Por definição, o capitalista é quem detém o capital e os meios de produção, o empreendedor é quem elabora e executa um plano de investimento — também chamado de empreendimento —, e o proletário é a mão-de-obra contratada para ajudar no empreendimento.
A propaganda socialista popularizou a ideia de que o capitalista e o empreendedor exploram o trabalhador apropriando-se de parte de seu salário na forma de lucro. De acordo com este raciocínio, o operário constitui um elemento essencial do processo de geração de riqueza, mas ele é prejudicado porque surge um parasita, o capitalista, que o impede de reter a totalidade dos frutos de seu trabalho. A realidade, no entanto, é bem outra.
Trabalhar só por trabalhar, isto é, a simples aplicação de esforço em alguma atividade, não necessariamente gera riqueza. Se gerasse, as centenas de milhares de imóveis que foram construídas na Espanha durante a bolha imobiliária da década passada ou os vários aeroportos regionais que também foram construídos neste período utilizando o trabalho humano mas que hoje estão vazios e se revelaram desnecessários seriam vistos hoje como monumentos à prosperidade universal. Mas a realidade é mais sombria: todos estes investimentos representaram uma enorme dilapidação de recursos escassos, recursos estes que poderiam estar hoje sendo utilizados em outras indústrias mas estão imobilizados nestes empreendimentos desnecessários.
É correto dizer que o trabalho ali empreendido foi uma completa perda de tempo. Sendo assim, se todos os trabalhadores que foram empregados nestes projetos tão despropositados houvessem sido empregados em outras finalidades mais úteis, toda a sociedade — começando pelos próprios trabalhadores — teria sido beneficiada por esta boa alocação de esforços.
Que o trabalho seja em muitos casos uma condição necessária para gerar riqueza não significa que ele seja uma condição suficiente. É verdade que, antigamente, em uma ordem social extremamente simples e primitiva, praticamente qualquer trabalho permitia a geração de riqueza: as necessidades urgentes não satisfeitas (alimentação, vestuário, abrigo, ornamentação etc.) eram tantas, e os meios potenciais para se alcançá-las eram tão escassos e pouco variados (majoritariamente apenas a força bruta), que, com efeito, o único pré-requisito era o esforço físico. A coordenação deste trabalho físico, embora importante, tinha apenas uma função meramente técnica, de modo que era fácil visualizar o esforço humano como sendo uma condição suficiente para melhorar o bem-estar.
Já em uma ordem social extremamente complexa, as necessidades não-urgentes a serem satisfeitas, bem como os meios disponíveis para se alcançá-las, são de uma variedade tão grande, que a função de selecionar onde a criação de riqueza deve ser maximizada e como isso deve ser feito advém de uma constatação básica: investir recursos em uma linha de produção significa não poder investir esses mesmos recursos em outra linha de produção; ou seja, seguir um determinado curso de ação impede a possibilidade de seguir outros cursos.
Este é justamente o trabalho fundamental que o capitalista desempenha: como fomentador do empreendedorismo, ele seleciona, por sua própria conta e risco, quais serão aqueles empreendimentos que irão gerar mais valor para os consumidores e que, por isso, merecem receber financiamento. Tais empreendimentos, uma vez colocados em prática por empreendedores, empregarão vários trabalhadores. Da mesma maneira que para se encontrar a saída de uma enorme floresta é preferível ter um bom guia a ficar dando voltas contínuas e sem rumo, na hora de coordenar bilhões de pessoas para gerar riqueza é essencial contar com bons comandantes que evitem o naufrágio deste processo de coordenação social (a famosa “divisão do trabalho”).
É só então — quando um bom plano empreendedorial já foi criado por algum hábil empreendedor e o financiamento já foi levantado com o capitalista —, que o empreendimento pode começar a ser implantado e os fatores produtivos necessários para implantá-lo são contratados, entre eles os trabalhadores. No entanto, vale enfatizar que o trabalhador é apenas um relevante companheiro de viagem, uma vez que esta viagem já havia sido iniciada antes de ele ser contratado. Se de alguma forma fosse possível prescindir do trabalhador — por exemplo, robotizando sua ocupação —, o capitalista e o empreendedor ainda assim continuariam gerando riqueza com seu empreendimento. Por outro lado, o operário seria incapaz de gerar riqueza sem o capitalista e o empreendedor (a menos que ele se tornasse também um empreendedor autônomo bem-sucedido e elaborasse um plano de negócios tão bom quanto ou melhor que o de seus rivais).
Consequentemente, são o empreendedor e o capitalista que cedem ao trabalhador parte da riqueza o empreendimento cria: longe de espoliar a mais-valia do proletário, é o trabalhador que fica com uma parte da mais-valia que corresponderia ao capitalista e ao empreendedor. Marx, portanto, entendeu exatamente ao contrário o processo social do capitalismo: o valor não é extraído do proletário para o capitalista e para o empreendedor, mas sim do capitalista e do empreendedor para o proletário.
Claro que, também ao contrário do que diz a propaganda marxista, em nenhum caso é válido dizer que o trabalhador explora o capitalista e o empreendedor: afinal, as relações trabalhistas são acordos feitos voluntariamente em que todos os lados ganham. Se apenas um dos lados ganhasse, não haveria acordo voluntário. Portanto, trata-se de uma relação na qual não existe parasitismo, mas sim simbiose.
Em suma, o capitalista é o proprietário do capital (tanto do financiamento quanto dos meios de produção), o empreendedor elabora o plano de negócios, o trabalhador executa o plano em colaboração com vários outros fatores de produção, e o consumidor desfruta a enorme quantidade e variedade de bens assim produzidos. Capitalismo de livre mercado, este é o nome deste arranjo.
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