Sorria! Você vai pagar um trem

Tempo estimado de leitura: 4 minutos

dilma_lula_cabine_trem_balaEstá em processo de licitação a construção de um trem-bala no Brasil.  Estima-se que ele entrará em operação antes da Copa do Mundo de 2014, e que a obra se encerre depois das Olimpíadas de 2016.

Ela seguirá o já famoso modelo de concessão, onde uma empresa privada irá administrar o funcionamento do trem-bala ao passo que o governo regulamentará tarifas e serviços por meio de uma estatal, nesse caso será a nova estatal Etav (Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade)

O projeto prevê sete paradas obrigatórias, incluindo Aeroporto de Viracopos em Campinas, Campo de Marte em São Paulo, Aeroporto de Cumbica em Guarulhos, e o Galeão no Rio de Janeiro.

O custo estimado pelo governo está em torno de R$33 bilhões, e nada menos que R$19,9 bilhões serão financiados pelo BNDES.

Não é preciso nem mencionar que se trata de um custo enorme, que hoje temos várias empresas de transporte aéreo concorrendo pela ponte aérea Rio-São Paulo, e que obviamente esse projeto não passa de propaganda.

Obras grandiosas são lembradas; e o que melhor para nos lembrar da “grandiosidade” do governo Lula do que a herança de um moderníssimo Trem-Bala?

Não vou entrar em detalhes a respeito de custos, pois não é necessário falar nada sobre uma obra pública de R$19,9 bilhões.  Acredito que muitos compartilham comigo a sensação de desconforto e raiva que esse número trás.

Mas a pergunta é: Esse trem-bala é necessário?

De fato o sistema rodoviário brasileiro é vergonhoso, são pouco mais de 29 mil quilômetros de ferrovias, contra mais de 63 mil quilômetros na Índia, 226 mil nos EUA e 85 mil na Rússia.

O sistema ferroviário brasileiro transporta poucos passageiros.  Então de fato é necessário aprimorá-lo.  O transporte de cargas e passageiros é extremamente dependente da atual malha rodoviária.  Porém esta se encontra em estado decadente na maior parte do Brasil, com algumas exceções.

Embora a partir de 1996 as empresas ferroviárias estatais tenham sido privatizadas, hoje não temos uma malha ferroviária muito melhor, isso graças à falta de concorrência.  Não podemos esquecer que essas ferrovias são regulamentadas pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e, como já foi explicado neste site, agências reguladoras impossibilitam a concorrência e burocratizam a entrada de novas empresas em um determinado setor.

Vejamos o que aconteceria se o governo fechasse a ANTT, privatizasse as empresas, se retirasse por completo do setor de transportes e cortasse os impostos.  Em um primeiro momento, teríamos pouquíssima concorrência.  Os donos de estradas estariam livres para cobrar o valor que quisessem de pedágio, e as poucas empresas de transporte ferroviário poderiam cobrar o quanto quisessem pelos serviços.  Mas isso não garantiria monopólio algum, porque daquele momento em diante qualquer um poderia construir sua ferrovia ou rodovia como quisesse, onde quisesse (comprando o terreno ou pagando para utilizar de alguém) e cobrando o valor que quisesse pelos serviços.

Se o setor de transporte aéreo também fosse desregulamentado ao mesmo tempo, o “abuso” de preços por parte dos setores de transporte terrestre seria freado — afinal a concorrência seria primeiramente com o setor aéreo, e depois de alguns anos de investimentos por parte das empresas privadas, a concorrência seria geral entre rodovias, ferrovias e companhias aéreas.

Isso significa que, em pouco tempo, teríamos empresas do mundo todo vindo para cá para concorrer, afinal todos estariam livres para isso e nós estaremos sempre demandando transporte.  Hoje só temos congestionamentos, estradas ruins e aeroportos lotados.  Aqueles que conseguirem oferecer estradas, ferrovias e aeroportos de qualidade a preços baixos ganharão mercado e crescerão.  Aqueles que não se adaptarem irão falir.

Em poucos anos teríamos várias estradas e ferrovias concorrendo pelos mesmos trechos.

Ir de Belo Horizonte para São Paulo significaria escolher entre ir de carro em uma das várias, ótimas e baratas novas rodovias ou entre uma das várias estradas de ferro, isso sem falar dos novíssimos aeroportos e empresas aéreas.

Viajar nunca seria tão seguro e barato.

E onde se encaixa o trem-bala nessa história?

A função do trem-bala como meio de transporte é oferecer um transporte terrestre mais rápido.

Aqui está a parte importante: a partir do momento em que o sistema tradicional de ferrovias já não atender mais a todas as demandas da população, por ser lento demais, o trem-bala pode ser a solução para distâncias relativamente curtas.  Então, primeiramente, é necessário que meios mais baratos e rápidos de serem construídos sejam colocados para funcionar.  Ferrovias tradicionais são extremamente mais baratas e podem ser construídas muito mais rapidamente do que uma ferrovia para trem-bala.

Portanto, o Brasil não precisa de trem-bala; o mercado não está demandando trens-bala.  O que o mercado está verdadeiramente demandando é concorrência, liberdade para o setor de transportes, estradas e ferrovias de qualidade, e transporte aéreo eficiente.

O trem-bala é apenas mais uma terrível distorção que o governo está fazendo no mercado.  Talvez um dia a construção de um trem-bala ligando São Paulo e Rio de Janeiro se justifique pela livre iniciativa.  Mas enquanto o transporte como um todo não se tornar eficiente, o trem-bala não passa de muito recurso retirado de onde seria mais bem aplicado.

Conclusão

Por toda a história, os governos brasileiros sempre distorceram a realidade do setor de transportes.  Enquanto as empresas eram estatais, a prioridade era pelo sistema rodoviário, e as ferrovias foram ficando de lado.  No fim não tivemos nem ferrovias e nem rodovias boas.

Agora vem aí, por meio de financiamento estatal, um trem-bala. Enquanto isso, o resto do Brasil não tem ferrovias e as rodovias estão esburacadas.  Para o Brasil crescer, é urgentemente necessário ter ferrovias para escoar a produção para os portos (que também não estão em grande fase) e ter rodovias melhores.

O governo pretende gastar vários bilhões de reais e desviar recursos para uma única estrada de ferro, de alta tecnologia, que transportará relativamente poucos passageiros, ligando apenas três grandes cidades (e algumas que tiveram a sorte de estarem no caminho).

Quem vai ganhar com isso? Apenas a empresa que oferecer a menor tarifa, que será a vencedora da licitação.

Sorria! Você vai pagar um trem.

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