Em seu livro Ação Humana, Ludwig von Mises escreveu que os sindicatos sempre foram a fonte primária de propaganda anticapitalista. Lembrei-me disso recentemente ao ver um adesivo de pára-choque aclamando um dos credos fundamentais do sindicalismo: “O movimento sindical: as pessoas que lhe trouxeram o fim de semana”.
Não exatamente. Nas últimas décadas do século XIX, a semana de trabalho era de, em média, 61 horas de trabalho. Atualmente, nos países mais ricos, ela é de 34 horas. E esta quase duplicação do tempo de lazer para os trabalhadores foi possibilitada pelo capitalismo, e não pelo sindicalismo.
Como explicou Mises: “Na sociedade capitalista prevalece uma tendência de contínuo aumento da quota de capital investido per capita. … Consequentemente, a produtividade marginal do trabalho, os salários reais e o padrão de vida dos assalariados tendem a aumentar continuamente.”
É claro que isso só ocorre em economias capitalistas em que a prevalecem a propriedade privada, a livre iniciativa e o empreendedorismo. O contínuo aumento observado no padrão de vida dos países (predominantemente) capitalistas se deve aos benefícios gerados pelo investimento em capital, pelo empreendedorismo, pelo avanço tecnológico, e por uma força de trabalho mais bem educada (e não à educação estatal, que serviu apenas para tornar a população mais ignorante).
Os sindicatos rotineiramente conseguem um feito inegavelmente astuto: eles conseguem ganhar o crédito por essas melhorias ao mesmo tempo em que defendem políticas que afetam e obstruem justamente as instituições do capitalismo que são a causa da prosperidade deles próprios.
A semana de trabalho mais curta é uma invenção inteiramente capitalista. À medida que os investimentos em capital — isto é, em máquinas, equipamentos e instalações mais modernas — levaram a um aumento na produtividade marginal dos trabalhadores ao longo do tempo, foi possível que uma quantidade menor de trabalho gerasse os mesmos níveis de produção. À medida que a concorrência por mão-de-obra foi se tornando mais intensa, vários empregadores passaram a competir pelos melhores empregados. E esta competição se deu de duas maneiras: oferecendo salários maiores e horas de trabalho menores.
Aqueles que não oferecessem semanas de trabalho menores eram obrigados pelas forças da concorrência a compensar esta desvantagem oferecendo salários maiores — caso contrário, estes empreendedores se tornariam pouco competitivos junto ao mercado de trabalho, ficando sem mão-de-obra qualificada.
A concorrência capitalista, não obstante as alegações contrárias dos sindicalistas, também explica por que o “trabalho infantil” desapareceu nos países ricos. Antigamente, os jovens deixavam o campo e iam para a cidade trabalhar sob condições severas nas fábricas porque isso era uma questão de sobrevivência para eles e para suas famílias. Porém, à medida que os trabalhadores foram se tornando mais bem pagos — graças aos investimentos em capital e aos subsequentes aumentos na produtividade —, um número cada vez maior de pessoas passou a poder se dar ao luxo de manter seus filhos em casa e na escola.
As legislações, apoiadas pelos sindicatos, proibindo o trabalho infantil só surgiram depois que o trabalho infantil já havia declinado.
Ademais, as leis contra o trabalho infantil aprovadas nos séculos seguintes sempre foram de cunho protecionista e sempre tiveram o objetivo de privar os mais jovens da oportunidade de trabalhar. Dado que o trabalho infantil, em várias ocasiões, concorria com a mão-de-obra sindicalizada, os sindicatos se esforçaram ao máximo para usar o poder do estado com o intuito de privar os mais jovens do direito de trabalhar.
Atualmente, nos países mais atrasados, o amor incontido dos sindicalistas às crianças fez com que a alternativa ao “trabalho infantil” passasse a ser a mendicância, a prostituição, o crime e a inanição. Os sindicatos absurdamente proclamam estar adotando uma postura altamente moral ao defenderem políticas protecionistas que inevitavelmente levam a estas desumanas consequências.
Os sindicatos também se vangloriam de ter defendido todas as legislações sobre segurança do trabalho impostas pelo Ministério do Trabalho e similares agências governamentais. É fato que os ambientes de trabalho são hoje muito mais seguros do que eram há mais de um século, mas isso foi também uma consequência das forças da concorrência capitalista, e não das regulamentações defendidas pelos sindicatos.
[N. do E.: ainda hoje, há pessoas que realmente acreditam que no século XVIII havia o mesmo tanto de riqueza que há hoje, de modo que, se os salários eram baixos (comparado aos padrões de hoje), se a segurança no trabalho era precária (de novo, comparado aos padrões de hoje) e se mulheres e crianças trabalhavam, isso só ocorria porque os malditos e gananciosos capitalistas se recusavam a prover segurança e salários altos, e obrigavam mulheres e crianças a trabalhar.
Tais pessoas realmente acreditam que bastava apenas um decreto governamental para que um trabalhador em 1750 gozasse dos mesmos confortos, segurança no trabalho e níveis salariais vigentes hoje! É inacreditável. Para quem está acostumado a todas as comodidades e confortos do século XXI, é claro que as condições de vida do século XVIII pareciam “sub-humanas”.
Falar que a qualidade de vida era ruim nos séculos XVIII e XIX tendo por base o século XXI, e daí tirar conclusões, é vigarice intelectual. Tal postura ignora toda a acumulação de capital que ocorreu ao logo dos séculos seguintes. Era simplesmente impossível ter nos séculos XVIII e XIX a qualidade de vida que usufruímos hoje no século XXI, a segurança no trabalho, e a renda. Naquela época, não havia a mesma acumulação de capital que temos hoje. A produtividade era menor, os investimentos eram menores, a quantidade e a variedade de bens e serviços eram menores. Era impossível ter naquela época a mesma quantidade de comodidades que temos hoje.
Trabalhar muito e receber pouco não era uma decisão de capitalistas maldosos. Era a necessidade da época. Quem realmente acredita que era possível trabalhar 6 horas por dia nos séculos XVIII e XIX e ainda assim viver bem não entende absolutamente nada de economia. Tal raciocínio parte do princípio de que vivemos no Jardim do Éden, que a riqueza já está dada, e que tudo é uma mera questão de redistribuição.]
Ambientes de trabalho perigosos e precários são extremamente custosos para os empregadores, pois eles são obrigados a oferecer uma diferença compensadora (salários maiores) para conseguir atrair mão-de-obra. Mais ainda: a diferença salarial teria de ser muito alta para atrair trabalhadores qualificados, que é o que todo empregador realmente quer.
Sendo assim, qualquer empreendedor possui um poderoso interesse financeiro em aperfeiçoar a segurança de seu ambiente de trabalho, especialmente nas indústrias, onde os salários normalmente são a maioria dos custos totais. Adicionalmente, caso o mercado de trabalho seja livre, permitindo ampla liberdade de mobilidade para os trabalhadores e ampla oferta de trabalho, empregadores que não aumentarem continuamente tanto a segurança quanto os salários de seus empregados irão perder mão-de-obra.
Toda perda de mão-de-obra implica grandes custos para os empregadores, que têm de arcar com os custos da mão-de-obra perdida, treinando e qualificando novos empregados. Da mesma maneira, quanto menor for a segurança no trabalho, maiores serão os gastos com compensações trabalhistas em decorrência de acidentes de trabalho — para não mencionar a simples ameaça de processos.
Investimentos em tecnologia — desde tratores e retroescavadeiras com ar condicionado aos robôs utilizados nas fábricas de automóveis — também tornaram o ambiente de trabalho mais seguro. No entanto, os sindicatos quase sempre se opuseram a estas tecnologias, recorrendo ao argumento ludita de que elas “destroem empregos”.
Mises estava certo ao dizer que os sindicatos sempre foram uma das principais fontes de propaganda anticapitalista. Porém, desde que ele escreveu Ação Humana, os sindicatos também se tornaram a principal frente de esforços lobistas em prol da regulamentação e da tributação de empresas, algo que serve apenas para destruir seu capital e consequentemente impedir aprimoramentos na produção e na segurança do trabalho.
Isso obstruiu severamente o progresso da economia de mercado, fazendo com que todos, inclusive os sindicalistas, ficassem em uma situação pior do que poderiam estar em termos econômicos. As regulamentações impostas sobre as empresas por burocracias federais, estaduais e municipais constituem um tributo efetivo sobre os investimentos em capital, fazendo com que tais investimentos sejam menos lucrativos.
Menos investimentos em capital geram um declínio no crescimento da produtividade da mão-de-obra, o que por sua vez diminui o crescimento dos salários e do padrão de vida.
Adicionalmente, um aumento mais lento da produtividade leva a um aumento mais lento de tudo o que é produzido na economia, fazendo com que os preços de bens e serviços sejam maiores do que seriam em um contexto de maior liberdade. Adicionalmente, uma quantidade menor de produtos será inventada e comercializada.
Tudo isso é prejudicial para a economia e para o bem-estar daquelas mesmas pessoas que os sindicatos alegam “representar”. (Inacreditavelmente, existem economistas que afirmam que os sindicatos são bons para a produtividade. Se isso fosse verdade, as empresas estariam recrutando sindicalistas, e não se esforçando para tentar impedir a sindicalização de seus empregados.)
Mises também demonstrou que, à medida que as empresas vão se tornando mais estritamente reguladas, suas decisões empreendedoriais vão se tornando cada vez mais baseadas na aquiescência aos ditames governamentais e não na busca pelo lucro. Os sindicatos continuam a clamar por mais regulamentações porque, para poderem sobreviver, eles têm de convencer os trabalhadores — e a sociedade — de que “as empresas são o inimigo”. É por isso que, como observou Mises, a propaganda sindicalista sempre foi anticapitalista. Os trabalhadores supostamente necessitam de ser protegidos do “inimigo” pelos sindicatos.
Mas a realidade é que substituir decisões que visam ao lucro pela mera complacência à burocracia é uma postura que reduz a lucratividade sem trazer benefício algum para ninguém. O resultado final será, mais uma vez, uma redução na lucratividade do investimento e uma subsequente redução na quantidade de investimentos. Os salários estagnam e qualidade de vida fica abaixo do potencial, graças à autodestrutiva propaganda sindical.
As altas hostes sindicais, extremamente bem remuneradas, conseguem manter seus empregos e seus privilégios ao perpetuarem tais propagandas. Vários líderes sindicais conseguem se tornar políticos bem-sucedidos. Mas o que eles realmente fazem é prejudicar exatamente aquelas pessoas que compulsoriamente pagam as taxas que são utilizadas para sustentar seus luxos.