13.1 A teoria do valor-trabalho
Vimos que, na segunda metade de sua vida, Karl Marx, exilado na Grã-Bretanha longe do combate político ou do possível combate revolucionário, passou os últimos anos de sua vida procurando pelo mecanismo pelo qual a economia do capitalismo daria, inevitável e inelutavelmente, ascensão à sua própria derrubada revolucionária. Em suma, o mecanismo pelo qual a classe capitalista seria expropriada pelo proletariado revolucionário, que passaria então a inaugurar as várias etapas do comunismo.
Marx encontrou uma chave crucial para esse mecanismo na teoria do valor-trabalho de Ricardo e na tese socialista ricardiana de que o trabalho é o único determinante do valor, com a parcela do capital, ou os lucros, sendo a “mais-valia” extraída do produto criado pelo trabalho pelo capitalista. “Capital” era meramente “trabalho congelado”, de modo que qualquer contribuição possível para o produto recai sobre o trabalho também.
Mas, a fim de chegar à teoria do valor trabalho, ou quantidade de horas de trabalho, Marx, em sua obra sistemática, O Capital, teve de descartar outros pretendentes subjetivos à determinação do valor. Ele também teve de demonstrar que o valor estava de alguma forma objetivamente incorporado no produto (um bem material, é claro, uma vez que Marx, com Smith, havia rejeitado os serviços imateriais como “improdutivos”). Ele tentou realizar essa façanha logo no início do Volume I de O Capital, e como ele fez isso é altamente instrutivo.
Marx começa O Capital concentrando-se na “mercadoria”, um objeto — como vimos, uma substância material — que tem utilidade para satisfazer necessidades humanas. Dessa forma, como Ricardo, ele deixa de fora os serviços imateriais, e também omite estudar o valor de produtos não reproduzíveis, que não têm custos de produção contínuos. Como Ricardo, Marx também começa com a necessidade de utilidade, mas, como seu mestre, ele rapidamente descarta esse fato básico como de pouca ou nenhuma utilidade para explicar o “valor de troca”, a proporção em que as mercadorias são trocadas umas pelas outras no mercado. Assim como em Smith e Ricardo, portanto, valor de uso e valor de troca, ou preço, das mercadorias são separados um do outro. Como, então, explicar o valor de troca? Como, em suma, explicar as proporções pelas quais as mercadorias são trocadas umas pelas outras no mercado?
Marx acrescenta que, superficialmente, parece que os valores de troca são relativos, que flutuam em relação uns aos outros, e que, portanto, não há nada objetivamente “intrínseco” no produto que determine seu valor. Marx então se propõe a corrigir esse suposto erro. Aqui está o parágrafo crucial:
Tomemos duas commodities, por exemplo, milho e ferro. As proporções em que são trocáveis, quaisquer que sejam essas proporções, podem sempre ser representadas por uma equação na qual uma dada quantidade de milho é igualada a alguma quantidade de ferro: por exemplo, 1 quarto de milho = x quintais de ferro [cwt.]. O que essa equação nos diz? Diz-nos que em duas coisas diferentes — em 1 quarto de milho e x quintais de ferro, existe em quantidades iguais algo comum de ambos. As duas coisas precisam, portanto, ser iguais a uma terceira, que em si não é nem uma nem a outra. Cada uma delas, na medida em que é valor de troca, precisa, portanto, ser redutível a essa terceira […] de qual coisa eles representam uma quantidade maior ou menor.[1]
Assim, Marx insere seu erro crucial bem no início de seu sistema. O fato de duas mercadorias trocarem uma pela outra em alguma proporção não significa que sejam, portanto, “iguais” em valor e possam ser “representadas por uma equação”. Como aprendemos desde Buridan e os escolásticos, duas coisas trocam uma pela outra apenas porque são desiguais em valor para os dois participantes na troca. A cede x para B em troca de y, porque A prefere y a x, e B, ao contrário, prefere x a y. Um sinal de igualdade falsifica a figuração essencial.
E se as duas mercadorias, x e y, fossem realmente iguais em valor aos olhos dos dois trocadores, por que diabos qualquer um deles se deu ao trabalho de fazer a troca? A concentração de Marx na “mercadoria” o desorientou desde o início, pois o foco não deveria ter estado na coisa, o objeto material, mas nos indivíduos, os agentes, fazendo a troca e decidindo se fariam ou não a troca.
Se não há igualdade no valor, então claramente não há um terceiro “algo” ao qual esses valores precisam ser iguais. Marx compõe seu erro original com outro, assumindo que, se houvesse uma igualdade de valor, haveria, portanto, necessariamente uma terceira coisa tangível com a qual elas precisariam ser iguais e pela qual poderiam ser mensuradas. Não há garantia para esse salto da igualdade de valor para a mensuração de uma terceira entidade objetiva; a suposição implícita e falaciosa é que “valor” é uma entidade objetiva, como peso ou comprimento, que pode ser cientificamente medido em relação a algum terceiro padrão externo.
Tendo cometido dois erros flagrantes e fatais em um parágrafo, Marx insiste inexoravelmente em sua conclusão. Enfatizando pela mera afirmação de que a utilidade não pode ter nada a ver com valores de troca, um ponto crucial para seu caso, ele afirma que os valores de uso não têm nada a ver com valores de troca ou preços. Isso significa que todos os atributos reais dos bens, suas naturezas, suas qualidades variadas, etc., são abstraídos de, e não podem ter nada a ver com, seus valores. Ao descartar todas as propriedades do mundo-real da discussão, Marx é deixado forçadamente com bens como a personificação de horas de trabalho puras, abstratas e indiferenciadas, a quantidade de horas de trabalho supostamente homogêneas incorporadas no produto.
Marx, é claro, vê que há grandes problemas com essa abordagem. E quanto ao impulso escolástico: espera-se que o mercado cubra os custos, o enorme número de horas de trabalho, necessários para fabricar um produto de maneira obsoleta? Se um livro for impresso, ou escrito à mão, o mercado cobrirá o pagamento pelo enorme número de horas de trabalho necessárias no processo de cópia à mão? Espera-se que o mercado pague os custos de trabalho do transporte de mercadorias por terra, em comparação com o envio delas pelo mar?
A maneira de Marx de se livrar dessas questões estranhas foi a criação do conceito de tempo de trabalho “socialmente necessário”. O determinante do valor de um bem não é qualquer tempo de trabalho antigo gasto, ou incorporado, em sua produção, mas apenas o tempo de trabalho que é “socialmente necessário”. Mas isso é um pretexto, e evade do problema cometendo completamente petição de princípio. O valor de mercado é determinado apenas pela quantidade de tempo de trabalho “socialmente necessário”. Mas o que é “socialmente necessário”? Qualquer coisa que o mercado decidir. Então, um ingrediente crucial para explicar o valor de mercado são as próprias decisões de mercado, os próprios valores de mercado.
Para elaborar mais: Marx define “tempo de trabalho socialmente necessário” como “aquilo requirido para produzir um artigo sob as condições normais de produção, e com o grau médio de habilidade e intensidade predominantes na época”.[2] Isso traz um problema corolário: como combinar uma miríade de diferentes qualidades e habilidades de trabalho em uma “hora de trabalho” homogênea e abstrata? Aqui, retomando uma dica de Ricardo, Marx insere os conceitos de “médio” e “normal”. Tudo chega a uma média.
Mas como essa média é obtida? Ela é feita por pesos, com trabalho extraordinariamente produtivo de maior qualidade pesando mais em unidades de quantidade de tempo de trabalho do que o trabalho de um trabalhador não qualificado. Mas quem decide os pesos? Mais uma vez, a crucial metodologia de Marx de peticionar princípio entra em jogo. Pois Marx reconhece que é o mercado, seus preços e salários relativos, que determina os pesos, i.e., qual trabalho é mais produtivo ou maior em qualidade e em que grau do que algumas outras formas de trabalho. Assim, valores de mercado, preços e produtividades estão sendo usados para tentar explicar os determinantes desses mesmos valores e preços.[3]
13.2 Taxas de lucro e “mais-valia”
Marx prossegue com seu modelo em uma maneira socialista ricardiana. Em contraste com Ricardo, no entanto, terra e aluguel são simplesmente assimilados ao “capital”, uma vez que o trabalho do homem supostamente criou toda a terra de qualquer maneira, e uma vez que a importância da terra e do feudalismo supostamente desaparece à medida que o capitalismo avança em seu caminho. Valores e preços da terra, portanto, não precisam ser tratados ou explicados. Há, então, duas classes poderosas sob o capitalismo: os trabalhadores homogêneos, o proletariado; e “os capitalistas” [como em Smith e Ricardo, é claro, não há empreendedores. Tudo está em um equilíbrio de longo prazo que se move lentamente]. Mas os valores dos bens são a única criação das quantidades de horas de trabalho. Os capitalistas, por algum tipo de coerção, por seu conjunto imposto de relações de propriedade, extraem através da força um “lucro” do produto dos trabalhadores “explorados”. Esse lucro é a “mais-valia”, o valor tomado pelos capitalistas do valor total produzido.
O lucro, para Marx, é derivado apenas da exploração do trabalho; é a mais-valia {o valor excedente} dos salários necessários para a subsistência do trabalho. Os lucros, por outro lado, nada têm a ver com a quantia de capital investida; pois o capital é apenas matéria morta, trabalho armazenado ou congelado e, portanto, não pode mais ser “explorado” para fornecer lucros correntes.[4] Somente o trabalho “vivo” pode, então, ser usado para fornecer lucro ao capitalista. Mas se a quantia de lucro é extraída exclusivamente do trabalho, isso significa que qualquer acumulação de capital necessariamente irá reduzir a taxa de lucro auferida pelo capitalista. Assim, suponha que nenhum capital ou, em termos marxianos, capital “constante” seja usado,[5] e que o investimento seja feito apenas na forma de “capital variável” usado para pagar salários. Suponha que os lucros da produção do bem sejam de $100, e o capital variável total, ou pagamento de salários, seja de $1.000. Nesse caso, a taxa de lucro é de 10%. Por outro lado, suponha que haja um investimento em bens de capital no valor de, digamos, outros $1.000. O investimento total de capital é então de $2.000, mas uma vez que os lucros são derivados apenas do trabalho, eles ainda são os mesmos $100, de modo que a taxa de lucro agora caiu para 5%.
O que determina os salários, a quantia de má vontade concedida aos trabalhadores pela classe capitalista? Aqui Malthus e a lei de ferro dos salários fazem sua aparição vital, determinando sempre os salários aos meios de subsistência. Marx, é claro, apressa-se para limpar sua futura utopia comunista de quaisquer problemas malthusianos, ao afirmar que Malthus e a lei de ferro só prevalecem sob o capitalismo e certamente não se aplicariam sob o comunismo.
Deve-se enfatizar que a lei de ferro é crucial para todo o sistema de Marx. Para Marx, o valor e o preço de todo bem são determinados por seu custo, i.e., a quantidade de horas de trabalho incorporadas em sua produção. Marx acreditava que, no mercado, os capitalistas pagam aos trabalhadores o “valor de sua força de trabalho”, pelo qual, ele significou, é claro, não sua produtividade ou produtividade marginal, mas o “custo” de produzir e manter o trabalho, i.e., o custo, ou a quantidade de horas de trabalho, necessário para produzir os meios de subsistência dos trabalhadores.[6]
O professor Conway, em sua pesquisa e crítica geralmente excelentes do marxismo, reivindica que a teoria de Marx da mais-valia não requer a lei de ferro dos salários, uma vez que os capitalistas ainda poderiam extrair alguma mais-valia mesmo se os salários fossem maiores do que o salário de subsistência. Muito verdade, exceto que então os salários no sistema marxiano seriam indeterminados e, de fato, não haveria razão para assumir que a mais-valia existe, ou que é grande o suficiente para ter alguma importância na economia.
Além disso, se os salários não estão travados aos meros meios de subsistência, então a condição dos trabalhadores sob o capitalismo pode não ser tão lamentável, afinal. E se, então, houvesse pouquíssima substância para estimular os trabalhadores à derrubada revolucionária do capitalismo que Marx insistia ser inevitável? Assim, no Manifesto Comunista, Marx e Engels proclamaram enfaticamente que o salário médio é sempre “o salário-mínimo, i.e., aquela quantia dos meios de subsistência [Lebensmittel], que é requisito absoluto [notwendig] para manter o trabalhador na mera existência como trabalhador. O que, portanto, o trabalhador assalariado se apropria por meio de seu trabalho, basta meramente para prolongar e reproduzir uma mera existência”.[7],[8] E Engels, em sua obra tardia Anti-Dühring (1878), afirma que a indústria de larga escala “restringe o consumo das massas em casa a um mínimo de fome […]”
Há grandes problemas no modelo de Marx. Sua teoria implica que, uma vez que os lucros derivam apenas da exploração do trabalho, as taxas de lucro são necessariamente menores nas indústrias fortemente capitalizadas do que nas de trabalho intensivo. Mas todos, incluindo Marx, são forçados a reconhecer que isso manifestamente não se mantém verdadeiro no mercado. A tendência no mercado, como Smith e Ricardo bem sabiam, é que as taxas de lucro tendam à igualdade em todas as indústrias. Mas como, se as taxas de lucro são necessária e sistematicamente maiores nas indústrias de trabalho intensivo?
Aqui está certamente o buraco mais gritante e singular no modelo marxiano. Marx reconheceu que, no mundo real, as taxas de lucro tendem claramente para a igualdade (ou, como Marx a denominou, uma “taxa média de lucro”) e que os preços reais ou valores de troca nos mercados capitalistas, portanto, não trocam em seus valores de quantidade de trabalho marxianos. Marx admitiu esse problema crucial e prometeu que poderia resolvê-lo com sucesso em um volume posterior de O Capital. Ele sofreu com esse problema pelo resto de sua vida e nunca o resolveu — talvez uma das principais razões pelas quais ele parou de trabalhar cedo em O Capital e nunca publicou os volumes posteriores. Na primeira edição de seu grandioso History of the Theories of Capital and Interest, publicado em 1884, um ano após a morte de Marx, o notável teórico austríaco Eugen von Böhm-Bawerk, em sua crítica a Marx, apontou que “o próprio Marx ficou ciente do fato de que havia uma contradição aqui, e achou necessário, pelo bem de sua solução, prometer lidar com isso mais tarde. Mas a promessa nunca foi cumprida e, de fato, não poderia ser cumprida”.[9]
Böhm-Bawerk notou mais tarde que a crescente legião de adeptos marxianos continuava a manter sua fé de que o mestre acabaria por encontrar uma solução para essa falha grave e aparentemente inextirpável no sistema marxiano.[10] Então, no prefácio do segundo volume póstumo de Marx de O Capital, Friedrich Engels, de forma provocante e um tanto infantil, declarou que em um volume futuro Marx resolveria o famoso problema da taxa de lucro e do valor, e convidou todos os marxianos e outros economistas para uma espécie de concurso de ensaio premiado para adivinhar como Marx viria a resolver essa contradição aparentemente insolúvel. Nos nove anos que se seguiram até a publicação do climático Volume III de O Capital, um número surpreendentemente grande de economistas aventurou-se nesse joguinho.
No prefácio do tão esperado Volume III, publicado em 1894, um ano antes de sua própria morte, Engels pôde demonstrar triunfantemente que nenhum desses economistas chegara perto de ganhar o prêmio.[11] Assim, Engels foi muito menos cauteloso do que Marx ao estar disposto a ir a público e alardear uma “solução” que Marx aparentemente não achava digna de ser publicada.[12]
O volume III foi submetido a uma demolição detalhada, fulminante e completa dois anos depois por Böhm-Bawerk em seu extenso ensaio crítico, Karl Marx and the Close of His System.[13] Um século depois, permanece definitiva a refutação devastadora de Böhm-Bawerk da solução do Volume III e, portanto, do sistema marxiano. Ela fez a festa na economia profissional e tem permanecido dominante desde então, inoculando com sucesso os economistas, pelo menos, contra o vírus marxiano e certamente contra a teoria do valor-trabalho. Infelizmente, o ponto de Böhm-Bawerk era técnico demais para ter muito impacto fora das fileiras dos economistas e, desde então, o marxismo tem mantido sua maior atração nas fileiras de sociólogos, historiadores, literatos e outros que tendem a ser economicamente ignorantes.
Böhm-Bawerk, em suma, apresentou a grave contradição interna da teoria marxiana de forma clara e incisiva: Marx afirmou que os bens trocavam no mercado em proporção às quantidades de trabalho neles incorporados (i.e., que seus valores são determinados pela quantidade de horas de trabalho necessárias para produzi-los), e ainda também concedeu que as taxas de lucro de todos os bens tendiam a ser iguais. E, no entanto, se a primeira cláusula for verdadeira, as taxas de lucro seriam sistematicamente menores em proporção à intensidade do investimento de capital e maiores em proporção à sua intensividade de trabalho da produção. Marx prometeu resolver essa contradição insolúvel no Volume III e reconciliar essas duas proposições fundamentalmente contraditórias.
Em Karl Marx and the Close of His System, Böhm-Bawerk demonstrou que a “solução” proposta por Marx era uma farsa, e que, na verdade, o que Marx fez foi jogar a toalha e admitir que, no mercado capitalista, as taxas de lucro eram iguais e, portanto, que os preços não eram proporcionais ou determinados pela quantidade de horas de trabalho na produção de bens. Em vez disso, Marx, com efeito, abraçou a teoria ricardiana padrão e admitiu que os preços eram, na verdade, determinados pelos custos (ou, em sua terminologia, “preços”) da produção mais a taxa média de lucro. Dessa forma, enquanto fingia ter salvado sua teoria falando grandiosamente sobre a competição transformando “valores em preços de produção”, Marx na verdade abandonara completamente a teoria do valor-trabalho e, portanto, afundou todo o seu sistema.
Böhm-Bawerk procedeu, então, a uma crítica sistemática de vários argumentos marxianos que tentam salvar o fenômeno, incluindo bobagens sobre o “valor total” ser igual aos preços totais de todos os produtos.
É instrutivo observar a reação dos marxistas ao Volume III e à exposição e demolição de Böhm-Bawerk das graves contradições internas do sistema deles. Muitas vezes, eles reagiram à maneira de cultistas religiosos e não de cientistas honestos. Isto é, quando seu sistema é pego em falácias ou contradições egrégias, ou faz previsões grosseiramente falhas, os cultistas salvam sua teoria mudando os termos do argumento. Ou seja, eles afirmam que a teoria disse algo bem diferente, ou que a previsão havia na verdade sido diferente. Semelhantemente, o movimento milenarista extremamente popular no início da década de 1840 previu com confiança a data exata do Segundo Advento de Jesus, em 1843. Quando Jesus não chegou na data prevista, os milenaristas caracteristicamente alegaram um pequeno erro em seus cálculos e adiaram a feliz data por mais alguns meses. Quando Jesus não chegou mais uma vez, a maioria dos milenaristas se dispersou, mas alguns dos fiéis mais radicais mudaram os termos do argumento insistindo que Jesus realmente havia chegado na data esperada, mas que seu advento era invisível, com a segunda parte mais visível da Segunda Vinda devendo chegar em alguma data futura. (Este último grupo tornou-se os Adventistas do Sétimo Dia.)
E assim, a posição de recuo dos apologistas marxianos foi a alegação escandalosamente falsa de que Marx nunca quis dizer que seus valores determinados pelo trabalho determinassem ou que de alguma forma afetassem os preços de mercado. Marx, afirmavam altivamente, não tinha interesse em assuntos tão pequenos como o preço de mercado; seus “valores” criados pela quantidade de trabalho eram simplesmente incorporados misticamente nas mercadorias de mercado, presumivelmente, então, não tendo qualquer relevância para o mundo real do capitalismo de mercado.
Assim, Paul Sweezy afirmou que Marx não estava sequer lidando com preços, mas, na verdade, com “o que hoje pode ser chamado de sociologia econômica”.[14] G.D.H. Cole tentou afirmar, em seu What Marx Really Meant, que para Marx, em contraste com outros economistas, o valor não tinha nada a ver com a determinação de preços, mas era, essencialmente, por definição, a quantidade de horas de trabalho incorporada em um produto. Alexander Gray levantou uma crítica sagaz e devastadora a Cole:
Mas a identidade do valor e trabalho corporificado era certamente algo que Marx pensava ter provado (e que, portanto, exigia prova) nas primeiras páginas de O Capital […]
Se a identidade do valor e do trabalho é uma questão de definição e suposição, então, pelo menos sabemos o significado que Marx atribui a “valor”: mas, nesse caso, a pretensa prova no capítulo de abertura é mero colírio; uma vez que se afirma, mas não se prova, as definições.
Também nesse caso é de ser temido que o todo d’O Capital, apoiado em uma definição arbitrária que implica a conclusão a ser alcançada, é um exemplo de um vagar, de modo vão, em círculo, ainda mais do que os críticos mais críticos pensaram ser possível. Se, por outro lado, a identidade do valor e do trabalho é uma questão de prova e não de definição, resta-nos ainda tatear para encontrar o significado que Marx atribui a “valor”.[15]
Embora todos os marxistas oficiais tenham tomado essa escapatória — de salvar a teoria do valor-trabalho tornando-a irrelevante — a única tentativa marxista em grande escala de refutar Böhm-Bawerk foi a do marxista austríaco Rudolf Hilferding (1877-1941), Böhm-Bawerk’s Critique of Marx, publicada em 1904, com a tradução para o inglês publicada em 1920. A apologética de Hilferding, adotando a linha de recuo de que Marx nunca quis dizer que valores determinam preços, é um trabalho desajeitado e distorcido.
É interessante que o amigo e colega teórico austro-marxista de Hilferding, Otto Bauer, rejeitou Hilferding como nunca tendo entendido verdadeiramente a natureza do problema. Bauer se matriculou no grande seminário de Böhm-Bawerk na Universidade de Viena para aprender o suficiente para poder refutar a célebre crítica de Böhm-Bawerk. No final, Bauer desistiu da tarefa, virtualmente admitindo que a teoria marxiana do valor-trabalho era indefensável.[16] A maior parte dos estudiosos marxistas modernos sustentam que a teoria de valor-trabalho é uma vergonha e os marxistas sofisticados abandonaram-na totalmente, infelizmente sem também abandonar o sistema do qual ela é uma parte crucial e necessária.[17]
Um caso curioso de apologética marxista é um livro ampla e extravagantemente promovido como a crítica definitiva do marxismo. Em seu Marxism, o Professor Thomas Sowell toma a linha de Hilferding e acrescenta seus próprios erros adicionais. Assim, ele repreende Böhm-Bawerk por ter “repetidamente entendido mal” Marx, quando o meticuloso Böhm-Bawerk entendia Marx muito bem, e Sowell segue Hilferding ao afirmar erroneamente que Böhm-Bawerk e outros críticos sustentaram erroneamente que Marx identificava “valores” com preços.
Pelo contrário, Böhm-Bawerk e os outros estavam plenamente conscientes de que os “valores” criados pelo trabalho deveriam determinar, mas não ser o mesmo que valores de troca, ou preços. Também é irônico que um autor que faz um grande ponto de castigar economistas bem conhecidos que escrevem sobre economia marxiana sem citar Marx nem uma vez, ainda faça a afirmação egrégia e pomposa de que Marx não se referiu “em lugar algum a uma teoria do valor, apesar da numerosa — e não documentada — literatura interpretativa afirmando o contrário”. Como aponta um crítico de Sowell, tal referência por Marx pode ser facilmente encontrada no Volume III de O Capital.[18]
Embora os marxistas ortodoxos obviamente não a reconheçam, a posição de fuga de Hilferding, embora de fato salve a equalização do lucro no mundo real, fá-lo ao grave custo de abandonar a teoria do valor-trabalho. Ou, o que dá no mesmo, deixando-a como uma casca vazia e sem significado. Mas se não há teoria do valor-trabalho, então não há mais-valia, não há exploração e não há razão para o proletariado se rebelar contra um mundo em que seu produto não está sendo sistematicamente confiscado pela classe capitalista.
O caso mais interessante e extravagante de um marxista fervoroso que se comportou com honra quando confrontado com a gritante contradição entre os Volumes I e III de O Capital foi o do economista italiano Achille Loria (1857-1943). Para Loria, o primeiro volume de O Capital foi “uma obra-prima em que tudo é grande, tudo igualmente incomparável e maravilhoso”. No entanto, para Loria, o Volume III foi um golpe mortal para o próprio sistema de Marx. Na verdade, Loria não precisou esperar pela crítica de Bohm-Bawerk; em sua própria crítica do Volume III, Loria atacou o livro como uma “mistificação” em vez de uma “solução”. Loria denunciou o livro como “a campanha russa” [à la Napoleão] do sistema marxiano, sua “completa bancarrota teórica”, um “suicídio científico” e a “mais explícita rendição de seu próprio ensinamento”.[19]
Deixe Alexander Gray ter a última palavra perspicaz e hilária sobre a teoria do valor de Marx:
Testemunhar Böhm-Bawerk ou o Sr. [H.W.B.] Joseph trinchando Marx é apenas um prazer banal; pois esses são apenas escritores banais, que são tão banais que se agarram ao significado simples das palavras, sem perceber que o que Marx realmente quis dizer [Cole] não tem conexão necessária com o que Marx inegavelmente disse.
Testemunhar Marx cercado por seus amigos é, no entanto, uma alegria de uma ordem totalmente diferente. Pois é bastante claro que nenhum deles realmente sabe o que Marx realmente quis dizer; eles estão mesmo em dúvida considerável quanto a sobre o que ele estava falando; há indícios de que o próprio Marx não sabia o que estava fazendo.
Em particular, não há ninguém para nos dizer o que Marx pensava que ele queria dizer com “valor”. E, de fato, o que todas essas conjecturas revelam é um tanto surpreendente e, gostaríamos de pensar, único.
O Capital é, em certo sentido, um tratado de três volumes, expondo uma teoria do valor e suas múltiplas aplicações. No entanto, Marx nunca condescende em dizer o que ele quer dizer com “valor”, que, de acordo, é o que qualquer um se preocupa em fazer enquanto segue o desdobramento, do pergaminho, de 1867 a 1894. Nem ninguém sabe a que mundo tudo isso se aplica.
É para o mundo em que Marx escreveu? Ou para um mundo capitalista “puro” e abstrato que existe idealmente na imaginação e em nenhum outro lugar? [Croce]
Ou (por mais estranha que a sugestão possa parecer) Marx (provavelmente inconscientemente) estava pensando em termos de condições medievais? [Wilbrandt]
Ninguém sabe. Estamos preocupados com Wissenschaft, slogans, mitos ou encantamentos? Marx, foi dito, era um profeta — e talvez essa sugestão forneça a melhor abordagem. Não se aplica a Jeremias e Ezequiel os testes a que são submetidos os homens menos inspirados. Talvez o erro que o mundo e a maioria dos críticos tenham cometido seja apenas que eles não consideraram Marx suficientemente como um profeta — um homem acima da lógica, proferindo palavras enigmáticas e incompreensíveis, que todo homem pode interpretar como quiser.[20]
13.3 As “leis do movimento”, I: a acumulação e a centralização do capital
Assim, Karl Marx havia estabelecido, pelo menos para sua própria satisfação, a teoria do valor-trabalho e a reconciliação da teoria com a tendência das taxas de lucro à igualdade. Mas Marx não estava particularmente interessado em leis explicativas para o funcionamento do sistema capitalista. Ele estava interessado em avançar para o que chamou de “leis do movimento” (um termo reveladoramente mecanicista!) do sistema capitalista, isto é, em sua inevitável marcha em direção à vitória do comunismo revolucionário, uma marcha que prosseguiria “com a inexorabilidade das leis da natureza”. Como e para onde, então, o capitalismo estava fadado a se mover?
Um aspecto crucial da ruína inevitável do capitalismo é a lei inescapável da taxa decrescente de lucro. A taxa uniforme de equilíbrio existente, de acordo com Marx, estava fadada a continuar caindo. Tanto Smith quanto Ricardo tinham teorias de uma taxa decrescente de lucro, cada uma delas falaciosa, e cada uma delas chegada de maneiras completamente diferentes. Para Smith, a taxa de lucro (ou juros) é determinada pelo estoque de capital; quanto maior a quantidade de capital acumulado, menor a taxa de lucro. Ricardo, ao contrário, estava preocupado com o crescente dreno da economia pelos latifundiários, à medida que o crescimento populacional inevitável coloca cada vez mais terras inferiores sob cultivo. As horas de trabalho necessárias para a produção são aumentadas, aumentando, assim, os salários e os aluguéis monetários, desse modo consumindo cada vez mais os lucros.[21]
A taxa de lucro decrescente de Marx decorre da acumulação de capital ao longo do tempo, mas de uma maneira diferente da elaborada por Smith ou por Ricardo.[22] Como vimos, para Marx o capital é um peso morto e não fornece lucro ao capitalista. Todo o seu lucro vem da exploração do trabalho “vivo” e, portanto, acumular mais capital necessariamente reduz sua taxa de lucro, a proporção de seu lucro total dividida pelo seu capital total investido. E como a marca registrada do desenvolvimento capitalista é a acumulação contínua de capital, isso significa que o capitalismo está condenado a taxas de lucro sempre em queda.
Mas, pode muito bem ser perguntado, se a acumulação de capital necessariamente reduz os lucros, por que os capitalistas, que são claramente motivados pela busca de lucros maiores em vez de menores, insistem em continuar acumulando? Por que eles persistem em cortar suas próprias gargantas?
Uma resposta marxista a essa charada é a “competição”, e os leninistas em particular gostam de explicar o desenvolvimento supostamente posterior do “capitalismo monopolista” e do imperialismo como tentativas dos capitalistas de formar cartéis ou encontrar saídas de investimento no exterior, como tentativas de evitar as terríveis consequências da competição.[23] Mas a mera citação de “competição” dificilmente é uma resposta adequada. É verdade, por exemplo, que uma nova descoberta ou uma nova indústria causará lucros muito altos no início e que, na busca por esses novos lucros, as empresas concorrentes acabarão baixando a taxa de lucro da indústria.
Mas, pelo menos, no curto prazo, e antes que o equilíbrio chegue, esses capitalistas ainda estão obtendo lucros altos e acima do normal. Mas, em contraste, o empresário marxista que acumula capital perde lucros a cada passo do caminho, e não apenas no longo prazo. Portanto, é difícil ver por que qualquer capitalista, em qualquer etapa do caminho, seria tentado a participar do desfile acumulativo.
A resposta final de Marx a essa charada é enganosamente simples: os capitalistas acumulam, apesar da queda imediata e futura em seus lucros porque, bem, eles têm um desejo irresistível e irracional, ou um “instinto” de fazê-lo. Isso, é claro, não é explicação alguma; ele abandona qualquer explicação genuína sob o manto de um rótulo pomposo, mas em última análise sem significado, como “impulso” ou “instinto”. Comete o mesmo erro que a tentativa lendária de “explicar” por que o ópio adormece as pessoas entoando solenemente que o ópio tem “poder dormitivo”.
Observe o Leitmotiv da irracionalidade na análise de Marx sobre porque os capitalistas acumulam no Volume I de O Capital:
“Acumule, acumule! Esse é Moisés e os profetas! […] Portanto, poupe, poupe, i.e., reconverta o máximo possível de mais-valia ou produto-excedente em capital! Acumulação pelo bem da acumulação, produção pelo bem da produção”.[24]
Não por causa dos lucros! E um tema semelhante aparece no ensaio anterior de Marx, Trabalho Assalariado e Capital:
“Essa é a lei que repetidamente tira a produção burguesa de seu antigo curso e que compele o capital a intensificar as forças produtivas do trabalho, porque as intensificou […], a lei que não dá descanso ao capital e continuamente sussurra em seu ouvido: ‘Continue! Continue!’”[25]
Havia, é claro, outra maneira pela qual Marx e os marxistas poderiam resgatar a racionalidade da acumulação de capital, e essa era tomar o caminho substituto de Hilferding e abandonar a teoria do valor-trabalho como uma doutrina relevante para o mundo real. Marx, de fato, tomou esse caminho, além de reivindicar um desejo místico de acumular “pelo bem de acumular”. Nessa manifestação, ou face, de Marx, os inovadores capitalistas de fato obtêm um lucro inicialmente alto acima da taxa “média” uniforme prevalecente no mercado; esses pioneiros obtêm altos “lucros excedentes”, seguidos por imitadores e concorrentes até que a taxa de lucro seja eventualmente reduzida ao equilíbrio, ou taxa média. Tudo muito bem, e nessa variante, pelo menos, a realidade novamente vence. No entanto, mais uma vez, o preço de reconhecer a realidade é proibitivo: pois se esse tipo de coisa acontece habitualmente no mercado, por que a taxa de lucro tem mesmo de cair, ou ainda mesmo de nos apresentar uma tendência inexorável e contínua? Mais uma vez, como no imbróglio de Böhm-Bawerk-Hilferding, os marxistas só podem abraçar a realidade ao abandonar o sistema marxiano. Infelizmente, é claro que eles não reconhecem essa rendição e continuam a proclamar que a realidade exigiu apenas um pequeno ajuste à verdadeira doutrina.
Qualquer que seja o rumo que os marxistas tomem, é crucial para eles resgatar a acumulação contínua de capital, uma vez que é por meio dessa acumulação que o aumento da produtividade e, particularmente, as inovações tecnológicas ocorrem e são instituídos na economia. E devemos lembrar que é por meio da inovação tecnológica que os capitalistas cavam sua própria cova, pois o sistema capitalista e as relações capitalistas se tornam os grilhões que bloqueiam o desenvolvimento tecnológico. Algum método tecnológico que o capitalismo não pode abranger, que Marx tarde na vida pensou que seria a eletricidade, forneceria a faísca, a base necessária e suficiente para a inevitável derrubada do capitalismo e a tomada do poder pela classe histórica “final”, o proletariado.
Para Marx, duas consequências decorreriam necessariamente da suposta tendência da acumulação de capital e do avanço da tecnologia. A primeira é a “concentração de capital”, pela qual Marx significava a tendência inexorável de cada empresa de crescer cada vez mais em tamanho, para alargar a escala de produção.[26] Certamente, há uma grande expansão da escala da fábrica e da empresa no mundo moderno. Por outro lado, a lei é dificilmente apodítica. Por que a acumulação de capital não pode se refletir no crescimento do número de firmas, ao invés de meramente aumentar o tamanho de cada?
E enquanto muitos processos industriais crescem aumentando a escala ótima, outros florescem por serem relativamente pequenos e flexíveis em tamanho. As enormes fábricas de automóveis de Henry Ford foram econômicas e lucrativas por um tempo; mas, mais tarde, na década de 1920, elas inevitavelmente levaram a graves perdas porque esse investimento maciço se mostrou inflexível para atender às mudanças na natureza e na forma da demanda do consumidor. E enquanto as fábricas de automóveis são de grande porte, as fábricas e empresas de peças de automóveis são tipicamente de pequeno porte. Além disso, as empresas novas e pequenas normalmente têm superado os Behemoths grandes na introdução de invenções e inovações tecnológicas — a própria área que mais interessava a Marx.
As empresas de grande escala tendem a tornar-se burocráticas, inflexíveis e atoladas em interesses intelectuais e financeiros conferidos em fábricas e formas de produção existentes. De tempos em tempos, apenas novas e pequenas empresas podem levar adiante a inovação tecnológica de ponta.[27]
Se a lei da concentração do capital de Marx não está de forma alguma certa, então sua próxima tese, a “lei da centralização do capital”, está em uma forma ainda mais bamba. Aqui, Marx afirmou uma lei inevitável pela qual as empresas menores em cada indústria vão para a parede e são absorvidas em cada vez menos empresas gigantes — em suma, uma tendência rumo à monopolização da indústria. Por uma razão, a competição “sempre termina na ruína de muitos pequenos capitalistas, cujos capitais passam em parte para as mãos de seus conquistadores e em parte desaparecem completamente”. A uma segunda razão para sua lei, Marx apontou para a recente invenção da sociedade anônima, ou corporação, e sua capacidade de concentrar massas de pequeno capital em uma organização.
Mas pode-se reagir, e tem sido, a esse processo de centralização ou monopolização, através de tais desenvolvimentos como o crescimento de novos processos (como vimos acima) e da disseminação da competição geográfica.
Assim, além dos pequenos inovadores que mencionamos, o suposto domínio das Três Grandes empresas automobilísticas nos Estados Unidos tem sido erradicado pelo crescimento da concorrência estrangeira (japonesa, alemã ocidental, etc.).
Além disso, enquanto as pequenas mercearias de varejo “familiares” foram suplantadas, a alegada monopolização do negócio de mercearia de varejo pela A&P na década de 1930 foi pulverizada pelo crescimento da nova tecnologia dos supermercados.
Nesse ínterim, as pequenas mercearias voltaram na nova forma de lojas de conveniência ou 24 horas. Na cidade de Nova York, nos últimos anos, supermercados maiores foram superados na qualidade e variedade de frutas e vegetais por pequenas lojas familiares 24 horas coreano-americanas. Na América do final do século XIX e início do século XX, o monopólio do refino de petróleo da Standard Oil foi abalado por sua falha burocrática em perceber que os novos campos de petróleo do Texas e de Oklahoma eram a onda do futuro do petróleo bruto, e por seu atraso em ver que o querosene rapidamente estaria dando lugar à gasolina como o produto de petróleo dominante. Esse fracasso forçado deixou espaço para novos empreendedores pequenos e vigorosos, como Gulf e Texaco, saltarem e eliminarem o domínio da Standard no petróleo.
Um exemplo final e instrutivo, de escala excessiva da empresa e de monopólio não lucrativo, foi o resultado do grande boom de fusões de 1899-1901, no qual literalmente dezenas de indústrias, seguindo a atração dos lucros monopolistas, fundiram-se em uma empresa monopolista e quase invariavelmente perderam pesadamente, e foram forçados a dar lugar a uma extenuante competição de multiempresas.[28]
Assim, ninguém pode prever para que lado soprarão os ventos da competição, da criação e do declínio, da inovação e da decadência. Certamente uma das tendências do capitalismo é uma maior variedade e espectro de qualidade do produto, e essa tendência promove a “descentralização” ao invés da centralização marxiana. Basta dizer que não há evidências, apesar das inúmeras tentativas do governo federal de dar um impulso artificial à centralização, de que a indústria americana seja mais centralizada agora do que era na virada do século XX.[29]
Finalmente, há um outro lado da ascensão das corporações que Marx naturalmente deixa de fora. O próprio instrumento, pelo qual a sociedade anônima pode levantar massas de capital de outra forma indisponíveis, transformou a economia de um pequeno número de capitalistas em um mundo moderno em que cada pessoa, seja ele ou ela muito pequeno ou pequena, pode e torna-se um ou uma capitalista. Ou seja, praticamente todo mundo possui algumas cotas de ações, ou possui cotas de fundos de pensão investidos em ações ou títulos. “Todo homem é um capitalista” é, no mundo de hoje, uma condição generalizada ao invés de um slogan esperançoso para o futuro.
Enfatizar esse ponto deixa um ponto para ser ridicularizado por marxistas e liberais de esquerda, que apontam, obviamente, que um capitalista individual que possui algumas cotas de ações exerce pouco poder no mundo corporativo.
Mas tal ridicularização é ignorante e mal colocada, uma vez que o ponto é que, nesse sentido, os acionistas são como os consumidores. O consumidor individual tem pouco a dizer sobre os tipos e quantidades de bens e serviços produzidos, mas a massa de consumidores juntos exerce o poder econômico total.
Da mesma forma, o homem que possui uma cota de ação pode ter pouco a dizer nas decisões corporativas, mas o descontentamento de até mesmo uma minoria relativamente pequena poderia ter consequências custosas para os grandes acionistas se os descontentes venderem suas ações e fizerem com que os valores das ações despenquem. Grandes acionistas exercerão o controle direto de uma corporação, mas muito mais poder indireto reside nas mãos da massa de pequenos acionistas, assim como o poder econômico final sobre cada empresa é exercido pela massa de consumidores em suas decisões sobre se e quanto comprar do produto da empresa.
Voltando a Marx e a suas leis de concentração e centralização do capital. Estamos, agora, começando a ver os lineamentos do porquê de, para Marx, o capitalismo estar inevitavelmente correndo para sua ruína designada. Primeiro, é claro, Marx precisa confiar em seu absurdo modelo monolítico de duas classes, toda a sociedade sendo cada vez mais espremida em duas classes uniformes, cada uma com interesses comuns: os capitalistas e o proletariado.
Mas a lei da centralização do capital significa que as fileiras dos capitalistas estão diminuindo continuamente (como vimos, contrariando a universalização virtual das fileiras dos capitalistas a partir do desenvolvimento dos mercados de capitais e das corporações). Em verdade, o número cada vez menor de capitalistas cada vez mais ricos e poderosos tiveram sucesso ao “expropriar” seus companheiros capitalistas e conduzi-los para baixo nas fileiras do proletariado (já que, no esquema de duas classes de Marx, não há outro lugar para eles irem).[30]
Antes mesmo de trazer os próprios trabalhadores à figuração, podemos ver que as fileiras dos capitalistas, conforme diminuem, tornam-se necessariamente mais sitiadas.
A absurdidade genuína dessa figuração foi involuntariamente revelada pelo marxista alemão Karl Kautsky, apelidado por Engels, em sucessão apostólica, o próximo papa do movimento marxiano. Kautsky seguiu de forma simplista a lógica de seu mestre. Como Kautsky resumiu esse processo em seu livro sobre o programa de Erfurt:
a produção capitalista tende a unir os meios de produção, que se tornaram monopólio da classe capitalista, em menos mãos. Essa evolução finalmente torna todos os meios de produção de uma nação, na verdade de toda a economia mundial, a propriedade privada de um único indivíduo ou companhia, que dispõe arbitrariamente deles.
Toda a economia será atraída para um empreendimento colossal, no qual tudo tem de servir a um mestre. Na sociedade capitalista, a propriedade privada dos meios de produção termina com todos, exceto uma pessoa, sem propriedade. Conduz, assim, à sua própria abolição, à falta de propriedade de todos e à escravização de todos.[31]
E o que é adicional, estamos avançando em direção a esse estado de coisas “mais rapidamente do que a maioria das pessoas acredita”.
É como se Kautsky pudesse vislumbrar agora um pouco da absurdidade da posição em que a lógica do sistema marxiano o colocou. Para que não sejamos tentados a sentar e esperar por um Goldfinger, digno de muitos quatrilhões de dólares, que mantém todo o mundo de escravos empobrecidos em sua servidão, Kautsky se apressa em nos assegurar que o mundo não terá de esperar que todo o processo se resolva.
Em vez disso,
“a mera aproximação a essa condição precisa aumentar os sofrimentos, os conflitos e as contradições na sociedade a tal ponto que se tornem intoleráveis e a sociedade rompa seus limites e desmorone […]”[32]
Kautsky, no entanto, não teve sucesso em recuar antes de revelar inadvertidamente quão absurdo o modelo marxiano realmente é.
13.4 As “leis do movimento”, II: o empobrecimento da classe trabalhadora
O corolário vital para o sistema marxiano, das fileiras cada vez mais escassas dos capitalistas centralizados, é as fileiras cada vez maiores do proletariado e seu crescente empobrecimento e miséria. As duas classes antagônicas se envolvem em uma dialética própria, a dialética culminante no sistema marxiano. Por um lado: as fileiras cada vez mais escassas dos capitalistas cada vez mais ricos, até (ou quase até) um homem possuir toda a riqueza do mundo; por outro, as fileiras cada vez mais numerosas do proletariado cada vez mais empobrecido, até que as massas proletárias se levantem e assumam o poder. Mas deixe Marx contar a história, no que equivale a sua peroração empolgante no penúltimo capítulo do Volume I de O Capital:
De mãos dadas com essa centralização, ou essa expropriação de muitos capitalistas por poucos, desenvolvem-se, em escala cada vez maior, a forma cooperativa do processo de trabalho, a aplicação técnica consciente da ciência, […] o enredamento de todos os povos na rede do mercado mundial e, com isso, o caráter internacional do regime capitalista.
Junto com o número constantemente decrescente de magnatas do capital, que usurpam e monopolizam todas as vantagens desse processo de transformação, cresce a massa de miséria, opressão, escravidão, degradação, exploração; mas com isso também cresce a revolta da classe trabalhadora, uma classe sempre crescente em número, e disciplinada, unida, organizada pelo próprio mecanismo do próprio processo de produção capitalista.
O monopólio do capital torna-se um grilhão do modo de produção, que surgiu e floresceu com ele e sob ele. A centralização dos meios de produção e a socialização do trabalho chegam finalmente a um ponto em que se tornam incompatíveis com seu tegumento capitalista. Esse tegumento é rompido. O sino de morte da propriedade privada capitalista soa. Os expropriadores são expropriados.[33]
Agora, aqui está um ponto crítico e crucial no argumento marxiano. O empobrecimento crescente da classe trabalhadora é uma chave para o sistema marxiano, porque sobre ele repousa a ruína supostamente inevitável do capitalismo e sua substituição pelo proletariado.[34]
Se não há empobrecimento crescente, não há razão para a classe trabalhadora reagir contra sua exploração intensificante e romper seu “tegumento capitalista”, esses grilhões ao modo de produção tecnológico. Então, como Marx demonstra a crescente pobreza do proletariado?
Nesse ponto, Marx parece ficar desesperado e apresenta uma série de argumentos variados e contrastantes, alguns dos quais são mutuamente contraditórios. É como se Marx tentasse descontroladamente multiplicar os argumentos, por mais fracos que fossem, na esperança de que pelo menos um se sustentasse, e que ele demonstrará a inevitabilidade do próximo estágio comunista proletário da história. Mas todas essas tentativas de provar a miséria crescente chocam, antes de tudo, contra um obstáculo insuperável, um obstáculo que apenas Ludwig von Mises demonstrou claramente.[35]
Pois se os salários dos trabalhadores já estão e sempre estão nos meios de subsistência, mantidos lá pela lei de ferro, como eles podem piorar? Eles estão no nível máximo de pobreza, por assim dizer, há muito tempo. Mas, se por essa razão, eles não podem piorar, onde está a dinâmica que os levará a se levantar e derrubar o sistema?
Podemos conceder, é claro, que os novos proletários, tão rudemente lançados nas fileiras da classe trabalhadora por seus companheiros capitalistas triunfantes, ficarão particularmente nervosos e descontentes com seu novo destino na vida. Mas certamente Marx não se contentaria em confinar seus trabalhadores revolucionários às fileiras relativamente limitadas de capitalistas recentemente desclassificados. Especialmente porque a maior parte dos trabalhadores simplesmente permanece onde sempre esteve: na margem da subsistência.[36]
Deixando de lado, por enquanto, essa grave contradição interna com a lei de ferro dos salários, como Marx propõe estabelecer sua pretensa lei do empobrecimento crescente do proletariado? Em uma resposta, a taxa de lucros eternamente decrescente exerce uma severa pressão sobre os capitalistas para obter mais lucro ao suar e explorar o proletariado mais intensamente, fazendo-os trabalhar mais pesado e por mais horas.
Mas, além do problema da sempre presente lei de ferro, Marx se depara com o problema: por que os capitalistas permitiram que sua taxa de exploração diminuísse até finalmente ser estimulada por uma taxa de lucro em queda? Os capitalistas não tentam sempre e em todos os momentos maximizar suas taxas de lucro? E se assim for, e a menos que suponhamos uma súbita intensificação da ganância, ou da ânsia de lucro entre os capitalistas, eles nunca são negligentes ou frouxos em espremer a maior quantidade possível de lucro dos trabalhadores. Mas, então, como uma taxa de lucro decrescente pode estimulá-los a alturas cada vez maiores? Certamente, não é simplesmente um desejo de lucro.
Aqui Marx recua a um mecanismo sugerido para essa crescente exploração do trabalho e a decrescente taxa de salário: o crescimento acelerado de um “exército industrial de reserva” permanente, uma legião crescente de desempregados. É a concorrência aumentada dos desempregados que força os salários para baixo, e cada vez mais continua a fazê-lo à medida que o capitalismo avança.
Mas como pode haver um exército contínuo de desempregados, quando os salários dos desempregados são zero? Por que os desempregados não morrem de fome antes que possam constituir uma ameaça competitiva para o proletariado empregado? Se Marx responde que os desempregados são rapidamente absorvidos pelas fileiras dos empregados, reduzindo assim as taxas de salários, então ele abandona sua exigência de empobrecimento crescente: o crescimento de um exército permanente e em expansão de desempregados. Então, como eles são sustentados e como eles continuam existindo?
Além disso, de onde vem o exército industrial de reserva? Os economistas de mercado sabem que o desemprego se elimina rapidamente reduzindo taxas de salários. Somente se as taxas de salários forem reforçadas acima do nível de equilíbrio de mercado o desemprego se torna permanente; e se, como afirma Marx, o exército desempregado reduz os salários por meio de sua competição, então ele deve desaparecer rapidamente e não apresentar mais problemas.
Mas de onde vem o exército industrial de reserva em primeiro lugar? Para Marx, é o velho bicho-papão, o desemprego tecnológico. A indústria é mecanizada e os trabalhadores são expulsos, presumivelmente de forma permanente, de seus empregos. Mas e quanto à expansão da quantidade demandada e da produção provocada pela inovação tecnológica? E quanto ao aumento da demanda por produção e recursos em outras indústrias que são liberadas por produtos mais baratos na indústria em expansão tecnológica?
E o que dizer, como vimos acima, das taxas de salário mais baixas como a forma de livre mercado de manter o pleno emprego da mão de obra? O desemprego tecnológico é um bicho-papão antigo e muitas vezes desacreditado. Quando a discagem automática para telefones foi estabelecida, por exemplo, houve uma lamentação geral lamentável de que os pobres e amados operadores de telefonia seriam demitidos por essa inovação produtiva, mas sem coração. E, no entanto, é claro, os preços mais baixos do serviço telefônico resultaram em uma enorme expansão do mercado de telefonia, incluindo um aumento substancial no número de operadoras de telefonia.
De modo similar, o número de trabalhadores na indústria da construção aumentou, não reduziu, pelo desenvolvimento de guindastes, pás elétricas e outras máquinas de construção, em comparação com os bons velhos tempos das pás manuais. Em suma, para que o argumento do desemprego tecnológico funcionasse como uma forma de demonstrar o empobrecimento crescente, não apenas cada inovação tecnológica sucessiva teria de causar desemprego permanente, mas o efeito teria de se acelerar ao longo do tempo e, assim, mais do que compensar quaisquer tendências de equilíbrio rumo a mais empregos que o mercado possa possuir.
Na discussão do suposto exército industrial de reserva, lidamos com a afirmação de Marx de que há um aumento permanente e secular desse exército. A seguir, trataremos de outra doutrina marxiana, da recorrência do desemprego cíclico, que, junto com as depressões cíclicas cada vez piores, pode fornecer o motor da miséria crescente e da revolução proletária.
Outro argumento marxiano para a inevitabilidade do empobrecimento da classe trabalhadora é encontrado particularmente no Manifesto Comunista. Conforme a maquinaria se desenvolve e os capitalistas acumulam capital, lamentam Marx e Engels, o trabalho perde sua variedade de habilidades, e o proletariado é empurrado para tarefas cada vez mais simples, mais monótonas e não qualificadas, e essa desqualificação reduz o salário médio.[37]
Esse argumento fraco soa particularmente vazio hoje em dia, quando os amigos liberais de esquerda da classe trabalhadora estão fazendo o lamento exatamente oposto: que, em uma época em que um número cada vez maior de trabalho está indo para a operação de alta-habilidade de computadores e eletrônicos, o que acontecerá com o pobre trabalhador que está envelhecendo cada vez mais e não é habilitado, deixado para traz na marcha do progresso?
Um argumento marxiano relacionado enfatiza não tanto o empobrecimento crescente da classe trabalhadora, mas sua miséria através da “alienação” agravada, aumentando a monotonia ou a repulsão do trabalho causada pela mecanização em expansão. Embora o próprio Marx, de fato, refira-se a essa alegada miséria crescente no trabalho da classe trabalhadora, vimos mais acima que, para Marx, a “alienação” não tinha nada a ver com a psicologia subjetiva ou com a monotonia do trabalho, mas que tinha raízes cósmicas em, e de fato é definida como um atributo de, o sistema básico moderno de troca e da divisão do trabalho; e, além disso, na separação dos homens individuais do Homem e da Natureza que seria curada, e só poderia ser curada, pelo comunismo.
À parte do problema empírico de como o trabalho estava realmente se tornando mais monótono, e o contraste com a natureza libertadora da crescente variedade de quereres, produtos e ocupações, é difícil ver como ou por que qualquer “alienação” deveria aumentar significantemente ao longo do tempo, muito menos como esse aumento é transmitido de alguma forma para a classe trabalhadora.
Não, o caso da miséria crescente como estímulo à revolução precisa ser palpável e objetivo, evidente para a classe trabalhadora, ou não ser qualquer caso.
Ficamos com a doutrina do empobrecimento crescente do proletariado, uma doutrina tão crucial em Marx que dificilmente pode ser banalizada como uma “predição” que de alguma forma saiu da linha. Essa “predição” é absolutamente crítica para a tendência supostamente inevitável dos trabalhadores de se levantar e derrubar o capitalismo, uma tendência que é suposta a se aprofundar e acelerar conforme o capitalismo progride.
E ainda assim, ficou totalmente evidente para todos que um dos fatos vitalmente significativos, do século e meio desde o nascimento do marxismo, foi o crescimento contínuo e espetacular dos salários reais e do padrão de vida da classe trabalhadora e da massa da população. De fato, o que vimos nesse período é o crescimento mais espetacular na industrialização e nos padrões de vida da história do mundo.
Ademais, e particularmente revelador de uma crítica a Marx, esse avanço da classe trabalhadora foi particularmente notável precisamente nos países capitalistas avançados do Ocidente, aqueles que deveriam anunciar o crescente empobrecimento do proletariado. Aqui está um fato severo e implacável que todo marxista precisa enfrentar, e que por si só pode e deveria destruir o sistema marxiano. Como os marxistas lidaram com esse grave problema?
Alguns marxistas, é claro, simplesmente abandonaram o barco, ou proclamando ruidosamente sua deserção ou saindo silenciosamente do redil. Alguns marxistas, como Schumpeter observa atenciosamente, “na verdade não se importam em assumir a ridícula posição de que uma tendência de queda do padrão de vida da classe trabalhadora é de fato observável”.[38]
Mas, em geral, os marxistas tentaram salvar o fenômeno, resgatar a teoria, por meio de várias posições substitutas ou formas de evasão. Uma tática popular afirma que a tendência subjacente ao empobrecimento ainda existe, mas foi “temporariamente” (um ou dois séculos?) compensada por fatores contrários. Uma variante leninista popular, mas bizarra, é que os trabalhadores no Ocidente se beneficiaram da exploração imperialista ocidental ou do investimento no Terceiro Mundo, de modo que, em certo sentido, os trabalhadores ocidentais se tornaram “capitalistas” em escala internacional.
Em primeiro lugar, nessa transmutação do proletariado oprimido do Ocidente em “capitalistas” exploradores do Terceiro Mundo, o que aconteceu com a inevitável diminuição da classe capitalista? Em segundo lugar, o grotesco dessa doutrina pode ser medido pelo fato, como P.T. Bauer demonstrou em muitos trabalhos, que a maior parte do Terceiro Mundo, por mais pobre que seja, também tem se desenvolvido rapidamente nas últimas décadas, e o padrão de vida de suas massas trabalhadoras aumentou consistentemente.
Não apenas isso; mas esse desenvolvimento e elevação dos padrões ocorreu precisamente nas áreas e regiões do Terceiro Mundo (e.g., cidades portuárias) em contato comercial e de investimento mais próximo com os países ocidentais desenvolvidos. Por outro lado, são as áreas remotas do Terceiro Mundo, ainda não abertas ao comércio com o Ocidente, que ficaram para trás nesse crescimento econômico. Nada disso pode ser enquadrado com a imagem do mundo ocidental fazendo suas tremendas pernadas ao longo do século às custas do que teria de ter sido o empobrecimento e emiseração rapidíssimos e profundos das massas no Terceiro Mundo.[39]
Além do imperialismo, houve outros fatores intervenientes que vários marxistas afirmam ter interrompido temporariamente o funcionamento do empobrecimento inevitável. Uma escolha particularmente popular, por volta da virada do século XX, foi o fechamento da fronteira no oeste dos Estados Unidos.
A tese da fronteira eventualmente perdeu popularidade à medida que o evento recuava na memória e os padrões de vida dos trabalhadores continuavam seu avanço inexorável, embora, curiosamente, ela tenha sido revivida na bizarra “tese da estagnação” do final da década de 1930, em que o fechamento de fronteiras (junto de outros fatores mal escolhidos) era suposto a repentinamente levantar de sua cova de quatro décadas e esmagar a economia com uma miséria atrasada e inexplicável.
Mas, de longe, a posição substituta mais popular tem sido mudar os termos do argumento e da previsão. Fugindo face às evidências, esses marxistas contestam que Marx “não quis dizer realmente” o empobrecimento “absoluto”, uma queda contínua no padrão de vida; ele quis dizer uma queda na renda relativa dos trabalhadores, relativa, é claro, ao padrão de vida da classe capitalista. Era “empobrecimento relativo”, não “absoluto”, o que Marx supostamente queria dizer, e que os marxistas estavam agora proclamando.[40]
Como questão empírica, o empobrecimento relativo pode ou não ser verdadeiro em vários momentos e lugares, mas sua cogência é certamente dúbia. É certamente claro que o grau de desigualdade, por exemplo, sob o despotismo oriental ou na França absolutista de Luís XIV era muito maior do que sob o capitalismo moderno.
Mas mais importante é a ridicularidade de confiar no “relativo empobrecimento” como um motor suficiente para a classe trabalhadora se levantar em uma revolução sangrenta para derrubar a classe capitalista. Se um trabalhador tem um iate, ele se rebelará porque há outros na sociedade que têm dois ou três? Ou, para ser mais realista, um trabalhador com dois aparelhos de TV em cores se levantará na revolução porque Rockefeller, Lee Iacocca ou Hugh Hefner tem um aparelho maior em cada quarto? Estamos muito, muito longe da emiseração. A iminente ira inevitável do proletariado se transformou, finalmente, em farsa.
E, ainda assim, mesmo o chefe do marxismo oficial depois de Engels, Karl Kautsky, sendo forçado em 1899 a admitir que o padrão de vida dos trabalhadores estava subindo, foi compelido a retroceder na visão de que o que Marx realmente queria dizer era pobreza relativa, ou o que Kautsky chamava de “social”.
Por “pobreza social”, Kautsky significou francamente inveja, ou “cobiça”, e assim foi obrigado a retroceder na visão de que ganhar em renda, mas ver outros ganhar mais seria suficiente para incitar o trabalhador à inveja suficiente para se levantar e derrubar o sistema inteiro.[41] Em qualquer caso, é muito mais plausível que a inveja seria institucionalizada em impulsos políticos, digamos, por um imposto de renda progressivo ou vários subsídios do governo, em vez da erupção a uma destruição revolucionária de todo o sistema.
Tudo isso não nega que existam, de fato, passagens em Marx que descrevem apenas um empobrecimento relativo da classe trabalhadora e um aumento de sua inveja pelos mais ricos do que eles.[42] O ponto, no entanto, é que há também outra variante dominante nos escritos de Marx que prevê e enfatiza um crescente empobrecimento real absoluto e objetivo da classe trabalhadora.
Finalmente, há uma contradição interna gritante no coração da economia marxiana que nunca é resolvida. Se os capitalistas sofrem ao longo do tempo com uma taxa de lucro decrescente e os trabalhadores sofrem com o empobrecimento crescente, quem está se beneficiando na distribuição da torta econômica?
Pelo menos no sistema ricardiano, os capitalistas sofrem com a taxa de lucro decrescente, e os trabalhadores são mantidos no nível de subsistência bruta, mas algum grupo continua pegando todos os benefícios sociais — os latifundiários parasitas e sua crescente absorção do produto social pelo aluguel da terra. Mas no sistema marxiano, os latifundiários desapareceram, assimilados crescente e rapidamente na classe capitalista. Então, como ambas as classes poderosas podem perder sob o capitalismo em desenvolvimento?[43]
13.5 As “leis do movimento”, III: crises de ciclos econômicos
Uma variante final da tentativa de Marx de demonstrar a inevitabilidade da revolução proletária estava intimamente relacionada à doutrina do empobrecimento absoluto. Essa variante, no entanto, enfatizou, não uma tendência secular consistente ao empobrecimento crescente ou a um exército industrial de reserva, mas sim, crises de ciclos econômicos e depressões crescentemente destrutivos, marcados pelo empobrecimento e desemprego cíclico. Voltamo-nos agora para a teoria de Marx, ou melhor, suas várias teorias de ciclos e crises, pois seus escritos contêm várias teorias muito diferentes e incompatíveis. Talvez Marx, em desespero, estivesse disposto a apresentar uma série de teorias, esperando que uma delas, pelo menos, conseguisse colar.
13.5.1 Subconsumismo
A explicação do subconsumismo para a depressão era a variante dominante da teoria dos ciclos de Marx, como evidenciado, por exemplo, pelos repetidos ataques dele e de Engels à lei de Say e à adesão de Ricardo a essa lei.[44]
O ponto, como elaborado particularmente no Teorias da Mais-Valia de Marx (escrito em 1861-63), é que conforme a acumulação e a produção capitalistas avançam, ultrapassam a capacidade de consumo dos trabalhadores explorados, que ganham bem menos do que o valor do seu produto.
A massa de trabalhadores não pode consumir o suficiente para comprar o produto capitalista, e a folga não é ocupada pelos exploradores capitalistas, que estão muito mais interessados em economizar e acumular do que em consumir. Assim, Say está incorreto e há superprodução geral sistêmica, com a produção superando a capacidade de consumo das massas.[45] Como Marx repetidamente diz, “a maioria do povo, a população trabalhadora, só pode estender seu consumo dentro de limites muito estreitos”.
Marx retorna a esse tema dominante do subconsumismo no Volume III de O Capital. No capitalismo, escreve Marx, o “poder de consumo da sociedade” é determinado por “condições antagônicas de distribuição”, que “reduzem o consumo da grande massa da população a um mínimo variável dentro de limites mais ou menos estreitos”. Além disso,
o poder de consumo é ademais restringido pela tendência de acumulação, a ganância por uma expansão do capital e uma produção de mais-valia em escala ampliada […] O mercado precisa, portanto, ser continuamente ampliado […] Mas na medida em que a força produtiva se desenvolve, ela se encontra em desacordo com a base estreita sobre a qual repousam as condições de consumo.
Em adição, no Volume III de O Capital, Marx escreve: “A razão última de todas as crises sempre permanece a pobreza e o consumo restrito das massas, em face do impulso para desenvolver as forças produtivas como se apenas o consumo absoluto da sociedade estabelecesse um limite a eles”.[46]
O problema mais óbvio e flagrante com uma teoria subconsumista das crises econômicas é que ela explana demais. Pois, se o consumo das massas nunca é suficiente para recomprar o produto e manter o negócio lucrativo, por que não há depressão permanente? Por que existem expansões, bem como contrações?
Tanto Marx quanto Engels aparentemente sentiram esse problema e, consequentemente, viram a necessidade de, pelo menos, uma teoria suplementar. Assim, no Volume III de O Capital, Marx, além da citação acima, concedeu que há períodos de expansão pelo menos temporários antes das crises, quando os salários aumentam e os trabalhadores obtêm uma parcela maior do produto.[47]
Engels, também, em Anti-Dühring, afirma primeiro que “a indústria de larga escala, que caça em todo o mundo novos consumidores, restringe o consumo das massas domésticas a um mínimo de fome e, assim, mina seu próprio mercado interno”. Mas, então, um pouco mais adiante na mesma obra, Engels, depois de afirmar que “o subconsumo das massas é, portanto, também uma condição necessária das crises”, admite que o conceito não pode explicar “por que as crises existem hoje” enquanto “elas não existiam em períodos anteriores”.
Na época em que Engels escreveu o prefácio da primeira edição inglesa do Volume I de O Capital em 1886, no entanto, o problema já havia sido nitidamente resolvido para sua própria satisfação. Embora os ciclos econômicos de expansão e contração tenham de fato prevalecido até 1867, ele opinou, a economia inglesa estava agora satisfatoriamente atolada em uma depressão permanente.
Quaisquer que fossem as causas subsidiárias das expansões, eles agora estavam encerrados, e a depressão permanente logo daria início à revolução proletária. Em meio ao mar de destroços de “previsões” marxianas autogarantidas, essa foi uma das mais absurdas e surpreendentemente erradas. Assim Engels:
O ciclo decenal de estagnação, prosperidade, superprodução e crise, sempre recorrente de 1825 a 1867, parece de fato percorrido seu curso; mas apenas para nos desembarcar no pântano do desânimo de uma depressão permanente e crônica.
O esperado período de prosperidade não virá; com tanta frequência quanto parecemos perceber seus sintomas prenúncios, com tanta frequência eles desaparecem no ar.
Enquanto isso, cada inverno que se segue traz à tona a grande questão: “o que fazer com os desempregados”; mas enquanto o número de desempregados aumenta de ano para ano, não há ninguém para responder a essa pergunta; e quase podemos calcular o momento em que os desempregados que perdem a paciência tomarão seu próprio destino em suas próprias mãos.[48]
No fim, é claro, a prosperidade veio à Inglaterra muito antes da revolução proletária.
De qualquer forma, o subconsumo é uma teoria totalmente falha, seja usada para explicar crises cíclicas seja depressões permanentes. Em primeiro lugar, as poupanças não “vazam” da economia; elas são gastas, em investimentos de vital importância em recursos e bens de capital.
Mais importante ainda, como no caso de toda teoria maluca, o sistema de preços silenciosamente sai de cena, e ficamos com juggernauts agregadores como “produção” e “consumo” enfrentando um ao outro. Não existe algo como superprodução; há apenas muito produzido para o preço que os consumidores estão dispostos a pagar, um preço que, nas crises, não cobre os custos incorridos pelos empresários.
Mas uma vez que reconhecemos isso, precisamos, então, ver também que, a fim de trazer produção e consumo a um equilíbrio, a fim de eliminar o problema da oferta, ou estoque, ser maior que a demanda, tudo que precisa acontecer é que os preços caiam. Deixe os preços caírem e eles logo equilibrarão a oferta e a demanda, e as perdas de negócios serão apenas temporárias.
E esse ponto leva o analista a considerar o próximo passo: por que os empresários — empreendedores com um histórico geral excelente na previsão de demanda e custos — por que dessa vez eles ofertaram custos tão excessivamente altos que sofrem perdas na tentativa de vender o produto? Em suma, por que os empresários cometeram esse aglomerado de graves erros de previsão que marcam o período de crise econômica? Nada disso, é claro, poderia ser considerado por Marx e pelos subconsumistas, que não se preocupam em considerar o sistema de preços. Além disso, Marx, como Smith e Ricardo antes dele, não tem nenhuma concepção do empreendedor ou da função do empreendedorismo.
Finalmente, sabe-se que as crises começam invariavelmente, não nas indústrias de bens de consumo que o subconsumismo nos levaria a esperar, mas precisamente nas indústrias de bens de capital e naquelas indústrias mais distantes e remotas do consumidor. O problema pareceria que é — corretamente — muito consumo em vez de pouquíssimo.[49]
13.5.2 A taxa de lucro decrescente
A segunda teoria da crise, proeminente no Volume III de O Capital, concentra-se na taxa de lucro decrescente marxista. O impulso incessante dos capitalistas para acumular provoca uma tendência secular de queda da taxa de lucro.
Finalmente, quando o lucro cai abaixo de “uma certa taxa”, o crescimento do capital cessa e uma crise econômica se instala. Assim como o capitalismo leva a uma superprodução de bens em relação ao consumo, também cria uma superacumulação de capital. A cessação do investimento de capital leva a uma recessão nas indústrias de bens de capital, que então se amplia para uma depressão geral.
Embora essa segunda explicação da crise econômica tenha pelo menos o mérito de se concentrar nas indústrias de bens de capital e não no consumo, dificilmente é uma melhoria. Em primeiro lugar, mais uma vez, a taxa de lucro decrescente parece descrever uma lei de declínio secular; mas por que deveria levar a um colapso econômico específico, muito menos a uma série cíclica de expansões e contrações?
Mesmo que a taxa de lucro caia, por que os empresários deveriam parar de investir, especialmente de repente? Qual é o mecanismo para explicar o súbito e agudo ponto de virada? Além disso, mesmo que a taxa de lucro caia, a massa reconhecidamente crescente de capital poupado pode muito bem aumentar a quantidade absoluta de lucros agregados, de modo que, mesmo que a taxa caia, o processo ainda pode estimular muitos investimentos adicionais.
Além disso, mesmo que Marx pudesse explicar um ponto de virada e uma queda brusca, por que deveria haver um renascimento? Aqui está um ponto particularmente bambo em Marx: o capital desacumula grandemente durante a crise, de modo que o denominador do capital realmente diminui e, portanto, a taxa de lucro para o investimento total aumenta.
Esse processo pode novamente criar maiores investimentos e outra expansão. A probabilidade, no entanto, de que uma depressão seja acentuada o suficiente para realmente consumir capital e também aumentar as taxas de lucro mais do que a suposta tendência contínua de queda da taxa de lucro é muito baixa. E mesmo se uma recuperação estiver em andamento, por que uma expansão vigorosa ocorreria?
Não há, finalmente, nenhuma indicação em Marx ou Engels do porquê desses ciclos ou depressões serem supostos a aumentar em intensidade, universalidade e profundidade ao longo do tempo, para finalmente resultar em depressão e revolução permanentes.
Em suma, a linha da taxa de lucro decrescente da teoria dos ciclos é singularmente sombria e inconvincente.
13.5.3 Desproporcionalidade
Aqui, na teoria da “desproporcionalidade” de Marx, voltamos, num sentido profundo, onde nós começamos, ou melhor, onde o próprio Marx começou: ao comunismo e ao desejo de erradicar o mercado e a divisão do trabalho. Entremeada em suas discussões em O Capital e Teorias da Mais-Valia está a visão de que os ciclos e as crises inevitavelmente derivam do processo de mercado.
Para Marx, o problema era endêmico na economia de mercado, e particularmente na economia monetária, ou de troca indireta. Como o mercado supostamente não tinha mecanismo de coordenação, toda produção e troca, segundo Marx, é caótica, descoordenada, um regime do que ele chamou de “a anarquia de produção”. Como Bober resume:
Essa teoria está preocupada com os maus-ajustamentos e desproporcionalidades atribuídos à anarquia da competição; aos movimentos desajeitados e descoordenados de multidões de capitalistas individuais; às complexidades dos muitos elementos que devem se encaixar em um mundo extremamente complexo, e que o farão por mero acidente, senão por projeto planejado; e aos caprichos do vento e do tempo.[50]
Marx tinha um ponto revelador contra os ricardianos, os classicistas britânicos de sua época. De fato, o mundo não se aquece feliz na terra do nunca do equilíbrio de longo prazo. Mas o que Marx negligenciou é precisamente o que os ricardianos negligenciaram: se eles tivessem mudado seu foco para fora da terra nebulosa do equilíbrio de longo prazo e de volta ao mundo real da economia de mercado, eles teriam descoberto um mundo muito diferente.
Teriam visto o que Turgot, os franceses, os italianos e os escolásticos tinham visto: o mundo real dos mercados não é perfeitamente, mas ainda harmônica e dinamicamente coordenado por dois elementos cruciais: um sistema de preços que é livre para flutuar para igualar as forças mutáveis de oferta e manda; e empreendedores que, em sua busca contínua de aumento de lucros e evitamento de prejuízos, realizam essa tarefa de coordenação.
Mas, ao focar no equilíbrio de longo prazo, os classicistas britânicos eliminaram tanto o sistema de preços do mundo real quanto o papel vital do empreendedor na economia de mercado — a antecipação bem-sucedida da mudança em um mundo em mudança e incerto. Se não há sistema de preços para a troca de títulos de propriedade por bens e serviços, e não há empreendedores-capitalistas, então, de fato, a produção está em estado de “anarquia”.
Marx também viu que a descoordenação pode causar superacumulação de capital, e teceu esse tema na variante anterior — a taxa de lucro decrescente — em uma tentativa de explicar ciclos e crises. Alguns economistas posteriores, notadamente o economista marxista russo Tugan-Baranowsky, elaboraram essas dicas no que foi chamado de “teoria do superinvestimento não monetário” do ciclo econômico.[51]
Marx viu que o sistema monetário e de crédito desempenhava um papel importante nos ciclos e crises: o crédito é importante na centralização do capital: estimula a especulação, intensifica a crise e acelera a superprodução.
Mas enfatizar o crédito bancário como causa fundamental do ciclo poderia ter sido fatal para a tentativa de Marx de atribuir a culpa pelos ciclos e crises às forças inerentes da economia capitalista de mercado. E, portanto, era necessário que ele repudiasse qualquer possível ênfase da currency school sobre o papel causal do crédito bancário: “A superficialidade da Economia Política”, Marx escreve em O Capital, “mostra-se no fato de que ela olha sobre a expansão e contração do crédito, que é um mero sintoma das mudanças periódicas do ciclo industrial, como sua causa”.[52]
Apesar de seu desprezo aberto por John Stuart Mill, Marx foi assim levado a apoiar implicitamente a teoria da escola bancária-Mill-Tooke do ciclo econômico.[53] Como vimos, os próprios escritores da currency school foram forçados a adotar essa visão após o aparente fracasso do Peel’s Act de 1844 em erradicar os ciclos econômicos.
Enquanto todos os teóricos à la escola bancária sobre desproporcionalidade não monetária e superinvestimento foram obrigados a admitir que a expansão do dinheiro e do crédito bancário eram condições necessárias para um ciclo de expansão, todos eles proclamaram que os ciclos de crédito eram apenas resultantes passivos de ciclos não monetários de “super” e “sub”’ negociações ou de “especulação”.
Assim, a teoria milliana do ciclo não-monetário permeou as fileiras dos economistas e os encorajou, incluindo Marx, a culpar a economia capitalista de mercado pela recorrência dos ciclos econômicos. Os insights da currency school desaparecida, a percepção de que o dinheiro e o crédito enquanto uma condição necessária estava perto de dizer uma causa, e o insight original, de que é necessária a expansão do crédito bancário para distorcer os sinais do mercado aos empreendedores e criar um ciclo de expansão-contração, permaneceu enterrado, para ser descoberto ou redescoberto por Ludwig von Mises em 1912.
13.6 Conclusão: o sistema marxiano
Assim, Karl Marx criou o que parece ser, ao observador superficial, um sistema de pensamento impressionante e integrado, explicando a economia, a história mundial e até o funcionamento do universo. Na realidade, ele criou uma verdadeira teia de falácias.
Cada ponto nodal da teoria é errado e é falacioso, e seu “tegumento” — para usar um bom termo marxiano — também é uma teia de falácias. O sistema marxiano jaz em absolutos farrapos e ruínas; o “tegumento” da teoria marxiana “estourou” muito antes de seu previsto “estouro” do sistema capitalista.
Longe de ser uma estrutura de leis “científicas”, além disso, a estrutura improvisada foi construída e escorada em serviço desesperado ao objetivo messiânico fanático e enlouquecido de destruição da divisão do trabalho e, de fato, da própria individualidade do homem, e à criação apocalíptica de uma ordem mundial coletivista supostamente inevitável, uma variante ateizada de uma venerável heresia cristã.
Durante a década de 1960, os marxistas messiânicos e românticos gostavam de fazer uma separação nítida entre o jovem Marx — adorável, idealista e “humanista” — e o velho Marx — economista malvado, hardcore e proto-stalinista. Mas agora sabemos que não existe tal divisão. Há apenas um Marx, seja cedo ou tarde, uma vez que ele adotou o marxismo na década de 1840.
Há até um bom argumento para ver um Marx ao longo da vida, incluindo seus poemas enlouquecidos e demoníacos pedindo a destruição universal em seus anos de graduação em Berlim. Na verdade, o Marx humanista dificilmente é um alívio do economista posterior — muito pelo contrário.
Todas as variantes de Marx estavam a serviço de sua visão messiânica fanática e destrutiva do comunismo. Um caso convincente pode ser feito, de fato, de que os conhecidos horrores do comunismo do século XX: de Lenin, Stalin, Mao e Pol Pot, podem ser considerados o desdobramento lógico, a encarnação, da visão do século XIX de seu mestre, Karl Marx.
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Notas
[1] Karl Marx, Capital, Vol. 1 (Nova York: International Publishers, 1967), p. 37.
[2] Ibid., I, p. 39.
[3] Compare a discussão em David Conway, A Farewell to Marx: An Outline and Appraisal of His Theories (Harmondsworth, Mddx: Penguin Books, 1987), pp. 83-9.
[4] Como Böhm-Bawerk iria apontar mais tarde, mesmo se optarmos por adotar essa abordagem de custo de produção, temos de reconhecer que o capital incorpora não apenas trabalho e terra, mas também tempo. A terra, como veremos mais adiante, foi jogada fora por Marx ao amalgamá-la em capital; mas se o tempo tivesse sido reconhecido como um fator importante, então a preferência temporal teria de ser reconhecida, e todo o sistema marxista entraria em colapso
[5] “Constante” porque, de acordo com Marx, bens de capital, sendo peso morto, não podem gerar qualquer lucro ou aumento de valor.
[6] O professor Conway resume bem o ponto de Marx: “[…] o trabalhador recebe em salários por dia uma soma de valor igual ao valor de sua força de trabalho por um dia. Dado que o valor da força de trabalho de um dia é igual à quantidade de trabalho necessária para produzir a força de trabalho desse dia, segue-se que o valor da força de trabalho de um dia é igual à quantidade de trabalho necessária para produzir os meios de subsistência do trabalhador consumidos por dia”. Conway, op. cit., nota 3, pp. 96-7.
[7] Em uma passagem anterior do Manifesto, Marx e Engels escreveram que “o preço de uma mercadoria e, portanto, também do trabalho [mais tarde modificado para “força de trabalho”], é igual ao custo de produção”. Além disso, “o custo de produção de um trabalhador se restringe, quase inteiramente, aos meios de subsistência de que necessita para sua manutenção e para a propagação de sua raça”. Veja Robert C. Tucker (ed.), The Marx-Engels Reader (2ª ed., Nova York: W.W. Norton, 1972), pp. 479, 485.
[8] Sobre a dependência do sistema marxiano da lei de ferro dos salários, veja Ludwig von Mises, “The Marxian Theory of Wage Rates”, em Eugen von Bohm-Bawerk, The Exploitation Theory of Socialism-Communism (3ª ed., South Holland, Ill.: Libertarian Press, 1975), pp. 147-51. O ensaio de von Mises foi publicado originalmente na Christian Economics, em maio de 1961.
Como aponta von Mises, Marx não gostou do nome “lei de ferro dos salários”, porque foi cunhado por seu grande rival na política socialista alemã, Ferdinand Lassalle (1825-64), mas aderiu fortemente ao conceito.
Curiosamente, a famosa frase de Lassalle, traduzida para o inglês como “a lei de ferro”, deveria ter sido chamada, como Alexander Gray aponta, a lei de “bronze” ou de “latão” dos salários. Como Gray acrescenta caracteristicamente, “de qualquer forma, sendo metálico, não importa muito. Um maníaco por precisão pode de fato apontar que o que ele [Lassalle] chamava com mais frequência era ‘das eherne [bronze] und grausame [cruel] Gesetz [lei]’, o que de alguma forma soa ainda mais horrível”. Alexander Gray, The Socialist Tradition (Londres: Longmans, Green, 1946), p. 336.
[9] Eugen von Böhm-Bawerk, Capital and Interest (Londres: Macmillan, 1890), p. 390.
[10] Eugen von Böhm-Bawerk, Karl Marx and the Close of His System (Nova York: A. M. Kelley, 1949), p. 5
[11] Ibid., pp.5-6. Os “contestantes” incluíam o bem conhecido estatístico alemão Wilhelm Lexis (1885), o marxista Conrad Schmidt (1889, 1892-93), o marxista italiano Achille Loria (1890), o liberal laissez-fairista Julius Wolf (1891) e vários economistas italianos durante 1894.
[12] Lembre-se que, como observamos em nossa discussão sobre a definição de classe, Karl Marx quase não foi impedido de trabalhar em O Capital. Ele havia abandonado o trabalho em sua magnum opus no momento da publicação do Volume I, e passou uma década e meia mentindo para seu amigo e patrono sobre continuar trabalhando em O Capital.
[13] Publicado pela primeira vez como Zum Abschluss des Marxschen Systems em um Festschrift para Karl Knies em 1896, e publicado como um livreto separado no mesmo ano. Foi um sucesso rápido, sendo traduzido no ano seguinte para o russo, e a tradução para o inglês lançada em 1898. Infelizmente, “close” é um termo peculiar e enganoso; um título muito mais preciso teria sido Karl Marx and the Completion of His System
[14] Paul M. Sweezy, “Professor Cole’s History of Socialist Thought“, American Economic Review, 47 (1957), p. 990. Citado em Gary North, Marx’s Religion of Revolution (Nutley, NJ: The Craig Press, 1968), p. 163. Sweezy também sustentou que o alemão Ladislaus von Bortkiewicz havia refutado a crítica de Böhm-Bawerk a Marx, mas Samuelson apontou que a posição de von Bortkiewicz estava muito mais próxima de Böhm-Bawerk do que de Marx. Paul Samuelson, “Wages and Interest: A Modern Discussion of Marxian Economic Models”, American Economic Review, 47 (1957), pp. 890-92.
[15] Gray, op. cit., nota 8, p. 319.
[16] Veja Ludwig von Mises, Notes and Recollections (South Holland, Ill.: Libertarian Press, 1978), pp. 39-40.
[17] Para uma crítica extensa das tentativas recentes de um grupo de “marxistas analíticos” de descartar a teoria do valor-trabalho e ainda manter o marxismo, veja David Gordon, Resurrecting Marx (New Brunswick, NJ.: Transaction Books, 1990).
[18] A afirmação de Sowell está na página 153 da edição London: Lawrence and Wishart. Sowell também nega absurdamente que Marx acreditasse em uma teoria do valor-trabalho. Thomas Sowell, Marxism: Philosophy and Economics (Londres: Unwin Paperbacks, 1986), pp. 3-5, e passim. A excelente e devastadora crítica a Sowell é de David Ramsay Steele, “Review of Thomas Sowell, Marxism: Philosophy and Economics”, International Philosophical Quarterly, 26 (junho de 1986), pp. 201-3.
[19] Böhm-Bawerk, op. cit., nota 10, p. 30. Veja também Gray, op. cit., nota 8, p. 317.
[20] Gray, op. cit., nota 8, pp. 321-2.
[21] Os salários reais, é claro, permanecem a nível de subsistência
[22] Marx, é claro, não estava interessado na questão da terra, uma vez que a terra deveria estar perdendo importância com o declínio do remanescente da “terra feudal” à medida que o capitalismo avançava em seu curso determinado. Além disso, Marx estava ansioso para entrar em seu modelo de duas classes, capitalistas vs. proletariado, e assim ele simplesmente assimilou a terra no conceito de “capital”.
[23] A teoria leninista depende da afirmação de que tanto o capitalismo monopolista de estado quanto o imperialismo vêm depois do capitalismo competitivo e não imperialista, esta última condição tendo prevalecido durante a vida de Marx. Mas o imperialismo — tribos ou estados-nação conquistando ou agredindo e roubando outras tribos ou nações — é tão antigo quanto a história registrada, e o capitalismo monopolista de estado pelo menos tão antigo quanto a era mercantilista.
[24] Marx, op. cit., nota 1, I, p. 595.
[25] Tucker, op. cit., nota 7, p. 213.
[26] Assim, Marx escreveu, no Volume I de O Capital, que “É uma lei, que brota do caráter técnico da manufatura, que a quantidade mínima de capital que o capitalista precisa possuir deve continuar aumentando” e “o desenvolvimento da produção capitalista torna necessário aumentar constantemente o montante de capital investido em um determinado empreendimento industrial”. Cf. Conway, op. cit., nota 3, pp. 126-7.
[27] Isso tem sido espetacularmente verdade na indústria de computadores. Também nos casos de xerografia e fotografia Polaroid, as inovações pioneiras que fundaram a indústria foram recebidas com incompreensão e rejeição pelos Behemoths no campo da fotografia. Para esses e outros exemplos pré-computadores, veja John Jewkes, David Sawers e Richard Stillerman, The Sources of Invention (1959, 2ª ed., Nova York: Norton, 1968).
[28] Sobre o movimento das fusões na virada do século e seu colapso, veja Gabriel Kolko, The Triumph of Conservatism: A Reinterpretation of American History, 1900-1916 (Glencoe, Ill.: The Free Press, 1963); Arthur S. Dewing, Corporate Promotion and Reorganizations (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1924); idem., The Financial Policy of Corporations (5ª ed., Nova York: Ronald Press, 1953), 2 vols; e Naomi R. Lamoreaux, The Great Merger Movement in American Business, 1895-1904 (Nova York: Cambridge University Press, 1985).
[29] É lamentável que o professor Conway, em seu trabalho geralmente esclarecedor sobre o marxismo, aceite acriticamente a máxima marxista da tendência de empresas gigantes dominarem cada setor. Conway, op. cit., nota 3, p. 128.
[30] Na linguagem colorida de Marx, a centralização do capital consiste na “expropriação de muitos capitalistas por poucos” ou, em uma retórica ainda mais vívida, “um capitalista sempre mata muitos”. Marx, op. cit., nota 1, I, p. 763.
[31] Citado em Ludwig von Mises, Socialism: An Economic and Sociological Analysis (2ª ed., New Haven: Yale University Press, 1951), p. 362. [Tradução da casa disponível como Ludwig von Mises, Socialismo: Uma Análise Econômica e Sociológica, Editora Konkin: São Paulo, 2021).
[32] Ibid.
[33] Marx, op. cit., nota 1, I, p. 763.
[34] Assim, Marx escreve, novamente em O Capital: “Quanto maior a riqueza social, o capital em funcionamento, a extensão e a energia de seu crescimento e, portanto, também a massa absoluta do proletariado e a produtividade de seu trabalho, tanto maior é o exército industrial de reserva […] A massa relativa do exército industrial de reserva aumenta, portanto, com a energia potencial da riqueza. Mas quanto maior esse exército de reserva em relação ao exército operário ativo, maior é a massa de uma superpopulação consolidada […] Quanto mais extenso, finalmente, […] o exército industrial de reserva, maior é o pauperismo oficial. Essa é a lei geral absoluta da acumulação capitalista”. (Ênfase de Marx.) Marx, op. cit., nota 1, I, p. 664.
[35] Assim, von Mises escreve que Marx tentou demonstrar a inevitabilidade do socialismo “pelo famoso prognóstico de que o capitalismo gera necessária e inevitavelmente um empobrecimento progressivo das massas assalariadas. Quanto mais o capitalismo se desenvolve”, diz ele, mais “aumenta a massa de miséria, opressão, escravidão, exploração. Com ‘o progresso da indústria’ o trabalhador ‘afunda-se cada vez mais’, até que finalmente, quando seus sofrimentos se tornam insuportáveis, as massas exploradas se revoltam e estabelecem a felicidade eterna do socialismo”.
Mas von Mises então aponta, esse argumento crucial “contradiz toda a teoria marxiana da determinação das taxas de salário […] [E]ssa teoria afirma que as taxas de salário são sob o capitalismo sempre e necessariamente tão baixas que, por razões fisiológicas, não podem cair mais sem eliminar toda a classe de assalariados. Como é então possível que o capitalismo produza um empobrecimento progressivo dos assalariados? Marx em sua previsão do empobrecimento progressivo das massas contradisse os ensinamentos essenciais de sua própria teoria”. Von Mises, op. cit., nota 8, pp. 150-51.
[36] Em um turbilhão notavelmente frenético e pouco convincente de apologética marxiana, o Professor Sowell tenta absolver Marx dessa contradição negando ambas as partes: a adesão marxiana à lei férrea dos salários e ao empobrecimento progressivo da classe trabalhadora. No primeiro caso, Sowell se apega aos murmúrios anti-Lassalle de Engels em uma nota de rodapé e na correspondência entre Marx e Engels, e então surge com uma definição espetacularmente original de “subsistência” que implica não uma existência mínima, mas um crescente padrão de vida! Sobre o empobrecimento progressivo, ele descarta esse conceito como sendo o jovem Marx do Manifesto Comunista, rejeitado pelo Marx maduro de O Capital, e se apega ao apoio do economista marxista-leninista Ronald Meek. Para defender essa interpretação absurda, Sowell é forçado a descartar passagens embaraçosamente pró-empobrecimento em O Capital, como as que vimos acima, como observações “sagazes” aplicáveis apenas a grupos particulares de trabalhadores, e a ignorar convenientemente o capítulo de peroração de O Capital. Sowell, op. cit., nota 18, pp. 128-31. Marx também adotou a linha do empobrecimento em seu Value, Price and Profit (1865). Cf. North, op. cit., nota 14, pp. 140-41.
[37] “Devido ao uso extensivo da maquinaria e à divisão do trabalho, o […] [operário] torna-se um apêndice da máquina, e é apenas a habilidade mais simples, mais monótona e mais facilmente adquirida que é exigida dele. Assim, o custo de produção de um operário se restringe, quase inteiramente, aos meios de subsistência que ele requer para sua manutenção e para a propagação de sua raça.” Tucker, op. cit., nota 7, p. 479.
[38] Schumpeter, History of Economic Analysis (Nova York: Oxford University Press, 1954), p. 686n. Muitos marxistas afirmaram, pelo menos, que o padrão de vida dos trabalhadores ingleses caiu com o advento da Revolução Industrial, digamos, de meados ou final do século XVIII até meados do século XIX, mas os estudos de R. Max Hartwell e outros se livraram bem dessa investida marxista.
[39] Cf. Conway, op. cit., nota 3, p. 132.
[40] Schumpeter, que geralmente trata Marx de forma excessivamente gentil, despreza apropriadamente os teóricos do empobrecimento relativo: “Ainda outros intérpretes têm feito esforços para fazer a lei de Marx significar apenas miséria relativa, i.e., uma queda na parcela relativa do trabalho, que, além de ser igualmente insustentável, viola claramente o significado de Marx”. Schumpeter, op. cit., nota 38, p. 686n. Sobre o empobrecimento absoluto, ver também M.M. Bober, Karl Marx’s Interpretation of History (2ª ed., Cambridge Mass.: Harvard University Press, 1948), pp. 213-21.
[41] Von Mises, op. cit., nota 31, pp. 381-4. Como aponta von Mises, é pelo menos igualmente provável que a inveja dos trabalhadores seja despertada por um aumento no igualitarismo e em seu status relativo, assim causando maior irritação em uma lacuna que agora é menor.
[42] Cf. Conway, op. cit., nota 3, p. 133.
[43] Veja Gottfried Haberler, “Marxist Economics in Retrospect and Prospect”, em M. Drachkovitch (ed.), Marxist Ideology in the Contemporary World — Its Appeals and Paradoxes (Hoover Institution, New York: Praeger, 1966), pp. 118, 183.
[44] “Se julgada pela quantidade de espaço que recebe, e especialmente pelas referências persistentemente repetidas a ela no início e no final de seus escritos e de Engels, a teoria do subconsumo parece dominar as outras teorias.” Bober, op. cit., nota 40, p. 232. Somos gratos a Bober por sua discussão clássica das teorias de ciclos de Marx, em ibid., pp. 232-57.
[45] Assim, Marx em Teorias da Mais-Valia: “A superprodução tem por condição especificamente a lei geral da produção do capital […] enquanto, em contraposição, a massa dos produtores fica restrita — e com base no sistema capitalista precisa permanecer restrita — a uma quantia média de necessidades” Veja Bober, op. cit., nota 40, p. 240. Veja também Tucker, op. cit., nota 7, pp. 443-65. É significativo que as passagens que expõem a teoria do subconsumo no capítulo XVII das Teorias da Mais-Valia sejam a única discussão da teoria da crise no Reader de Tucker. Na nota de cabeça das seleções, o Professor Thomas Ferguson, depois de apontar que Marx, curiosamente, “não deixou nenhum relato desenvolvido de seus pontos de vista sobre as crises”, acrescenta que o capítulo XVII de Teorias “contém a melhor e mais sistemática discussão de Marx sobre crises econômicas”. Tucker, pág. 443.
[46] Surpreendentemente, Sowell sustenta não apenas que não há nenhum traço de subconsumismo em Marx, mas que aqueles que o afirmam apenas citam uns aos outros, não o próprio Marx. Ele, por um lado, aparentemente nunca ouviu falar do trabalho padrão de Bober. Sowell, op. cit., nota 18, pp. 78-9, 85-8.
[47] Marx e Engels também sentiram a necessidade de se separarem o máximo que pudessem do subconsumo puro, tendo em vista que dois de seus grandes rivais e oponentes alemães eram ardentes subconsumistas. Esses foram o aristocrata prussiano e socialista de estado evolucionário Johann Karl Rodbertus (1805-75), e o economista e reformador social da Universidade de Berlim Eugen Karl Dühring (1833-1921).
[48] Engels, “Preface to the English Edition”, em Marx, op. cit., nota 1, I, p. 6.
[49] Para uma crítica adicional do subconsumismo, veja Murray N. Rothbard, America’s Great Depression (4ª ed., Nova York: Richardson & Snyder, 1983), pp. 55-8.
[50] Bober, op. cit., nota 40, pp. 251-2.
[51] Mikhail Ivanovich Tugan-Baranowsky (1865-1919). Estritamente falando, Tugan-Baranowsky foi um ucraniano que ensinava em São Petersburgo da Rússia. Ele enunciou pela primeira vez sua teoria dos ciclos econômicos em sua tese de doutorado, “The Industrial Crisis in England”, publicada em russo em 1894. Tugan-Baranowsky ensinou economia política em São Petersburgo até 1917, quando se tornou ministro das finanças e secretário-geral da Central Rada da Ucrânia.
No ano seguinte, Tugan-Baranowsky tornou-se chefe do departamento socioeconômico da Academia Ucraniana e de seu Instituto para o Estudo dos Ciclos Econômicos. Na sua morte em 1919, Tugan era conselheiro econômico da delegação ucraniana em Versalhes. Veja Sergio Amato, “Tugan-Baranowsky…” em I.S. Koropeckyj (ed.), Selected Contributions of Ukrainian Scholars to Economics (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1984), pp. 1-59. Sobre as teorias do ciclo de superinvestimento não monetário, ver Gottfried Haberler, Prosperity and Depression (4ª ed., Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1958), pp. 72-85.
Amato sustenta que o economista alemão Arthur Spiethoff (1873-1957), que lançou sua própria versão da teoria dos ciclos em 1902-3, roubou-a da tradução alemã de Tugan-Baranowsky em 1901, depois a reivindicou como sua própria descoberta original. Amato, “Tugan-Baranowsky”, p. 6.
[52] Veja Bober, op. cit., nota 40, p. 275. Sowell, por outro lado, afirma que Marx considerava o dinheiro e o crédito a única causa do ciclo econômico. Sowell, op. cit., nota 18, pp. 92-5.
[53] De fato, toda a teoria monetária de Marx foi profundamente influenciada por Thomas Tooke e pela escola bancária. Marx acreditava, com Tooke, que mudanças nos níveis de preços determinavam mudanças na quantidade de dinheiro e não vice-versa, e que os déficits do balanço de pagamentos eram determinados por fatores reais em vez de fatores monetários. Assim, em sua teoria do dinheiro e de seus efeitos, Marx era o oposto de um ricardiano. Veja Arie Arnon, “Marx’s Theory of Money: the Formative Years”, History of Political Economy, 16 (inverno de 1984), pp. 560-75.