XVI – Liberdade, Desigualdade, Primitivismo e Divisão de Trabalho

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I

Se as pessoas fossem como formigas, não haveria interesse na liberdade humana. Se os indivíduos, como formigas, fossem uniformes, intercambiáveis, desprovidos de traços específicos de personalidade, quem então se importaria se eles são livres ou não? Quem, na verdade, se importaria se eles estão vivos ou não? A glória da raça humana é a unicidade de cada indivíduo, o fato de que cada pessoa, apesar de similar em muitos aspectos às outras, possui uma personalidade completamente distinta e própria. É o fato da unicidade de cada pessoa – o fato de que duas pessoas não podem ser completamente intercambiáveis – que torna cada e toda pessoa insubstituível e faz nos importar se ela está viva ou morta, se ela está contente ou oprimida. E, finalmente, é o fato de que essas personalidades únicas necessitam de liberdade para seu pleno desenvolvimento que constitui um dos principais argumentos em favor de uma sociedade livre.

Talvez exista um mundo no qual seres inteligentes são completamente desenvolvidos em algum tipo de jaulas externamente determinadas, sem necessidade de um aprendizado interno ou escolhas por parte dos próprios indivíduos. Mas o ser humano está necessariamente numa situação diferente. Os seres humanos não nasceram ou foram concebidos com conhecimento plenamente formado, valores, metas ou personalidades; cada um deles precisa formar seus próprios valores e metas, desenvolver sua personalidade e aprender sobre si mesmo e sobre o mundo ao seu redor. Toda pessoa precisa ser livre, precisa de um espaço para criar, testar e agir de acordo com suas próprias escolhas, para que qualquer tipo de desenvolvimento de sua própria personalidade aconteça. Ela precisa, em suma, ser livre para que ela seja completamente humana. Num certo sentido, até mesmo as civilizações mais rígidas e totalitárias permitiram ao menos um pequeno espaço para a escolha e desenvolvimento individual. Até mesmo o mais monolítico dos despotismos teve que liberar ao menos um mínimo de “espaço” para a liberdade de escolha, mesmo que em meio às frestas das regras da sociedade. Quanto mais livre a sociedade, claro, menor tem sido a interferência para com a ação individual, e maior o espaço para o desenvolvimento de cada indivíduo. Quanto mais livre a sociedade, então, maior será a variedade e diversidade entre as pessoas, pois mais desenvolvida será a personalidade única de cada uma delas. Por outro lado, quanto mais despótica a sociedade, quanto mais restrições sobre a liberdade do indivíduo, mais uniformidade haverá entre os homens e menor a diversidade, e menos desenvolvida será a personalidade única de cada e toda pessoa. Num sentido profundo, então, uma sociedade despótica previne seus membros de serem completamente humanos.[1]

Se a liberdade é uma condição necessária para o pleno desenvolvimento do indivíduo, ela de forma alguma é a única. A própria sociedade deve estar suficientemente desenvolvida. Ninguém, por exemplo, pode se tornar um físico criativo numa ilha deserta ou numa sociedade primitiva. Isso porque conforme a economia cresce, a margem de escolha aberta ao produtor e ao consumidor se multiplica consideravelmente.[2] Além do mais, apenas uma sociedade com um padrão de vida consideravelmente acima do de subsistência pode se dar ao luxo de dedicar boa parte de seus recursos para melhorar seu conhecimento e desenvolver uma miríade de bens e serviços acima do nível de subsistência física. Mas existe outra razão explicando porque o pleno desenvolvimento dos poderes criativos de cada indivíduo não pode ocorrer numa sociedade primitiva ou subdesenvolvida, e ela é a necessidade de uma abrangente divisão do trabalho.

Ninguém pode desenvolver completamente seus poderes em qualquer direção sem se engajar em especialização. O camponês ou tribal primitivo, comprometido com um conjunto interminável de tarefas diferentes para se sustentar, não poderia ter tempo ou recursos disponíveis para perseguir qualquer interesse em particular ao máximo. Ele não teria condições de se especializar, desenvolver qualquer campo no qual ele fosse mais habilidoso ou que possuísse mais interesse. Há duzentos anos, Adam Smith mostrou que a crescente divisão do trabalho é uma chave para qualquer economia avançar acima do nível de subsistência. Uma condição necessária para qualquer tipo de economia desenvolvida, a divisão do trabalho também é um requisito para o desenvolvimento de qualquer tipo de sociedade civilizada. O filósofo, o cientista, o construtor, o mercador – nenhum deles poderia desenvolver essas habilidades ou funções se ele não tivesse escopo para a especialização. Além do mais, nenhum indivíduo que não viva numa sociedade desfrutando de uma ampla divisão do trabalho poderá empregar seus poderes ao máximo. Ele não pode concentrar seus poderes num campo ou disciplina e avança-la bem como suas capacidades mentais. Sem oportunidade para se especializar no que ele faz melhor, ninguém pode desenvolver totalmente seus poderes; ninguém então, poderia ser completamente humano.

Ao passo que uma contínua e crescente divisão do trabalho é necessária para uma sociedade e economia desenvolvida, a extensão de tal desenvolvimento em qualquer tempo dado limita o grau de especialização que qualquer economia pode ter. Não há, então, espaço para um físico ou engenheiro da computação numa ilha primitiva; essas habilidades seriam prematuras dentro do contexto daquela economia em particular. Como disse Adam Smith, “a divisão do trabalho está limitada pelo tamanho do mercado”. O desenvolvimento econômico e social é então um processo mutuamente reforçador: o desenvolvimento do mercado permite uma mais ampla divisão do trabalho, o que por sua vez permite um maior tamanho de mercado.[3]

Se o tamanho do mercado e a extensão da divisão do trabalho se reforçam mutuamente, o mesmo vale para a divisão do trabalho e os interesses e habilidades individuais entre as pessoas. Assim como uma cada vez maior divisão do trabalho é necessária para garantir apoio total às habilidades e poderes de cada indivíduo, a existência dessa própria divisão depende da diversidade inata dos seres humanos. Não haveria escopo algum para a divisão do trabalho se todas as pessoas fossem uniformes e intercambiáveis. (Uma condição adicional para a emergência da divisão do trabalho é a variedade dos recursos naturais; áreas em específico no globo também não são intercambiáveis.) Além disso, logo se tornou evidente na história da humanidade que uma economia de mercado baseada na divisão do trabalho é profundamente cooperativa, e que tal divisão multiplicou enormemente a produtividade e por consequência a riqueza de cada pessoa participante da sociedade. O economista Ludwig von Mises colocou o assunto de uma maneira muito clara:

Historicamente a divisão do trabalho se originou em dois fatos da natureza: a desigualdade das habilidades humanas e a variedade das condições externas da vida humana no planeta. Esses dois fatos na verdade constituem um só: a diversidade da Natureza, que não se repete, mas cria o universo sem exaustão, com uma variedade infinita…

Essas duas condições… acabam quase que por forçar a divisão do trabalho na humanidade. Velhos e jovens, homens e mulheres cooperam ao fazer uso apropriado de suas diversas habilidades. Aqui também se encontra o germe da divisão geográfica do trabalho; o homem vai à caça e a mulher até a fonte coletar água. Caso a força e as habilidades de todos os indivíduos, bem como as condições externas de produção fossem iguais em todos os locais, a ideia de divisão do trabalho nunca teria surgido… Nenhuma vida social poderia ter surgido entre pessoas de capacidade igual num mundo geograficamente uniforme…

Uma vez que o trabalho foi dividido, a própria divisão exerce uma influência diferenciadora. O fato de o trabalho ser dividido possibilita um maior cultivo do talento individual e dessa forma a cooperação se torna cada vez mais produtiva. Através da cooperação as pessoas são capazes de atingir o que estaria além do seu alcance como indivíduos…

A maior produtividade do trabalho sob a divisão é uma influência unificadora. Ela leva as pessoas a considerarem umas as outras como camaradas num esforço conjunto pelo bem estar, ao invés de competidores numa luta pela existência.[4]

A liberdade, então, é necessária para o desenvolvimento do indivíduo, e tal desenvolvimento também depende da extensão da divisão do trabalho e da influência do padrão de vida. Uma economia desenvolvida deixa espaço e encoraja uma cada vez maior especialização e florescimento dos poderes do indivíduo do que uma economia primitiva, e quanto maior o grau de tal desenvolvimento, maior tal espaço para cada indivíduo.

Se a liberdade e o crescimento do mercado são importantes para o desenvolvimento de cada indivíduo e, portanto, para o florescimento da diversidade e diferenças individuais, então existe uma conexão causal entre liberdade e crescimento econômico. Isso porque é precisamente a liberdade, a ausência ou limitação de restrições ou interferências inter-pessoais, que propicia as condições para o crescimento econômico e consequentemente da economia de mercado e divisão desenvolvida do trabalho. A Revolução Industrial e o derivado e consequente desenvolvimento econômico do Ocidente foram um produto de sua relativa liberdade de ação, para a invenção, inovação, mobilidade e avanço do trabalho. Comparado a sociedades em outros tempos e lugares, a Europa Ocidental e EUA dos séculos XVIII e XIX foram marcados por uma bem maior liberdade social e econômica, liberdade de movimento, investimento, trabalho e produção, protegida de boa parte da perturbação e interferência do governo. Comparado ao papel do governo em outros locais, seu papel nesses séculos no Ocidente foi notavelmente mínimo.[5]

Ao permitir espaço total para o investimento, mobilidade, divisão do trabalho, criatividade e empreendedorismo, a economia livre cria então as condições para o desenvolvimento econômico rápido. Foram a liberdade e o livre mercado, como bem disse Adam Smith, que desenvolveram a “riqueza das nações”. Assim, a liberdade leva ao desenvolvimento econômico e ambas as condições por sua vez multiplicam o desenvolvimento econômico e o desdobramento dos poderes do indivíduo. Em duas formas cruciais, então, a liberdade está nas raízes; apenas pessoas livres podem ser completamente individualizadas, e, portanto, podem ser completamente humanas.

Se a liberdade leva a uma cada vez maior divisão do trabalho e ao pleno desenvolvimento individual, ela também leva a uma crescente população. Assim como a divisão do trabalho está limitada pelo tamanho do mercado, da mesma forma a população total está limitada pela produção total. Um dos fatos notáveis sobre a Revolução Industrial não foi apenas uma grande elevação no padrão de vida de todos, mas também a viabilidade de tais amplos padrões de vida para uma população enormemente maior. A área da América do Norte era capaz de prover apenas cerca de um milhão de índios há quinhentos anos, e isso num nível próximo ao de subsistência. Mesmo se quiséssemos eliminar a divisão do trabalho, nós não conseguiríamos fazer isso sem literalmente eliminar a vasta maioria da atual população mundial.

 

II

Concluímos que a liberdade e sua concomitante, a crescente divisão do trabalho, são vitais para o florescimento de cada indivíduo, bem como literalmente para a sobrevivência da grande maioria da população mundial. Isso nos deve fazer preocupar, então, com o fato de que durante os dois últimos séculos poderosos movimentos sociais emergiram, os quais têm se dedicado de coração a apagar todas as diferenças humanas, toda a individualidade.

Ficou evidente nos anos recentes, por exemplo, que o coração da complexa filosofia social do Marxismo não está, como parecia nos anos 30 e 40, nas doutrinas econômicas Marxistas: na teoria do valor trabalho, na tradicional proposta em favor da propriedade estatal dos meios de produção, e no planejamento central da economia e da sociedade. As teorias econômicas e programas do Marxismo são, para usar um termo Marxista, meramente a elaborada “superestrutura” erguida sobre o núcleo interno da aspiração Marxista. Consequentemente, muitos Marxistas estiveram, nas décadas recentes, dispostos a abandonar a teoria do valor trabalho e até mesmo o planejamento central, conforme a teoria econômica Marxista tem sido cada vez mais abandonada e a prática do planejamento central se mostrou infrutífera. Similarmente, os Marxistas da “New Left” nos EUA e no mundo tem se mostrado dispostos a jogar fora a teoria econômica e a prática socialista. O que eles não tem se mostrado dispostos a abandonar é o coração filosófico do ideal Marxista – não o socialismo ou o planejamento central, que é tratado de qualquer forma como sendo apenas um “estágio” temporário de desenvolvimento, mas o próprio comunismo. É o ideal comunista, a meta final do Marxismo, que excita o Marxista contemporâneo, que desperta suas paixões mais ardentes. O Marxista da New Left não vê com bons olhos a Rússia Soviética porque os Soviéticos claramente relegaram o ideal comunista para o futuro mais remoto possível. O partidário da New Left admira Che Guevara, Fidel Castro, Mao Tse-Tung não apenas graças ao seu papel como revolucionários e líderes de guerrilha, mas por causa de suas seguidas tentativas de saltar ao comunismo o mais rápido possível.[6]

Karl Marx foi vago e nebuloso ao descrever o ideal comunista, sem falar no caminho específico para atingi-lo. Mas uma característica fundamental é a erradicação da divisão do trabalho. Contrário à crença vigente, o agora popular conceito de “alienação” tem pouco a ver com o produto do trabalho. Um trabalhador, por exemplo, trabalha numa siderúrgica. Obviamente, ele mesmo irá consumir muito pouco ou nada do aço que ele produz; ele ganha o valor do produto sob a forma de uma mercadoria-dinheiro, e então ele alegremente usa esse dinheiro para comprar qualquer coisa dos produtos dos outros que ele escolher. Dessa forma, A produz aço, B ovos, C sapatos, etc., e cada um deles troca seus produtos pelos produtos dos demais através do uso do dinheiro. Para Marx esse fenômeno do mercado e a divisão do trabalho é um mal radical, pois isso significa que ninguém consumia seu próprio produto. O operário se torna assim “alienado” de seu aço, o sapateiro de seus sapatos, etc.

A resposta apropriada para esse “problema”, me parece ser: “E daí?”. Porque alguém deveria se importar com esse tipo de “alienação”? Certamente o fazendeiro, o sapateiro, o operário estão bem contentes em vender seu produto e troca-lo por quaisquer outros produtos que desejarem; priva-los dessa “alienação” os farão infelizes, bem como mortos de fome. Se o fazendeiro não pudesse produzir mais trigo ou ovos do que ele mesmo consume, ou o sapateiro mais sapatos do que ele mesmo pode calçar, ou o operário mais aço do que ele é capaz de usar, fica claro que a grande maioria da população iria rapidamente morrer de fome e o resto seria reduzido a uma subsistência primitiva, com a vida “imunda, bruta e curta”.[7] Mas para Marx essa condição era o resultado perverso do individualismo e do capitalismo e deveria ser erradicado.

Além disso, Marx era completamente ignorante do fato de que cada participante na divisão do trabalho coopera através da economia de mercado, fazendo trocas com os produtos dos demais e aumentando a produtividade e o padrão de vida de todos. Para Marx, as diferenças entre as pessoas, e por consequência, qualquer especialização na divisão do trabalho, é uma “contradição”, e o ideal comunista é substituir essa “contradição” pela harmonia geral. Isso significa que para o Marxista qualquer diferença individual, qualquer diversidade entre as pessoas, são “contradições” a serem eliminadas e substituídas pela uniformidade do formigueiro. Friedrich Engels mantinha que a emergência da divisão do trabalho havia dizimado a suposta harmonia sem classes e uniformidade da sociedade primitiva, e sido responsável pela clivagem da sociedade em classes distintas e conflitantes. Consequentemente, para Marx e Engels, a divisão do trabalho deve ser erradicada para abolir o conflito de classes e para nos conduzir à ideal harmonia da “sociedade sem classes”, a sociedade da uniformidade total.[8]

Assim, Marx prevê seu ideal comunista apenas “após ter sido extinta a subordinação escravista dos indivíduos sob a divisão do trabalho, e junto com ela a antítese entre o trabalho mental e físico”.[9] Para Marx a sociedade comunista ideal é aquela na qual, como colocou o Professor Gray, “todos devem fazer tudo”. De acordo com Marx na Ideologia Alemã,

Na sociedade comunista, onde ninguém tem uma esfera exclusiva de atividade, mas onde todos podem se tornar hábeis em qualquer campo que desejarem, a sociedade regulará a produção geral e dessa forma possibilitará que eu faça uma coisa hoje e outra amanhã, caçar durante a manhã, pescar durante a tarde, criar gado ao anoitecer, resenhar após o jantar, tudo isso a meu bel-prazer, sem nunca me transformar num caçador, pescador, vaqueiro, ou crítico.[10]

E o Marxista August Bebel, aplicou consistentemente essa noção amadora ao papel a mulher:

Num momento uma trabalhadora prática em alguma indústria, no momento seguinte uma educadora, professora, enfermeira; na terceira parte do dia ela exercita alguma arte ou cultiva alguma ciência; e na quarta parte ela cumpre alguma função administrativa.[11]

O conceito de comuna no pensamento socialista ganha uma importância central precisamente como um meio de erradicar as diferenças individuais. Não é apenas o fato da comuna possuir os meios de produção de seus membros. Crucial para o ideal comunista é que cada pessoa pratique todas as funções, sejam todas elas uma vez ou em rotação rápida. Obviamente a comuna terá que subsistir num nível não acima do primitivo, com apenas algumas poucas tarefas comuns, para que esse ideal seja atingido. Consequentemente temos a comuna da New Left, onde toda pessoa deve se ocupar igualmente com cada tarefa; novamente, a especialização é erradicada, e ninguém pode desenvolver seus poderes ao máximo. Assim temos a admiração atual por Cuba, que tentou enfatizar incentivos “morais” ao invés de econômicos à produção, e que tentou estabelecer comunas na Ilha da Juventude. Assim temos a admiração por Mão, que tentou estabelecer comunas rurais e urbanas uniformes, e que recentemente exilou permanentemente milhões de estudantes nas áreas de fronteira agrícola, para eliminar a “contradição entre trabalho intelectual e físico”.[12] De fato, no coração do rompimento entre a Rússia e a China está o abandono virtual por parte da Rússia do ideal comunista sob os olhos da devoção “fundamentalista” chinesa ao credo original. A compartilhada pela comuna também explica as semelhanças entre a New Left e os socialistas utópicos do século XIX[13], e os anarquistas comunistas, uma ala do anarquismo que sempre dividiu o ideal comunista com os Marxistas.[14]

O comunista negaria que sua sociedade ideal iria suprimir a personalidade de cada um. Pelo contrário, liberto do confinamento da divisão do trabalho, cada pessoa iria desenvolver por completo todos seus poderes em todas as direções. Todos estariam completamente desenvolvidos em todas as esferas da vida e trabalho. Como disse Engels em seu Anti-Dühring, o comunismo daria a “cada indivíduo a oportunidade de se desenvolver e exercitar todas as suas habilidades, físicas e mentais, em todas as direções…”.[15] E Lênin escreveu em 1920 sobre a “abolição da divisão do trabalho entre as pessoas… a educação, ensino e treinamento de pessoas com um desenvolvimento versátil e um treinamento versátil, pessoas capazes de fazerem de tudo. O comunismo está e deve marchar em direção a essa meta, e irá atingi-la…”.[16]

O absurdo ideal de pessoas “capazes de fazerem de tudo” é apenas viável se (a) todos fizerem de tudo porcamente, ou (b) se houverem muitas poucas coisas a serem feitas, ou ainda (c) se todos miraculosamente se transformarem em super-homens. O Professor Mises aptamente notou que o homem comunista ideal é amador, um homem que sabe um pouco de tudo e não faz nada direito. Como ele pode desenvolver qualquer um de seus poderes e capacidades se ele não pode desenvolver nenhum deles até um ponto sustentável? Como diz Mises sobre a Utopia de Bebel,

A arte e a ciência são relegadas às horas de lazer. Dessa forma, pensa Bebel, a sociedade do futuro “possuirá e cientistas e artistas de todos os tipos em números incontáveis”. Esses, de acordo com suas diversas inclinações, irão desenvolver seus estudos e suas artes em seu tempo livre… Todo trabalho mental ele trata como mero amadorismo… Mas, no entanto, nós devemos nos perguntar se sob essas condições a mente seria mais capaz de criar aquela liberdade sem a qual ela não pode existir.

Obviamente todo trabalho artístico e científico que demandasse tempo, viagens, educação técnica e muitos gastos com materiais estaria fora de questão.[17]

Todo o tempo e energia das pessoas na Terra são necessariamente limitados; consequentemente, para desenvolver qualquer uma de suas capacidades ao máximo, ela deve se especializar e se concentrar em algumas ao invés de outras. Como Gray escreve:

Todos indivíduos tendo a oportunidade de desenvolver todas as suas capacidades, físicas e mentais, em todas as direções, é um sonho que irá aclamar a visão apenas dos mais ingênuos, esquecidos das restrições impostas pelos estreitos limites da vida humana. A vida é uma série de atos de escolha, e cada escolha é ao mesmo tempo uma renúncia…

Até mesmo o habitante do futuro mundo mágico de Engels terão que decidir mais cedo ou mais tarde se ele deseja ser um Arcebispo de Canterbury ou Primeiro Lorde Naval, se ele deseja se sobressair como violinista ou pugilista, se ele deve saber tudo sobre literatura Chinesa ou sobre as páginas escondidas na vida de um carapau.[18]

É claro, a única forma de resolver esse dilema é fantasiar que o Novo Homem Comunista será um super-homem. O Marxista Karl Kautsky afirmou que na futura sociedade “um novo tipo de homem surgirá… um super-homem… um homem exaltado”. Leon Trotsky profetizou que sob o comunismo

… as pessoas se tornarão incomparavelmente mais fortes, sábias, belas. Seu corpo será mais harmônico, seus movimentos mais rítmicos, sua voz mais musical… O ser humano médio subirá ao nível de um Aristóteles, um Goethe, um Marx. Acima desses outros novos picos surgirão.[19]

Em anos recentes, os comunistas intensificaram seus esforços para acabar com a divisão do trabalho e reduzir todos os indivíduos à uniformidade. As tentativas de Fidel Castro de “construir o Comunismo” na Ilha da Juventude, e a Revolução Cultural de Mão-Tse-Tung foram ecoadas em miniatura pela New Left americana através de numerosas tentativas de formar comunas hippies e criar “coletivos” organizacionais nos quais todos fazem tudo sem benefícios ou especialização.[20] Em contraste, a Iugoslávia tem sido a quieta dissidente do movimento comunista ao se mover rapidamente na direção oposta – em direção a uma cada vez maior liberdade, individualidade, e operações de livre mercado – e se provou influente ao liderar os demais países “comunistas” da Europa Oriental (notavelmente a Hungria e a Checoslováquia) na mesma direção.[21]

 

III

Uma maneira de estimar o desenvolvimento “harmônico” de todos os poderes individuais na ausência da especialização é considerar o que realmente aconteceu durante as eras primitivas ou pré-industriais. E, de fato, muitos socialistas e outros oponentes da Revolução Industrial exaltam os períodos primitivos e pré-industriais como uma idade de ouro de harmonia, comunidade e pertencimento social – uma pacífica e alegre sociedade destruída pelo desenvolvimento do individualismo, pela Revolução Industrial, e pela economia de mercado. Em sua exaltação do primitivo e do pré-industrial, os socialistas já haviam sido perfeitamente antecipados pelos reacionários do movimento Romântico, aquelas pessoas que desejavam reverter a onda do progresso, individualismo e indústria e retornar à suposta idade de ouro da era pré- industrial. A New Left, em particular, também enfatiza uma condenação da tecnologia e da divisão do trabalho, bem como um desejo de “retornar ao solo” e uma exaltação da comuna e da “tribo”. Como John W. Aldridge atentamente mostrou, a atual New Left virtualmente constitui uma tribo de geração que exibe todas as características de um rebanho uniforme e intercambiável, com pouca ou nenhuma individualidade entre seus membros.[22]

Semelhantemente, o reacionário alemão do início do século XIX, Adam Muller, denunciou a

… tendência viciosa de dividir o trabalho em todos os campos da indústria privada… [A] divisão do trabalho em grandes cidades ou províncias industriais ou mineradoras divide o homem, o homem completamente livre, em rodas, cilindros, degraus, hastes, etc., lhe força oportunidade de ação completamente unilateral no campo já unilateral de atender um único desejo…[23]

Os principais conservadores franceses do início do século XIX, Bonald e de Maistre, que idealizaram a ordem feudal, denunciaram a interrupção da ordem social pré-existente e da coesão social por parte do individualismo.[24] O reacionário francês contemporâneo, Jacques Ellul, em The Technological Society, um livro muito em favor da New Left, condena nossas “fábricas desumanizadas, nossos sentidos insatisfeitos… nosso estranhamento com a natureza”. Na Idade Média, em contraste, alega Ellul, “As pessoas buscavam lugares abertos… a possibilidade de se mover… de não trombar consistentemente com outras pessoas”.[25] No ínterim, do lado socialista, a influente The Great Transformation do historiador econômico Karl Polanyi faz dessa tese da perturbação de uma harmonia social prévia pelo individualismo, economia de mercado e divisão do trabalho o tema central de seu livro.

Por sua parte, a adoração do primitivo é uma extensão lógica da adoração do pré-industrial. Essa adoração por parte de modernos e sofisticados intelectuais tem origens no “nobre selvagem” de Rousseau e na glorificação dessa criatura por parte do movimento Romântico, chegando até a adoração dos Panteras Negras por parte de intelectuais brancos.[26] Qualquer outra patologia que a admiração do primitivo reflita, uma parte básica dela é um ódio enraizado da diversidade individual. Obviamente, quanto mais primitiva e menos civilizada a sociedade, menos diversa e individualizada ela é capaz de ser.[27] Também, parte desse primitivismo reflete um ódio do intelecto e suas criações, uma vez que o florescimento da razão e do processo de compreensão leva à diversidade à desigualdade de realizações individuais.

Para que o indivíduo avance e se desenvolva, a razão e o intelecto devem ser ativos, devem incorporar a mente individual trabalhando e transformando os materiais da realidade. Desde o tempo de Aristóteles, a filosofia clássica mostrava o homem como apenas satisfazendo a si mesmo, sua natureza e personalidade através de ação propositada sobre o mundo. Foi partindo de tal ação racional e propositada que os trabalhos da civilização se desenvolveram. Em contraste, o movimento Romântico sempre exaltou a passividade da criança que, necessariamente ignorante e imatura, apenas reage passivamente ao seu meio ao invés de agir tentando muda-lo. Essa tendência de exaltar a passividade e a juventude, e denegrir o intelecto, teve sua incorporação atual na New Left, que admira tanto a juventude per se e a atitude passiva da espontaneidade ignorante e despropositada. A passividade da New Left, seu desejo de viver com simplicidade e em “harmonia” com “a terra” e os supostos ritmos da natureza, remete totalmente ao movimento Romântico de Rousseau. Assim como o movimento Romântico, ela é uma rejeição consciente da civilização e do ser diferenciado em favor do primitivo, do ignorante e do homem da “tribo”.[28]

Se a razão, o propósito, e a ação devem menosprezadas, então o que lhes irá substituir no panteão Romântico são “sentimentos” espontâneos, não analisados. E uma vez que o conjunto de sentimentos é relativamente menor comparado às realizações intelectuais, e em qualquer caso não podem ser conhecidos objetivamente por outra pessoa, a ênfase nos sentimentos é apenas outra maneira de eliminar a diversidade e a desigualdade entre os indivíduos.

Irving Babbitt, um crítico apurado do Romantismo, escreveu sobre o movimento Romântico:

O movimento como um todo é permeado pelo enaltecimento da ignorância e daqueles que ainda desfrutam de suas inapreciáveis vantagens – o selvagem, o camponês e acima de tudo a criança. O seguidor de Rousseau pode ser de fato creditado com tendo descoberto a poesia da infância… mas ao que pareceria as vezes um tanto quanto grande sacrifício da racionalidade. Ao invés de consentir em lidar com as coisas através de análise, as pessoas deveriam, como nos diz Coleridge, retroceder ao estado sincero do espanto infantil.[29] Entretanto, crescer eticamente não é retroceder, mas sim lutar bravamente para seguir adiante, afirmar o contrário é proclamar a incapacidade de amadurecer… [O Romântico] está pronto para afirmar que o que chega espontaneamente para a criança é superior ao esforço moral deliberado do homem maduro. Os discursos de todos os filósofos são, de acordo com Maeterlinck, desbancados pela sabedoria inconsciente da criança momentânea.[30]

Outra crítica atenta do Romantismo e do primitivismo foi escrita por Ludwig von Mises. Ele nota que “toda a tribo dos românticos” condenou a especialização e a divisão do trabalho. “Para eles o homem do passado que desenvolvia seus poderes “harmonicamente” é o ideal: um ideal que infelizmente não inspira mais nossa idade degenerada. Eles recomendam o retrocesso na divisão do trabalho…” com os socialistas ultrapassando seus colegas Românticos nesse assunto.[31] Mas os primitivos ou pré-industriais estão privilegiados para se desenvolver livre e harmonicamente? Mises responde:

É fútil procurar pelo homem harmonicamente desenvolvido no início da evolução econômica. O habitante da economia quase auto-suficiente como o conhecemos na figura do camponês solitário dos vales remotos não mostra nada do nobre desenvolvimento harmônico do corpo, mente e sentimentos que os românticos lhe atribuem. A civilização é um produto do tempo livre e da paz mental que só a divisão do trabalho possibilita. Nada é mais falso do que supor que o primeiro homem apareceu na história com uma individualidade independente e que apenas durante a evolução [da sociedade]… ele perdeu… sua independência espiritual. Toda a história, evidências e observações da vida dos povos primitivos é diretamente contrária a essa visão. O homem primitivo não possui nenhuma individualidade em nosso sentido. Dois habitantes da Ilha do Sul se parecem muito mais um com o outro do que dois Londrinos do século XX. A personalidade não foi concedida ao homem desde o início. Ela foi adquirida no decorrer da evolução da sociedade.[32]

Ou podemos notar a crítica de Charles Silberman das rapsódias de Jacques Ellul “nos ritmos tradicionais da vida e da natureza” vivenciados pelo homem pré- industrial, comparado às “fábricas desumanizadas… ao nosso estranhamento com a natureza.” Silberman pergunta:

Mas com o que devemos contrastar esse mundo desumanizado? Com a vida bela, harmônica, digamos, da mulher camponesa chinesa ou vietnamita, que trabalha em campos próximos à natureza, durante doze horas ao dia – basicamente as condições nas qual a vasta maioria que mulheres (e homens) trabalhou… durante a história humana? Pois essa é a condição que Ellul idealiza.

E, quanto ao canto de glória de Ellul sobre a mobilidade, espaçamento e tranqüilidade da Idade Média:

Isso teria sido uma notícia impressionante para o camponês medieval, que vivia com sua mulher e filhos, outros parentes e provavelmente outros animais numa cabana de palha de apenas um cômodo. E mesmo para a nobreza, havia realmente mais possibilidades de “se locomover” na Idade Média, quando as viagens eram feitas a pé ou em animais, do que hoje, quando na Europa operários desfrutam de licenças de um ano do serviço?[33]

O selvagem é tomado não só como “nobre”, mas também supremamente feliz. Desde os seguidores de Rousseau até o que Erich Fromm chamou de “Paraíso infantil” de Norman O. Brown e Herbert Marcuse, os Românticos enalteceram a felicidade desfrutada pelos espontâneos e infantis. Para Aristóteles e para os filósofos clássicos, a felicidade era agir de acordo com a natureza única e racional do ser humano. Para Marcuse, qualquer ação racional, propositada, é por definição “repressiva”, a qual ele contrasta com o estado “liberto” do comportamento espontâneo. Deixando de lado a destituição universal que a proposta abolição do trabalho traria, o resultado seria uma infelicidade profunda, pois como nenhum indivíduo seria capaz de se satisfazer, sua individualidade iria desaparecer em grande parte, uma vez que num mundo de comportamento “polimorfo” todos seriam virtualmente semelhantes.

Se considerarmos a suposta felicidade do homem primitivo, devemos considerar também que sua vida era, na famosa frase de Hobbes, “imunda, bruta e curta”. Havia pouca ajuda médica contra doenças; não havia nenhuma contra a fome, pois num mundo sem mercados inter-regionais e parcamente acima da linha de subsistência qualquer diminuição da oferta local de comida iria dizimar sua população. Satisfazendo os sonhos dos Românticos, a tribo primitiva é uma criatura passiva do seu meio e não possui capacidade de agir para superá-lo e transforma-lo. Assim, quando a oferta local de comida numa área acabar, a despreocupada tribo morrerá em massa.

Além disso, devemos perceber que o primitivo enfrenta um mundo o qual ele não é capaz de compreender, uma vez que ele não está envolvido numa pesquisa científica, racional. Nós sabemos o que é uma tempestade elétrica, e, portanto, tomamos medidas racionais contra ela; mas o selvagem não sabe, e, portanto assume que o Deus do Trovão está zangado com ele e deve ser agradado com sacrifícios e oferendas. Uma vez que o selvagem possui apenas um conceito limitado de um mundo conectado por uma lei natural (um conceito que emprega razão e ciência), ele crê que o mundo é governado por um grupo de espíritos e demônios caprichosos, cada um deles podendo ser agradado apenas através de rituais e mágicas, e por pajés que se especializam em tal tarefa.[34] O renascimento da astrologia e credos místicos similares na New Left marca um retrocesso a tais formas primitivas de magia. Tão amedrontado é o selvagem, tão ligado ele é a tabus irracionais e ao costume de sua tribo, que ele não consegue desenvolver sua individualidade.

Se o costume tribal impedia e reprimia o desenvolvimento de cada indivíduo, da mesma forma o faziam os vários sistemas de casta e redes de restrição e coerção nas sociedades pré-industriais que obrigavam todos a seguirem os passos hereditários da profissão do pai. Toda criança sabia desde ao nascer que estava fadada a caminhar onde seus ancestrais tinham ido antes dela, não importando sua habilidade ou inclinação ao contrário. A “harmonia social”, o “sentimento de pertencimento”, fornecido pelo mercantilismo, pelas guildas ou pelo sistema de castas, garantia tal contentamento que seus membros deixavam a agonia do sistema assim que tinham uma oportunidade. Dada a liberdade de escolher, os membros abandonam o seio da tribo para virem para as “atomísticas”, mais livres cidades procurando empregos e oportunidades. É curioso, de fato, que esses Românticos que procuram restaurar a mítica idade de ouro das castas e do status se negam a permitir a liberdade de escolher entre o mercado de um lado, e a comuna tribal ou de casta do outro. Invariavelmente, a nova idade de ouro tem que ser imposta através da coerção.

Por acaso é, na realidade, uma coincidência de que os nativos dos países subdesenvolvidos, quando possuem uma chance, abandonam sua “cultura folclórica” em favor de modos Ocidentais, seu padrão de vida e “coca-cocalização”? Há alguns anos, por exemplo, as pessoas do Japão se deliciaram em abandonar sua cultura tradicional de séculos, e se voltarem para as realizações materiais e economia de mercado do Ocidente. Tribos primitivas, também, quando possuem uma chance, estão ávidas por se diferenciarem e desenvolverem uma economia de mercado, romper com sua “harmonia” estagnante e substituir sua mágica por conhecimento da lei descoberta. O eminente antropólogo, Branislaw Malinowsi, mostrou que os primitivos são mágicos apenas para cobrir aquelas áreas da natureza sobre as quais eles são ignorantes; naquelas áreas aonde vieram a compreender o processo natural em andamento, a magia é, bem sensivelmente, descartada.[35]

Um exemplo particularmente interessante do desenvolvimento ávido de uma economia de mercado dentre primitivos tribais é o quase desconhecido caso da África Ocidental.[36] E Bernard Siegel mostrou que quando uma economia primitiva se torna grande e tecnologicamente e socialmente complexa, como os Penajachel da Guatemala, uma economia de mercado inevitavelmente acompanha esse crescimento, repleto de especialização, competição, compras monetárias, oferta e demanda, preços e custos, etc.[37]

Há então ampla evidencia de que mesmo os próprios tribais primitivos não têm um gosto por seu primitivismo e aproveitam a primeira oportunidade para escapar dele; o principal refúgio do amor pelo primitivismo parece estar entre os decididamente não primitivistas intelectuais Românticos.

Outra instituição primitiva que tem sido saudada por muitos cientistas sociais é o sistema de “família estendida”, uma harmonia e status supostamente quebrado pela individualista “família nuclear” do Ocidente moderno. Ainda assim, o sistema de família estendida tem sido responsável por impedir o indivíduo criativo e produtivo bem como reprimir o desenvolvimento econômico. Assim, o desenvolvimento da África Ocidental tem sido impedido pelo conceito de família estendida no qual se uma pessoa prospera, ela tem a obrigação de dividir sua recompensa com um conjunto de parentes, minando assim a recompensa por sua produtividade e sua motivação para ser bem sucedido, enquanto encoraja os parentes a viver desocupados das doações. E os membros produtivos da tribo não parecem muito contentes com esse laço social supostamente harmônico. O Professor Bauer mostra que

… muitos admitem em discussões privadas que temem essas obrigações extensas… O medo das obrigações do sistema familiar é parcialmente responsável pelo uso disseminado de têxteis e bijuterias como escoadouros para poupanças, em detrimento de formas mais produtivas de investimento que provavelmente atrairão a atenção de parentes.

E muitos africanos não confiam em bancos, “temendo que eles possam revelar a situação de suas contas para os membros de suas famílias. Eles, então, preferem manter suas poupanças sob a lareira ou enterradas no solo”.[38]

De fato, a comunidade primitiva, longe de ser feliz, harmônica e idílica, é muito mais capaz de ser pautada pela suspeita mútua e inveja dos mais bem sucedidos ou bem favorecidos, uma inveja tão penetrante que danifica, através do medo de sua presença, todo desenvolvimento econômico pessoal ou geral. O sociólogo alemão Helmut Schoeck, em seu importante trabalho recente sobre a Inveja, cita numerosos estudos desse efeito danificador penetrante. Assim o antropólogo Clyde Kluckhohn encontrou entre os Navaho a ausência do conceito de “sucesso pessoal” ou “realização pessoal”; e tal sucesso é automaticamente atribuído a exploração dos outros, e, portanto, os índios Navaho mais prósperos se sentem sob constante pressão social para darem seu dinheiro. Allan Holmberg descobriu que o índio Siriono da Bolívia come sozinho à noite porque se ele o fizer de dia, uma multidão se aglomera ao redor para observar com uma inveja odiosa. O resultado entre os Siriono é que, em reação a essa pressão penetrante, ninguém irá dividir comida voluntariamente com ninguém. Sol Tax descobriu que a inveja e o medo da inveja numa “pequena comunidade onde todos os vizinhos observam e todos são vizinhos” era responsável pela falta de progresso, uma demora na mudança em direção a uma economia produtiva entre os índios da Guatemala. E quando uma tribo de índios Pueblo mostrou indícios de especialização e divisão do trabalho, a inveja de seus companheiros os impeliu a tomar medidas para finalizar esse processo, incluindo a destruição física da propriedade daqueles que pareciam estar em condições melhores do que seus companheiros.

Oscar Lewis descobriu um medo extremamente penetrante da inveja dos demais numa vila indígena Mexicana, um medo produzindo uma reticência intensa. Lewis escreveu:

O homem que fala pouco, não revela seus planos, e mantém alguma distância dos outros tem uma chance menor de criar inimigos ou de ser criticado ou invejado. Geralmente não se discute planos de comprar e vender ou de fazer uma viagem.[39]

O Professor Schoeck comenta:

… é difícil imaginar o significado para o desenvolvimento econômico e técnico de uma sociedade quando, quase que automaticamente e como uma questão de princípios, a dimensão futura é banida do relacionamento e conversa humana, quando ela nem pode ser discutida. Inveja ubíqua, medo da própria e daquelas que a sentem, isola as pessoas de qualquer tipo de ação comunal direcionada ao futuro… Todo o esforço, preparação e planejamento para o futuro só pode ser conduzido por seres socialmente fragmentados, reticentes.[40]

Além disso, nessa vila mexicana ninguém avisará ou contará sobre perigo iminente ameaçando a propriedade alheia; não há nenhum senso de solidariedade humana qualquer.

Dentre os índios de Aritama, na Colômbia, Reichel-Dolmatoffs anunciou:

Todo indivíduo vive sob medo constante da agressão mágica dos demais, e a atmosfera social geral na vila é uma de suspeita mutua, de perigo latente, e hostilidade escondida, que permeia todos os aspectos da vida.

A razão mais imediata para a agressão mágica é a inveja. Qualquer coisa que possa ser interpretada como uma vantagem pessoal acima dos demais é invejada: boa saúde, ativos econômicos, boa aparência física, popularidade, uma vida familiar harmoniosa, uma nova roupa. Todos esses e outros aspectos implicam prestígio, e com ele poder e autoridade sobre outras pessoas. A mágica agressiva é, então, planejada para prevenir ou destruir esse poder e agir como uma força niveladora.[41]

Reichel-Dolmatoffs também notou que se um membro do grupo em Aritama trabalha mais rápido ou melhor do que seus companheiros, seu campo de trabalho é mercado com uma cruz antes que ele chegue na manhã seguinte, e seus colegas invejosos rezam para Deus fazer esse trabalhador mais capaz mais lento e cansado.

Finalmente, Watson e Samora descobriram que a principal razão para a incapacidade de um grupo de cidadãos pobres de língua espanhola numa cidadezinha montanhosa no Colorado em se igualar à comunidade Anglo- Saxônica mais rica, era a forte inveja do grupo hispânico para com qualquer companheiro que conseguisse prosperar. Qualquer um que conseguisse subir era considerado como um “homem que se vendeu aos Anglos”, que “subiu sobre as costas de seu povo”.[42]

O antropólogo Eric Wolf acabou por cunhar o termo “inveja institucionalizada” para descrever tais instituições penetrantes, incluindo a prática e o medo da magia negra nessas sociedades primitivas.[43] Schoeck nota:

Inveja institucionalizada… ou o medo ubíquo dela, significa que há pouca possibilidade de avanço econômico individual e nenhum contato com o mundo exterior, o que poderia alimentar esperanças de progresso para a comunidade. Ninguém se atreve a mostrar algo que possa levar as pessoas a pensar que ele está em melhor situação. Inovações são raras. Métodos agrícolas permanecem tradicionais e primitivos, ao detrimento de toda a vila, porque qualquer desvio da prática anterior se depara com as limitações ditadas pela inveja.[44]

E Schoeck aptamente conclui:

Não há nada aqui que lembre a próxima comunhão que supostamente existe entre povos primitivos em tempos pré-afluentes – quanto mais pobre, se diz, maior o senso de comunidade. A teoria sociológica teria evitado muitos erros se esses fenômenos tivessem sido apropriadamente observados e avaliados há um século. O mito de uma idade de ouro, quando a harmonia social prevalecia porque cada homem tinha tão pouco quanto o próximo, o caloroso e generoso espírito comunitário das sociedades simples, também era em grande parte um mito, e os cientistas sociais deveriam ter feito melhor do que estabelecê-lo como um padrão utópico usado para criticar suas próprias sociedades.[45]

Somando-se a isso, as críticas de Ludwig von Mises ao Romantismo não parecem ter sido exageradas:

O Romantismo é a revolta do homem contra a razão, bem como contra a condição sob a qual a natureza o obrigou a viver. O romântico é um sonhador; ele facilmente imagina uma forma de ignorar as leis da lógica e da natureza. O homem pensador e racional agente tenta se livrar do desconforto dos desejos insatisfeitos através da ação econômica e do trabalho; ele produz para melhorar sua posição. O romântico… imagina os prazeres do sucesso mas não faz nada para atingi-lo, não faz nada para remover os obstáculos; ele meramente os remove na imaginação… Ele odeia trabalhar, a economia e a razão.

O romântico toma todas as dádivas de uma civilização social como dadas e deseja, além disso, tudo de bom e belo que, como ele acredita, tempos e criaturas distantes tem ou poderiam oferecer. Cercado pelos confortos da cidade européia ele sonha em ser um rajá indiano, um beduíno, um corsário, ou um trovador. Mas ele enxerga apenas a parte da vida dessas pessoas que lhe agrada… A natureza perigosa de sua existência, a pobreza relativa de suas circunstâncias, suas misérias e trabalho – essas coisas sua imaginação tacitamente relega: tudo é transfigurado num brilho favorável. Comparado com esse ideal imaginado, a realidade parece árida e superficial. Esses são obstáculos a serem superados que não existem no sonho… Aqui há trabalho a se fazer, incessantemente, arduamente… Aqui é necessário arar e plantar se se deseja colher. O romântico escolhe não admitir tudo isso. Obstinado como uma criança, ele se nega a reconhecer isso. Ele zomba e caçoa; ele despreza e odeia o burguês.[46]

A atitude Romântica, ou primitivista, também foi brilhantemente criticada pelo filósofo espanhol, Ortega y Gasset:

… é possível ter pessoas que são perenemente primitivas… aqueles que permaneceram no crepúsculo estático, congelado, que nunca avança em direção ao meio dia. Isso é o que acontece no mundo que é mera Natureza. Mais isso não acontece no nosso mundo civilizado. A civilização não apenas “está aqui”, ela não é auto-sustentável. É artificial… Se você quer fazer uso das vantagens da civilização, mas não está preparado para se preocupar com seu sustento, você está perdido. Num instante você se vê sem ela… A floresta primitiva aparece em seu estado nativo… A selva é sempre primitiva e, vice versa, tudo primitivo é mera selva.[47]

Ortega adiciona que o tipo de pessoa que ele vê chegando ao poder, o moderno “homem das massas”, “acredita que a civilização na qual ele nasceu e da qual se utiliza, é tão espontânea e auto-sustentável quanto a Natureza”… Mas o homem das massas, o homem do rebanho, também é caracterizado por seu desejo de reprimir aqueles indivíduos que diferem da massa: “A massa… não deseja viver junto com aqueles que não são parte dela. Ela possui um ódio mortal de tudo aquilo que não é ela mesma”.[48]

 

IV

A Esquerda, claro, não introduz suas demandas em termos de acabar com a diversidade; o que ela deseja atingir soa semanticamente muito mais agradável: igualdade. É em nome da igualdade que a Esquerda vai em busca de todo tipo de medida, desde impostos progressivos até o estágio final do comunismo.

Mas o que, filosoficamente, é “igualdade”? O termo não deve ser deixado sem uma análise e aceito ao valor de face. Vamos considerar três entidades: A, B e C. A, B e C são postulados como “iguais” (ou seja, A=B=C) caso uma característica na qual as três entidades são uniformes ou idênticas seja encontrada. Em suma, temos aqui três indivíduos: A, B e C. Cada um deles pode ser similar em alguns aspectos mas diferente em outros. Se cada um deles possui precisamente 5 pés e 10 polegadas de altura, então eles são iguais em altura. Isso significa para nossa discussão do conceito de igualdade que A, B e C só podem ser completamente “iguais” se são idênticos um uniformes em todas as características – em suma, se todos eles forem, como nozes ou flechas, completamente intercambiáveis. Nós vemos, então, que o ideal de igualdade humana só pode implicar uniformidade total e a absoluta eliminação da individualidade.

Já passou da hora, então, para aqueles que celebram a liberdade, a individualidade, a divisão do trabalho, e a prosperidade e sobrevivência econômica, de parar de conceder a suposta nobreza ao ideal da igualdade. Frequentemente vemos “conservadores” abraçando o ideal de igualdade apenas criticando sua “impraticabilidade”. Filosoficamente, não pode haver divórcio entre a teoria e a prática. Medidas igualitárias não “funcionam” porque elas violam a natureza básica do ser humano, ou o que significa para um indivíduo ser completamente humano. O clamor por “igualdade” é uma sirene que pode apenas significar a destruição daquilo que celebramos como ser humano.

É irônico que o termo “igualdade” traga sua conotação favorável de um uso passado que era radicalmente diferente. O conceito de igualdade atingiu popularidade disseminada durante os movimentos liberais clássicos do século XVIII, quando ele não significava uniformidade de status ou renda, mas sim liberdade para todo e cada ser humano, sem exceção. Resumindo, “igualdade” naqueles dias significava o conceito individualista e libertador de plena liberdade para todos. Assim, o bioquímico Roger Williams corretamente mostra que

“a frase ‘livres e iguais’ na Declaração de Independência foi uma paráfrase infeliz de uma melhor afirmação contida na Carta de Direitos de Virgínia… ‘todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes’. Em outras palavras, as pessoas podem ser igualmente livres sem serem uniformes”.[49]

Esse credo libertário foi formulado com coerência particular por Herbert Spencer em sua “Law of Equal Liberty”, como sugeria o núcleo fundamental de sua filosofia social:

… a felicidade do homem só pode ser obtida através do exercício de suas capacidades… Mas o cumprimento desse dever necessariamente pressupõe liberdade de ação. O homem não pode exercer suas capacidades sem certo espaço. Ele deve possuir liberdade para ir e vir, ver, sentir, falar, trabalhar; se alimentar, vestir, abrigar e garantir para ele e para todos as necessidades de sua natureza… Para exercitar suas capacidades ele deve ter liberdade para fazer tudo aquilo que suas capacidades acabam por impeli-lo a fazer… Logo, ele possui um direito àquela liberdade. Isso, no entanto, não é o direito de um, mas de todos. Todos são dotados com capacidades. Todos devem… [exercita-las]. Todos, portanto, devem ser livres para fazer aquelas coisas que consistem no exercício daquelas (das capacidades – N.T.). Isto é, todos devem ter direito a liberdade de ação.

E consequentemente aparece necessariamente uma limitação. Se todos os homens possuem direitos a tal liberdade que é necessária para o exercício de suas capacidades, então a liberdade de cada deve ser restrita pela liberdade similar de todos… Chegamos assim na proposição geral, que todas as pessoas podem reivindicar a mais plena liberdade para exercitar suas capacidades, liberdade essa compatível com a posse de liberdade semelhante por parte de todas as outras.[50]

Assim, apenas a específica igualdade de liberdade – a antiga visão da igualdade humana – é compatível com a natureza básica humana. Igualdade de condições iria reduzir a humanidade a uma existência de formigueiro. Felizmente, a natureza individualizada do homem, aliada à diversidade geográfica da terra, torna o ideal de igualdade total inatingível. Mas uma grande quantidade de danos – o enfraquecimento da individualidade, bem como a destruição econômica e social – podem ser gerados na tentativa.

Vamos agora sair da igualdade para chegar a desigualdade, a condição que existe quando todas as pessoa não são idênticas em todas as características. É evidente que a desigualdade inevitavelmente aparece com a especialização e divisão do trabalho. Logo, uma economia livre não levará só a diversidade de ocupação, com padeiros, atores, engenheiros civis, etc., mas desigualdades específicas também irão despontar na renda monetária e status e escopo de controle dentro de cada ocupação. Todos irão, numa economia livre, tender a ganhar uma renda monetária igual ao valor atribuído a sua contribuição ao satisfazer os desejos e demandas dos consumidores. Na terminologia econômica todos irão tender a ganhar uma renda igual a seu “produto marginal”, igual a sua produtividade particular ao satisfazer demandas dos consumidores. Claramente, num mundo de desenvolvida diversidade individual, alguns serão mais inteligentes, outros mais alertas e de melhor previsão do que o restante da população. Outros, enquanto isso, estarão mais interessados naquelas áreas rendendo maior ganho monetário; aqueles bem sucedidos em perfurar petróleo cru ganharão recompensas monetárias maiores do que aqueles que permanecem em trabalhos secretariais.

Muitos intelectuais costumam denunciar a “injustiça” do mercado ao garantir uma renda monetária muito superior a uma estrela de cinema, do que, digamos, e um assistente social, dessa forma recompensando muito mais o “material” do que o “espiritual”. É de surpreender que se a suposta “bondade” do assistente social reside na verdade em sua “espiritualidade”, então é completamente inapropriado e inconsistente demandar que ele receba mais amenidades “materiais” (dinheiro) vis a vis a estrela de cinema. Na sociedade livre, aqueles capazes de prover bens e serviços que os consumidores valoram e desejam comprar, receberão precisamente aquilo que os consumidores estão dispostos a gastar. Aqueles que persistem em entrar em ocupações mal cotadas, seja porque preferem o serviço ou porque não são suficientemente capazes para os setores mais bem pagos, não podem reclamar muito quando ganham um salário mais baixo.

Se, então, desigualdade de renda é o corolário inevitável da liberdade, então também é a desigualdade de controle. Em qualquer organização, seja ela uma firma, um albergue, ou um clube de jogos, sempre haverá uma minoria de pessoas que subirão até a posição de líderes e outros que permanecerão como seguidores nas fileiras. Robert Michels descobriu isso como uma das grandes leis da sociologia, “A Lei de Ferro da Oligarquia”. Em qualquer atividade organizada, não importando a esfera, um pequeno número se tornará os líderes “oligárquicos” e outros seguirão.[51]

Numa economia de mercado, os líderes, sendo mais produtivos em satisfazer os consumidores, inevitavelmente ganharão mais dinheiro do que as massas. Dentro de outras organizações, a diferença será apenas aquela de controle. Mas, em todo caso, habilidade e interesse selecionarão aqueles que ascenderão à liderança da corporação; os mais capazes e enérgicos tenderão a ascenderem à liderança no clube de jogo local; e por aí vai.

Esse processo da habilidade e dedicação encontrarem seu próprio nível funciona melhor e mais suavemente, é verdade, em instituições como firmas numa economia de mercado. Isso porque nesse cenário todas as firmas se colocam sob a disciplina dos lucros monetários e renda obtida ao vender um produto adequado aos consumidores. Se os gerentes ou trabalhadores não fazem o serviço correto, perdas monetárias fornecem um rápido sinal de que algo está errado e que esses produtores precisam corrigir suas ações. Em organizações não mercantis, aonde o lucro não fornece é um teste de eficiência, é muito mais fácil para outras atividades externas a atividade em questão desempenharem um papel ao selecionar os membros da oligarquia. Assim, um clube de jogos local poderá selecionar seus líderes não só pela capacidade e dedicação às atividades do clube, mas também graças a características físicas ou raciais externas preferidas pelos membros. Essa situação é muito menos comum onde perdas monetárias acontecerão ao se dar muita atenção a esses fatores externos.

Precisamos apenas olhar ao nosso redor em toda atividade ou organização humana, pequena ou grande, política, econômica, filantrópica ou recreativa para ver a universalidade da Lei de Ferro da Oligarquia. Considere um clube de jogos de cinquenta pessoas e, não importando as formalidades legais, cerca de meia dúzia realmente irão organizar os jogos. Michels, na verdade, descobriu a Lei de Ferro ao observar a ordem rígida, burocrática, oligárquica que permeava os partidos Social Democratas na Europa no final do século XIX, mesmo que esses partidos estivessem supostamente dedicados á igualdade e a abolição da divisão do trabalho.[52] E foi precisamente a óbvia e rígida desigualdade de renda e poder e o domínio oligárquico que desiludiu a igualitária New Left na União Soviética. Ninguém glorifica Brezhnev ou Kosygin.

É a tentativa igualitária da New Left de fugir da Lei de Ferro da desigualdade e oligarquia que explica seus esforços desesperados para acabar com elites de liderança dentro de suas organizações. (Certamente não houve indicações de desaparecimento da elite de poder nas frequentemente citadas Cuba e China.) A precoce virada em direção ao igualitarismo na New Left emergiu no conceito de “democracia participativa”. Ao invés dos membros de uma organização elegerem uma elite de liderança, cada um participaria igualmente em todas as tomadas de decisão da organização. É, ao que parece, esse senso de direção e participação intensa de cada indivíduo que explica o forte entusiasmo das massas nos estágios iniciais dos regimes revolucionários na Rússia Soviética e Cuba – um entusiasmo que rapidamente desapareceu conforme a inevitável oligarquia começou a tomar controle e a participação popular morreu.

Apesar dos aspirantes a democratas participativos fizeram críticas perspicazes da ordem burocrata em nossa sociedade, o próprio conceito, quando aplicado, vai rapidamente de encontro a Lei de Ferro. Assim, qualquer um que já se sentou nas sessões de qualquer organização comprometida com a democracia participativa conhece o intenso tédio e ineficiência que se desenvolve rapidamente. Isso porque se cada pessoa deve participar igualmente em todas as decisões, o tempo atribuído a tomada delas acaba se tornando quase infinito, e o processo de organização acabam por se tornar a vida dos participantes. Essa é uma das razões pelas quais várias organizações da New Left rapidamente insistem para que seus membros vivam em comunas e dediquem todas as suas vidas à organização – com efeito, fundirem suas vidas com a organização. Pois se eles verdadeiramente vivem e desejam democracia participativa, dificilmente poderão fazer outra coisa. Mas, apesar dessa tentativa de salvar o conceito, a inevitável crassa ineficiência e o tédio agravante garantem que todos exceto os mais intensamente dedicados abandonarão a organização. Em suma, se ela for capaz de funcionar, a democracia participativa só pode dar certo em grupos tão pequenos que eles serão, com efeito, os “líderes” separados de seus seguidores.

Concluímos que, para ser bem sucedida, qualquer organização eventualmente deverá cair nas mãos de “profissionais” especializados, uma minoria de pessoas dedicada as suas tarefas e capazes de levá-las adiante. Estranhamente, foi Lênin quem, apesar de sua retórica em favor do ideal final do comunismo igualitário, reconheceu que uma revolução, também, para ser bem sucedida, deve ser guiada por uma minoria, uma “vanguarda” de profissionais dedicadas.

É a intensa virada igualitária da New Left que explica, além do mais, sua curiosa teoria da educação – uma teoria que teve um enorme impacto no movimento estudantil contemporâneo nas universidades americanas nos anos recentes. A teoria diz que, em contraste aos conceitos “antiquados” de educação, o professor não sabe mais que seus alunos. Todos, então, estão em condições “iguais”; ninguém é melhor que o outro em nenhum sentido. Uma vez que apenas um imbecil proclamaria de fato que o aluno sabe tanto sobre o conteúdo de qualquer disciplina quanto o professor, essa reivindicação de igualdade é mantida argumentando em favor da abolição do conteúdo na sala de aula. Esse conteúdo, afirma a New Left, é “irrelevante” para o estudante e consequentemente não é uma algo compatível com o processo educacional. O único assunto apropriado para a sala de aula não é um corpo de verdades, não são leituras ou tópicos determinados, mas sim discussão descompromissada, móvel, dos sentimentos dos estudantes, uma vez que apenas seus sentimentos são realmente “relevantes”. E uma vez que o método de leituras implica, é claro, que o professor dirigente sabe mais que os estudantes os quais ele transmite conhecimento, a leitura também deve ser abandonada. Essa é a caricatura da “educação” proposta pela New Left.

Uma questão que essa doutrina suscita, e que a New Left nunca respondeu na verdade, é claro, é porque os estudantes então deveriam estar na faculdade. Porque eles próprios não poderiam realizar tais discussões descompromissadas de seus sentimentos em casa ou no mercadinho do bairro? De fato, nessa teoria educacional, a escola como tal não possui função particular alguma; ela se torna, em efeito, o mercadinho, e também se funde com a vida em si. Mas então, novamente, porque ter uma escola afinal de contas? E porque, de fato, os estudantes deveriam pagar mensalidades e os funcionários receberem um salário por serviços inexistentes? Se todos são verdadeiramente iguais, porque pagar pela faculdade?

De qualquer forma, a ênfase nos sentimentos ao invés do conteúdo racional nos cursos novamente implica uma escola igualitária; ou pelo contrário, a escola como tal deverá desaparecer, mas os “cursos” certamente seriam igualitários, pois se apenas sentimentos serão discutidos, logo com certeza os sentimentos de todos são aproximadamente “iguais” aos dos demais. Uma vez que se permite que a razão, o intelecto e as realizações desabrochem, o demônio da desigualdade rapidamente irá levantar sua horrível cabeça.

Se, então, a desigualdade natural de capacidade e interesse entre as pessoas torna elites inevitáveis, o único caminho sensato é abandonar a quimera da igualdade e aceitar a necessidade de líderes e seguidores. A tarefa do libertário, a pessoa dedicada a ideia da sociedade livre, não é invejar elites que, assim como a necessidade de liberdade, surgem diretamente da natureza humana. A tarefa do libertário é ao invés estabelecer uma sociedade livre, uma sociedade na qual todas as pessoas são livres para encontrarem seu melhor nível. Em tal sociedade, todos serão “iguais” apenas em liberdade, permanecendo diversas e desiguais em todos os demais aspectos. Em terminologia Jeffersoniana, nós descobriremos “aristocracias naturais” que despontarão à proeminência e liderança em todos os campos. O importante é permitir a subida dessas aristocracias naturais, não através da ordem de “aristocracias artificiais” – aquelas que dominam através da coerção. Os aristocratas artificiais, ou oligarcas coercivos, são aqueles que sobem ao poder invadindo as liberdades de seus companheiros, negando-lhes sua liberdade. Em contraste, os aristocratas naturais vivem em liberdade e harmonia com seus companheiros, e despontam ao exercerem sua individualidade e suas principais habilidades em serviço de seus companheiros, seja numa organização ou produzindo eficientemente para os consumidores. De fato, as oligarquias coercivas invariavelmente sobem ao poder suprimindo as elites naturais, bem como outras pessoas; os dois tipos de liderança são antitéticos.

Vamos considerar um exemplo hipotético de um possível caso de conflito entre diferentes tipos de elites. Um grande grupo de pessoas voluntariamente se dedica ao futebol profissional, vendendo seus serviços a um ávido público consumidor. Rapidamente subindo ao tipo temos uma elite natural dos melhores – os mais capazes e dedicados – jogadores de futebol, técnicos e organizadores do jogo. Aqui temos um exemplo da ascensão de uma elite natural numa sociedade livre. Depois, a elite de poder sob controle do governo decide em toda sua sabedoria que todos os atletas profissionais, e especialmente do futebol, são malvados. O governo então decreta que o futebol profissional está proibido e ordena a todos a se filiarem a um clube local de eurrítmica como um substituto para a participação das massas. Aqui os governantes consistem claramente numa oligarquia coerciva, uma “elite artificial”, usando a força para reprimir uma elite natural ou voluntária (bem como o resto da população).

A visão libertária da liberdade, governo, individualidade, inveja e elites naturais versus coercivas nunca foi elaborada mais concisamente ou com mais entusiasmo do que por H. L. Mencken:

Todo governo, em sua essência, é uma conspiração contra o homem superior: seu único e permanente objetivo é oprimir e debilita-lo. Se ele é aristocrático em sua organização, ele procura então proteger as pessoas que são superiores apenas na lei contra aquelas que são superiores de fato; se ele é democrático, então ele procura proteger aqueles que são inferiores em todas as formas contra ambos. Uma de suas funções primárias é regimentar as pessoas através da força, combater a originalidade entre elas. Tudo que ele pode ver numa ideia original é mudança potencial, e consequentemente uma invasão de suas prerrogativas. O homem mais perigoso para um governo é aquele capaz de pensar coisas por si próprio, sem se importar com as superstições ou tabus prevalecentes.[53]

Similarmente, o escritor libertário Albert Jay Nock viu nos conflitos políticos entre Direita e Esquerda

“simplesmente um conflito entre dois grupos de homens massificados, um grande e pobre, a outra pequena e rica… O objetivo do conflito eram os ganhos materiais advindos do controle do maquinário estatal. É mais fácil tomar riqueza (dos produtores) do que produzi-la; e enquanto o estado possibilite a tomada de riqueza como uma questão de privilégio legalizado, o conflito por tal privilégio continuará”.[54]

A Inveja de Helmut Schoeck possui um argumento poderoso em favor da visão de que a virada moderna em direção ao socialismo e doutrinas similares é um estímulo à inveja do diferente e desigual, mas a tentativa socialista de eliminar a inveja através do igualitarismo não pode ter nem esperanças de ser bem sucedida. Isso porque sempre existirão diferenças pessoais, tais como aparências, habilidade, saúde, boa e má sorte, as quais nenhum programa igualitário, não importa quão rigoroso, pode apagar, e sobre as quais a inveja será capaz de concentrar.

 

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Notas

[1] Sobre as relações entre liberdade, diversidade, e o desenvolvimento de cada indivíduo, ver o clássico trabalho de Wilhelm von Humboldt, The Limits of State Action (Cambridge University Press, 1969). Sobre liberdade como uma necessidade para o desenvolvimento da individualidade, ver também Josiah Warren, Equitable Commerce (Nova Iorque: Burt Franklin, 1965) e Stephen Pearl Andrews, The Science of Society (Londres: C. W. Daniel, 1913).

[2] Os economistas Bauer e Yamey convincentemente definiram desenvolvimento econômico como “a ampliação do espectro de alternativas abertas às pessoas como consumidoras e produtoras”. Peter T. Bauer e Basil S. Yamey, The Economics of Underdeveloped Countries (Cambridge: Cambridge University Press, 1957), p. 151.

[3] Ver George J. Stigler, “The Division of Labor is Limited by the Extent of the Market,” Journal of Political Economy (Junho, 1951), p. 193.

[4] Ludwig von Mises, Socialism: An Economic and Sociological Analysis (New Haven: Yale University Press, 1951), pp. 292-95, p. 303.

[5] Historiadores nos têm lembrado em décadas recentes que nem na Inglaterra nem nos EUA o governo se dedicou estritamente ao ideal do laissez faire. É bem verdade; mas devemos comparar essa era com o papel do governo em dias anteriores e posteriores para ver a significância da diferença. Assim, cf. Karl Wittfogel, Oriental Despotism (New Haven: Yale University Press, 1957).

[6] A New Left, por exemplo, ignora e zomba o Marechal Tito apesar de seu papel igualmente proeminente com revolucionário Marxista, líder de guerrilha, e rebelde contra a ditadura Soviética. O motivo, como será visto abaixo, é que Tito foi pioneiro ao mudar do Marxismo em direção a uma filosofia individualista e uma economia de mercado.

[7] É difícil, claro, ver como serviços intangíveis poderiam ser produzidos sem “alienação”. Como um professor poderia, por exemplo, ensinar, se ele não pode “alienar” seus serviços de ensino ao fornecê-los para os seus estudantes?

[8] Assim, ver Alexander Gray, The Socialist Tradition (Londres: Longmans, Green, 1947), pp. 306, 328.

[9] Karl Marx, Crítica do Programa de Gotha (Nova Iorque: International Publishers, 1938), p. 10.

[10] Citado em Gray, The Socialist Tradition, p. 328. Gray divertidamente adiciona: “Um breve fim de semana numa fazenda deve ter convencido Marx que o próprio gado poderia ter alguma objeção a ser tocado dessa maneira causal, ao anoitecer.”.

[11] August Bebel, em Women and Socialism. Citado em Mises, Socialism, p. 190n.

[12] Um noticiário recente revelou que a China agora abrandou seu ataque contra o trabalho intelectual. A política de intercambiar estudantes e trabalhadores parece ter dado muito errado, e foi descoberto que “uma falta de professores e treinamento técnico tem impedido o desenvolvimento industrial e a produção nos anos recentes”. Além disso, “os trabalhadores normalmente não parecem ter sido fortificados, mas sim mais abrandados devido à sua exposição a uma vida mais sedentária, assim como muitos estudantes, ao invés de achar a vida na fazenda gratificante, fugiram da China ou se mataram.”. Lee Lescase, “China Softens Attitude on Profs. School Policy,” The Washington Post (Juho 23, 1970), p. A12.

[13] Sobre os socialistas Utópicos, ver Mises, Socialism, p. 168.

[14] É provável que a devoção particular de Mão ao ideal comunista tenha sido influenciada pelo fato de ter sido um anarquista antes de se tornar um Marxista.

[15] Citado em Gray, The Socialist Tradition, p. 328.

[16] Itálicos como em V.I. Lenin, Left-Wing Communism: An Infantile Disorder (Nova Iorque: International Publishers, 1940), p. 34.

[17] Mises, Socialism, p. 190.

[18] Gray, The Socialist Tradition, p. 328.

[19] Citado em Mises, Socialism, p. 164.

[20] Assim, uma das principais críticas ao jornal da New Left, The Guardian, por parte de seu dissidente, The Liberated Guardian, foi que o primeiro funcionava da mesma forma que qualquer revista “burguesa”, com editores especializados, datilógrafos, revisores, administradores, etc. O segundo é dirigido por um “coletivo” no qual, declaradamente, todos cumprem todas as tarefas sem especialização. A mesma crítica, bem como a mesma solução, foi aplicada pela cúpula feminina que confiscou o semanal da New Left, Rat. Alguns dos grupos de “Libertação Feminina” foram tão extremados na tarefa de extirpar a individualidade ao recusar a identificar os nomes dos membros individuais, escritores ou porta-vozes.

[21] Dessa forma, foi um choque para os comunistas ortodoxos pelo mundo o programa de 1958 da Liga dos Comunistas da Iugoslávia, que declarou que o “interesse pessoal do indivíduo… é a força motriz de nosso desenvolvimento social… A objetividade da categoria de interesse pessoal reside no fato de que o socialismo [Iugoslavo]… não pode sujeitar a felicidade pessoal do ser humano à “fins” ulteriores e à “metas superiores”, pois a meta superior do socialismo é a felicidade pessoal do ser humano”. De Kommunist (Belgrado), 8 de Agosto 8, 1963. Citado em R. V. Burks, “Yugoslavia: Has Tito Gone Bourgeois?” East Europe (Agosto, 1965), pp. 2-14. Ver também T. Peter Svennevig, “The Ideology of the Yugoslav Heretics,” Social Research (Primavera, 1960), pp. 39-48. Para ataques de comunistas ortodoxos, ver Shih Tung-Hsiang, “The Degeneration of the Yugoslav Economy Owned by the Whole People,” Peking Review (12 de Junho, 1964), pp. 11-16; e “Peaceful Transition from Socialism to Capitalism?” Monthly Review (Março, 1964), pp. 569-590.

[22] John W. Aldridge, In the Country of the Young (Nova Iorque: Harper & Row, 1970).

[23] Citado em Mises, Socialism, p. 304.

[24] Sobre a forte influência desses pensadores reacionários sobre o anti- individualismo dos Marxistas e socialistas do século XIX, ver em particular Leon Bramson, The Political Context of Sociology (Princeton: Princeton University Press, 1961), pp. 12-16 e passim.

[25] Ver a crítica de Ellul em Charles Silberman, The Myths of Automation (Nova Iorque: Harper & Row, 1966), pp. 104-105.

[26] Assim, ver o atento artigo satírico de Tom Wolfe, “Radical Chic: That Party at Lenny’s,” New York (8 de Junho, 1970).

[27] Essa adoração do primitivo permeia o livro de Polanyi, que em certo ponto seriamente aplica o termo “nobre selvagem” aos cafres da África do Sul. Karl Polanyi, The Great Transformation (Boston: Beacon Press, 1957), p. 157.

[28] Tanto os aspectos passivos quanto os tribais da cultura da New Left estavam incorporados em seu ideal da “Nação Woodstock”, na qual centenas de milhares de jovens indiferenciados, partes do rebanho, rolavam passivamente na lama ouvindo seu ritual musical tribal.

[29] A frase original é: “Rather than consent to have the bloom taken off things by analysis one should, as Coleridge tells us, sink back to the devout state of childlike wonder.” [N. T]

[30] Irving Babbitt, Rousseau and Romanticism (Nova Iorque: Meridian Books, 1955), pp. 53-54. A ênfase da New Left na passividade, primitivismo, no irracional, e na dissolução da individualidade pode responder pela atual popularidade da filosofia Taoísta e Budista. Ver ibid., pp. 297ff.

[31] Mises, Socialism, p. 304.

[32] Mises, Socialism, p. 305.

[33] Silberman, The Myths of Automation, pp. 104-105.

[34] A magia usada por tribos primitivas não é uma evidencia da superioridade dos meios superiores, “idealistas” opostos aos mundanos, “materialistas”. Pelo contrário, os ritos mágicos eram meios errôneos e não confiáveis através dos quais as tribos tentavam obter tais fins materialistas como uma boa colheita, chuvas, etc. Assim, o Cargo Cult da Nova Guiné, ao observar os europeus obtendo comida pelo além mar mandando pedaços de papel, imitava os europeus escrevendo frases ritualistas em tiras de papel e as mandavam para o mar, esperando depois os cargueiros. Cf. Ludwig von Mises, Epistemological Problems of Economics (Princeton: D. Van Nostrand, 1960), pp. 62-66, 102-105.

[35] Bronislaw Malinowski, Magic, Science, Religion and Other Essays (Nova Iorque: Doubleday Anchor Books, 1955), pp. 27-31. Ver também Mises, Epistemological Problems of Economics.

[36] Ver a discussão inspiradora em Peter T. Bauer, West African Trade (Cambridge: Cambridge University Press, 1954).

[37] Bernard J. Siegel, “Review of Melville J. Herskovits, Economic Anthropology,” American Economic Review (Junho, 1953), p. 402. Sobre o individualismo crescente nos Pondos da África do Sul, ver Bauer e Yamey, The Economics of Underdeveloped Countries, p. 67n. Ver também Raymond Firth, Human Types (Nova Iorque: Mentor Books, 1958), p. 122; Sol Tax, Penny Capitalism: A Guatemalan Indian Economy (Washington, D.C., 1953); e Raymond Firth e Basil S. Yamey, eds., Capital, Saving and  Credit  in  Peasant  Societies (Chicago: Aldine, 1963).

[38] Bauer, West African Trade, p. 8. Also see Bauer and Yamey, The Economics of Underdeveloped Countries, pp. 64-67. Similarmente, Professor S. Herbert Frankel mostra como os africanos ocidentais habitualmente esperam nas entradas de bancos para abordar seus parentes enquanto eles saem e demandar dinheiro. Qualquer pessoa que acumule dinheiro deve penar para enganar seus parentes quanto a seu status atual. Citado em Helmut Schoeck, Envy: A Theory of Social Behaviour (Nova Iorque: Harcourt, Brace & World, 1970), pp. 59-60. Sobre a reatividade dos nativos africanos à incentivos da economia de Mercado, ver (além de Bauer, (West African Trade) Peter Kilby, “African Labour Productivity Reconsidered,” Economic Journal (Junho, 1961), pp. 273-291.

[39] Os trabalhos citados são Clyde Kluckhohn, The Navaho (Cambridge: Harvard University Press, 1946) e Navaho Witchcraft (1944; Boston: Beacon Press, 1967); Allan R. Holmberg, Nomands of the Lon Bow: The Siriono of Eastern Bolivia (Washington, D.C.: U.S. Government Printing Office, 1950); Sol Tax, “Changing Consumption in Indian Guatemala,” Economic Development and Cultural Change (1957); e Oscar Lewis, Life in a Mexican Village: Tepoztlan Restudied (Urbana, Ill.: University of Illinois Press, 1951). Ver Schoeck, Envy, pp. 26-61.

[40] Clyde Kluckhohn, The Navaho and Navaho Witchcraft, p. 50.

[41] De Gerardo e Alicia Reichel-Dolmatoff, The People of Aritama-The Cultural Personality of a Colombian Mestizo Village (Chicago: University of Chicago Press, 1961), p. 396. Citado em Schoeck, Envy, pp. 51-52.

[42] Watson e Samora, American Sociological Review (1954), pp.

[43] Eric Wolf, American Anthropologist (1955), pp.

[44] Reichel-Dolmatoff, The People of Aritama, Citado em Schoeck, Envy, p. 47.

[45] Reichel-Dolmatoff, The People of Aritama, Citado em Schoeck, Envy, pp. 31.

[46] Mises, Socialism, pp. 463-464. Ver também José Ortega y Gasset, The Revolt of the Masses (Nova Iorque: W. W. Norton, 1932), pp. 63-65.

[47] José Ortega y Gasset, The Revolt of the Masses (Nova Iorque: W. W. Norton, 1932), pp. 97.

[48] José Ortega y Gasset, The Revolt of the Masses (Nova Iorque: W. W. Norton, 1932), pp. 98, 84. Para Ortega, o grande perigo avultante é que o homem das massas irá cada vez mais usar o Estado “para esmagar qualquer minoria criativa que o perturbe, o perturbe em qualquer estado de coisas: na política, na indústria.” Ibid., p. 133.

[49] Roger J. Williams, Free and Unequal: The Biological Basis of Individual Liberty (Austin, Texas: University of Texas Press, 1953), pp. 4-5. Williams adiciona: “O nosso amor pela liberdade, que parece ser inerente em todos, não reside diretamente em nossas desigualdades? Se ao nascer todos nós possuíssemos os mesmos gostos potenciais… preocupar-nos-íamos em ser livres para persegui-los como individualmente os desejássemos? … Parece-me claro que a ideia de liberdade surgiu diretamente de nossa variabilidade humana. Se todos nós fossemos idênticos, não haveria razão para desejar a liberdade; ‘viver minha própria vida’ seria uma expressão vazia, sem significado”. Ibid., pp. 5, 12.

[50] Herbert Spencer, Social Statics (London: John Chapman, 1851), pp. 76-78. No restante do livro, Spencer desenvolve as implicações concretas do seu princípio básico. Para uma crítica da Lei de Igual Liberdade, ver Murray N. Rothbard, Power and Market (Menlo Park, Calif.: Institute for Humane Studies, 1970), pp. 159-160.

[51] Esse tipo de relação de respeito e “submissão” espontânea numa sociedade livre não possui parentesco algum com as relações autoritárias advindas de uma sociedade pautada na agressão (sociedade estatal). Como se tratam de relações voluntárias, qualquer comportamento considerado excessivamente autoritário seria automaticamente retaliado com o rompimento da associação. Uma posição de status numa sociedade livre teria que ser exclusivamente conquistada de forma cooperativa, e não de uma forma agressiva, como é o caso em uma sociedade estatal.

[52] Robert Michels, Political Parties (Glencoe, Ill.: Free Press, 1949). Ver também o brilhante trabalho de Gaetano Mosca, The Ruling Class (Nova Iorque: McGraw-Hill, 1939), que se fica na inevitabilidade de uma “classe dominante” minoritária exercendo poder no governo.

[53] H. L. Mencken, A Mencken Crestomathy (Nova Iorque: Alfred A. Knopf, 1949), p. 145.

[54] Albert Jay Nock, Memoirs of a Superfluous Man (Nova Iorque: Harper, 1943), p. 121.

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