O catolicismo e o austrolibertarianismo

10
Tempo estimado de leitura: 69 minutos

Introdução

Algo me intrigava, eu já participei de várias bolhas da internet, mas nunca encontrei tantos católicos quanto na bolha do austrolibertarianismo. “Era influência do Kogos”, eu pensava, cada vez mais percebemos o quão Paulo Kogos é influente, até em relação a pessoas que não são libertárias. Mas não, isso não foi iniciado pelo youtuber economista, pois até uns dos primeiros anarcocapitalistas do Brasil, os irmãos Chiocca, fundadores do Instituto Mises Brasil em 2007, e que em 2015 mudou de nome e agora segue como Instituto Rothbard, são católicos. O anarcocapitalista mais famoso da argentina, Javier Milei, também é, e ele luta diariamente contra a mentalidade progressista tão enraizada em seu país. O anarcocapitalista mais famoso da Espanha também é católico, o economista e professor universitário Jesús Huerta de Soto. Na Galícia, outro católico anarcocapitalista, o professor Miguel Anxo Bastos, preside a Asociación Xoán de Lugo, que inclusive conta com um padre como membro. Jörg Guido Hülsmann, professor alemão que leciona na França, um dos maiores nomes atuais da Escola Austríaca e autor da monumental biografia de Mises, também é católico. O fundador e chairman do Mises Institute e adepto da filosofia do Paleolibertarianismo (um libertarianismo conservador e cristão, em oposição aos degenerados seguidores de Ayn Rand), Lew Rockwell também é católico. Até mesmo o historiador e professor universitário, escritor do Best-seller Como a Igreja Católica construiu a Civilização Ocidental e apresentador de documentários como “Igreja Católica Construtora da Civilização”, Thomas Woods também é um libertário católico.

Toda essa associação de pessoas católicas em uma filosofia política não é coincidência. A Escola Austríaca de Economia é a base da epistemologia que esses grandes nomes seguem. A Escola Austríaca, diferente de outras escolas de pensamento econômico, não se baseia em iluministas e maçons (inclusive, ela criticava muito Smith e Ricardo, no grande debate sobre o método). Desde sua fundação, com Carl Menger, a Escola Austríaca segue primordialmente teorias e postulados deduzidos por estudantes de teologia, padres e filósofos tomistas da Escola de Salamanca. Em “Princípios de Economia e Política”, de 1871, Menger cita o arcebispo Diego de Covarrubias y Leyva (1512-1577). Friedrich A. Hayek também dizia que os princípios teóricos da economia de mercado, assim como os elementos básicos do liberalismo econômico, não foram concebidos, como geralmente se acredita, pelos calvinistas e protestantes escoceses. Ele chegou ao ponto de citar dois escolásticos de Salamanca em seu discurso de vencedor do prêmio Nobel de economia em 1974: Luís de Molina (1535-1600) e João de Lugo (1583-1660). Entender isso é fundamental para responder toda crítica soberba de tradicionalistas que consideram o livre mercado como um fruto da modernidade: ele não é, e nem a Escola Austríaca! (algo que me deixa intrigado é jovem metido a facho chamando o livre mercado de modernista, mas defendendo nacionalismo, nação geograficamente grande e ordenamento social centralizado em uma figura. Isso sim foge totalmente da normalidade que havia na baixa idade média, além de abrir margens para maiores deturpações. Com um estado geograficamente grande, o indivíduo terá de andar mais tempo caso o líder queira arbitrar em instituições importantes, fazendo com que seu poder se torne quase que ilimitado).

Metodologia

Os autores da Escola Austríaca tiveram intensos debates contrários a outras vertentes de pensamento que eram dominantes em sua época e que consideravam que as verdades e a relação de causa e efeito mudavam em relação ao contexto histórico e cultural, como a Escola Historicista Alemã. A Escola Austríaca utiliza um método de deduções de postulados universais com base em verdades auto evidentes. Utiliza a razão para compreender a sociedade e todas as relações de causa e efeito das trocas voluntárias interpessoais. Falarei mais sobre isso futuramente, porém é necessário que nós, católicos, compreendamos as leis econômicas como universais, elas precisam ser, pois a realidade é ordenada. 1+1 será 2 em qualquer local que estejamos, pois a Bíblia incessantemente proclama que a regularidade dos fenômenos naturais é o reflexo da bondade, da beleza e da ordem de Deus. Esse fato é um grande diferencial entre católicos e islâmicos. O islã crê que o mundo em que habitamos é caótico, é irracional e incompreensível, enquanto que apenas o paraíso deles é ordenado. Católicos entendem que o mundo é ordenado, belo e deve ser compreendido pela mente humana por meio de postulados matemáticos e racionais. Foi por conta disso que a Igreja Católica foi a maior patrocinadora da ciência em toda a história da humanidade. Então, devemos acreditar na teoria da causa e efeito e não podemos epistemologicamente fugir dos efeitos lógicos de uma causa lógica.

A Escola Austríaca de Economia usa a metodologia da praxeologia, desenvolvida por Ludwig von Mises, que estuda as ações propositadas dos indivíduos (ações involuntárias não estão no ramo da praxeologia austríaca). A praxeologia parte do axioma de que o indivíduo age, e até mesmo ficar parado para tentar desobedecer esse postulado acaba sendo uma ação. O ser humano age propositalmente com o intuito de sair de um estágio de menor satisfação em direção a um estágio de maior satisfação, sendo satisfação entendida como uma noção de “bem maior” (por exemplo: alguém que acorda cedo para estudar filosofia. Ele só faz isso por acreditar que seria melhor ele fazer essa ação do que não fazer, por estudar filosofia lhe trazer maior satisfação intelectual do que se ele estivesse praticando outra ação aleatória). E o indivíduo busca esse “bem maior”, essa “satisfação”, ou como você queira chamar, com base nas informações que ele obtêm. Informações essas que podem ser verdadeiras, falsas ou incompletas, e em alguns casos as informações estão constantemente mudando, é por isso que alguns projetos de humanos podem falhar.

O ser humano age com o intuito de sair de um estágio de menor satisfação para ir a um estágio de maior satisfação, e ele faz isso por meio de escolhas. Fazer escolhas nos leva a uma conclusão lógica: escassez. Se não houvesse escassez, não seria necessário fazer escolhas, pois toda ação poderia acontecer. E não há escassez apenas de objetos físicos, mas também há escassez de tempo e escassez de corpos. Ora, eu só não posso dirigir um carro ao mesmo tempo em que eu limpo minha casa, pois há uma escassez de corpos, pois eu só tenho um corpo, e por isso eu devo fazer escolhas.

Eu já debati com um amigo, que afirmava que a praxeologia é uma metodologia anti-católica, pois, segundo ele, afirma que todos buscam satisfação e interesse pessoal, o que iria contra o conceito de virtude. A confusão dele era razoável, a terminologia “satisfação” pode deixar a entender que se trata apenas de confortos mundanos, mas não é sobre isso. É sobre a ideia de que o ser humano age propositalmente visando o que ele considera ser o melhor a ser feito, não está implícito um “egoísmo altruísta” de Ayn Rand aqui. Meu amigo usou o exemplo de Jesus: “Como Cristo pode escolher a sua morte visando uma maior satisfação?”. Obvio, não é fácil compreender 100% de como funcionava a cabeça de Deus – é como um menino pensar que consegue levar toda a água do mar em baldes para um buraco que ele fez na praia (referência a Santo Agostinho e sua tentativa de compreender a santíssima trindade), mas Deus, que se fez homem, tinha todas as informações, e mesmo assim optou por encarar sua morte na cruz ao invés de fugir. Isso só pode ser concebido se ele acreditasse que esse destino era melhor que os outros destinos que poderiam ter ocorridos.

São Tomás de Aquino corrobora com a praxeologia. Em “Suma Contra os Gentios”, o santo afirma que ao agir, todo agente pretende alcançar um fim, e todo agente age com vistas a um bem. Ele também afirma que indiferenças diante de alternativas não faz surgir uma ação:

“Agora, aquele que olha com indiferença para uma grande variedade de coisas não tem, ao realizar uma delas, êxito maior que em outra. Daí se conclui que um agente eventualmente indiferente a alternativas não pode causar nenhum efeito, a menos que ele esteja determinado a acarretar certo efeito por algo. Portanto, ser-lhe-ia impossível agir.”

Isso, pois ao agir, o indivíduo escolhe entre várias possibilidades, visando atingir o que ele considera ser um bem. O ato de renuncia às alternativas, além da escassez, também nos mostra que há uma hierarquia subjetiva de preferências. Imagine um homem que está há tempos sem consumir água, o primeiro copo de água será muito valorado por ele. A cada vez que acrescenta mais do mesmo produto, mais a avaliação de valor por ele diminuirá. O terceiro copo de água pode ser utilizado pelo homem para lavar a mão, o quinto para tomar banho, o sexto para limpar a mesa… Caso o homem tenha preocupação com o gasto de água patrocinado por ele, ele tenha algo melhor para fazer ou simplesmente a utilidade da água se tornou momentaneamente negativa para ele, provavelmente ele parará seus gastos em algum estágio após o primeiro copo de água. Esse postulado foi chamado por Carl Menger de Teoria da Utilidade Marginal Decrescente, e foi usado como base para afirmar que o valor é subjetivamente fixado pelo indivíduo que percebe suas necessidades.

Em verdade, até mesmo em trocas voluntárias entre indivíduos há o conceito de valor subjetivo. Imagine que José está vendendo seu carro para Adolfo por 300 dólares. Eles não concebem essa troca como uma equivalência entre o dinheiro e o produto, pois se imaginassem assim, não seria necessário haver uma troca. A troca apenas acontece quando ambos valoram a troca de formas diferentes. José apenas vende seu carro, pois ele valoriza mais ter 300 dólares do que ter seu carro, e Adolfo prefere mais ter um carro do que ter seus 300 dólares.

Tais proposições parecem lógicas e simples, mas ficaram na escuridão pela maior parte do tempo. Os primeiros a desenvolverem a teoria do valor subjetivo foram os escolásticos de Salamanca. O bispo de Segóvia, Diego de Covarrubias y Leyva (1512-1577), afirmou em 1555:

“O valor de uma coisa não depende da sua natureza objetiva, mas antes da estimação subjetiva dos homens, mesmo que tal estimação seja insensata”. “… nas índias o trigo vale mais do que na Espanha porque ali os homens o estimam mais, e isso apesar de a natureza do trigo ser a mesma em ambos os lugares”

A tradição subjetivista iniciada por Covarrubias é continuada por outro notável escolástico, Luis Saravia de La Calle, que é o primeiro a tornar clara a verdadeira relação que existe entre preços e custos no mercado, no sentido de que, em todas as situações, são os custos que tendem a seguir os preços e não o contrário, antecipando-se assim na refutação dos erros da teoria objetiva do valor que seria posteriormente desenvolvida pelos teóricos da escola clássica anglo-saxônica. Em “Instrucción de mercaderes”, ele proclama:

“Os que medem o preço justo de uma coisa segundo o trabalho, custos e riscos em que incorre quem produz a mercadoria cometem um grave erro; porque o preço justo nasce da abundância ou falta de mercadorias, de empresários e de moeda, e não dos custos, trabalhos e riscos”

Se os escolásticos tardios tivessem ficado mais famosos em sua época, Adam Smith e David Ricardo não teriam usado a teoria do valor-trabalho em suas teses, e por consequência Karl Marx não teria utilizado a teoria do valor-trabalho como base para desenvolver a mais-valia que resultaria na teoria da luta de classes como epistemologia de análise da história, na teoria do materialismo histórico e dialético marxista. Mas, graças a Deus, a Escola Austríaca de Economia retomou a tradição dos católicos de Salamanca em 1871, e desenvolveu sua teoria, sendo a mais famosa escola de pensamento econômico a realizar esse feito na atualidade.

Eu já vi pessoas criticando a Escola Austríaca e o austrolibertarianismo, alegando ser individualista, e essa é uma confusão comum que até pessoas dentro da bolha cometem. A Escola Austríaca defende sim o individualismo metodológico, que é analisar a sociedade e as ciências sociais baseado nas ações dos indivíduos, e não na ação do coletivo. Isso, para impedir que confusões do tipo “os alemães perseguiam e matavam judeus na década de 1930 e 40” surjam. Ora, nem todos os alemães tinham culpa do ocorrido, havia muitas crianças, inocentes e pessoas sem total noção do que ocorria. O coletivo não age, apenas os indivíduos agem. Não somos o estado, e não existe forma lógica de alegar o oposto. Por isso, deve ser estudado e teorizado as causas e efeitos das ações dos indivíduos, e não do coletivo. Isso não significa que somos individualistas em relação a tudo, e sim apenas ao método de análises. Há muitos austrolibertários que fazem doações e se preocupam com o próximo.

Em 2005, Thomas Woods escreveu o excelente livro A Igreja e o Mercado: Uma Defesa Católica da Economia de Livre Mercado. Dez anos depois, ele escreveu uma segunda edição de seu livro, respondendo criticas que a primeira versão recebeu. Christopher Ferrara o criticava por utilizar a praxeologia de Mises, visto que Mises criticou a igreja católica em vários trechos do livro Socialism de 1922. Ludwig Von Mises teve problemas, nenhum austríaco nega esse fato. Hoppe criticava-o por sua defesa da democracia como superiora à monarquia. Mises não obteve conhecimento sobre a tradição da escolástica tardia, diferente de Rothbard. A contribuição epistemológica de Mises não é apagada por qualquer bobagem que ele tenha argumentado, assim como a maioria dos tomistas desconsideram os textos de São Tomás que denominava toda forma de juros como usura, mesmo usando sua base teórica para outros assuntos. Assim como há luteranos que não agridem fisicamente judeus e assim como Agostinho utilizava da epistemologia aristotélica sem se render ao paganismo de Aristóteles.

Além disso, Mises escreveu livros até os anos 1970, em 1922 ele não havia desenvolvido nem a praxeologia austríaca ainda. Com certeza, ele pode ter mudado de opinião, ainda mais por seus seguidores falarem abertamente sobre a Escola de Salamanca só depois da metade do século XX.

A questão dos juros

Nem sempre os grandes nomes da Igreja Católica acertaram em tudo. São Tomás de Aquino era terminantemente contra a existência de juros (não apenas contra os juros altos, mas contra todas as formas de juros). Na questão 78 da Suma Teológica, o santo afirmava que existiam certas coisas cujo seu uso consistia em seu consumo, como o empréstimo de dinheiro. Ele afirmava, por exemplo, que alugar uma casa não é injusto, pois ao deixar que outra pessoa habite sua casa por um tempo determinado e por um preço X, não faz com que a casa se destrua, mas “alugar” dinheiro é emprestar um bem do qual seu uso gera autodestruição, então os juros sob esse bem seriam injustos.

Com base nisso e no versículo “emprestai sem esperar nada em troca”, os juros foram proibidos em vários locais, sendo chamados de usura. Contudo, até mesmo a Catholic Encyclopedia de 1913 dizia que o versículo se tratava tão somente de uma exortação da benevolência geral e desinteressada, incentivando a doação, e não uma condenação aos juros.

Muitos jesuítas foram eliminando os argumentos contra os juros, como o jesuíta Leonardo Lessius (1554-1623) que argumentava sobre o juro ser justificável, pois quem empresta estaria abrindo mão de consumir por um determinado tempo. Martín de Azpilcueta, em 1556, argumentou “os bens futuros não são tão valorizados como os mesmos bens disponíveis de imediato, nem têm a mesma utilidade para os seus proprietários. Por esta razão, o seu valor de acordo com a justiça há de ser mais reduzido”. É o conceito de preferência temporal. O indivíduo prefere usar seus bens hoje ao invés de amanhã, a não ser que seus bens sejam mais bem empregados no futuro do que hoje.

Poupança é o motor material da civilização, pois quando a civilização consome tudo o que produz, ela não progride. É com acumulo de capital, se abstendo do consumo imediato, que se tornam possíveis empreendimentos e avanços tecnológicos, que tornam o trabalho mais produtivo e consequentemente produtos mais baratos. O empréstimo de dinheiro sob juros trás incentivos para que tais poupanças se tornem prioritárias em relação as outras alternativas, além de causar uma maior racionalização na alocação de empréstimos. Caso você defenda os juros, mas de forma não alta, defenda a liberdade de concorrência entre bancos, agências de empréstimos e aplicativos de empréstimos de dinheiro (com certeza, se não houvesse tanta regulamentação do banco central, haveria aplicativos de celular que facilitasse essa prática entre os próprios usuários, de forma descentralizada), e defenda uma moeda forte anti-inflacionária (de preferência não fiduciária; moeda inflacionária desincentiva pesadamente poupanças) pois são essas coisas que tornam o empréstimo mais acessível.

A DSI

Doutrina Social da Igreja seria o conjunto de encíclicas escritas por papas que comentavam e propunham soluções para certos conflitos em relações interpessoais. Iniciou-se com a Rerum Novarum, escrita em 1891 pelo Papa Leão XIII, em que ele comentava sobre a condição dos operários em uma época de bastante agitação. Ele criticava o socialismo, considerando-o uma ideologia anti-católica, e chegou até a “cristianizar” a ideia de apropriação original de John Locke para defender o direito natural à propriedade privada. Ele escreveu:

“Aqui temos mais uma prova de que a propriedade privada está de acordo com a lei da natureza. Em verdade, grande parte do que é necessário à preservação da vida e seu bem-estar é produzida a partir do solo, mas somente quando o homem a cultiva e lhe dedica sua atenção e habilidade. Agora, quando o homem dirige a atividade de sua mente e a força de sua corpo à obtenção de frutos da natureza, ele torna sua, por essa ação, aquela porção da área natural que assim cultiva – aquela porção em que ele deixa, por assim dizer, a marca de sua personalidade; e não pode ser senão lícito que ele possua essa porção de terra como sua e tenha direito de detê-la sem que ninguém possa, com justiça, violar esse direito.”

Nesse aspecto, a Rerum Novarum se baseou em uma encíclica anterior do Papa Leão XIII, a Quod Apostolic Muneris (1878), em seu discurso contrário ao socialismo. Nessa encíclica, Leão também pregava que a igreja:

“entende que o direito de propriedade e posse, que emana da própria natureza, não deve ser infringido e permanece inviolável, pois ela sabe que o roubo foi proibido de maneira tão especial por Deus, o autor e defensor do direito, que Ele não permitiu que o homem sequer desejasse aquilo que pertencia a outrem.”

O Salário Justo

A Rerum Novarum condenava o socialismo per se, mas não condenava o capitalismo per se, visto que ele é baseado em uma lei natural. Porém, o Papa criticava certos pontos do capitalismo e dava propostas para melhorá-lo. Ele defendia a necessidade de um “salário justo” e se opunha aos trabalhos condenáveis, além de ser contrário às greves trabalhistas. Ele considerava que os salários ditados pelos processos de mercado poderiam ser submetidos à crítica moral de observadores externos em relação a sua capacidade de atender as necessidades materiais dos trabalhadores e deveria ser suficiente para o trabalhador sustentar sua família.

É compreensível para a Igreja descrever a situação ideal do trabalhador como aquela em que seu salário seja o suficiente para atender adequadamente as necessidades materiais de sua família, porém qualquer declaração que pretenda indicar a forma mais eficiente para promover esse resultado afasta-se das áreas da moral e da fé. As pessoas de boa vontade podem discordar com legitimidade, visto que não há nada no carisma da infalibilidade papal que lhe atribua uma compreensão sobrenatural sobre a política econômica. Até o Papa Leão XIII compreendia isso, ele afirmou:

“Se eu me pronunciasse acerca de qualquer aspecto de um problema econômico difundido, estaria interferindo na liberdade dos homens de resolverem seus próprios negócios. Certos casos devem ser solucionados na esfera dos fatos, caso a caso, à medida que ocorrem. Os homens devem realizar, por atos concretos, aquelas coisas cujos princípios já não são possíveis de discussão. É preciso que se deixe a solução de tais coisas ao tempo e à experiência”[1]

Os escolásticos de Salamanca tinham opiniões opostas ao salário mínimo fixado pelo governo. Consideravam o salário justo como sendo o salário que emergia das trocas voluntárias, baseadas nas relações de escassez e necessidade no mercado. O jesuíta Luis de Molina (1535- 1600) ensinava que o proprietário era “obrigado apenas a pagar ao trabalhador o justo salário por seus serviços, levando em conta todas as circunstancias relacionadas ao trabalho, e não o que é suficiente para sua subsistência e menos ainda para o sustento de sua família”. O frade e confessor do imperador Carlos V, Domingo de Soto (1494-1560) era ainda mais conciso em seu pensamento sobre o tema, ele alegava que “se eles (os trabalhadores) aceitaram livremente esse salário por seu trabalho deve ser um salário justo”, pois “nenhum prejuízo é causado àquele que deu consentimento”. Certamente, esses padres não tinham tal posição por mero desprezo contra os pobres, mas por acreditarem que tal regulação econômica iria decair negativamente para o lado mais fragilizado – os pobres. Ambos acreditavam que a fixação de um salário superior à estimativa comum apenas resultaria em desemprego.

Vou ilustrar com um exemplo: Mateus é dono de uma loja de roupas, mas não quer ele mesmo vender roupas para clientes em sua loja, já que ele é tímido. Enquanto que Maria é uma boa vendedora. Maria está ofertando seu serviço de vendedora a Mateus, que está demandando pelo serviço de uma boa vendedora. Uma relação entre eles será mutuamente benéfica. O preço desse serviço não é simplesmente definido pela Maria, pois, se fosse, ela iria desejar receber 1 milhão de reais. O preço também não é definido pelo Mateus, pois, se fosse, ele iria desejar pagar apenas 1 real. O que realmente define um salário é a lei de oferta e demanda. É a relação entre o quanto de vendedores bons existem na cidade, e o quanto de lojas de roupas existem nessa cidade. Se há poucas lojas de roupas, e muitos vendedores bons, então o valor do serviço de vendedor irá baixar, pois é um serviço muito abundante na cidade. Enquanto que, se há muitas lojas de roupas, e poucos vendedores bons, então o valor do serviço do vendedor tende a subir bastante. A mão invisível do mercado regula essas ações, pela lei de oferta e demanda, e incentiva uma relação harmônica na sociedade, com alocações de recursos escassos e de tempo no que realmente é produtivo e racional (por exemplo, se o preço do salário de vendedores de roupa está muito baixo, então é melhor eu me especializar em outro serviço, visto que já têm muitos vendedores de roupas nessa cidade. Devo gastar meu tempo aprendendo outra habilidade. Porém, essa relação só funciona em um livre mercado. Quando há muita presença de regulamentação do estado em certa área econômica, como na área da educação, os salários reais são muito distorcidos).

Caso Mateus queira, então, pagar 1.000 reais para Maria pelo seu serviço de vendedora, e ela aceite, mas o estado coloque o valor do salário mínimo em 1.800 reais, pode ser que Mateus decida desistir desse contrato. Ele pode tentar enfrentar sua timidez e ele mesmo vender seus produtos, sabendo que os custos de encargos trabalhistas, FGTS, o salário mínimo e outros, será mais custoso que enfrentar a timidez. Nessa história, e em muitas outras, o estado acabou com uma livre associação trabalhista. Quando algum encanamento da nossa casa entope, qual o procedimento padrão que normalmente seguimos? Fazemos um levantamento de preços com vários encanadores e contratamos aquele que tem o melhor preço. Se todos os preços forem altos, a maioria de nós irá preferir pegar uma chave inglesa e uma soda cáustica, e fazer o serviço por conta própria. O mercado de trabalho funciona da mesma forma.

Poucos trabalhadores se beneficiam com o salário mínimo. As pessoas que recebem um salário um pouco menor que a do mínimo pode receber um aumento, mas quem está mais abaixo dessa pirâmide, torna-se condenada ao desemprego. As leis trabalhistas incentivam diminuição de empregos existentes, além de fazer com que algumas pessoas se tornem desempregadas eternamente, visto que elas não rendem minimamente o salário mínimo. Isso também causa algumas anomalias econômicas, como o desemprego de jovens. Jovens precisam aceitar qualquer trabalho para ganhar experiência, colocar isso em seu currículo e ter mais chances de conseguir um emprego melhor no futuro. Os jovens precisam fazer isso, pois eles não valem muito sem ter experiência. Porém, empresários não podem contratar esses jovens por um salário menor. Então, se for para escolher entre contratar alguém com experiência por 1.800 mais encargos trabalhistas, ou contratar um jovem sem experiência por 1.800 mais encargos trabalhistas, o empresário tem mais incentivos para contratar a primeira opção. Empregos de formação, como os “entregadores de jornais” nos EUA, para jovens trabalharem, conseguirem um dinheirinho e enriquecer seu currículo, irão sumir, por conta das leis de salário mínimo. Assim como no exemplo anterior, existem certos trabalhos que não são destinados para chefes de família, então não faz sentido que o salário de todos os empregos seja baseado na possibilidade de sustentar materialmente a família do empregado.

O salário mínimo mata regiões menos desenvolvidas de um país. Por que alguém empreenderia em uma região que seria impossível contratar pessoas? O salário mínimo é usado por políticos ligados a lobistas, e grandes CEO’s defendem tal medida, pois o salário mínimo beneficia os ricos, visto que eles conseguem arcar com todos os encargos trabalhistas com facilidade, mas o mesmo não acontece com o pequeno empreendedor. Ele se torna um grande entrave para pequenas empresas locais e independentes das corporações.

Se, sem regulações, empregadores pagariam apenas o mínimo ou menos que o mínimo, então por que há tantos empregados que ganham mais que o salário mínimo, nos dias de hoje?

É impressionante o quanto o senso comum das pessoas não entende as causas e efeitos básicos das alterações dos salários. Eles acreditam que, caso fosse permitido, todos os empresários iriam abaixar ao máximo o salário dos seus empregados. OK, então imagine que todas as empresas, por hipótese, fixassem o salário dos trabalhadores para 1 real. Nesse cenário, elas inevitavelmente deveriam diminuir absurdamente o preço de seus produtos, pois a maioria dos produtos do capitalismo tem os trabalhadores, pessoas de classe baixa e média, como público alvo, visto que eles são a maioria da sociedade. Todo trabalhador é um consumidor. Pouco importa o quanto de dinheiro, o quanto de papel moeda o trabalhador tem, o importante é o poder de compra que o dinheiro do trabalhador tem.

A única forma de aumentar o poder de compra do dinheiro do trabalhador é por meio do aumento da produtividade e da concorrência empreendedorial.  Darei um exemplo: há uma pequena vila em que 30% da população trabalham em plantações de arroz, um produto essencial para a qualidade de vida do povo. Então, um dos trabalhadores decide poupar dinheiro e poupar alimentos, ao invés de consumi-los rapidamente. E então, tendo dinheiro poupado, ele consegue abster-se de trabalhar na plantação e começa a trabalhar no planejamento de um sistema automatizado que consegue recolher todo o arroz de forma mais rápida e com menos mão de obra humana. Graças a isso, ele faz com que a produção seja mais eficiente, mais rápida, aumentando a oferta do arroz e consequentemente tornando o arroz mais barato. E agora, apenas 4% da população da vila trabalham na plantação. Como o arroz e os custos de produção do produto se tornaram mais baratos, a população terá mais dinheiro poupado em suas carteiras, que poderão ser usados para consumir outros tipos de bens e serviços, ou que poderão ser poupados para ser utilizado em futuros investimentos, o que ocasionará, de ambas as formas, em novos empregos para os que saíram da plantação de arroz. Isso é construir riqueza, é ser rico: poder produzir mais e consumir mais com menos trabalho e menos esforço físico. Não é aumentando nominalmente os salários que é aumentado o padrão de vida dos trabalhadores, é tornando o trabalho mais produtivo que o padrão de vida é aumentado. E produtividade é construída por meio do capitalismo (acumulo de capital), e o livre mercado o auxilia, por incentivar a alocações racionais de recursos escassos.

O aumento da produtividade é o resultado inevitável do capitalismo. Então, se você defende o aumento da qualidade material da vida de todos, defenda o capitalismo! Caso houvesse uma confusão temporal causada pelo DeLorean do Marty Mcfly e voltássemos ao ano em que foi escrito a Rerum Novarum, todas nossas televisões, computadores, celulares, esses meios de comunicação deixariam de existir. Ainda não existiria nem rádio, apenas meios de comunicação por telégrafo, para os ricos. A produção de vestuários, comidas e demais produtos ainda não seria tão abundante quanto hoje, e por consequência o seu valor seria demasiadamente caro. Então, iríamos ter que trabalhar muito mais do que hoje, e nosso salário teria muito menos poder de consumo do que hoje.

Por conta disso, crianças trabalhavam para ajudar a sustentar toda sua família, e isso era uma prática comum entre a maioria da população desde sempre, mas foi diminuindo até se tornar quase que inexistente na atualidade, por conta da alta produtividade gerada pelas tecnologias. Criticar os pais de outrora não é sensato, visto que eles só recorriam ao emprego de seus filhos pequenos por conta da urgência por consumo material de comida, vestimenta e entre outros bens. Caso, no começo da primeira revolução industrial, os governos proibissem o emprego de crianças menores de 16 anos, geraria fome aos familiares, e os forçariam a tomar medidas drásticas como empregar seus filhos no mercado negro (prostituição e tráfico de drogas).

De fato, até a Organização Internacional do Trabalho admitiu, em um relatório de 1997, que “a pobreza aparece como motivo mais forte para as crianças trabalharem. Os lares pobres precisam de dinheiro e as crianças costumam contribuir com cerca de 20% a 25% da renda familiar. Como, por definição, esses lares gastam a maior parte de sua renda com alimentação, é evidente que a renda advinda do trabalho infantil é crucial para sua sobrevivência”.

O aumento da produtividade fez naturalmente com que os produtos e serviços se tornassem mais abundantes e baratos, e fez com que os pais pudessem sustentar de forma confortável seus filhos até os 18 anos ou mais, com o objetivo de fazê-los estudarem como forma de investimento para que seus filhos tenham uma profissão melhor no futuro, para promoverem uma vida materialmente confortável também aos pais, na velhice. É o que vemos na Inglaterra, o país em que outrora a maioria do povo era formado por operários miseráveis, hoje seus descendentes estão em universidades.

Deve-se também defender o livre mercado e a ausência de barreiras governamentais para empreendimentos. É com a concorrência entre várias empresas que elas passam a pagar salários mais altos para contratar empregados mais compromissados e que façam um bom trabalho. Uma empresa que paga um salário mais alto que a empresa concorrente, significa que ele atrai melhores funcionários que o concorrente, e deixa no concorrente apenas os piores. Além de que, com o livre mercado, surgem novas especializações e mais divisão do trabalho, que torna mais escasso os profissionais de cada área, o que aumenta o seu valor para a sociedade, e consequentemente seus salários.

Para o caso especifico dos “católicos marxistas”, eu não consigo entender como pode haver cristãos que acreditam na teoria da exploração do trabalho pela mais-valia, sendo que A Parábola dos Trabalhadores da Vinha (Mateus 20:1-16) o refuta. Nele, Jesus Cristo faz uma alusão sobre o Reino dos Céus ser igual a um proprietário que saiu de manhã cedo para contratar empregados para trabalhar em sua produção de vinho. Primeiro, ele faz um acordo com alguns desocupados para eles trabalharem na sua produção de manhã até a noite por um denário. De tarde, ele encontra outros desocupados e faz o mesmo acordo, mas para eles trabalharem de tarde até a noite. Ao cair da tarde, o dono da vinha disse a seu administrador: “Chame os trabalhadores e pague-lhes o salário, começando com os últimos contratados e terminando nos primeiros”. Vieram os trabalhadores contratados à tarde, e cada um recebeu um denário. Quando vieram os que tinham sido contratados primeiro, esperavam receber mais, por terem trabalhado mais. Mas cada um deles também recebeu um denário. Quando receberam, começaram a se queixar do proprietário da vinha, dizendo-lhe: “Estes homens contratados por último trabalharam apenas uma hora, e o senhor os igualou a nós, que suportamos o peso do trabalho e o calor do dia”. Mas ele respondeu a um deles: “Amigo, não estou sendo injusto com você. Você não concordou em trabalhar por um denário? Receba o que é seu e vá. Eu quero dar ao que foi contratado por último o mesmo que lhe dei. Não tenho o direito de fazer o que quero com o meu dinheiro? Ou você está com inveja porque sou generoso?” “Assim, os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos”. Apesar desse não ser o foco da parábola, fica explicito que o salário justo é o salário do qual o empregado e o empregador voluntariamente entraram em acordo, por meio de um contrato (no exemplo da parábola, um contrato verbal). Nem mais e nem menos do que foi aceito voluntariamente por ambas as partes. Sendo alguém o proprietário legítimo de certos recursos, e mantendo a sua palavra dos contratos voluntários de trocas mútuas, o direito desse indivíduo de tomar decisões é absoluto.

Materialismo e Consumismo

É compreensível toda a desconfiança do Papa Leão XIII com a possibilidade do livre mercado suprir materialmente as necessidades dos indivíduos, devido ao contexto e as informações que ele tinha na época. Porém, hoje temos evidências empíricas de como a revolução industrial e a competição entre empresas trouxe comida, vestimenta, energia, tecnologias, informação descentralizada, transportes e entre outros bens de forma abundante e acessível a todos. Fez com que alguém de classe média-baixa de hoje usufrua de bens superiores ao que reis tinham no século XIX. Os tradicionalistas perceberam isso, por isso começaram a usar um argumento totalmente oposto ao do antigo papa para poder deslegitimar o capitalismo de livre mercado. Agora, eles argumentam que o capitalismo trás tantos bens materiais e a tanta gente que gera uma cultura de materialismo e consumismo desenfreado, destruindo as virtudes dos indivíduos. Alguns chegam ao ponto de defender uma sociedade agrícola de subsistência, rejeitando a produtividade das indústrias para forçadamente empobrecer todos e forçar virtudes (sim amiguinho, olhe os mendigos da rua, como são virtuosos!).

Essa troca de lógica é absurda, pois os miseráveis acabam desejando ainda mais bens materiais, pelo simples fato deles necessitarem ainda mais deles. Lógico, quando estamos muito tempo sem consumir água, desejamos muito mais matar a sede, e poderemos passar a recorrer à religião apenas por interesse próprio, para orar com o intuito de suprir essa necessidade material. Não é à toa que existem tantos pobres materialistas. Bens materiais são extremamente necessário sim, Primum vivere, deinde philosophari. É necessário alimentação para posteriormente se preocupar com os mistérios transcendentais. Claro, há os franciscanos, mas escolher se negar à riqueza e viver a pobreza é um ato voluntário, proposital e ordenado. Não devemos incentivar ladrões que roubem nossos bens apenas para nos forçar a caridade, pois esse sim seria um grande pecado.

A agricultura de subsistência já matou muitas crianças, que nunca foram capazes de serem batizadas ou terem uma capacidade racional plena. Os indicies de mortalidade infantil é absurdamente minúscula hoje, em relação há 50 anos, imagine há séculos!

A Escola Austríaca não incentiva o consumismo, muito pelo contrário, ela defende e incentiva a poupança, o acumulo de capital, como motor dos avanços tecnológicos, aliado com a racionalização da alocação dos recursos escassos. São outras escolas do pensamento econômico que defendem o consumismo desenfreado e irracional como motor da economia, como o keynesianismo que pede por uma baixa taxa de juros, por meio do banco central, apenas com o intuito de gerar consumo.

A Escola Austríaca não favorece algo apenas por ser eficiente, apenas por A trazer mais bens materiais do que um não A, diferente de outras escolas do pensamento econômico. Por exemplo, se uma grande empresa quisesse alagar uma certa região para construir uma hidroelétrica e trazer energia barata para toda a cidade, ainda assim ela só poderia fazer isso caso os donos daquelas terras concordassem. Mesmo que trazer energia para todos fosse um bem mais valorizado pela maioria dos habitantes daquela cidade do que ver alguns poucos miseráveis terem suas casas alagadas, ainda assim seria imoral e seria criticado pelos austríacos (como de fato foi, em vários outros exemplos do embate entre eficiência e ética). Os habitantes daquela vila, que poderá ser alagada, são quem devem decidir se querem vender suas terras ao empresário da hidrelétrica ou não, pois eles são soberanos sob suas propriedades, e não o resto daquela cidade.

A cultura consumista na sociedade também é patrocinada por programas governamentais do estado que destroem o princípio de subsidiariedade e a relação natural entre familiares, mas irei falar mais sobre isso ao decorrer desse artigo.

A inflação também gera a cultura consumista, visto que ela desincentiva a poupança. Inflação é comum em uma sociedade que usa moeda fiduciária emitida por um banco central, controlada por um governo e sem limites para o aumento de sua oferta. O dinheiro é uma mercadoria como qualquer outra, mas ele é uma mercadoria usada como meio de troca, as causas e efeitos da oferta e demanda interferem no seu valor. Quando há mais dinheiros do que antes, mas continua havendo os mesmos produtos na sociedade, então naturalmente o valor real do dinheiro irá cair. Logo, quem tem dinheiro guardado vai perder valor, então é melhor trocar dinheiro por bens materiais o quanto antes. Caso queira se proteger disso e queira uma mercadoria usada como meio de troca que não tenha esses problemas, compre ouro ou bitcoin!

Inflação é uma forma de obtenção de dinheiro muito praticada pelos governos que controlam suas moedas, pois conseguem verba sem irritar diretamente a população com aumento de impostos. Um exemplo para ilustrar como funciona a inflação:

O governo, quando emite dinheiro para custear uma guerra, tem de comprar munições. Os primeiros a receber o dinheiro adicional são, então, as indústrias de munição e os que nelas trabalham. Esses grupos passam a ocupar uma posição privilegiada. Auferem maiores lucros e ganham maiores salários: seus negócios prosperam. Por quê? Porque foram os primeiros a receber o dinheiro criado recentemente. E, tendo agora mais dinheiro à sua disposição, estão comprando mais. E compram de outras pessoas, que fabricam e vendem as mercadorias que lhes interessam.  Estas outras pessoas constituem um segundo grupo. E este segundo grupo considera a inflação muito benéfica para seus negócios. Por que não? Não é esplêndido vender mais? E o proprietário de um restaurante situado nas vizinhanças de uma fábrica de munições, por exemplo, diz: “é realmente maravilhoso! Os trabalhadores do setor de munições estão com mais dinheiro; estão consumindo produtos do meu estabelecimento como nunca; estão todos prestigiando meu restaurante; isto me deixa muito feliz”. Não vê razão alguma para se sentir de outro modo.

A situação é a seguinte: aqueles para quem o dinheiro chega em primeiro lugar têm sua renda aumentada e podem continuar comprando muitas mercadorias e serviços a preços que correspondem ao estado anterior do mercado, à situação vigente às vésperas da inflação.  Encontram-se, portanto, em situação privilegiada. E assim a inflação se expande, passo a passo, de um grupo para outro da população. E todos os que têm acesso ao dinheiro adicional na primeira hora da inflação são beneficiados, enquanto os últimos a receber o dinheiro verão os produtos mais caros (Pois vendedores passam a aumentar o preço de seus produtos para que não comprem tudo de uma vez e não tornem as mercadorias em escassas).

O Preço Justo

Os escolásticos de Salamanca também defendiam o preço justo, mas consideravam que ele só poderia emergir em trocas voluntárias, juntamente com liberdade de concorrência. Em 1554, Luís Saravia de La Calle Veroñese sintetizou a posição dos escolásticos de que o preço justo “emerge da abundância ou escassez de mercadorias, mercadores e dinheiro, como já se disse, não dos custos, da força de trabalho e do risco. Se tivéssemos de considerar a força do trabalho e o risco na avaliação do preço justo, nenhum mercador jamais sofreria prejuízos, tampouco a abundância ou escassez de mercadorias e dinheiro influiriam na questão.”

O jesuíta Juan de Mariana também afirmava sobre os riscos da interferência do estado nos fenômenos do mercado:

“Somente um tolo tentaria separar esses valores de tal maneira que o preço legal fosse diferente do preço natural. Mais que tolo, perverso é o governante que ordena que um produto cujo valor percebido pelo povo – digamos, cinto – deva ser vendido a dez. Nessa matéria, os homens são orientados por estimativas comuns fundamentadas em considerações como a qualidade de coisas bem como sua abundância e escassez. Seria bobagem de um príncipe tentar minar esses princípios de comércio. É melhor deixá-los intactos do que buscar dominá-los à força em detrimento do povo.”

Entretanto, a maioria dos escolásticos espanhóis tinha a ressalva do estado fixar preços nas mercadorias em graves crises, sendo uma exceção em caso emergencial. Porém, até em casos emergenciais, a alteração dos preços por meio de um agente externo pode resultar em efeitos inesperados.

Um hotel da rede Days Inn, em Long Island, foi multado pouco tempo depois do 11 de Setembro por prática de preço abusivo. Com os aeroportos fechados, o hotel viu uma súbita e inesperada demanda por quartos, o que fez aumentar o seu preço. Se não houvesse leis impedindo que o preço da diária do hotel aumentasse, por exemplo, uma família de 4 pessoas, que normalmente alugaria 2 quartos, um para os pais e o outro para os filhos, se veriam obrigados a alugar apenas um quarto para todos eles conviver, ou poderiam até dividir o mesmo quarto com parentes e amigos, devido a escassez de quartos refletido no alto preço. Isso causaria problemas a curto prazo, mas a longo prazo outros comerciantes da área iriam perceber toda a confusão e os altos preços das diárias dos hotéis, e eles iriam improvisar quartos, kitnets em suas casas e seus comércios, e iriam conseguir um dinheirinho a mais abrigando essas famílias por um valor abaixo do que o hotel cobra.

Porém, com os preços artificialmente baixos, os quartos tendem a ser ocupados de forma mais rápida e sem planejamento, pois a família de 4 pessoas irá alugar 2 quartos, como normalmente fazem, e outros comerciantes e moradores de casas irão dificilmente ver a confusão acontecer para improvisarem kitnets baratos, e até provavelmente percam o incentivo para fazer isso, visto que acreditam que ganharão mais dinheiro caso seu comércio funcione normalmente do que se fizessem um kitnet. O livre mercado é a melhor forma de gerar racionamento de produtos e serviços. Distorcendo ele, aumenta incentivos para a falta de racionamento.

No congelamento do preço de produtos comestíveis, vemos ainda mais esse efeito, como na crise do governo Sarney. O preço artificialmente baixo de um produto leva, primeiro, a um esgotamento quase que imediato de todo o pequeno estoque que existe e, segundo, a uma ausência de informações e incentivos para que empreendedores procurem normalizar a oferta.

Quadragesimo Anno

Em 1931, no aniversário de 40 anos da Rerum Novarum, o Papa Pio XI escreveu a Quadragesimo Anno, encíclica que buscava atualizar a doutrina social da igreja. O papa, que escreveu inúmeras encíclicas condenando o fascismo, o nazismo e o comunismo, escreveu em Quadragesimo Anno que considerava o livre mercado, em princípio, benéfico, mas que havia problemas que poderiam ser corrigidos. Sua encíclica foi escrita no momento em que ocorria a grande depressão americana, e as escolas de pensamento econômico mais famosas de sua época consideravam o livre mercado e a “crise de superprodução” como responsáveis pelo crash, então é compreensível ver o papa fazendo criticas pontuais ao capitalismo.

Não quero me estender sobre a crise de 1929, já que há excelentes livros e artigos por aí sobre o tema. Mas Mises e Hayek já demostraram a priori e a posteriori que a crise foi causada por uma baixa taxa de juros artificial causada pelo Federal Reserve. Caso se interesse pelo assunto, pesquise sobre a teoria dos ciclos econômicos da Escola Austríaca.

O papa criticava o acumulo do capital em poucas mãos, enquanto havia pobreza no mundo. Sim, isso ocorria e ainda ocorre. Corporações se beneficiavam pelo poder financeiro passar a ser controlado cada vez mais pelo estado, o que favorecia o trabalho de lobistas.

Grandes empresários e corporativistas enriqueceram por lobby, como Marcelo Odebrecht, Eike Batista, João Dória, George Soros e grande maioria dos metacapitalistas. Grandes corporativistas não sobrevivem sem o estado, pois do contrário não seria necessário tanto investimento em políticos. Eles não gostam da livre concorrência, abertamente defendem doutrinas socialistas e, em alguns casos, governos de viés socialista, com a finalidade de se manter projetos de poder que visam destruir a sociedade a qual conhecemos. Muitos abertamente financiam campanhas em defesa do aborto e de desarmamento, projetos que promovem a degeneração moral, a quebra dos laços familiares que leva ao enriquecimento do estado e, por consequência, enriquecimento desses corporativistas (irei falar mais sobre essa relação ao decorrer do artigo). Há ligações entre instituições degeneradas, políticos e corporativistas de forma muito clara, como a demoníaca Planned Parenthood, responsável pela maior parte dos abortos nos EUA, que recebe milhões de dólares do governo sempre que o presidente é um democrata, e em troca ele financia campanha desses líderes políticos. George Soros financiou o instituto desarmamentista “Sou da Paz”, a abortista “Católicas pelo Direito de Escolher” e movimentos antifas. Corporativistas também defendem leis salariais para se mostrarem bonzinhos, escondendo a real motivação de quebrar concorrentes. Até Mark Zuckemberg falou, em 2019, “Ninguém merece ter tanto dinheiro (como eu)”. Ele também se beneficia da “lei” concedida pelo estado de propriedade intelectual e patenteamento para formar seu monopólio dos meios de comunicação digitais, proibindo outras redes sociais de crescerem copiando suas simples mecânicas. Sobre regulação de redes sociais, veja o vídeo “As redes sociais descentralizadas são a solução para punições injustas!” no canal Visão libertária.

Na Quadragesimo Anno, Pio XI comenta que “o trabalhador deve receber um salário suficiente para seu sustento e o de sua família”. Mais adiante, ele faz um atenuante: “se isso nem sempre puder ser atendido nas circunstâncias vigentes, a justiça social exige que se promovam mudanças, o mais depressa possível, para assegurar esse salário a todo trabalhador adulto”. O papa reconhece os argumentos que eu dei nesse artigo, visto que é o mesmo argumento de grandes teólogos da Igreja. Ele reconhece que nem sempre o salário mínimo pode ser benéfico, e propõe que mudanças devem ocorrer, mas sem se aprofundar em quais mudanças. Se com “mudanças” o papa quis dizer “aumento da produtividade”, bom, então eu devo concordar com ele.

O papa não falava sobre redistribuição de renda e a taxação de grandes fortunas, mas vou comentar sobre isso aqui, pois é algo que alguns católicos de hoje defendem. A ideia do mainstream econômico de condenar a desigualdade tendo em mente a pobreza é tola. Ela leva em consideração que a economia é um jogo de soma zero, em que alguém sai ganhando e alguém sai perdendo quando há trocas voluntárias. Óbvio, isso é falso, pois alguém só comercializa quando acredita que o que está recebendo é mais vantajoso do que o que está ofertando, e porque a riqueza é criada. É perfeitamente possível existir uma cidade em que todos são materialmente iguais, mas são pobres, e cidades em que a maioria das pessoas são materialmente desiguais, mas têm uma boa e confortável qualidade de vida. No segundo exemplo, invejar a propriedade do rico não passa de um pecado venial. Como argumentei anteriormente, a capacidade de consumir bens aumentam para toda a sociedade a partir do momento em que a produtividade do trabalho aumenta, o que é uma constante natural e lógica do capitalismo de livre mercado (ênfase no “livre”, pois liberdade de empreendimento gera uma maior racionalização na alocação dos recursos escassos. Leia-se “recursos escassos” como qualquer bem escasso, como madeira, tempo dos trabalhadores, dinheiro, ferro, borracha… a liberdade faz com que eles sejam empregados aonde realmente sâo demandados pela maioria das pessoas, já que do contrário não gerará lucro. Lucro é um incentivo sinalizador do grau de necessidades, e não é condenado pela Igreja).

Os empresários, comerciantes, entre outros, ganham dinheiro a cada vez que vendem seus bens para os trabalhadores, e a mercadoria fica mais acessível a cada vez que a produtividade aumenta (graças à evolução tecnológica) e cada vez que há concorrência entre lojas e empresas, que buscam vender a um menor preço para ganhar mais dinheiro que a concorrente, beneficiando assim os consumidores. Caso haja taxação de grandes fortunas, empresários vão pensar duas vezes em relação a enriquecer, terão incentivos para eles aumentarem o valor final dos seus produtos, e aumentarão os incentivos para diminuir o número de funcionários. O indivíduo age com o intuito de sair de um estágio de menor satisfação em direção a um estágio de maior satisfação, e ele faz isso por meio de escolhas. Escolhendo entre várias possibilidades para empregar seus recursos escassos, e é lógico que incentivos podem influenciar muito as suas escolhas. Claro, podemos observar que não é 100% dos casos que os preços aumentam em países que há taxação de ricos (ou, pelo menos, não são todos os produtos que aumentam). Porém, há concepções de empreendedores que, como dizia Bastiat, não se vê. O que a praxeologia nos dá de absoluta certeza, nessa caso, é que a realidade está pior do que estaria caso não houvesse essa interferência, por conta da artificial mitigação de incentivos. Existiria mais empregados, menores preços ou maiores investimentos caso tal roubo não ocorresse. Muitos empresários do exterior abandonarão a possibilidade de pensar em empreender em tal território, entre outras possibilidades…

Jeff Bezos não tem 182 bilhões de dólares na sua conta do banco, as maiores partes de sua riqueza estão investidas em meios de produção (por isso existe o termo “valor bruto”). Socializar esses bens é diminuir a capacidade da produtividade dos bens de consumo, e diminuir a qualidade de vida geral.

Populorum Progressio

Em 1967, foi escrito a Populorum Progressio pelo Papa Paulo VI, criticando o neocolonialismo e o imperialismo. De fato, há governos imperialistas, como os EUA, que se beneficiaram economicamente inúmeras vezes por meio de fomentação de conflitos em territórios alheios. Esses países devem ser criticados!

Sua encíclica se tornou conhecida por conceber a necessidade de governos ricos ajudarem materialmente governos pobres, por meio de dinheiro. Ele declarou que os esforços privados eram insuficientes e que “cabe às autoridades públicas estabelecer e especificar os objetivos desejados, os planos a ser seguidos e os métodos a ser usados para alcançá-los, e também é seu papel incentivar os esforços daqueles que estão envolvidos nessa atividade comum”. Essa ideia se mostrou totalmente falha, e até inúmeros católicos tradicionalistas se opõem a ela, visto que tal prática ajuda governos autoritários e corruptos a não arcarem com as consequências de suas ações políticas. O principal motivo para nações pobres continuarem pobres, não é pelo senso comum de que foi explorada no passado, mas sim por conta de governos que passam uma insegurança jurídica em relação ao direito de propriedade privada e direitos contratuais, o que faz com que empreendimentos privados não sejam cogitados. Subsidiar estados é a pior forma possível de fazer caridade, mais adiante falarei sobre o santo princípio de subsidiariedade. Subsidiar governos grandes e corruptos só faz com que os amigos do rei se beneficiem, e faz com que ele patrocine programas de governo populistas e assistencialistas apenas para cultivar a adoração por sua personalidade (algo comum em governos do tipo).

No final da Guerra Fria, mais de dois trilhões de dólares, considerada a inflação, foram doadas aos governos do Terceiro Mundo. Um estudo de 1983, feito pelo Banco Mundial, concluiu que as taxas de crescimento econômico em países emergentes caíam conforme aumentavam as distorções no mercado. Onze anos depois, o Banco Mundial chegou à mesma conclusão em relação ao relatório sobre a África. Dwight Phaup e Bradley Lewis observaram que:

“O recebimento de doações de recursos, circunstâncias favoráveis, a condição de ex-colônia e outros fatores semelhantes fazem pouca diferença na velocidade de crescimento econômico dos países. No entanto, os resultados das opções de políticas domésticas são sentidos em todas as áreas da economia”.

Até mesmo grandes nomes envolvidos nessa empreitada, anos depois, começaram a reconhecer sua falha, como Alan Woods, economista chefe da Agência Norte Americana para o Desenvolvimento Internacional:

“O auxílio estrangeiro é intrinsecamente ruim. Ele retarda o processo de crescimento econômico e a acumulação de riqueza. Enfraquece o efeito coordenado dos processos de mercado, direcionando o capital empresarial e intelectual para atividades não produtivas e administrativas. Cria uma tônica ética e moral que nega a dura tarefa de criação de riqueza. O auxílio estrangeiro permite que as sociedades transfiram a riqueza dos mais pobres para os mais ricos”.

A partir do momento em que há direito pleno de propriedade privada e direito contratual para poder empreender sem ser roubado, naturalmente surge o interesse para que empreendimentos surjam, e naturalmente surgirá capital local ou capital privado estrangeiro para empreendimentos maiores. Isso porque a riqueza não existe per se, ela é construída. Deve-se alimentar o povo, e não os governos, pois os governos têm incentivos para usar os alimentos como forma de comprar o apoio e a adoração do povo, além de matar de fome seus inimigos políticos.

O papa também alertava para as desvantagens que os países subdesenvolvidos enfrentam nas trocas internacionais. Hoje, ainda há muitas pessoas que têm mentalidade protecionista e defendem leis como a de substituição de importações. Medidas protecionistas apenas dificultam a vida dos mais pobres, pois os impedem de comprar mais barato (afinal, se naturalmente os produtos locais fossem mais baratos do que o estrangeiro, não seriam necessárias leis protecionistas). Quando há produtos importados que são mais acessíveis do que produtos locais, o povo deixa de gastar mais dinheiro do que gastaria com os produtos feitos localmente. Eles ficam com mais dinheiro no bolso, que poderá ser gasto de outras formas, ou que poderá ser investido em empreendimentos. De ambas as formas, isso causa mais empregos necessários na região, mais produtividade e um aumento da riqueza real de todos.

São João Paulo II

No centésimo ano da Rerum Novarum, em 1991, o Papa João Paulo II escreveu a Centesimus Annus, homenageando e atualizando a primeira encíclica da doutrina social da Igreja. Ele comenta sobre a queda do muro de Berlim, reitera todas as condenações ao comunismo, comenta sobre o direito natural à propriedade privada, defesa do lucro e como eles devem ser usados como meio para os indivíduos crescerem harmonicamente, não apenas como finalidade.

A Centesimus Annus alerta para a possibilidade dos programas assistências do estado burocratizarem e desumanizarem a caridade e o envolvimento cívico, destruindo o princípio de subsidiariedade. Porém, dez anos antes, ele teve um discurso contrário, em 1981, em que ele escreveu a Laborem Exercens, onde declarava:

“As despesas relativas a cuidados com a saúde, sobretudo em casos de acidente no trabalho, exigem que os trabalhadores tenham acesso a assistência médica e que, na medida do possível, esta seja barata ou até mesmo gratuita. No tocante a benefícios, outro setor seria aquele atinente ao direito ao descanso. Em primeiro lugar, isso engloba um descanso semanal regular que compreenda ao menos o domingo e também um período mais longo de descanso, ou seja, férias, gozadas uma vez ao ano ou talvez em períodos mais curtos durante o ano. Um terceiro setor diz respeito ao direito a aposentadoria ou seguro para a velhice e em caso de acidente de trabalho”.

O papa defendia direitos totalmente arbitrários, e que não são nada naturais. Ora, para algo ser um direito natural, ele deve ser possível e lógico em todos os tempos, em todos os lugares, para todos os humanos. Como dois homens, em uma ilha deserta, iriam impor ao seu semelhante seu “direito a pensão”, a não ser gritando e tentando escravizar um ao outro? Papa Pio XI nos lembra que há tentativas de melhorar a vida do trabalhador que podem resultar em condições piores do que haveria em um livre mercado, em Quadragesimo Anno. Impor inúmeros custos na contratação faz com que diminuam os incentivos para surgimento de novas contratações, e faz com que esses custos adicionais reflitam em uma diminuição do salário líquido. Faz com que empregos que não são tão produtivos deixem de existir. Faz com que existam menos trabalhos do que existiriam em uma realidade sem tantas leis trabalhistas, já que, novamente, quando algum encanamento da nossa casa entope, o procedimento padrão que normalmente seguimos é fazer um levantamento de preços com vários encanadores e contratamos aquele que tem o melhor preço. Se todos os preços forem altos, a maioria de nós irá preferir pegar uma chave inglesa e uma soda cáustica, e fazer o serviço por conta própria.

Em relação à saúde, o Papa pede para que, na medida do possível, esta seja barata. Há formas eficientes de baratear a saúde, que é tão sucateada e cara por conta das inúmeras regulações impostas pelo estado no Brasil, nos EUA, e na maioria dos países do mundo.

Além de regulamentações excessivas, os conselhos de profissões (que todos os médicos são obrigados a participar) também impõem códigos de ética que encarecem muito o serviço de profissionais da saúde. O artigo 38 do código de ética profissional do psicólogo o proíbe de fixar um preço abaixo do mercado e se divulgar com isso, proíbe fazer qualquer forma de propaganda para seu próprio serviço e não pode fazer uma previsão de preço pelo seu serviço. Isso faz com que esse serviço tão essencial se torne caro. Conselho Federal de Psicologia torna a psicologia um serviço elitista e pouco acessível para pessoas de baixa renda. Além de que essa regulamentação beneficia os psicólogos mais antigos e famosos em relação aos novos, visto que os novos psicólogos não podem cobrar por um preço menor, para assim aumentar seu currículo e crescer posteriormente.

O Conselho Federal de Medicina (CFM) também proíbe clínicas populares privadas de fazerem publicidade com valores de serviços, além de limitá-las a seguirem apenas os procedimentos reconhecidos pela CFM. Clínicas populares não podem divulgar preços nem na internet, a divulgação dos valores deve ficar limitada aos ambientes internos do estabelecimento. Além disso, “fica vedado praticar anúncios publicitários de qualquer natureza com indicação de preços de consultas, formas de pagamentos que caracterizem a prática da concorrência desleal, comércio e captação de clientela”.

“Para que o serviço médico não se confunda com comércio, a resolução (do CFM) veda a instalação de clínica no mesmo espaço que estabelecimentos que comercializem órteses, próteses, implantes de qualquer natureza, produtos e insumos médicos, bem como em óticas, farmácias, drogarias e comércio varejista de combustíveis, ou em interação com estabelecimentos comerciais de estética e beleza. No entanto, isso não impede, conforme entende o conselho, a instalação em ruas comerciais e mesmo em shoppings centers. Também fica proibida a oferta de promoções relacionadas ao fornecimento de cartões ou descontos.” (Fonte: “CFM regulamenta funcionamento de clínicas populares e limita publicidade”- Agência Brasil). Essas organizações quase soviéticas, que se recusam deixar a livre associação entre indivíduos acontecer, encarece ainda mais clínicas populares, tornando qualquer forma de concorrência legítima como ilegal e tornando a saúde privada como algo de consumo apenas das elites ricas. Apenas a concorrência e o livre mercado fazem com que preços baixem enquanto que a qualidade aumenta. Planos de saúde também são bastante regulados pelo estado brasileiro e estadunidense. O engraçado é que quem mais vem com esse papo de proibir o comércio de saúde são os ricos, isso acontece porque todos os aristocratas são um bando de socialistas que não aguentam ver pobres crescendo na vida e colocando seus monopólios em risco. Se você odeia rico, defenda o livre mercado!

Há casos famosos de quando cartéis conselhos de profissões intimaram indivíduos por fazerem coisas contrárias às regras da organização (organização essa em que o trabalhador é obrigado a participar, caso contrário vai preso). Em 2016, o veterinário Ricardo Camargo, de São Carlos, interior de SP, teve que suspender os atendimentos gratuitos que fazia a animais de estimação de pessoas carentes do seu bairro após receber intimação judicial do Conselho Regional de Medicina Veterinária, por ferir o Código de Ética da profissão. O conselho de veterinários proíbe a prestação de serviços gratuitos ou abaixo dos preços de mercado, exceto em casos de pesquisas, ensino ou utilidade pública. Para se enquadrar nessa última categoria, o profissional precisa estar vinculado a uma ONG ou sociedade civil reconhecida pelo conselho.

O conselho chegou até o Ricardo por conta de denúncias de veterinários que acusavam ele de concorrência desleal. Não existe concorrência desleal em trocas voluntárias, nunca! Essa ideia de proibir o profissional de fixar o preço que ele quiser faz o seu serviço virar elitista. Essa é só um dos exemplos de organizações apoiadas pelo estado sucateando a saúde privada.

A ANVISA é um órgão perigoso, que pode causar oligopólios. Em um livre mercado de verdade, existiriam vários selos privados de regulamentação (como de fato existem hoje, em outras áreas), e que podem divulgar seus dados de forma mais transparentes, em aplicativos, e em que suas reputações se tornam realmente importantes, visto que caso haja corrupção, seus rivais se beneficiariam. Na ANVISA, quando ocorre corrupção em seu órgão, quando lobistas se beneficiam do monopólio da vistoria, nada ocorre, visto que é um monopólio.

No começo da pandemia do Coronavírus, aumentou a busca dos indivíduos pela compra do álcool em gel, e isso resultou no aumento do preço. Porém, a escassez do álcool em gel não era natural, era artificialmente causado pela ANVISA. Era ilegal farmácias de manipulação fabricarem álcool em gel (as mesmas farmácias que mexem com outros remédios químicos). Depois disso, a ANVISA concedeu o poder para essas farmácias produzirem esse produto por um curto período de tempo. Há, também, uma burocracia enorme para comprar maquinas hospitalares estrangeiras, e também para criá-las. Um empresário do Paraná criou um respirador de baixo custo, no meio da pandemia da Covid-19, e ele mesmo falou que esperar a análise e a emissão da licença pela ANVISA para o produto poder ser utilizado iria demorar demais, e o momento da pandemia necessitava que seu produto fosse usado com urgência. (Sobre isso, veja a reportagem “Empresário de Marialva cria respirador para pacientes com Covid-19” da CBN Maringá).

Quando o governo gasta o dinheiro de outras pessoas para outras pessoas, é obvio que haverá má alocação de recursos escassos e superfaturamento, visto que não há incentivos para ser o oposto. E, em instituições de saúde públicas, os médicos ganharão o mesmo salário independente de realizarem ou não um bom trabalho, isso dá incentivos para o descaso dos profissionais em relação ao usuário do SUS que tanto vemos. Espero que a igreja volte, um dia, com a tradição de construir hospitais católicos financiados por doações.

Aposentadoria, Natalidade e Princípio de Subsidiariedade

Na Centesimus Annus, São João Paulo II alerta para os riscos do estado assistencialista:

“Disfunções e falhas no Estado de Assistência Social são resultado de certa incompreensão das tarefas próprias do Estado. Aqui, novamente, o princípio de subsidiariedade deve ser respeitado: uma comunidade de ordem superior não deve interferir na vida íntima de uma comunidade de ordem inferior, despojando esta de suas funções; ao contrário, deve ampará-la em caso de necessidade e ajudar a coordenar sua atividade com as atividades do resto da sociedade, sempre com vistas ao bem comum. Ao intervir diretamente e despojar a sociedade de uma responsabilidade, o estado de assistência social leva a uma perda de energias humanas e a um aumento excessivo de agências públicas, que são regidas mais por raciocínios burocráticos que pela preocupação de servir seus clientes e se fazem acompanhar de um enorme aumento de despesas. Na realidade, parece que as necessidades são melhores compreendidas e atendidas por pessoas mais próximas delas e que atuam como vizinhos dos necessitados. Deve-se acrescentar que certos tipos de demandas geralmente exigem respostas que não sejam simplesmente materiais, mas estejam aptas a perceber as necessidades humanas mais profundas. A condição de refugiados, imigrantes, idosos, doentes e de todos aqueles em circunstâncias que requerem assistência deve ser vista como o dos usuários de drogas: todas essas pessoas podem ser efetivamente ajudadas tão-somente por aqueles que oferecem aparo genuinamente fraterno, além dos cuidados necessários”.

Antigamente, as irmandades do final do século XIX e início do século XX prestavam os serviços que hoje associamos ao estado assistencialista, e elas faziam com atenção individualizada e legítima, do tipo que nenhum burocrata e político populista fará, e com recursos que não eram proveniente de roubo[2]. O estado assistencial tomou conta totalmente do sistema de auxílio mútuo.

O estado assistencialista é uma agressão direta à família, pois é ela quem destrói o tecido social, e isso é totalmente planejado. Os burocratas do deep state já entenderam isso, e por isso expandem projetos assistencialistas e pautas progressistas, e é por isso que corporativistas, como Soros e outros, compram pautas anti-família, pois isso acende o sentimento nos indivíduos de dependência estatal. Essa é a principal arma utilizada hoje para retardar a ascensão da sociedade de leis privadas, pois, com uma sociedade conservadora e patrocinadora do princípio de subsidiariedade, o povo entenderia mais rápido a falta da necessidade de um estado, ainda mais pela sua ineficiência frente à era da informação descentralizada e universalizada (comprem Bitcoin’s!). O estado tomou para ele todas as principais formas de se subsidiar o indivíduo, que ficava na família. Pegou para ele a garantia do seguro-desemprego, assistência à saúde, educação…

As consequências da intervenção do estado na seguridade social e seu potencial destrutivo das relações parentais são perceptíveis. Na maior parte da história humana, os indivíduos mais velhos contavam apenas com as economias adquiridos ao longo de sua vida produtiva, somado com a assistência de seus filhos adultos. As crianças eram sustentadas pelos pais até uma certa idade, com a condição de estudar, para no futuro poder formar sua família e poder ajudar a sustentar seus pais na velhice. Os idosos, por sua vez, ensinavam a seus netos sobre a história e os valores de seu clã.

Por conta disso, os casais acabavam tendo muitos filhos, para não causar tanto “prejuízo” a um filho apenas, caso eles fossem sustentados no futuro. E isso forçava-os a seguirem o conservadorismo e a Igreja, levando seus filhos desde o começo para essa instituição, para que seguissem essa ordem natural.

Porém, na Alemanha, Otto Von Bismarck criou o primeiro sistema de assistência social pública do mundo, que libertava os indivíduos da responsabilidade de obter o próprio sustento. Nesse sistema, o idoso não necessita mais de filhos para ter uma vida materialmente confortável, enquanto que as crianças não aprendem mais a doutrina e os valores de sua família, visto que já havia ensino público, obrigatório e totalmente controlado pelo estado, na Alemanha de Bismark (a Alemanha foi o primeiro país do mundo também a inventar o atual modelo de educação centralizada e pública). Isso fez com que diminuísse o valor do casamento, dos filhos, do conservadorismo, e fez com que aumentassem o número de divórcios e abortos. Fez com que diminuíssem os números de natalidade e de respeito em relação aos idosos.

O sistema de previdência social é uma pirâmide financeira. Quem entra em baixo (o trabalhador), paga para quem está no topo (o idoso). Quando você se torna o idoso, quem entra em baixo da pirâmide paga para sustentar sua aposentadoria. O problema é que cada vez mais nascem menos crianças, já que filhos não são mais tão importantes como eram antes, e então, gradualmente, acaba existindo mais idosos do que trabalhadores. A pirâmide se inverte.

Esse fenômeno foi observado até por cientistas sociais de esquerda. Gunnar e Alva Myrdal reconheceram, por meio de suas pesquisas empíricas, que a diminuição de nascimentos na Suécia se devia aos programas assistencialistas do estado, em especial a previdência social, que coletivizava o bônus de ter filhos, mas continuava privatizado na família o ônus de se ter filhos. Isso aumentava os incentivos para não se ter filhos, visto que eles passam a ser vistos pela família muito mais como gasto do que como investimento. Gunnar e Alva deram duas alternativas para esse problema: acabar com os projetos assistencialistas atuais, ou criar novos programas assistencialistas (por meio de imposto, claro) para tirar todos os custos da família de se criar filhos, oferecendo comida, roupas, escolas, creches, universidades, planos de saúde, completamente tudo “de graça”. Socialistas declarados, os Myrdal decidiram que a segunda opção era a melhor.[3]

Eu entendo que esse tipo de pensamento pode parecer demasiadamente materialista. Apesar da família ser uma instituição de ajuda material mútua, essa não é a única função da família. Porém, ao destruir essa relação, degenera as outras. Imagine um indivíduo sem virtude, ele pode casar e ter vários filhos apenas para ter os benefícios de se ter uma companhia e uma ajuda financeira quando não puder mais ser produtivo. Então, para poder ter certeza que eles não vão lhe abandonar e se tornar devassos, ele passa a levá-los à igreja, ele é forçado a ter uma boa relação familiar e atitudes conservadoras, o que pode levá-lo, com o tempo, a de fato adquirir virtudes. Agora imagine esse mesmo indivíduo sem virtude na atualidade, em que o estado tomou o poder de ajudar na velhice (e em todos os outros períodos). Ele perde os incentivos para se ter filhos, e perde todos os benefícios que isso causa.

A quebra da relação mútua de ajuda familiar, o ensino centralizado e obrigatório, tudo isso faz o valor da família diminuir, faz com que políticos populistas e líderes de movimentos degenerados se tornem mais importantes e venerados e se tornem figuras de identificação maiores do que os pais e líderes naturais do clã.

A rejeição do princípio de subsidiariedade causa terceirização moral, causa bizarrices como o Felipe Neto reclamar por famosos ricos doarem oxigênio na escassez desse gás em hospitais de Manaus, por considerar que doações deveriam ser responsabilidade do governo, e não dos indivíduos. Delegar todas as responsabilidades ao estado causa uma desumanização do indivíduo, faz o indivíduo pensar em como ajudar toda a humanidade, sem se preocupar em ajudar para mitigar o desespero mais imediato de seu irmão mais próximo. Principalmente em democracias, o estado se beneficia do fim dos laços familiares, pois isso faz com que indivíduos se submetam ao estado e políticos dêem programas assistencialistas e imediatistas, que causam inflação e pobreza a longo prazo, pois políticos têm um curto período de governança, não terão todas as causas de seus efeitos em suas costas. O assistencialismo mata a caridade e torna os pobres em mesquinhos, fazendo-os acharem que têm o dever de receber ajuda material.

Enquanto as doações privadas são feitas com o intuito de elevar o indivíduo para não precisar mais de doações, as “doações” do estado são para multiplicar o que é visto de forma negativa. Quando o estado subsidia desempregados, pobres, ineficiências, ele ajuda seu aumento. Quando escolas públicas têm resultados abaixo da média, elas recebem verba pública maior, enquanto escolas com resultado acima da média ganham verba igual ou menor que anteriormente, isso se torna incentivos para que ocorra ineficiência. Quando o estado toma o lugar do pai ausente e subsidia mães solteiras, ele favorece seu aumento. O cientista social James Payne, em Overcoming Welfare, escreveu que:

“As garotas que ‘se metiam em encrenca’–  eram objeto de mexericos –  e eram expulsas da escola. Ao ver essa reprovação social, as outras garotas esforçavam-se ao máximo para evitar a gravidez. Hoje em dia, programas como creches gratuitas para mães estudantes  fazem com que a gravidez de jovens solteiras na adolescência pareça quase normal – não um “problema”, em absoluto, mas uma opção viável, escolhida de livre e espontânea vontade por garotas de determinadas subculturas”. (com subculturas, creio eu que o ator esteja falando de pessoa à margem da sociedade, ou seja, pobres, pessoas em situação de vulnerabilidade).

De 1960 a 1990, o número de filhos nascidos fora do casamento cresceu de 5% para 28%, e de 23% para 65,2% entre afro-descendentes. Ao eliminar as consequências econômicas de seus atos, são eliminados os incentivos para evitá-lo.

Outras questões da DSI

Nesse século, aumentou-se o discurso ambientalista em encíclicas papais. Em Laudato si’, Papa Francisco escreveu:

“Os recursos da terra estão a ser depredados também por causa de formas imediatistas de entender a economia e a atividade comercial e produtiva. A perda de florestas e bosques implica simultaneamente a perda de espécies que poderiam constituir, no futuro, recursos extremamente importantes não só para a alimentação, mas também para a cura de doenças e vários serviços.”

Não vou me aprofundar sobre isso, pois há o excelente livro O Ambientalista Libertário, escrito pelo biólogo, doutor em ecologia e professor de universidade federal, Marco Batalha, em que argumenta várias questões sobre a ecologia com base no pensamento austrolibertário. Basicamente, a extração tem esse caráter imediatista por conta da tragédia dos comuns. As terras e a natureza são encaradas como um bem comum, algo de todos, então os custos de tais usos e cuidados serão de todos. Há mais incentivos para consumir e menos para cuidar.

Um exemplo prático disso é a seguinte: Antigamente, era comum, aqui no Brasil, os prédios terem um hidrômetro coletivo. O consumo de água de um prédio era socializado: media-se o volume de água consumido por todo o prédio, dividia-se esse volume pelo número de apartamentos e cobrava-se de cada apartamento o valor médio. Assim, não adiantava você economizar água, porque se o seu vizinho a desperdiçasse, você também pagaria a conta. Logo, não havia nenhum incentivo para que os condôminos economizassem esse recurso. Pelo contrário, o incentivo era para que eles gastassem à vontade, já que os vizinhos teriam também de arcar com os custos. Esse hidrômetro socializado era fonte de inúmeros conflitos e brigas homéricas em reuniões de condomínio. Qual a única solução possível? Isso mesmo, individualizar o consumo de água. Isso foi feito, e os prédios novos vêm sendo construídos com hidrômetros separados para cada apartamento, o que racionaliza o consumo de água e faz com que cada família pague exatamente o que gasta, nem mais, nem menos. Note que a socialização de um recurso natural – no caso, a água – não funciona nem em uma situação extremamente simples, como em um único prédio, envolvendo algumas poucas pessoas. O que dirá de uma escala muito maior?

O papa também se mostra feliz pelos acordos globais sobre o clima e incentiva sua prática, além de defender uma autoridade global, como a ONU, para promover esse cuidado com o bem comum. Ele também comenta sobre a fala de Bento XVI, em Caritas in veritate, que defende uma autoridade mundial para promover o desarmamento, a economia e a paz global:

“Para o governo da economia mundial, para sanar as economias atingidas pela crise de modo a prevenir o agravamento da mesma e em consequência maiores desequilíbrios, para realizar um oportuno e integral desarmamento, a segurança alimentar e a paz, para garantir a salvaguarda do ambiente e para regulamentar os fluxos migratórios urge a presença de uma verdadeira Autoridade política mundial, delineada já pelo meu predecessor, o (São) João XXIII.”. “Perante o crescimento incessante da interdependência mundial, sente-se imenso — mesmo no meio de uma recessão igualmente mundial — a urgência de uma reforma quer da Organização das Nações Unidas quer da arquitetura econômica e financeira internacional, para que seja possível uma real concretização do conceito de família de nações.”

Creio eu que essa alternativa levantada pelos papas seja criticada pela maioria dos católicos. Ainda mais com a bíblia apontando o governo mundial como um passo para o apocalipse. É previsto até um controle mundial da economia, em Apocalipse 13:16,17: “E faz que a todos, pequenos e grandes, ricos e pobres, livres e servos, lhes seja posto um sinal na sua mão direita, ou nas suas testas, Para que ninguém possa comprar ou vender, senão aquele que tiver o sinal, ou o nome da besta, ou o número do seu nome.”

Será imposto sobre o povo uma marca e ela é quem definirá quem está a favor ou contra essa coligação. O cenário de união entre as potências religiosas e políticas do mundo é um dos últimos sinais que vão anteceder a segunda vinda de Cristo e o fim do mundo. Quando Cristo vier, as autoridades políticas e religiosas vão perder seus poderes, e Deus salvará o seu povo e será o único governante do Universo, e “Ele reinará pelos séculos dos séculos”.

Além disso, uma autoridade política global traria inúmeros problemas. Qualquer comerciante que monopolize a oferta de algum produto, como, por exemplo, haver um único padeiro do mundo, o dá muitos incentivos para o aumento do preço e deterioração da qualidade de seu produto. Com a monopolização da jurisdição, tal monopólio é extremamente mais perverso. O governo poderia passar qualquer lei demoníaca, poderia regular a economia global em prol de alguns poderosos, taxar empreendedores e deixariam todos os homens bons sem opções de lugares para poder fugir.

Eu prefiro enxergar a DSI como uma critica moral a um problema, mas não como algo que impõe o método definitivo para resolver o problema. O método para alcançar o fim do problema moral apontado pelos papas deve ser de livre debate, já que a compreensão da relação de causa e efeito do âmbito econômico foge totalmente da área da moralidade.

“A Igreja não tem soluções técnicas para oferecer e não pretende de modo algum imiscuir-se na política dos Estados; mas tem uma missão ao serviço da verdade para cumprir, em todo o tempo e contingência, a favor de uma sociedade à medida do homem, da sua dignidade, da sua vocação. Sem verdade, cai-se numa visão empirista e céptica da vida, incapaz de se elevar acima da ação porque não está interessada em identificar os valores — às vezes nem sequer os significados — pelos quais julgá-la e orientá-la. A fidelidade ao homem exige a fidelidade à verdade, a única que é garantia de liberdade (cf. Jo 8, 32) e da possibilidade dum desenvolvimento humano integral.” — Caritas in Veritate, Bento XVI

O padre James Sadowsky (1923-2012), amigo pessoal de Murray Rothbard e outros austríacos, foi um jesuíta e professor de filosofia, lógica matemática e ética empresarial da Universidade Fordham. Seguia a Escola Austríaca e os escolásticos de Salamanca, e disse que “o que havia de errado com o pensamento social católico de século XIX não era tanto sua ética, mas sua incompreensão de como o livre mercado pode funcionar”. “A preocupação com o trabalhador era absolutamente legítima, mas a preocupação pouco pode fazer, a menos que conheçamos as causas da doença e sua cura”. A Igreja deve sim criticar as fraudes e roubo que acontecem sistematicamente nas relações de trocas, em nossa atual sociedade, mas, em relação às causas e efeitos gerais do mercado, é possível debater sadiamente qual a melhor forma de gerar um maior conforto a todos os indivíduos. Como já disse anteriormente, o católico não pode fugir da relação de causa e efeito de suas intervenções, pois há leis naturais e atemporais do funcionamento das trocas interpessoais, independentes das virtudes do humano que queira alterá-lo.

Imposto

Austrolibertários definem o estado como a instituição que monopoliza a jurisdição. E, a partir disso, tenta monopolizar qualquer outra função. Segundo o sociólogo Franz Oppenheimer, há apenas duas formas de interações sociais: a via política, do qual o mais forte impera e manda no mais fraco, e a via econômica, do qual livres trocas e livres associações causam melhorias a todos os indivíduos envolvidos.

Murray Rothbard usa a Teoria do Bandido Estacionário para identificar como o estado se forma, em A Anatomia do Estado. Um bando de saqueadores descobre que seus roubos seriam mais eficientes se eles parassem em alguma vila e iniciasse suas espoliações de forma fracionada, vivendo como parasitas, dando um serviço de segurança monopolizada com a base da força e taxando os indivíduos da forma que eles quisessem. Posteriormente, uma classe de intelectuais iria criar teorias, como contrato social, mitos de fundação, títulos, imagens e bandeiras bonitinhas para esconder o fato da instituição monopolizadora da segurança e da jurisdição não passar de uma máfia. Foi assim a história do Brasil, com o império português invadindo esse território e monopolizando tudo com base na sua força.

O estado age como milícias cariocas. Eles tomam uma certa área, como favelas e morros, monopolizam seus serviços, literalmente assassinando a concorrência, e dão “bens públicos, gratuitos e de qualidade’’. Muitos milicianos do Rio de Janeiro fazem festas, fazem gato de luz, subsidiam gás de cozinha, provém Wifi grátis, tribunais e segurança para toda a comunidade. Eles mexem com o sentimento natural de amor ao seu próprio bairro para fazer com que jovens acreditem que devem apoiar e proteger a milícia, pois a milícia é sua família, seu laço paternal… Fazem eles acreditar que tudo seria pior sem a milícia.

Na Baixa Idade Média Europeia, durante a infame era feudal, quando pessoas entravam em conflito, elas procuravam um juiz para que o problema fosse resolvido. Elas recorriam a autoridades naturais, aristocratas, reis ou clãs. Esses reis não tinham títulos hereditários, apenas eram escolhidos voluntariamente pelos cidadãos, por depositar sua confiança a ele. Os reis não eram pessoas que criavam leis, eles apenas acreditavam que a lei já existia, assim como a matemática e qualquer coisa lógica, era o dever do bom juiz apenas encontrar a verdade, encontrar a lei e revelar para seus clientes.[4]

Os reis eram escolhidos pela população por sua habilidade de conquistar riqueza, por sua sabedoria, bravura ou alguma combinação disso tudo. Alguns indivíduos vêm a ter mais autoridade que os demais, e suas opiniões e julgamentos adquirem um amplo respeito, tornando-se assim um aristocrata. Quando um aristocrata natural perdia a confiança, as pessoas poderiam recorrer a outro aristocrata. Não havia um monopólio da jurisdição, como há hoje em dia. Naquela época, havia uma espécie de ‘’livre mercado de tribunais privados’’, e sempre que um aristocrata tomava uma decisão de forma injusta, ele era acusado de irresponsabilidade por outros aristocratas.

Os aristocratas e os reis só podiam “taxar” com o consentimento dos taxados e, em sua própria terra, todo homem livre era equivalente a um soberano, ou seja, o tomador máximo de decisões, assim como o senhor feudal era em suas terras. Sem consentimento, a cobrança de impostos era considerada sequestro, ou seja, expropriação ilegal. O rei estava abaixo da lei e era subordinado a ela. Muitos aristocratas não cobravam pelo serviço, por considerar um dever cívico honroso.

Não era um sistema perfeito. Ainda existia servidão em muitos lugares, mas ela se aproximava imensamente da ordem natural, do anarcocapitalismo austríaco. Não havia relativismo legislativo, nem monopólio da jurisdição e arbitragem.

Porém, com o passar do tempo, aristocratas decidiram monopolizar seus serviços, impedindo que seus clientes buscassem outro aristocrata. O rei, gradualmente, passa a deteriorar seus serviços. Ele poderia ser parcial, poderia criar leis que não são naturais, poderia cobrar mais caro do que o normal pelo seu serviço, pois não havia mais concorrência. Nesse momento, o rei vira o estado.

O rei passa de um aristocrata natural para um rei absolutista, e depois para um rei constitucional. Se apoiando primeiro no seu trabalho como árbitro de conflitos, depois se apoiando na religião, e, por último, se apoiando em uma elite de intelectuais, como os filósofos que teorizaram algo que nunca aconteceu: o contrato social. Não há nenhum registro de que, um dia, todos assinaram algum contrato cedendo toda sua autonomia para alguma organização social. E mesmo que algum dia isso tivesse acontecido, não poderia ser um contrato hereditário. Seus filhos não poderiam virar escravos só porque seu pai escolheu voluntariamente virar escravo.

O estado, de fato, realiza muitas funções importantes e necessárias: da provisão da lei ao fornecimento da polícia e de bombeiros, da construção e manutenção das ruas à entrega de correspondências. Mas isto, de forma alguma, demonstra que apenas o estado pode realizar estas funções ou que ele de fato as realize toleravelmente bem.

Suponha, por exemplo, que existam muitas barracas de melão concorrentes em uma determinada vizinhança. Então, um dos vendedores de melão, Silva, utiliza violência para expulsar todos os seus concorrentes da vizinhança; desse modo ele empregou violência para estabelecer um monopólio coercitivo sobre a venda de melões em uma determinada extensão territorial. Será que isto significa que a utilização de violência de Silva para estabelecer e manter seu monopólio foi essencial para o fornecimento de melões na vizinhança? Certamente não, pois, além dos concorrentes atuais, haveria também os concorrentes em potencial, caso Silva abrandasse tanto a ameaça como o uso da violência; além disso, a ciência econômica demonstra que Silva, sendo um monopolista coercitivo, tenderá a realizar seus serviços de uma maneira mais cara e ineficiente, já que os consumidores são privados da escolha de qualquer alternativa possível. É a concorrência empresarial que faz com que produtos e serviços sejam mais eficientes e baratos.

O padre jesuíta Juan de Mariana (1536-1624) também negava que o rei teria algum poder de tributar as pessoas sem seu consentimento, e negava que o rei seria o verdadeiro proprietário dos bens de seus súditos. Ao rei não foi dado o poder de “atacar suas casas e terras, confiscando e tomando para si o que lhe aprouver.” “Nem o poder concedido ao líder em tempos de guerra nem a autoridade de governar súditos autoriza a apropriação dos bens dos indivíduos”. Juan de Mariana defendia até que o assassinato de reis que aumentassem impostos seria justificável.

“Os bens particulares dos cidadãos não estão à disposição do rei. Assim, ele não pode tomá-los, no todo ou em parte, sem a aprovação daqueles que têm direito sobre eles. Este é o pronunciamento dos jurisconsultos: o rei não tem o poder de tomar uma decisão que resulte na perda de bens privados sem que os proprietários concordem, tampouco pode tomar qualquer parte de sua propriedade ao criar e impor um novo tributo”.

O jesuíta também criticava a manipulação e a depreciação monetária que os reis faziam e que resultava em inflação (apesar da palavra “inflação” não existir na época), além de criticar também a criação de monopólios, que causava enriquecimento indevido para monarcas e seus amigos sob um produto mais caro e mais ineficiente do que seria em um livre mercado.

Todos os conflitos entre pessoas que ocorrem no mundo, acontecem por conta de recursos escassos. Um conflito ocorre quando duas ou mais pessoas tentam usar o mesmo recurso, ao mesmo tempo e para fins mutuamente excludentes. Por exemplo: Brigas pela posse de uma maçã, na floresta. Conflitos religiosos, em que algum religioso quer mandar em como o seu semelhante irá usar seu corpo e seu tempo. Até mesmo conflitos políticos, em que um grupo de pessoas deseja escolher como outras pessoas irão administrar seus recursos escassos, e quais recursos escassos as outras pessoas irão poder ou não usar.

Os bens da natureza são escassos, e, por isso, podem existir conflitos entre as pessoas para possuí-los. É função dos direitos de propriedade evitar esses possíveis conflitos sobre o uso dos recursos escassos através da atribuição de direitos de propriedade privada. Na realidade, até se assumirmos que vivemos no Jardim do Éden, aonde todos os recursos são infinitos, ainda assim nós teríamos nossos corpos escassos, e assim deveriam surgir regras de uso exclusivo pelo seu próprio corpo.

Quando uma pessoa age para alterar um estado de coisas que é entendido por ela como menos satisfatório, para um estado de coisas que parece mais recompensador, essa ação envolve necessariamente uma escolha relativa ao uso do corpo desse indivíduo. E escolher, preferindo uma coisa ou estado a outro, significa, evidentemente, que nem tudo, que nem todos os prazeres e satisfações possíveis podem ser desfrutados ao mesmo tempo, mas que algo considerado menos valioso deve ser rejeitado com a finalidade de obter alguma outra coisa considerada mais valiosa. Assim, escolher sempre resulta em custos. Até no Jardim do Éden eu não poderia, simultaneamente, comer uma maçã, fumar um cigarro, tomar uma bebida, subir numa árvore, ler um livro, construir uma casa, brincar com meu gato, dirigir um carro etc. Eu teria que fazer escolhas e só poderia realizar essas ações em sequência.

E seria assim porque só há um corpo que eu posso utilizar para realizá-las e para desfrutar a satisfação advinda de cada uma dessas realizações. Eu não tenho uma abundância de corpos que me permitiria aproveitar, simultaneamente, todas as satisfações possíveis num único momento de êxtase. Num outro aspecto, eu também estaria limitado pela escassez: na medida em que esse recurso escasso chamado de “corpo” não é indestrutível e nem equipado com saúde e energia eternas, mas um organismo com apenas um tempo de vida limitado, ou seja, o tempo também é escasso. Portanto, deveria haver autopropriedade no jardim do éden para acabar com possíveis conflitos. Eu, por exemplo, poderia querer usar o meu corpo para desfrutar uma xícara de chá enquanto outra pessoa poderia querer começar um relacionamento amoroso com meu corpo, me impedindo assim de beber o chá e também reduzindo o tempo disponível para buscar meus próprios objetivos por meio deste corpo, caso não houvesse autopropriedade. Ao falar sobre seu corpo, é impossível falar sem utilizar expressões possessivas: ‘’meu corpo’’, ‘’meu braço’’, ‘’meu pé’’, isso é uma prova de que o corpo é seu, e não simplesmente você. Eu posso fazer trocas contratuais, autorizando que outro indivíduo ame, machuque, examine ou injete medicamentos em meu corpo, visto que é minha propriedade. Qualquer forma de alterar ou invadir a integridade desse corpo sem autorização é chamado de agressão. Agressão, por definição, é fazer uma troca em que o agressor saia beneficiado enquanto o agredido saia lesado, uma troca não voluntária por uma das partes. (Algumas pessoas podem argumentar que o corpo de alguém não pode ser propriedade da pessoa, pois o corpo é a pessoa. Essa ideia materialista está totalmente errada, pois, caso eu perca um braço, eu não estaria perdendo 10% da minha identidade. Quando eu vou doar sangue, eu não estou doando a mim mesmo, e sim parte da minha propriedade. O corpo não sou eu, porém sou dono do corpo. O “eu” é minha alma, ou minha mente, para os anarcocapitalistas ateus).

O corpo é o meio ao que o individuo recorre para atingir uma finalidade. A ação humana sempre busca ir de um estágio que ele considera menos satisfatório para ir a um estágio entendido por ele como mais satisfatório. É impossível argumentar contra a autopropriedade, pois, ao fazer isso, você está utilizando seus bens escassos (como os lábios, as cordas vocais, o pulmão…) para realizar essa tarefa, e acaba a validando. E é impossível argumentar contra a propriedade e autopropriedade de outro ser humano, pois, ao fazer isso, você está reconhecendo que ele utiliza e é o dono legitimo daquele corpo (pois o outro humano está usando os recursos escassos dele para captar e entender sua mensagem). Usar o corpo para qualquer tipo de agressão é contraditório. (Obs: Todos os humanos vivos são autoproprietários de seus corpos. O ato de argumentar é apenas uma demonstração disso).

Exemplo mais curto e didático, para impedir confusões: Você age com o intuito de sair de um estágio de menor satisfação para um estágio de maior satisfação (satisfação material, intelectual ou espiritual, você que avalia sua escolha com base na sua prioridade e nas informações que você assimila), e você usa seus recursos para isso, como tempo, dinheiro, corpo.

Se outra pessoa quer usar seu corpo para batizá-lo, e você não quiser, pois orienta ele para outra finalidade, isso nos mostra uma coisa: só existe um corpo, e ele é ordenado pela alma (ou mente) que a controla.

Se o outro religioso negar isso, ele deveria negar que ele também não é o proprietário legítimo de seus próprios recursos, pois do contrário seria contraditório.

Após a autopropriedade, o ser humano passa a possuir outras propriedades, visando sempre sobreviver e ficar mais satisfeito (satisfeito de alimentação, de conhecimento, de espiritualidade ou de entretenimento, isso sempre avaliado subjetivamente e individualmente). Isso só pode ser feito eticamente por meio de trocas voluntárias ou por apropriação original (John Locke dizia que, ao misturar seu trabalho com a terra e transformar ela em outra coisa, você vira o dono legitimo dessa fração da natureza). Por isso, toda forma de início de agressão é contraditório e abominado por austrolibertários. Agressão só é legítimo se for orientado por meio de legítima defesa ou penalidade por crimes. E, por conta disso, austrolibertários são contrários ao estado, por considerá-lo um agente coercitivo, parasítico e que promove a agressão institucionalizada (além de utilitariamente desnecessário).

Conceito de apropriação original: o dono legítimo de certa porção de um recurso da natureza é o primeiro a se apropriar dele, trabalhando nele para aumentar sua produtividade (por exemplo, um homem que arou e plantou em um pequeno pedaço de terra, e depois o cercou).

Não é possível que os bens da natureza sejam “de toda a sociedade”, pois, se fosse, eu deveria pedir autorização para todos os humanos para que eu possa, por exemplo, pegar e comer certa maçã de uma árvore. E não é possível que o dono legítimo seja o último a se apropriar e nem alguma outra colocação arbitrária, apenas o primeiro a se apropriar é concebível logicamente como proprietário legítimo. Leão XIII concorda com isso.

Há algo na DSI chamado “Destino comum de bens”, que é um princípio parecido com a “função social de terras” da atual legislação federal. Como diz a constituição pastoral Gaudium et Spes, do concílio Vaticano II, “Deus destinou a terra com tudo o que ela contém para uso de todos os homens e povos; de modo que os bens criados devem chegar equitativamente às mãos de todos, segundo a justiça, secundada pela caridade”. Alguns podem confundir essa definição como algo parecido com marxismo, mas não é. A igreja definitivamente defende a propriedade privada e o lucro, desde que esses tenham uma função social. Em Centesimus Annus, São João Paulo II afirma:

“A Igreja reconhece a justa função do lucro, como indicador do bom funcionamento da empresa: quando esta dá lucro, isso significa que os fatores produtivos foram adequadamente usados e as correlativas necessidades humanas devidamente satisfeitas.”

De fato, quando uma empresa dá lucro, ela indica que realmente atendeu a sua função de oferecer algo demandado pela sociedade. E quando essa empresa tem concorrência, ela tem incentivo maior para atender de forma mais eficaz e com maior qualidade ao consumidor. Quando algo não favorece a sociedade, inevitavelmente perderá lucro, perceberá sua ineficiência e deverá ser liquidado o seu empreendimento, para que outro aloque os recursos de forma mais vantajosa para todos. Sobre o caso especifico da especulação, leia o artigo “Vamos culpar os especuladores!” de Walter Wiliiams, publicado no Instituto Rothbard.

Em Laudato si’, o Papa Francisco invoca o principio do destino comum de bens para criticar os latifúndios, criticar o acumulo de terras e a falta do acesso da terra aos pobres. Ele defende uma reforma agrária, para resolver tal injustiça. Eu também defendo uma reforma agrária, mas com base no princípio de homesteading (defendido por John Locke e Leão XIII), bem diferente da reforma agrária espoliadora de fazendeiros defendida, aqui no Brasil, pelo MST. Quando o império português chegou no continente americano, ele não se apropriou originalmente dessas terras. Eles não fizeram o que John Locke chama de “Homesteading”. Os portugueses apenas chegaram e colocaram pedras no litoral brasileiro escritas sobre, a partir de agora, aquele território pertencer ao rei português. Não é assim que se apropria da terra no modelo de Homesteading, ainda mais porque já havia moradores na região. Essa apropriação criminosa, na época da colonização, contribuiu muito para a desigualdade de terras. Desde as colonizações, até a lei de terras de 1850, o Brasil vivia o sistema de Sesmaria, em que as pessoas só poderiam ter uma terra caso o monarca doasse ou vendesse esta para eles. Após a Lei de Terras, só poderiam adquirir terras ao comprar diretamente do estado ou de antigos donos. Sempre foi proibido o natural e ético homesteading no Brasil. (Obs: Usucapião, no ordenamento jurídico brasileiro, só funciona para se apropriar de terras privadas. Não funciona para se apropriar de terras do governo).

Há muitas favelas no Brasil em que a maioria dos indivíduos não tem nenhum documento alegando ser dono daquele território, como no Vidigal/RJ, pois eles não compraram esses terrenos do estado. Mesmo que eles tenham sido os primeiros a se apropriarem do local, o estado não os considera donos legítimos do território. Isso causa muitos problemas para essas pobres pessoas, como a impossibilidade de abrir contas em bancos, e incertezas sobre a proteção de suas posses perante saqueadores, como os próprios saqueadores estatais.

Não há outra forma ética de vida em sociedade que não seja o austrolibertarianismo. Todas as que não respeitam a propriedade privada levam à agressão. Por exemplo, é totalmente ilógico você ser proibido de abrir uma empresa de ônibus e concorrer contra os cartéis monopolistas. É ilógico políticos escolherem o que pode e o que não pode ser ensinado nas escolas brasileiras, coisas assim deveriam ser direito de escolha do indivíduo e da família, e de mais ninguém.

Politizar a alocação dos recursos escassos não é uma boa ideia. Imagine a tamanha inépcia que seria o país se houvessem debates para escolher qual tipo de escova de dente as pessoas deveriam usar. Se seria uma com cabo de plástico ou madeira, elétrica ou manual, qual produto deveria compor as cerdas e qual o nível de flexibilidade ela deveria ter, e, ao final do debate, todos fossem ter de votar sobre qual modelo de escova seria usada por todos. Essa é a sociedade sem respeito à propriedade privada, em que há um conflito de interesses constante sobre o que cada um deve ou não fazer com sua propriedade e sua autopropriedade, um ambiente de agressão institucionalizado aos direitos individuais. Seria uma sociedade que empregaria muitos lobistas. Bem, nossa sociedade não é tão distante desse exemplo. Espero que a sociedade do futuro veja os debates eleitorais que temos hoje e riam, ao analisar vereadores debatendo sobre como deve ser o transporte público, os empregos, a disposição das casas, a previdência, o ensino, o ordenamento social em geral, ao invés de simplesmente respeitar a soberania da propriedade privada e deixar que a concorrência permita cada um escolher o melhor para si e para sua família (e não para o coletivo).

O austrolibertário defende que o direito natural de propriedade privada e o princípio de não agressão devem ser respeitados. Isso não significa que propriedade privada é absoluta e inviolável. Propriedade privada pode sim ser violada em alguns casos, mas apenas em urgências e essas ações terão algum tipo de reação. Como, por exemplo, alguém poder roubar o carro de outra pessoa se essa for a única forma de salvar um terceiro. Porém, essa pessoa que roubou deve saber que o dono do carro pode processá-lo, caso queira. Caso esse processo totalmente improvável aconteça, a multa que a pessoa deverá pagar não poderá ser grande, e muito provavelmente quem abriu o processo sofreria de boicote e ostracismo social.

São Tomás de Aquino também defendia que a propriedade privada de outrem poderia ser violada apenas em extrema necessidade. Ele afirma, na questão 66 do segundo volume da Suma Teológica:

“Se a necessidade atual é tão manifesta e urgente que obviamente precisa ser remediada por quaisquer meios que estejam ao alcance (por exemplo, quando uma pessoa está em perigo iminente e não existe outro remédio possível), então, é legítimo que um homem socorra sua própria necessidade mediante o uso da propriedade de outrem, tomando-a abertamente ou em segredo”.

Torna-se importante analisar os fragmentos do parágrafo “urgente” e “não existe outro remédio possível” para frisar que nem todo roubo é legitimamente justificável.

O anarquismo que foi fundado por Pierre-Joseph Proudhon é extremamente diferente do “anarcocapitalismo” do austrolibertarianismo. É tão diferente que até Hoppe prefere usar outros nomes para ele, como “ordem natural” e “sociedade de leis privadas”. É tanto que Frederic Bastiat, um proto austríaco, debateu com Proudhon contra a ideia do anarquista de que os juros bancários seriam algo criminoso e imoral. Proudhon era contra a autoridade da propriedade privada dos meios de produção, contra os juros bancários, contra autoridade da Igreja e entre outros, não apenas contra o estado. Sua famosa frase “propriedade é roubo!” ilustra isso.

Creio que muitas pessoas pensam que o libertarianismo austríaco defende que o ordenamento social deva se curvar ao poder financeiro. Fazem criticas como Papa Francisco em Fratelli Tutti: “a política não deve submeter-se à economia, e esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia”. Tal concepção pode ser comum para pessoas de fora, mas é totalmente oposto da realidade. Austrolibertarianismo não defende a economia per se, pois não é ela quem cria leis éticas e morais. Austrolibertarios defendem o mínimo comum ético, o principio de não agressão à propriedade e autopropriedade, mas pode haver outras formas de contratos voluntários que expandam as leis.

Os papas usavam essa critica relacionada às crises que supostamente foram culpas do liberalismo econômico. Bento XVI defendia uma arquitetura global para organizações como a ONU controlar a economia, pois ele acreditava que a crise de 2008 era culpa do livre mercado. Pio XI também criticava o liberalismo econômico, apontando-o como causador da crise de 1929. Tais crises, de fato, foram causadas por uma desordem na econômica, resultado de intervenções agressivas do estado e do banco central no mercado e nas relações sociais. Sobre isso, leia o excelente artigo de Hans F. Sennholz “A Grande Depressão – uma análise das causas e consequências”, publicado em português no Instituto Rothbard. E “Como ocorreu a crise financeira americana” de Leandro Roque, publicado no Instituto Rothbard.

Caso você tenha mais tempo, leia os livros O que o governo fez com o nosso dinheiro? e A grande depressão americana de Murray Rothbard. Todo privilégio que governantes dão a banqueiros e corporativistas é altamente criticado pela Escola Austríaca, esses bancos são muito regulados pelo banco central, há altas barreiras de mercado para impedir novos players, a moeda fiduciária não tem lastro em nada, apenas em honestidade de político, há fraudes bancárias orquestradas pelo banco central, como a fraude da reserva fracionária… O Banco Central deve ser extinto, e as moedas devem ser lastreadas em algum metal, ou devem ser digitais e terem oferta limitada. Há teorias de que Satoshi Nakamoto criou o Bitcoin por conta de seu profundo ódio pelos governos que socorriam grandes bancários e grandes corporativistas, por ter desenvolvido a tecnologia no meio da crise de 2008. Bitcoin é uma moeda descentralizada que está totalmente fora da mão dos banqueiros, corporativistas, globalistas e protegido das adulterações de qualquer burocrata. Se você odeia banqueiros judeus, odeia banqueiros de qualquer religião/etnia ou odeia burocratas que controlam o sistema financeiro por meio da manipulação e expansão monetária, pesquise sobre criptomoedas, é a tecnologia perfeita para todas as ideologias e formas de pensamento!

A igreja não defende formas especificas de ordenamentos sociais humanos, ela apenas julga a moralidade dos mesmos. São João Paulo II afirma isso, em Centesimus Annus:

“A Igreja não tem modelos a propor. Os modelos reais e eficazes poderão nascer apenas no quadro das diversas situações históricas, graças ao esforço dos responsáveis que enfrentam os problemas concretos em todos os seus aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais que se entrelaçam mutuamente. A esse empenhamento, a Igreja oferece, como orientação ideal indispensável, a própria doutrina social que — como se disse — reconhece o valor positivo do mercado e da empresa, mas indica ao mesmo tempo a necessidade de que estes sejam orientados para o bem comum”

Isso é um fato tão verdadeiro, que enquanto papas antigos defendiam sistemas monárquicos, os papas atuais defendem a democracia, em seus documentos doutrinários. Também em Centesimus Annus, São João Paulo II comenta que:

“A Igreja respeita a legítima autonomia da ordem democrática, mas não é sua atribuição manifestar preferência por uma ou outra solução institucional ou constitucional. O contributo, por ela oferecido nesta ordem, é precisamente aquela visão da dignidade da pessoa, que se revela em toda a sua plenitude no mistério do Verbo encarnado” e “A Igreja encara com simpatia o sistema da democracia, enquanto assegura a participação dos cidadãos nas opções políticas e garante aos governados a possibilidade quer de escolher e controlar os próprios governantes, quer de os substituir pacificamente, quando tal se torne oportuno; ela não pode, portanto, favorecer a formação de grupos restritos de dirigentes, que usurpam o poder do Estado a favor dos seus interesses particulares ou dos objetivos ideológicos.”

Não apenas os papas novos defendiam esse formato de governança, como também papas de um século em que a maioria da Europa era monárquica. Foi o que São João Pulo II afirmou sobre Leão XIII, sobre sua preferência por um sistema de três poderes separados, a tripartição de poder de Montesquieu:

“Leão XIII não ignorava que uma sã teoria do Estado é necessária para assegurar o desenvolvimento normal das atividades humanas: tanto as espirituais, como as materiais, sendo ambas indispensáveis. Por isso, numa passagem da Rerum novarum, ele apresenta a organização da sociedade segundo três poderes — legislativo, executivo e judicial — o que constituía, naquele tempo, uma novidade no ensinamento da Igreja. Tal ordenamento reflete uma visão realista da natureza social do homem a qual exige uma legislação adequada para proteger a liberdade de todos. Para tal fim é preferível que cada poder seja equilibrado por outros poderes e outras esferas de competência que o mantenham no seu justo limite.”

Pelo o que eu já afirmei, e pelo o que eu ainda vou afirmar até o fim desse artigo, é sim possível conciliar um ordenamento social austrolibertário com o catolicismo. Tom Monaghan é um empresário, fundador da Domino’s Pizza e filantropo católico. Ele criou a Fundação Ave Maria, que é dona de uma estação de rádio, escritórios para financiar ONG’s católicas, escolas primárias comandadas por freiras e uma universidade. No local de uma plantação de tomate abandonada na zona rural de Collier County, na Flórida, Tom criou a cidade privada Ave Maria, uma cidade planejada não incorporada, possuindo ruas com o nome de santos e é o local da Universidade Ave Maria, uma instituição católica conservadora. Há regras privadas nessa cidade, como afirmou seu dono: “Não vai haver nenhuma televisão pornográfica na cidade de Ave Maria. Se você for à farmácia e quiser comprar a pílula ou os preservativos ou contracepção, você não será capaz de conseguir isso na Cidade de Ave Maria”. Porém, a cidade ainda é bastante criticada pelos burocratas da federação por violar termos da constituição americana, e a cidade é bastante violada por políticas públicas, em alguns momentos. Mesmo que essa cidade não seja perfeita, é uma possibilidade de funcionamento.

Quem leu vários livros do Hoppe, compreende sua noção de quanto mais a sociedade de leis privadas impera, mais a moralidade emerge, e não precisa necessariamente da ajuda de ricos para isso. As privatizações que ocorrem no Brasil são maléficas e criticadas pela Escola Austríaca. FHC não tem o direito de vender a Vale do Rio Doce para um bando de corporativistas, pois essa empresa nem deveria ser do estado, para início de conversa, então ele não tem o direito de vender para outro. Privatização boa é aquela em que a comunidade próxima à empresa, os funcionários e etc, se apropriam do bem que era do estado. No caso de uma rua, as pessoas que moram nela devem se tornar proprietárias, obtendo frações de sua propriedade e se tornando sócias da rua. Eles poderiam votar, como sócios majoritários, e escolher um “síndico da rua”, ou poderiam vender sua parte da propriedade para algum empresário. No primeiro caso, seria mais fácil de administrar e fixar regras morais que a sociedade daquela comunidade deseja, e, por meio do voto, poderiam expurgar atitudes imorais que eles não queiram em sua proximidade. Uma comunidade católica, caso quisessem, poderia votar em síndicos e em propostas para impedir que mulheres visivelmente vulgares, usuários de drogas, pessoas que professam sua fé pagã na rua, e entre outros, andassem nessas ruas, e eles teriam o direito de fazer isso por essa ser sua propriedade privada. Por conta disso, é realmente incrível como a maioria dos liberais e social-democratas criticam austrolibertários, chamando-nos de intolerantes, fascistas e tudo mais, enquanto que tradicionalistas e fascistas clericais chamam-nos de libertinos e tolerantes com tudo.

Se a propriedade privada fosse respeitada por todos, Hans-Hermann Hoppe afirma que a moralidade teria muito a ganhar:

“Estaríamos no caminho certo para restabelecer a liberdade de associação e exclusão intrínseca ao instituto da propriedade privada se ao menos as cidadezinhas e vilarejos pudessem seguir e seguissem o que era o procedimento comum até boa parte do século XIX na Europa e nos Estados Unidos. Haveria placas informando os requisitos de entrada em uma cidade e, uma vez nela, requisitos para entrar em propriedades específicas”. “E aqueles que não atendessem a esses requisitos de entrada seriam expulsos como invasores. Como isso, a normalidade cultural e moral haveria de reafirmar-se quase que imediatamente”.

Assim como defendemos que a propriedade privada pode ser violada em alguns poucos casos, como em roubos com o intuito de salvar outras vidas humanas, também creio que algumas monarquias antigas foram estados com justificativas legítimas. É melhor que Santo Alfredo de Wessex colete impostos para defender sua comunidade, formando exércitos para matar os vikings assassinos e estupradores, do que esperar um exército voluntarista surgir espontaneamente. Não cabem tantos julgamentos sob a sociedade antiga, visto que a informação não era descentralizada, por conta de sua tecnologia primitiva não havia tanto conhecimento, e por conta disso era utilitariamente melhor governos coordenarem a administração jurídica e a segurança. Além disso, é possível que Deus realmente destine uma porção territorial para um monarca, trazendo milagres que comprovem isso a todo o povo, como em alguns relatos bíblicos. Deus pode fazer isso, pois, em última análise, ele é o proprietário de tudo. Mas, tal teoria teocrática do direito divino dos reis não é aplicável em todos os momentos porque, primeiramente, houve reis católicos guerreando contra reis católicos, e segundamente porque a igreja respeita a democracia em vários países que já foram monarquias, na contemporaneidade.

Outrossim, muitas pessoas são obrigadas a se juntarem ao sistema vigente para poder praticar alguma mudança. Um professor de biologia católico é obrigado pelo Ministério da Educação a falar sobre preservativos. Pobres são obrigados a andar em ônibus péssimos de corporativistas que detêm monopólio concedido pelo prefeito. Médicos são obrigados a trabalhar em postos públicos, por conta de haver poucas alternativas privadas, causada pelo estado. Não é pecado utilizar e fazer parte de sistemas estatais, desde que você tente minimamente fazer o bem, como o professor de biologia que pode alertar sobre métodos sexuais contrários à vida levarem ao inferno, segundo a igreja.

Em relação às polemicas passagens bíblicas de romanos 13, sobre “daí a César o que é de César’’ e sobre a expulsão dos mercadores do templo, veja os excelentes vídeos “A mensagem libertária de cristo- parte 1,”, “A mensagem libertária de cristo- parte 2”, “A mensagem libertária de cristo-parte 3” e “A mensagem libertária de cristo- parte 4” do canal Visão Libertária.

Fique com o livro de Samuel, até o próximo capítulo:

Quando, porém, disseram: “Dá-nos um rei para que nos lidere”, isso desagradou a Samuel; então ele orou ao Senhor. E o Senhor lhe respondeu: “Atenda a tudo o que o povo está lhe pedindo; não foi a você que rejeitaram; foi a mim que rejeitaram como rei. Assim como fizeram comigo desde o dia em que os tirei do Egito, até hoje, abandonando-me e prestando culto a outros deuses, também estão fazendo com você. Agora atenda-os; mas advirta-os solenemente e diga-lhes quais direitos reivindicará o rei que os governará”.

Samuel transmitiu todas as palavras do Senhor ao povo, que estava lhe pedindo um rei, dizendo: “O rei que reinará sobre vocês reivindicará como seu direito o seguinte: ele tomará os filhos de vocês para servi-lo em seus carros de guerra e em sua cavalaria, e para correr à frente dos seus carros de guerra. Colocará alguns como comandantes de mil e outros como comandantes de cinquenta. Ele os fará arar as terras dele, fazer a colheita, e fabricar armas de guerra e equipamentos para os seus carros de guerra. Tomará as filhas de vocês para serem perfumistas, cozinheiras e padeiras. Tomará de vocês o melhor das plantações, das vinhas e dos olivais, e o dará aos criados dele. Tomará um décimo dos cereais e da colheita das uvas e o dará a seus oficiais e a seus criados. Também tomará de vocês para seu uso particular os servos e as servas, e o melhor do gado e dos jumentos. E tomará de vocês um décimo dos rebanhos, e vocês mesmos se tornarão escravos dele. Naquele dia, vocês clamarão por causa do rei que vocês mesmos escolheram, e o Senhor não os ouvirá”.

Todavia, o povo recusou-se a ouvir Samuel, e disse: “Não! Queremos ter um rei. Seremos como todas as outras nações; um rei nos governará, e sairá à nossa frente para combater em nossas batalhas”.

Liberdade e Libertinagem

É bastante interessante, enquanto que liberais e social-democratas chamam austrolibertários de intolerantes, os fascistas clericais chamam-nos de libertinos. Se você utiliza o Twitter e está na bolha austrolibertária, sempre vê tais afirmações.

Vou falar sobre uma confusão comum, que até algumas pessoas dentro da bolha entendem dessa forma, e com certeza a maioria das pessoas de fora veem assim, o libertarianismo austríaco não é sobre liberdade. Uma maior liberdade, em algumas questões, é uma consequência, mas não um princípio da ordem natural. Liberdade per se não pode ser um princípio, não pode ser uma lei natural, pois limites são naturais. Eu não tenho, por exemplo, liberdade para voar, pois as leis naturais da física me proíbem disso. O que libertários austríacos realmente defendem é a liberdade calcada na lei de propriedade privada. A liberdade de expressão, por exemplo, é limitada pela propriedade privada. O pai, sendo dono da casa e o indivíduo que sustenta seu filho, do qual ainda não possui capacidade mental para responder por si mesmo, tem o direito de limitar o que sua prole fala e aprende.

Algumas pessoas defendem que qualquer tipo de deturpação moral, mesmo cometidas em propriedade particular e com autorização do proprietário, devam ser criminalizados. Tal afirmação é criticada por São Tomás de Aquino, na segunda parte da Suma Teológica, questão 90 a 108. Ele chegou a argumentar até que a prostituição, em determinadas circunstâncias e em alguns casos, não deveria ser proibida judicialmente.

“Do mesmo modo, também no governo humano, aqueles que estão investidos de autoridade toleram convenientemente certos males, a fim de que não se percam determinados bens nem ocorram determinados males maiores. Assim diz Agostinho: ‘Se desaparecerem as prostitutas, o mundo convulsionará de lascívia’”.

Na questão 96, São Tomás considera que o governo deve proibir apenas vícios extremamente graves, que feririam diretamente outros indivíduos, como roubo, estupro, assassinato…

“Ora, a lei humana é formulada para muitos seres humanos, dos quais a maioria não é perfeita em virtude. Por isso, as leis humanas não proíbem todos os vícios dos quais os virtuosos se abstêm, mas tão-somente os vícios mais graves, dos quais é possível que a maioria se abstenha; e sobretudo daqueles que prejudicam os outros, sem cuja proibição a sociedade humana não poderia ser mantida: assim, a lei proíbe o assassinato, o roubo e atos semelhantes”. “O propósito da lei humana é levar os homens à virtude, não de súbito, mas gradualmente. Por isso, ela não impõe à multidão de homens imperfeitos o julgo daqueles que já são virtuosos, a saber, que devem abster-se de todo o mal. Do contrário, os imperfeitos, sendo incapazes de suportar tais preceitos, acabariam perpetrando males ainda maiores”.

São João Paulo II, em Centesimus Annus, também critica o fanatismo religioso e a intenção de criar um ordenamento social rígido e sem liberdades:

“A Igreja também não fecha os olhos diante do perigo do fanatismo, ou fundamentalismo, daqueles que, em nome de uma ideologia que se pretende científica ou religiosa, defendem poder impor aos outros homens a sua concepção da verdade e do bem. Não é deste tipo a verdade cristã. Não sendo ideológica, a fé cristã não presume encarcerar num esquema rígido a variável realidade sócio-política e reconhece que a vida do homem se realiza na história, em condições diversas e não perfeitas. A Igreja, portanto, reafirmando constantemente a dignidade transcendente da pessoa, tem, por método, o respeito da liberdade”

O santo ex-papa também defendia a liberdade religiosa, aconselhando-a aos estados que estavam se livrando do comunismo, em Centesimus Annus:

“Após a queda do totalitarismo comunista e de muitos outros regimes totalitários e de ‘segurança nacional’, assistimos hoje à prevalência, não sem contrastes, do ideal democrático, em conjunto com uma viva atenção e preocupação pelos direitos humanos. Mas, exatamente por isso, é necessário que os povos, que estão reformando os seus regimes, dêem à democracia um autêntico e sólido fundamento mediante o reconhecimento explícito dos referidos direitos. Entre os principais, recordem-se: o direito à vida, do qual é parte integrante o direito a crescer à sombra do coração da mãe depois de ser gerado; o direito a viver numa família unida e num ambiente moral favorável ao desenvolvimento da própria personalidade; o direito a maturar a sua inteligência e liberdade na procura e no conhecimento da verdade; o direito a participar no trabalho para valorizar os bens da terra e a obter dele o sustento próprio e dos seus familiares; o direito a fundar uma família e a acolher e educar os filhos, exercitando responsavelmente a sua sexualidade. Fonte e síntese destes direitos é, em certo sentido, a liberdade religiosa, entendida como direito a viver na verdade da própria fé e em conformidade com a dignidade transcendente da pessoa”

A última encíclica a adentrar o magistério da Santa Igreja até o momento em que eu escrevo esse artigo, Fratelli Tutti, escrito por Papa Francisco, também defende a liberdade religiosa:

“Como cristãos, pedimos que, nos países onde somos minoria, nos seja garantida a liberdade, tal como nós a favorecemos para aqueles que não são cristãos onde eles são minoria. Existe um direito humano fundamental que não deve ser esquecido no caminho da fraternidade e da paz: é a liberdade religiosa para os crentes de todas as religiões. Esta liberdade manifesta que podemos encontrar um bom acordo entre culturas e religiões diferentes; testemunha que as coisas que temos em comum são tantas e tão importantes que é possível individuar uma estrada de convivência serena, ordenada e pacífica, na aceitação das diferenças e na alegria de sermos irmãos porque filhos de um único Deus.”

A igreja também condena a pena de morte. São João Paulo II o condenava, como afirmou Papa Francisco em Fratelli Tutti:

“São João Paulo II declarou, de forma clara e firme, que a mesma (pena de morte) é inadequada no plano moral e já não é necessária no plano penal. Não é possível pensar num recuo relativamente a esta posição. Hoje, afirmamos com clareza que a pena de morte é inadmissível e a Igreja compromete-se decididamente a propor que seja abolida em todo o mundo.”

Na mensagem do Papa João Paulo II para o 28° dia mundial das comunicações sociais, em 1994, o santo afirmou que “Reconhecendo a importância de um livre intercâmbio de ideias e de informações, a Igreja sustenta a liberdade de expressão e de imprensa. Ao mesmo tempo, insiste no fato que deve ser respeitado o direito de cada um, das famílias e da sociedade, à privacidade, à decência pública e à proteção dos valores fundamentais da vida”, e disse que a constituição pastoral Gaudium et Spes, de 1965, ampara sua declaração. Em Aetatis Novae, o papa argumentou que “intervenção governamental (na mídia) continua a ser um instrumento de opressão e exclusão”.

É possível frear a deterioração moral de outras formas, além do meio coercitivo e tirânico. Apenas ao destruir todas as leis de interferência indevida e enfraquecimento dos laços familiares, já ajuda muito. Como já falei nas partes anteriores desse artigo, a instituição da família, em uma ordem natural, sem seus incentivos manipulados pelo estado, leva ao conservadorismo dos costumes e da moralidade. Quando há interferência nos incentivos por meio do estado, os filhos deixam de se identificar com seus pais e passam a se identificar e venerar líderes políticos e outros degenerados das mídias sociais. A família como uma verdadeira instituição de ajuda mútua e identificação histórico-parental causa inevitavelmente a uma mitigação do individualismo perverso e do vazio existencial que a mídia e os burocratas querem criar em seus filhos, incentivando o indivíduo a olhar sua sociedade de forma caridosa.

Dessa forma, por meio de uma cultura conservadora, e por meio do direito de exclusão inerente ao direito de propriedade privada, o poder da desaprovação social, boicote, segregação e excomunhão tornam-se armas poderosas contra os vícios pecaminosos que não são tão extremos ao ponto de causar dano direto à propriedade de outros.

____________________________________

Fontes:

A Escola Austríaca – Jesús Huerta de Soto

Vídeo – A Igreja Católica: Construtora da Civilização, por Thomas Woods. Parte 2, Igreja inimiga da ciência? – Thomas Woods

A Igreja e O Mercado: Uma Defesa Católica da Economia de Livre Mercado – Thomas Woods

Fé e Liberdade – Alejandro Chafuen

Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo – Hans Hermann Hoppe

Democracia, o deus que falhou – Hans Hermann Hoppe

______________________________

NOTAS

[1] Leo the Thirteenth, The First Modern Pope — Katherine Burton

[2] From Mutual Aid to the Welfare State: Fraternal Societies and Social Services – David Beito

[3] The Swedish Experiment in Family Politics: The Myrdals and the Interwar Population Crisis – Allan Carlson

[4] Kingship and Law in the Middle Ages – Fritz Kern

10 COMENTÁRIOS

  1. Alguns parágrafos e frases de encíclicas mencionadas nesse artigo, como as da Centesimus Annus, Rerum Novarum e Laborem Exercens, foram escritas com base no livro de Thomas Woods, “A Igreja e o Mercado”, traduzido do inglês para o português por Giovanna Louise Libralon e pela editora Vide Editorial. Por conta disso, caso você copie e cole os trechos nos PDF’s das encíclicas disponibilizadas pelo site do Vaticano, talvez você não encontre exatamente o mesmo texto, pois a tradução em português das encíclicas do Vaticano foi feito por outro tradutor. Obviamente, sempre há diferenças no uso de palavras entre tradutores. Porém, alguns trechos foram baseados na tradução em português do site do Vaticano, como os trechos relacionadas a Caritas in Veritate, Laudato Si’ e Fratelli Tutti.

  2. Bravíssimo!

    A associação entre a ética-jurídica austríaca e a Santa Igreja católica é a única maneira de salvar a civilização ocidental do desastre, impedindo assim que a própria raça humana desapareça da terra.

    “em oposição aos degenerados seguidores de Ayn Rand”

    Fantástico! é isso mesmo que eu penso de liberais, principalmente desses fanáticos totalitários da seita randiana, que acham que objetivismo é um filosofia sofisticada. Como tu é aqui da província, quando quiser violar o P. N. A. de algum randiano é só me avisar….

    É curioso que eu conheço um randiano metido a intelectual liberal que diz exatamente isso que tu colocou no texto: “argumentar que o corpo de alguém não pode ser propriedade da pessoa”. O sujeito está sempre na mídia, já que um liberal é praticamente um esquerdista. É outro ateu degenerado que por conta disso, defendeu aqui em Porto que portadores de coronga fossem segregados para evitar que o comércio fosse fechado. Além de apoiar coisas básicas como a legitimidade dos Estados Unidos atirarem bombas nucleares em Hiroshima e Nagasaki para defender o estilo de vida americano…

    Os liberais seguem a típica nomenkatura ideológica de esquerda radical comunista/estatista: “a maioria dos liberais e social-democratas criticam austrolibertários, chamando-nos de intolerantes, fascistas e tudo mais”. Eu normalmente sou chamado também de anarquista e niilista por esses vagabundos…

    Os movimentos libertários são totalmente compatíveis com a moral por causa desta frase citada por ti do nobre São João Paulo II, que aplica-se em ambos os casos: “A Igreja não tem modelos a propor. Os modelos reais e eficazes poderão nascer apenas no quadro das diversas situações históricas” Só libertários e a Santa Igreja podem se intercambiar nesta frase.

    Para finalizar, uma história curiosa sobre São João Paulo II. Quando ele esteve aqui em Porto Alegre (eu não lembro se fui, mas minha família foi em peso. Eles eram sírios e vieram para o Brasil fugindo dos turcos. Chegaram aqui como cristão maronitas mas por algum motivo se converteram a Roma). O prefeito da época como é de costume, entregou a chave da cidade para o então papa João Paulo II. Ele olhou para o prefeito e disse:

    – espero que isso não signifique que eu tenha que pagar impostos, não é?

    Santo João Paulo II, da Ordem dos Austríacos.

  3. Incrível, elucidou diversas dúvidas que eu tinha. Fui confrontado dessa possível impossibilidade de conciliar os 2 num podcast do TradTalk. Para quem conhece um pouco de Escola Austríaca, é extremamente ilógico a existência de um Estado, fiquei abismado quando alguém nos comentários falou que deveria apoiar alguma forma de Estado para ser considerado católico. Acontece que, convenientemente, eles não citam que a infalibilidade papal é válida apenas quando o Papa se pronuncia sobre fé e moral.

    Inclusive ótimo tema para um artigo, fiquei sabendo de algumas pessoas que abandonaram o austrolibertarianismo porque acreditavam haver alguma impossibilidade de conciliar com o catolicismo.

  4. Eu esqueci de comentar, no artigo, sobre o caso do número 1899 do catecismo “toda autoridade emana de Deus”. “Submeta-se cada qual às autoridades constituídas. Quem resiste, pois, à autoridade, opõe-se à ordem estabelecida por Deus, e os que lhe resistem atraem sobre si a condenação”. Um leitor do Instituto Rothbard me perguntou sobre isso, no Twitter, então vou escrever sobre aqui nos comentários.
    Pensa comigo, toda nação já se desmembrou de nações maiores. O rei de Portugal seria herege por se separar da monarquia islâmica e fundar uma monarquia católica? E o imperador do Brasil seria herege por se separar da monarquia liberal portuguesa pra fundar sua própria monarquia? E no futuro, os separatistas sulistas seriam hereges por se separar do Brasil? Se toda autoridade política é pela graça de Deus, então essas novas autoridades provenientes de secessões também são. E então, se um novo ordenamento social libertário emergir, como no nosso exemplo das governanças privadas de ruas comentada no artigo acima, é o que Deus quer. Tem um vídeo da saga “a mensagem libertária de cristo” do canal visão libertária que fala sobre essa questão, com outros bons argumentos, sugiro assistir. Mas a igreja também defende a desobediência civil contra arbitrariedades estatais que vão contra a igreja, como a obrigação do aborto, que ocorria em alguns países (como a China). São José desobedeceu as autoridades territoriais ao fugir com sua família e impedir que Menino Jesus seja assassinado, entre outras provas de desobediências civis em oposição às injustiças.

    • O homem comum, as pessoas que sustentam suas famílias através de trocas pacíficas são muito superior moralmente a classe política. Sua noção de certo e errado e seu carácter é extremamente superior a políticos. Pessoas que vivem de trocas pacíficas devem se orgulhar de si mesmo, e ter a consciência que é a sua responsabilidade orientar e defender a população dos desmandos da escória da sociedade, pessoas arrogantes e violentas que acreditam que o uso da força contra a população pode ser de alguma forma benéfica. Ao você desobedecer a bandidos violentos de terno e gravata (os políticos) você mostra que tem discernimento superior para entender isso apesar da enxurrada de informações conflitantes da mídia, você mostra que tem responsabilidade com o próximo, você mostra que acredita na verdade e na justiça. Não se preocupe com o respeito do mainstream, se preocupe com o respeito da elite moral, que com certeza vai vir ao você fazer o certo!

    • Ademais, esse “dogma” – presente em Romanos 13, a propósito – implica em uma restrição da legitimidade da autoridade às potestades ungidas efetivamente por Deus. E, de qualquer maneira, nenhuma autoridade está permitida – nem sob o catolicismo e nem sob o libertarianismo – a violar os direitos de propriedade privada dos indivíduos – reconhecidos pela Igreja Católica – e, portanto, deve ser voluntarista.

  5. Perdão aos Chiocca’s por eu retornar aqui nos comentários novamente. Espero que seja a última vez. Alguém afirmou no Twitter que é necessário escolher entre a ética divina e a ética da propriedade privada. Certamente, não é necessário se privar de constatações lógicas apenas pelo indivíduo ser católico, visto que a lógica não é anti-católico (como afirmo no artigo).
    Por você ser católico, você não precisa excluir o conceito de apropriação original lockeano (que até Papa Leão XIII utiliza), ou a visão de Hegel de aplicar sua vontade ao solo, o transformando em propriedade. Nem a demonstração transcendental da auto-propriedade feita por Hoppe no teorema da a priori da argumentação. Nem a praxeologia. O católico não abandona verdades racionais ou axiomas.
    O corpo é autopropriedade do indivíduo, e o indivíduo pode fazer o que quiser com seu corpo para atingir sua satisfação pessoal, isso é um juízo de fato. Significa que o indivíduo pode alienar seu corpo, mas apenas em algumas partes isso é aceito (não condenado) pela igreja (como para doação ou venda de sangue. Há estados nos EUA em que ricos podem pagar para pessoas doarem sangue para ele, em caso de necessidade. Como para doação de órgão… A igreja também não é contra indivíduos fazerem tatuagens, desde que não seja desenho com conotação demoniaca). Estou falando sobre isso só para ficar ainda mais frisado em exemplos para impedir maiores incompreensões.
    Houve pessoas reclamando por o artigo apenas ter fontes austríacas. Eu comentei sobre isso no último comentário aí a baixo. Eu faço citações a livros de São Tomás de Aquino e a encíclicas, mas não coloquei os livros na parte de fontes, pois eles foram escritos com base nas citações presentes no livro de Thomas Woods, que foram traduzidos pela Vide Editorial, e por isso pode ter algumas palavras e termos diferentes em relação a outras traduções. Mas há sim citações de autores não austríacos.

    Por favor, quem quiser criticar o artigo, leia-o todo, pois há questões que se seguem de premissas anteriores. Ler pulando partes, em alguns casos, pode tornar o texto incompreendido e pode criar espantalhos. Eu escrevi ele praticamente todo pela ordem em que está

  6. Muito bom!

    Eu gostaria, ainda, de mencionar os comentários de Murray N. Rothbard, no seu livro “A Ética da Liberdade”, sobre a praxeologia e São Tomás de Aquino.

    “São Tomás de Aquino, nas palavras do eminente historiador da filosofia Padre Copleston, ‘enfatizou o lugar e a função da razão na conduta moral. Ele [Aquino] compartilhava com Aristóteles a visão de que é a posse da razão que distinguia o homem dos animais’ e que ‘o permite agir deliberadamente, em vista do fim conscientemente apreendido, e o eleva acima do nível de comportamento puramente instintivo’. . . . Aquino, então, percebeu que os homens
    sempre agem propositalmente, mas também foi além disso, ao argumentar que os fins também podem ser apreendidos pela razão como, ou objetivamente bons, ou maus, ao homem.” – Murray N. Rothbard, “The Ethics of Liberty” (1998), pp. 6–7.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui