senso — ou pela falta de bom senso.  Um banco central mundial, além de concentrar um grau de autoridade inadmissível, é uma afronta a um dos mais elementares princípios que regem a eficiência, seja ela política, econômica, administrativa e, mesmo, da vida de qualquer grupo: o princípio da subsidiariedade, que acaba de ser mandado às favas pelos banqueiros centrais dos países desenvolvidos. É uma ode ao planejamento central, agora globalizado, com todas as consequências nefandas que esse tipo de organização acarreta para as sociedades.

Quem comandará esse banco super-poderoso?  Economistas iluminados, com seus modelos de equilíbrio geral que tratam pessoas como aquelas esferas que deslizam em planos inclinados, que aprendemos nas primeiras aulas de Física?  Terão eles os conhecimentos suficientes para saberem que quantidades “corretas” de moeda e de crédito devem circular pela economia planetária ou estarão sujeitos às limitações e à dispersão do conhecimento, que Hayek tão bem apontou?  Saberão eles os bilhões de planos individuais de todos os agentes econômicos da terra, da Patagônia ao Alasca, das Ilhas Falkland ao leste da África, planos que acarretam ações, as quais por sua vez implicam cursos de mais e mais ações ao longo do tempo real, subjetivo e sob condições de incerteza? Para onde esses pretensiosos querem nos empurrar, Madonna mia?  Para um totalitarismo monetário mundial?  Tudo isso para salvar bancos insolventes, que acreditaram nos contos da Carochinha?  Como dizem os gaúchos, bah!

Com relação à EAE, é evidente que Bernanke e seus pares de outros países não sabem que os mercados são processos que tendem para o equilíbrio, mas que jamais alcançam esse equilíbrio, não conhecem a teoria da moeda de Mises, não desconfiam nem que existe uma teoria do capital de Böhm-Bawerk e nunca leram nada sobre a TACE (Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos)!  Só estudaram keynesianismo, monetarismo, expectativas racionais e econometria, enfim, só conhecem o paradigma falido da mainstream economics.  Se tivessem estudado os autores austríacos com a atenção que estes sempre mereceram, saberiam que a própria idéia de um banco central nacional é uma defesa descabida de um monopólio, que o valor da moeda sempre cai em relação aos dos demais bens e serviços quando as máquinas impressoras são colocadas para funcionar da maneira como está ocorrendo, que a moeda “nova” não cai de helicóptero nas mãos de todos, mas é despejada em um setor específico da estrutura de capital da economia e que expansões de crédito não lastreadas em poupança genuína — como as que vêm fazendo irresponsavelmente — acabam inexoravelmente levando à inflação e à sua consequência, o desemprego.

Por fim, no que diz respeito à violação das liberdades individuais, é evidente que a centralização da moeda e do crédito nas mãos de uma autoridade mundial vai se constituir em um monopólio muito mais forte do que os atuais monopólios nacionais. Meia dúzia de economistas supostamente sábios vão interferir na ação humana de mais de seis bilhões de indivíduos, vão dirigir, ou afetar indiretamente a função empresarial e vão desviar recursos que os mercados alocariam de maneira diferente.

Sempre sustentei que o Euro foi um erro, mesmo quando era moda afirmar o contrário. Com o seu advento, governos de países como Grécia, Portugal e Itália, entre outros, que nunca tiveram moedas fortes, passaram a acreditar que o passe de mágica do Euro os havia colocado em tal condição.  Voilà — pensavam os políticos desses países — agora temos uma moeda que, no fundo, é lastreada no antigo marco do Deutsche Bundesbank. Deram-nos a cornucópia inexaurível!  Preocupar-se com a dívida soberana?  Ora, isso seria coisa para as gerações futuras…

Do lado fiscal, a coisa não está menos desanimadora, haja vista a declaração da Sra. Angela Merkel de que, agora, a Europa caminha para uma “unidade fiscal”…  Como ela convencerá os taxpayers alemães a bancarem as orgias dos governos grego, português e italiano?

Parece que os governos estão se comportando como um grupo em um restaurante, em que todos já sabem que gastaram mais do que poderão pagar ao garçom, mas que continuam comendo e bebendo…

É evidente que essas medidas anunciadas não poderão dar bons resultados e nosso receio é que, com isso, venham a ser tomadas mais e mais medidas, até que o mundo inteiro seja envolvido pela nuvem negra daestagflação.

Talvez então alguns economistas não austríacos percebam que o “sonho” de um banco central mundial do senhor Keynes é um pesadelo. Como tudo o que ele escreveu, aliás. E que compreendam que Friedman, mesmo defendendo o livre mercado, no fundo, acreditava em sua própria frase: “we are all keynesians”

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