Vouchers escolares: o caminho mais “eficiente” para a socialização da educação

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Educação-Integral-EmpresasA direita, vários liberais e até mesmo alguns libertários gostam de defender a adoção de vouchers educacionais como uma alternativa para as escolas públicas.

Para quem ainda não está familiarizado com o termo, um voucher escolar nada mais é do que um certificado de financiamento emitido pelo governo e entregue para os pais de uma criança em idade escolar.  Em posse desse voucher, os pais podem então colocar a criança na escola privada que quiserem, sendo a mensalidade paga por este voucher — ou seja, paga pelos pagadores de impostos.

O argumento é o de que a adoção de um sistema universal de vouchers, os quais estariam disponíveis para todos os pais e que poderiam ser utilizados em toda e qualquer escola privada (religiosa ou não-religiosa, com ou sem fins lucrativos), estimularia a concorrência entre as escolas, as quais estariam agora à procura de mais alunos, independentemente da renda de seus pais.

No que mais, prossegue o argumento, haveria também um aprimoramento da indústria educacional privada, a qual se tornaria poderosa o bastante para contrabalançar a maléfica influência das escolas públicas, sua burocracia e, principalmente, seus sindicatos de professores, um dos mais poderosos grupos de interesse esquerdista de qualquer país.

O grande problema é que, não apenas esse argumento não se sustenta, como ele na realidade é um delírio completo.

As escolas que aceitarem entrar nesse programa de vouchers irão facilmente se tornar uma província dos reguladores e dos burocratas do governo, os quais agora estarão no controle do dinheiro da mensalidade.  Se os burocratas controlam o dinheiro, então eles têm o poder de determinar como cada escola deverá agir.  E as escolas, ansiosas por esse dinheiro, irão aquiescer tranquilamente.

Para piorar, o dinheiro que financia os vouchers continua sendo confiscado dos pagadores de impostos, os quais já são espoliados para bancar as escolas públicas.

Ou seja, em vez de reduzirem, os vouchers aumentam o envolvimento do governo na educação.

Mas as coisas pioram.  No final da década de 1990, o estado da Flórida adotou o programa de voucher, mas especificou que apenas os piores alunos das piores escolas públicas poderiam utilizá-lo.  As crianças com bons ou até mesmo razoáveis históricos escolares não eram elegíveis para o programa.  Consequência: houve uma fragorosa queda na qualidade do ensino dessas escolas privadas, que agora tinham de lidar com alunos bem mais atrasados em termos de aprendizado.

[No Brasil, temos algo semelhante aos vouchers, só que em nível universitário: o ProUni.  Os resultados foram o encarecimento das mensalidades e a piora da educação das universidades particulares que recebem esse subsídio, pois agora elas não mais precisam competir por novos alunos; o governo já garante a receita. O lucro é garantido, mesmo que os serviços prestados estejam em queda livre.]

Na melhor das hipóteses, os vouchers são uma tentativa cara e perigosa de reinventar o conceito de escola pública, uma tentativa fadada ao fracasso.  Na pior das hipóteses, vouchers são uma tentativa de forçar as escolas privadas a funcionar exatamente como as escolas públicas.

Apenas imagine toda a burocracia e todas as regulamentações que seriam impostas sobre as escolas privadas em troca desse enorme subsídio que elas agora receberiam do governo?  Com o governo estando efetivamente no controle das escolas privadas, elas rapidamente passariam a funcionar como escolas públicas.

E isso não é uma mera questão de previsão ou de opinião.  A própria esquerda admite isso e torce para que isso aconteça.  Veja, por exemplo, esse artigo escrito por um famoso colunista progressista em defesa dos vouchers.  O articulista repreende aquela parcela da esquerda que ainda não apoia os vouchers e que não é iluminada o bastante para perceber suas intrínsecas vantagens.  Segundo o articulista, os vouchers aumentam os gastos estatais com educação, privilegiam os pobres, e submetem escolas privadas ao controle do estado.  De uma perspectiva socialista, pergunta ele, o que há de errado com esse arranjo?  Boa pergunta, realmente.

Não é de se estranhar, portanto, que, nos últimos anos, a esquerda em geral tenha se tornado bastante receptiva aos vouchers e a outros programas de financiamento público de instituições educacionais privadas.  Ambos são um gigantesco programa estatal que, em vez de reduzir, aumenta o papel do estado na educação, e que irá transformar qualquer instituição privada que os aceite em uma cópia carbono das escolas públicas.

O problema da educação não pode ser solucionado por paliativos, e nem muito menos por programas que transformem escolas privadas em escolas públicas.  Enquanto houver dinheiro de impostos envolvido no esquema, o governo sempre estará no controle do espetáculo — coisa que, aliás, os artistas que vivem de subsídios estatais já entenderem há muito tempo.

Mas não seria ao menos uma medida na direção certa?

No entanto, considerando-se o atual estado das coisas, e a atual situação calamitosa das escolas públicas, os vouchers não seriam ao menos uma medida na direção correta?  Eles não seriam melhor do que não fazer nada?

Ao contrário: os vouchers piorarão as coisas.  Em vez de aumentar as oportunidades educacionais, os vouchers irão aumentar os tentáculos do governo sobre a educação, aumentar os custos da educação, aumentar a dependência das pessoas em relação ao estado, e aumentar o poder geral do estado.

Dado que o estado sempre acaba controlando aquilo que ele subsidia, as escolas privadas que aceitarem os vouchers estarão sujeitas a todos os tipos de regulamentação estatal.  Dado o histórico do estado, é inconcebível que ele opere de outra maneira.  As escolas privadas passarão a prestar contas ao estado, e não mais aos pais.

Vouchers, assim como a fajuta “privatização” da Previdência Social — a qual obriga os trabalhadores a continuarem dando seu suado dinheiro para um esquema fraudulento, com a única diferença que tal esquema agora será gerido por empresas privadas —, são apenas mais uma tentativa de alcançar resultados de mercado utilizando meios socialistas.  Isso, aliás, é o inverso do antigo hábito social democrata, em que o objetivo era alcançar o socialismo utilizando meios de mercado.

No entanto, como todo e qualquer esquema de economia mista, seja o estatismo aplicado aos meios ou aos fins, o resultado será ruim para as finanças públicas, ruim para a produtividade da economia, e ruim para a liberdade.

Conclusão

O verdadeiro desafio é entender por que conservadores, libertários e ativistas religiosos defendem esse esquema de vouchers para a educação.  Talvez eles passaram a acreditar em toda aquela retórica neoconservadora sobre desigualdade educacional, sobre a aflição dos pobres que não conseguem pagar escolas de luxo, e sobre os injustos privilégios usufruídos por aqueles que podem pagar por escolas boas.

Observe que tal retórica implica que a culpa é toda das escolas boas, que são muito caras, e não dos próprios pais que não conseguem fornecer educação para seus filhos, uma das obrigações inerentes à paternidade.

A solução?  Traçar uma linha estrita e inflexível separando educação e estado, jamais permitindo que as finanças de ambos se misturem.

O próprio Ludwig von Mises já havia previsto, ainda na década de 1920, que o envolvimento do estado na educação não daria coisa boa: “Existe, com efeito, apenas uma solução: o estado, o governo e as leis não devem, de maneira nenhuma, se envolver com a escola e com a educação.  A criação e a instrução dos jovens devem ser inteiramente deixadas a cargo dos pais e de instituições e associações privadas.”

Se há algum futuro para a educação, não será por meio de mais gastos e programas estatais; não será por meio de mais controle e centralização do estado.  Isso é apenas mais do mesmo.  Imaginar que burocratas — os quais nem sequer se educaram a si próprios — têm a solução para a educação de todo um país é a própria definição da insanidade.

O futuro da educação está no aumento do envolvimento dos pais; está no envolvimento das famílias; está no homeschooling; está no uso gratuito da internet; está em nível local, e não em nível federal; está nos gastos privados, e não no esbanjamento do dinheiro de impostos; está no esforço individual, e não em professores sindicalizados.  Cada um tem de correr atrás da própria educação em vez de esperar que ela lhe seja entregue mastigada por um burocrata.

O ideal é o envolvimento zero do governo.  Por que os defensores da liberdade têm de ser frequentemente relembrados disso?

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Sugestão de artigos que mostram soluções para a educação:

A educação livre

Educação e liberdade: apontamentos para uma prática pedagógica não coercitiva 

O Homeschooling nos EUA (e no Brasil) 

Melhorando os sistemas de saúde e educação em três passos (Concurso IMB) 

A educação como mercadoria 

 

1 COMENTÁRIO

  1. A tese do autor é 100% correta. O problema (não só em relação ao tópico específico, mas em praticamente qualquer tópico) é que passamos muito do ponto em que boa parte daquilo que ele conclui sugerindo pareça estar presente no horizonte. Conforme se sabe, os conservadores confiaram muito e durante muito tempo em que o estado era apenas “mal ocupado”, e que bastaria eventualmente torná-lo repleto de “funcionários públicos conservadores” (sabe-se lá como isso aconteceria) para que ele passasse a “trabalhar direito” (ou algo parecido). O fato é que, hoje, ao menos no Brasil, o simples questionamento de qualquer interferência pública na educação pode gerar processos e até mesmo criminalização. Logo, a pergunta que faço é: considerando que a tese do autor é correta, mas considerando também que não pareça haver qualquer margem de manobra sequer para questionar (e quanto mais para ignorar) o atual estado de coisas, o que fazer?

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