“Sim, privatizar é importante. Mas o estado possui papel fundamental na prestação de serviços essenciais, como água, esgoto, coleta de lixo e polícia.”
Este é o pensamento padrão daquela fatia de pessoas que não se encontra completamente idiotizada pela ideologia marxista e que ao menos admite a importância das privatizações.
“Com certeza deve-se privatizar a Telebrás e a Eletropaulo, e quem sabe até a Petrobrás e os Correios. Mas a Sabesp e a Polícia, jamais. O que seria dos pobres?!”
Ou então diria o mais científico:
“Alguns destes serviços são monopólios naturais, logo, o estado deve assumir o monopólio de fornecimento de alguns deles.”
Ao mesmo tempo em que estes abnegados defensores dos pobres — genuínos arautos de uma pseudociência econômica — continuam afeitos a estas ideias, os pobres vão se virando, vão superando as boas intenções alheias e as falácias econômicas estabelecidas, e vão conseguindo algumas coisas.
Apesar dos altos impostos, das regulamentações, da burocracia e das barreiras contra importações, não existem no Brasil empresas estatais monopolistas fabricantes de TV’s, geladeiras, micro-ondas, celulares, carros, móveis e imóveis. Por outro lado, serviços como esgoto, polícia, água e coleta de lixo são prestados por estatais monopolistas protegidas contra qualquer concorrência. (No caso do lixo, o serviço é geralmente feito por empresas privadas, que obtêm uma concessão monopolista dos governos locais).
E então vem a pergunta: entre estes dois arranjos, qual é aquele ao qual os pobres conseguem ter acesso? A reportagem da Folha de São Paulo do último sábado nos responde:
Casas têm mais TVs e menos rede de esgoto em 11 Estados do Brasil
Casas com TV, DVD, computador, carro e moto, mas sem esgoto e coleta de lixo.
Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, mostram que, enquanto no país avança a presença nas residências de bens duráveis, como eletrônicos, boa parte dos Estados fica paralisada —ou até regride— em serviços como água, esgoto e coleta de lixo.
De 2011 para 2012, 14 Estados tiveram redução no percentual de moradias com esses serviços (em 11 a rede de esgoto não teve nenhum avanço); apenas dois recuaram em bens duráveis. Na média nacional, houve crescimento ou estabilidade, dependendo do item.
E vejam que constatação impressionante agora:
Na prática, essa queda mostra que o aumento do número de moradias não é acompanhado no mesmo ritmo pelas políticas públicas.
Qual será o “mistério” que explica isso? Será que é porque o setor público não se guia pelo sistema de lucros e prejuízos, o que faz com que ele não possua nenhum incentivo em atender às demandas dos consumidores? Ou será que os moradores de regiões pobres não estão “votando direito”? Ao que tudo indica, na eleição diária que ocorre no mercado, onde cada real conta como um voto decisivo para eleger o produto que eles irão adquirir, os votos estão sendo bem conscientes.
E quanto às preocupações de nossos defensores dos pobres em relação ao maléfico mercado e aos interesses do grande capital? “Se o estado não sobrepujar os interesses econômicos e prover saneamento básico para os mais pobres, estes ficarão sem esgoto e água.” Parece que essas pessoas precisam tomar um choque de realidade antes de emitirem qualquer outra opinião. Veja o que diz a reportagem:
Um dos maiores entraves ainda é a rede de esgoto. Ao todo, 11 Estados recuaram no acesso a este serviço. No Piauí, o percentual de casas com acesso à rede foi de 4% para 2,8% — queda de 29%.
A desculpa dos parasitas estatais? Sempre a mesma:
Para os Estados, a dificuldade está na falta de recursos.
Outro ponto, diz, é a “forte transferência” de moradores da zona rural para a periferia das cidades, o que traz demanda por expansão dos serviços.
A carência de recursos também é apontada como justificativa nos Estados onde a maioria das casas não tem rede de esgoto, como o Piauí.
A Cosanpa, companhia de saneamento do Pará, um dos Estados com maior queda no índice de casas com esgoto, diz que faz melhorias na rede desde 2008, mas enfrenta o crescimento populacional.
Eis a lógica do setor público: sempre que um programa está indo mal, é necessário tomar mais dinheiro da população. O fracasso de uma iniciativa estatal significa que ela tem de ser recompensada com mais verbas confiscadas da população. Exatamente o contrário do que ocorre na iniciativa privada, onde o fracasso é punido e o sucesso é recompensado com maiores lucros.
Enquanto o setor privado reage a um aumento na demanda com regozijo, o setor público reage ao mesmo fenômeno com ameaças. Enquanto o setor privado está sempre implorando por qualquer aumento na demanda, disputando acirradamente seus consumidores, o setor público está sempre culpando e punindo os consumidores por utilizarem demais seus serviços ou até mesmo por eles existirem.
Alguém consegue imaginar a Coca-Cola gastando milhões para fazer propaganda pedindo para as pessoas beberem menos Coca-Cola? Pois é isso que as estatais monopolistas do fornecimento de água fazem, gastando milhões com suas campanhas pedindo para que as pessoas economizem água! “Mas se empresas privadas fornecessem água, empresários gananciosos iriam cobrar o quanto quisessem e os pobres não teriam acesso à água”. Enquanto os “defensores dos pobres” ficam com estas divagações, os pobres vão tendo acesso à Coca-Cola e não à água.
E quanto a “cobrar o quanto quisessem”, o monopólio estatal do fornecimento de água já chegou a um nível tão absurdo que, em São Paulo, é mais barato comprar água de um caminhão-pipa do que do encanamento da Sabesp. Isso mesmo: o uso de um caminhão-pipa, o pagamento do motorista, da gasolina e do pedágio, e a compra da água em alguma fonte próxima — tudo isso sai mais barato do que o transporte por canos. E não podemos ignorar o custo extra do mercado negro, pois, como a Sabesp possui o privilégio monopolístico no fornecimento de água, é ilegal concorrer com ela na venda de água para imóveis. No entanto, ainda assim, centenas de imóveis em São Paulo enchem suas caixas d’água todas as noites com caminhões-pipa em vez de comprarem a água da Sabesp pelo encanamento.
A reportagem da Folha segue mostrando o exemplo de Jorge de Souza, motorista de ônibus morador de Manaus:
“A vida melhorou muito. Agora a gente até viaja para Fortaleza todo fim de ano. Mas a situação no bairro continua complicada”, afirma Souza, que mora com a mãe, a mulher e o filho em frente a um igarapé no bairro São Jorge, na zona oeste da capital do Amazonas.
O lixo se acumula nas margens do canal, não há coleta de esgoto e a iluminação precária traz a sensação de insegurança — a casa dele já foi invadida duas vezes.
Na garagem, uma lona escura esconde um sonho antigo: o carro que ele comprou em fevereiro passado.
Dentro de casa, há geladeira, televisão e outros eletrodomésticos. Todos novos.
“A maioria dos produtos que comprei ficou com a minha ex-mulher”, conta Souza. “Mas, aos poucos, estou comprando tudo de novo.”
Jorge conseguiu comprar casa, carro, eletrodomésticos (duas vezes) e viaja todo final de ano, mas não pode comprar saneamento básico, segurança e tem que viver no meio do lixo, pois a coleta é monopolizada.
O que seria dos pobres se tudo fosse privatizado? Basta ver o exemplo de Jorge. Ele consegue obter os bens e serviços fornecidos pelo mercado privado. Ele não consegue obter os bens e serviços fornecidos pelo monopólio público.
Seria bom que aqueles benevolentes preocupados com os pobres — que fazem parte de uma minoria que possui saneamento básico onde mora — jogassem suas ideias estatistas em seus vasos sanitários, acionassem a descarga e passassem a defender a única solução definitiva para os problemas sociais: livre concorrência e privatização total.
Olá, gostaria de saber onde encontro estes dados de saneamento básico, pois os únicos que encontrei no site do IBGE são de 2008.
O atla é de 2011, mas compila apenas dados de 2000/2008
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv53096_cap1.pdf
Bom dia, gostaria imensamente de debater certos assuntos, pertinentes aos artigos citados neste texto, por favor entre em contato comigo e lhe darei maiores informações.