Marco Civil da Internet – as soturnas previsões vão se confirmando

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internet-chaosNo longínquo dia 11 de março de 2014, o IMB publicou esta análise de minha autoria acerca do então projeto de lei do Marco Civil da Internet, o qual sempre contou com amplo apoio da mídia, da classe política e da academia.
À época, muitas matérias jornalísticas, artigos e estudos acadêmicos foram produzidos sobre o tema, cada um deles abordando o assunto a partir de diferentes pontos de vista — e quase sempre se posicionando a favor da medida.

Até mesmo pessoas da área de Tecnologia da Informação demonstravam grande entusiasmo em relação à regulamentação, dizendo que ela traria mais liberdade ao usuário da internet.

De minha parte, procurei estudar a questão sob a ótica da ciência econômica, em especial dos conhecimentos extraídos da Teoria Austríaca do Intervencionismo, com o objetivo de alcançar eventuais consequências não planejadas dessa proposta de lei.

O texto definitivo da lei foi aprovado em abril de 2014, praticamente sem alterações com relação do projeto.

Abaixo, irei reproduzir oito previsões contidas naquele artigo de 2014 sobre as consequências nefastas da implantação do Marco Civil da Internet (em negrito). Na sequência de cada previsão, trago notícias de 2015 (em vermelho), as quais, infelizmente — mas não inesperadamente — confirmam as previsões feitas.

E tudo isso é só o começo…

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Trecho do artigo de 2014:

Uma lei que obrigue a neutralidade implicaria uma “estatização branca” das empresas provedoras de rede. Para não deixar dúvida, o Projeto de Lei chega a incluir a “finalidade social da rede” (Art. 1º, inciso VI), o que explicitamente representa um cheque em branco nas mãos do estado.

Toda e qualquer intervenção, incluindo a própria encampação das firmas, poderia ser justificada com base nesse absurdo jurídico. Nem precisamos nos aprofundar nos efeitos desastrosos que tal medida acarretaria. De pronto haveria uma retração nos investimentos no setor em decorrência da ausência de garantias acerca da propriedade privada.

E em função da crescente demanda e da implacável necessidade de aumento de capacidade, em pouco tempo os consumidores notariam a degradação da qualidade dos serviços.

Notícia de 2015:

Quem deixou o meu filme mais lento? A Vivo ou o Netflix? (01/09/2015)

Passei momentos de desespero com a qualidade da imagem, que variava entre o sofrível e o ruim em boa parte do tempo, com lapsos de algo próximo ao HD. Fui às redes sociais fazer uma pesquisa e percebi que muita gente enfrentava problema similar. […]

O pacote que tenho é de 100 Mbps. Deveria ser mais do que o suficiente para acessar qualquer serviço de internet mais pesado, como o Netflix e o YouTube. Deveria, mas não é. Por vários momentos, a imagem de Narcos parecia sair de uma fita VHS dos anos 1980. […]

Tentei de todas as maneiras amenizar o problema. Saí do Wi-Fi para o cabo. Troquei do Chromecast para a Apple TV. Assisti diretamente no aplicativo da TV. Mudei para o computador… e nada. A imagem melhorava por alguns minutos, mas subitamente travava.

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Trecho do artigo de 2014:

Aprovada a rede neutra, a Claro não poderia continuar com tal prática [oferecer gratuitamente a seus clientes acesso às redes sociais Facebook e Twitter], uma vez que sua rede não é “neutra” com relação a outras redes sociais. Ou a gratuidade é para todas ou que se faça a cobrança de forma igualitária. A diferenciação, um dos mais usuais mecanismos de concorrência, seria virtualmente proibida.

Notícia de 2015

“Tarifa zero” oferecida pela TIM para WhatsApp é alvo de inquérito (27/01/2015)

O Ministério Público da Bahia instaurou inquérito civil para apurar o descumprimento de regras impostas pelo Marco Civil da Internet. Na mira está a TIM, que lançou promoção para acesso ilimitado ao WhatsApp, sem desconto da franquia do usuário, produto chamado “TIM WhatsApp”.

No processo contra a TIM, questiona-se sua conduta sobre um dos pilares do marco que ainda geram discussão entre empresas e entidades da sociedade civil: o princípio da neutralidade de rede.

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Trecho do artigo de 2014:

O Art. 9º [que trata da Neutralidade de Rede] permite qualquer tipo de interpretação acerca da diferenciação dos serviços oferecidos aos consumidores. Isso é um terreno fértil para a judicialização e a burocratização das relações de mercado, que antes aconteciam de maneira contratual e orientada pelo sistema de preços.

Notícia de 2015:

Marco Civil da Internet não deve barrar serviços tipo ‘WhatsApp grátis’ (01/09/2015)

Em entrevista ao G1, o secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça, Gabriel Sampaio, explicou o esboço do decreto que preencherá lacunas da “Constituição da Internet Brasileira”.

Em nota, o MJ informa que “não trata nem se manifestará sobre práticas específicas de qualquer provedor de aplicação ou de conexão”.

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Trecho do artigo de 2014:

Em qualquer arranjo, o aparato estatal, na condição atual de supremo mediador dos conflitos, na prática assumiria o controle dos negócios, inclusive da circulação do conteúdo.

Notícia de 2015:

Câmara quer punir quem fala mal de político na internet (29/08/2015)

O procurador adiantou ao Congresso em Foco que vai propor uma mudança no Marco Civil da Internet para facilitar a retirada das postagens ofensivas contra políticos em geral.

Pela proposta, sites, provedores e portais serão corresponsáveis pelas publicações.

Nesta mesma linha, o deputado Silvio Costa (PSC-PE) apresentou, no início de junho, um projeto de lei (PL 1879/15) que obriga os provedores de internet e sites a coletar dados pessoais de usuários que postarem comentários em matérias, fóruns ou mesmo atualizações de redes sociais institucionais.

“No caso da internet, a responsabilização daqueles que, por ventura, pratiquem crimes é bastante complicada. Ainda que o Marco Civil [da internet] tenha avançado neste aspecto, ao estabelecer a obrigatoriedade de guarda de registros por provedores de acesso e de aplicações, o fato é que as informações tecnicamente coletáveis são, muitas vezes, insuficientes”, acrescenta Silvio Costa

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Trecho do artigo de 2014:

Veríamos o surgimento de uma pletora de leis definindo parâmetros técnicos, de qualidade, de atendimento e de conteúdo nacional mínimo, mais ou menos como já acontece com os serviços tradicionais de telecomunicações.

Notícia de 2015:

Ancine quer cotas nacionais para serviços sob demanda (29/01/2015)

Segundo fontes da agência, os serviços de VOD, como Netflix, HBO Go e Fox Play, terão em breve que respeitar regras similares às da televisão por assinatura no que se refere a cotas de conteúdo nacional.

A Ancine estuda estabelecer um ambiente regulatório no setor ainda em 2015, fixando número mínimo de produções independentes e nacionais para esses serviços.

Um dos estudos propõe que 30% do conteúdo de serviços de vídeos sob demanda sejam destinados à produção independente e nacional. A legislação do setor deve passar por um rearranjo para acomodar a nova regulação dos “on demand”.

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Trecho do artigo de 2014:

[…] uma vez imposta a neutralidade das redes, as grandes empresas estabelecidas pressionariam para que as diferentes interpretações convergissem para o interesse particular de seus negócios.

Notícia de 2015:

Operadoras de celular vão à Anatel contra WhatsApp só para o serviço de voz (24/08/2015)

Preocupadas com o efeito do serviço de voz do WhatsApp sobre suas receitas de voz móvel, que já enfrentam um movimento natural de queda frente ao crescimento vertiginoso dos dados, as operadoras celulares que operam no Brasil se preparam para reagir.

Embora não se pronunciem oficialmente, seus executivos confirmam informação divulgada semana passada pela agência Reuters de que deverão entrar com denúncia contra o serviço de voz do WhatsApp na Anatel.

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Trecho do artigo de 2014:

O crescimento de um determinado serviço, como video streaming, seria algo ameaçador para a percepção e qualidade de toda a rede. Reiterando o que foi dito acima, seriam deflagradas intermináveis batalhas judiciais envolvendo todos os agentes desse mercado.

Notícia de 2015:

Netflix na mira das operadoras: quem tem razão? (22/08/2015)

Publicamente, Vivo e Oi declararam descontentamento e disseram que a Netflix está prejudicando as operadoras. A reclamação é que enquanto elas têm a responsabilidade de investir em infraestrutura para suportar o serviço, empresas como a Netflix não sofrem qualquer tipo de regulamentação.

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Trecho do artigo de 2014:

Concluindo, não restam dúvidas de que a ideia de rede neutra representa uma grave ameaça ao futuro da Internet, seja nos aspectos tecnológicos, empresariais ou de liberdade de fluxo de informações. Sua aprovação representaria o início de uma espiral intervencionista: as primeiras interferências gerariam distúrbios no setor, o que seria usado como justificativa para mais e mais intervenções.

Notícia de 2015:

MPF encaminha propostas sobre neutralidade de rede para regulamentação do Marco Civil da Internet (22/05/2015)

A respeito das relações entre os usuários, provedores de conteúdos e os prestadores de serviços, a nota técnica lembra a importância de a regulamentação garantir a liberdade de competição no setor de telecomunicações.

Também afirma que os arranjos econômicos futuros entre as empresas deverão ser analisados caso a caso, conforme o potencial de criar mais inovação e bem-estar ou de gerar abuso de poder econômico.

O MPF também considera importante a adoção de políticas de segurança no gerenciamento do tráfego como um dos requisitos da regulamentação.

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Conclusão

Não obstante todo o entusiasmo até mesmo de pessoas da área de Tecnologia da Informação com relação ao Marco Civil da Internet e a Neutralidade de Rede — os quais, diziam eles, iriam garantir a plena liberdade de uso da internet —, os efeitos nefastos dessas regulamentações eram facilmente previsíveis para qualquer pessoa munida do conhecimento da correta teoria econômica.

Vale reiterar que o problema central da neutralidade de rede não está na relação das empresas de acesso com os consumidores finais. O problema está nas consequências não-previstas que toda e qualquer regulamentação gera.

Como explicado em detalhes no artigo dos quais os trechos acima foram extraídos, essa regulamentação tumultuará a Internet como um todo, desincentivando o investimento no aumento de capacidade e perturbando o cálculo econômico feito pelos inúmeros agentes envolvidos no negócio como um todo.

Paulatinamente, os consumidores ficarão insatisfeitos, os casos de judicialização dos contratos aumentarão sobremaneira, fazendo com que a “opinião pública”, ingênua e distraída, demande cada vez mais regulação do estado sobre a Internet.

Em pouco tempo, não tenho dúvida, a espiral intervencionista ganhará força. O estado passará a ser o ente central de toda a rede.

Trocando em miúdos, adeus Internet livre.

Como os próprios entusiastas dessa regulamentação sempre disseram, a neutralidade de rede é uma questão intocável, inegociável. Não tenham dúvidas, eles sabem bem o potencial de estrago que essa medida tem.

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